— …Então….— Ancilla fez uma pausa enquanto tentava acalmar sua agitação.
No entanto, cada vez que via o filho, cujos olhos estavam inchados de tanto chorar, corria o risco de perder o controle de suas emoções. Ancilla deu um tapinha no peito para abafar os sentimentos de frustração e pegou um leque para refrescar o rosto.
— …Meu filho, Cyan, desafiou um descendente colateral para um duelo… e perdeu?
— Sim — , respondeu Hazard.
Hazard fez questão de não levantar a cabeça curvada. Ele não queria aumentar o número de reprimendas que receberia dessa tigresa mal-humorada levantando a cabeça inutilmente.
— Além disso, você disse que aquele garoto não treinou sua mana?
— Sim….
— Isso não faz o menor sentido — , declarou Ancilla, sua reação inconscientemente espelhando a de Cyan.
Ela olhou para o filho incrédula. Cyan apenas ficou lá, fungando com os olhos baixos.
— Venha aqui.
— …Mãe…
— Eu disse para você vir aqui! — Ancilla gritou alto, incapaz de segurar por mais tempo.
Os ombros de Cyan tremeram, junto com o resto de seu corpo. Mesmo assim, embora com passos hesitantes, avançou até ficar diante de Ancilla.
Respirando fundo, Ancilla estendeu a mão com força.
— Urgh! — Cyan gritou.
A mão dela estava pressionando firmemente contra seu plexo solar, embora a dor de antes ainda não tivesse diminuído… Hazard olhou com pesar para Cyan antes de abaixar a cabeça mais uma vez.
— Em um único golpe?
— M-mãe, isso dói…!
— Fique quieto!
Assim que ele estava prestes a dar um passo para trás, o corpo de Cyan imediatamente enrijeceu com a ordem. Ancilla usou toda a sua força e repetidamente pressionou seu plexo solar sem qualquer hesitação. Cada vez que ela fazia isso, Cyan era forçado a cerrar os dentes para conter um grito.
Ciel estava assistindo a essa cena com uma expressão mal-humorada de seu assento no fundo da sala. Ela estava quase explodindo de vontade de dizer alguma coisa, mas Ciel sabia muito bem que não havia nada a ganhar abrindo a boca aqui.
— Hazard, você jura que viu tudo certo? — Ancilla virou-se para Hazard.
— …- Hazard hesitou.
— Perguntei se você está disposto a fazer um juramento — Ancilla repetiu.
— Aquele pirralho, ele realmente não treinou sua mana?
— Sim, eu juro — Hazard finalmente se rendeu.
Sob nenhuma circunstância um juramento deve ser feito levianamente. No entanto, se ele ficasse em silêncio agora, algo terrível definitivamente estaria reservado para ele. Hazard tinha certeza disso.
— O filho de Lorde Gerhard, Mestre Eugene, não treinou sua mana. Nem mesmo um único traço de mana pode ser sentido em seu corpo.
— Sério?
Ancilla procurou em sua memória o nome Gerhard. O nome dele não veio à mente de imediato, significando que ela já o havia classificado como um nome que não valia a pena lembrar. Isso significava que ele definitivamente tinha que ser o da província de Gidol. Ela parecia lembrar que Gerhard era o nome de um certo inseto que nem sequer possuía um título oficial e foi enterrado no campo. Ele era de uma linha colateral que se separou da família principal centenas de anos atrás e, até agora, nenhum membro daquela família havia causado qualquer impacto.
— Meu filho…— Ancilla disse enquanto puxava a camisa de Cyan.
Cyan fechou os olhos enquanto seu corpo tremia de medo.
Ancilla continuou — Foi derrotado em um único golpe… por alguém que nem treinou sua mana.
A superfície de seu estômago estava vividamente colorida em preto e azul. Ancilla bufou ao ver essa contusão profunda. Ela também era descendente de uma família marcial. Seu pai, o conde Caines, ocupava uma posição importante nas forças armadas do império.
— Sim, isso foi definitivamente feito em um único golpe. Ciel, como seu irmão conseguiu perder? — Ancila perguntou.
-M-mãe. Isso é— Cyan gaguejou.
— Eu não estou perguntando a você — Ancilla lançou ao filho um olhar afiado. Seus olhos eram tão intimidantes que era difícil acreditar que ela estava olhando para seu próprio filho de treze anos.
— …No momento em que o duelo começou, Eugene empurrou sua lança,— Ciel disse com os lábios franzidos.
— Meu irmão se assustou e tentou recuar, mas a lança de Eugene era rápida demais para ele evitar.
— A distância entre os dois? — Ancila questionou.
— Era um pouco grande.
— E o que seu irmão estava fazendo naquele momento?
— Ele estava tentando levantar a espada.
Tudo isso aconteceu apenas uma hora atrás, não o suficiente para tornar as coisas difíceis de lembrar. Cada vez que Ciel respondia a uma das perguntas de Ancilla, o corpo de Cyan tremia de ansiedade.
— Iss-…— Cyan estava prestes a se defender.
No entanto, Ancilla, que havia terminado de processar toda a história, gritou: — Seu idiota!-
Paf!
A cabeça de Cyan virou para o lado. Cyan cerrou os dentes e segurou um gemido de dor, tendo previsto que isso aconteceria.
— Alguém que nem treinou sua mana! Um pirralho que tem a mesma idade que você…! Você permitiu que ele desse o primeiro golpe?! E nem conseguiu se esquivar corretamente!? O deixou fechar a distância! E quando te acertou, desmaiou e saiu vomitando por toda parte?!
Ancilla pontuou cada grito agudo com um tapa em uma das bochechas de Cyan. A cada golpe, a cabeça de Cyan girava de um lado para o outro. Os golpes não eram para machucar, já que nenhum dos tapas tinha mana neles. No entanto, era excessivo infligir tal punição corporal a uma criança pequena.
— Bem na vista… onde qualquer um, mesmo às classes mais baixas, poderiam ver claramente! Se atreveu a perder depois de pedir o duelo?! Você quer ver sua mãe se matar de vergonha?!
— M-me.. desculpe… me desculpe, mãe…
Ele podia abafar seus gritos de dor, mas não conseguia conter seus soluços. Fluxos de lágrimas caíram dos olhos de Cyan enquanto ele fungava. No entanto, Ancilla sentiu raiva em vez de simpatia diante das lágrimas de seu filho.
— Você acha que merece chorar?
Hic…– Cyan soluçou.
— Por que fez uma coisa tão inútil que só vai tornar as coisas mais difíceis para sua mãe?! Seu pai deve retornar em breve para a Cerimônia de Continuação da Linhagem, mas não sei se poderei olhá-lo nos olhos…! Quanto àquela cadela Tanis, como posso enfrentá-la depois disso?!
Por uma questão de treinamento, Gilead Lionheart, o patriarca da linhagem direta Lionheart, esteve fora da propriedade por três anos.
Sob tais circunstâncias, a autoridade do chefe normalmente deveria estar nas mãos de Tanis, a primeira esposa. No entanto, durante a atual ausência do chefe da família, a autoridade não recaiu sobre a primeira esposa, mas sobre Ancilla.
Havia uma razão simples para isso. Depois de dar à luz seu filho, Eward, o corpo de Tanis ficou estéril, incapaz de gerar mais filhos. Gilead, que queria fazer amplos preparativos para a continuação de sua linhagem, não se contentava com apenas um filho.
Foi por isso que ele se casou com uma segunda esposa, Ancilla, que deu à luz gêmeos.
“Se houver três, então é o suficiente.”
Isso era o que Gilead dizia sempre que surgia, mas Ancilla nunca poderia concordar com isso. A razão pela qual ela, a filha do Conde Caines, recusou muitas boas ofertas de casamento e, em vez disso, se juntou à família Lionheart através do vergonhoso caminho de se tornar uma concubina, era que Ancilla estava obcecada com o prestígio do nome Lionheart.
— Todos… vão rir de mim. Com certeza — murmurou Ancilla enquanto roía as unhas, já imaginando o rosto de Tanis quando soube-se disso.
Cyan, que estava consumido pelo terror diante da aparência frenética de sua mãe, gaguejou e tentou falar: — E-eu vou desafiá-lo novamente. Para que mãe não fique envergonhada, eu vo-…
— Novamente? — Ancilla perguntou, sua voz aumentando bruscamente.
— Por que está pensando em desafiá-lo para outro duelo quando já foi derrotado uma vez?! Não faça nada inútil e fique longe de problemas até que a Cerimônia de Continuação da Linhagem comece!
— Mas — Cyan protestou.
Sem deixá-lo terminar de falar, Ancilla gritou: — Hazard!
A cabeça de Hazard ainda estava baixa e seus ombros tremeram quando ele respondeu:
— Sim, minha senhora.
— Eu gostaria de poder me livrar de você para sempre — disse Ancilla enquanto seus punhos tremiam de raiva.
— Mas… não posso fazer isso, mesmo que deixe algo assim acontecer…! Porque você… é o cavaleiro favorito do meu marido. Isso deve significar que não há problemas com o que está ensinando ao meu filho, certo?
— …— Hazard manteve seu silêncio.
— Se o seu ensino não é o problema, então… meu filho é…! Como ele não aprendeu bem, ele foi derrotado por aquele pirralho camponês.
— …Me desculpe.-
Em tal situação, onde ele não podia afirmar nem negar a acusação, e quando ficar de boca fechada não era uma opção, pedir desculpas era o melhor que Hazard podia fazer.
— … Pegue o Cyan e vá embora — Ancilla ordenou.
— Mãe…— Cyan parou. Ancilla ignorou seu grito: — Vá e torne-o mais forte, forte o suficiente para que ele nunca manche minha reputação novamente.
Hazard acenou com a cabeça e recuou. Mesmo que Cyan estivesse chorando, o garoto seguiu as ordens de Ancilla sem questionar, saindo da sala junto com Hazard.
— Ciel, você fica. — Ancilla gritou.
Pego quando ela estava prestes a tentar fugir com os outros, o rosto de Ciel se contorceu quando ela respondeu: — Sim…
Ela calmamente voltou ao seu lugar e esperou pacientemente enquanto dava uma olhada na expressão de Ancilla.
Ancilla finalmente começou a falar: — …Aquele pirralho, você disse que o nome dele era Eugene, certo?
— Sim.
— Também desafiou aquele pirralho para um duelo?
— Não, eu não o desafiei.
— Por que não?
— O irmão perdeu com um único golpe. Se tivéssemos lutado, eu também não seria capaz de vencer — Ciel respondeu em um murmúrio quieto.
Embora tivesse decidido começar respondendo honestamente, ainda temia que sua mãe ficasse ainda mais zangada com tal resposta.
No entanto, Ancilla não ficou furiosa como antes e disse: — Você fez bem.
Quase como se ela fosse uma pessoa diferente, ela agora olhava para a filha com olhos calmos.
— Se tivesse aparecido aqui depois de ser derrotada… eu realmente teria me enforcado de vergonha — confessou Ancilla.
— Por favor, não diga uma coisa dessas, mãe.— Ciel gritou.
Claro, Ciel realmente percebeu que sua mãe não era o tipo de pessoa que tiraria a própria vida em qualquer circunstância. No entanto, ela aprendeu desde tenra idade que poderia melhorar o humor de sua mãe agindo de forma tão fofa.
— … Como é aquele garoto, Eugene? — Ancila perguntou.
— Não tenho certeza se entendi o que está perguntando, mãe.— Ciel admitiu.
— Estou falando sobre sua aparência e primeira impressão.
— Sua aparência… hum… eu acho que ele é mais bonito que meu irmão. Quanto primeira impressão, ele é um pouco estranho…
— Estranho? Como assim?
— Quando ele estava discutindo com o irmão, ele era muito infantil e malvado, mas quando estava conversando com Hazard, ele parecia muito mais velho.
Com essas palavras, Ancilla ficou perdido em pensamentos por alguns momentos. Como o menino tinha apenas treze anos, ela podia entendê-lo sendo infantil e mesquinho, mas para ele parecer um adulto ao conversar com Hazard?
Ciel continuou: — Ele… ele ficava falando algo sobre honra. E ele também disse que mostrar misericórdia em um duelo era um insulto ao oponente. Porque Eugene disse isso, Hazard realmente se desculpou.
— …Ele se desculpou?
— Sim. Ao dizer que ele havia feito uma ‘observação presunçosa’.
Ao relembrar aquele momento, Ciel começou a sorrir sem nem perceber. Ela logo se lembrou que esta não era uma situação que pedia diversão e imediatamente reverteu sua expressão, mas Ancilla estava muito distraída para apontar a perda de controle de Ciel.
— … uma ‘observação presunçosa’…? — ponderou Ancilla.
Parecia que mais tarde ela teria que chamar Hazard novamente e obter a história completa dele.
Com um leve aceno de cabeça, Ancilla perguntou: — Está com raiva que Eugene bateu em seu irmão?
— …Sim — Ciel disse eventualmente.
Isso era uma mentira. Embora ela não odiasse seu irmão, ela achou a visão dele chorando enquanto ainda fingia arrogância muito divertida.
— Você não deve ingenuamente tentar se vingar em nome de seu irmão — advertiu Ancilla, embora estivesse realmente ciente dos verdadeiros sentimentos de sua filha.
Desde que os dois eram gêmeos, Cyan e Ciel ficaram juntos desde que nasceram. Ciel revelou seu caráter desde tenra idade, habitualmente pregando peças e fazendo travessuras, mesmo quando ela seguia seu irmão em todos os lugares. Ancilla sabia que Ciel era uma criança que priorizava sua própria diversão sobre sua afeição por seu irmão.
— …Por enquanto, seu irmão estará ocupado recebendo a orientação de Hazard.
— Vou treinar com eles — Ciel se ofereceu.
— Claro que vai. No entanto, não se concentre muito nisso e faça amizade com a criança… Eugene.
— Por quê?
— É bom ter muitos amigos.— Ancilla disse, seus olhos ficando frios.
O pirralho havia derrotado seu filho e manchado sua reputação. No entanto, ouvir que Eugene havia derrotado seu filho sem treinar sua mana a surpreendeu.
— …Por enquanto, aquele garoto, Eugene, ainda é forte o suficiente para bater em seu irmão. Como tal, seria melhor ficar ao seu lado — explicou Ancilla.
— Sério? — Ciel perguntou em confusão.
— Sim.
Ancilla acalmou suas emoções latentes. Para ser honesta, ela queria seguir seus impulsos e aleijar Eugene para que ele não pudesse se mover pelo resto de sua vida. No entanto, ela não poderia fazer isso.
Centenas de anos atrás, houve uma intensa luta sobre quem herdaria a linha direta de Lionheart. De alguma forma, a paz foi negociada, mas desde então, assassinar um parente tinha sido considerado um grave tabu entre a família Lionheart. A razão pela qual Gilead, o atual chefe da família, disse: “Se há três, então é o suficiente”, em primeiro lugar, foi que ele estava com medo de aumentar inútilmente o número de herdeiros da família principal.
A própria Ancilla não queria arriscar quebrar esse tabu que havia sido transmitido por centenas de anos, apenas por causa disso.
— E se ele for ferido, sou eu quem vai receber mais suspeitas — raciocinou Ancilla.
Embora fosse tradição que os membros da linha direta pudessem oprimir abertamente os membros das linhas colaterais nos dias anteriores à Cerimônia de Continuação da Linhagem, ainda havia uma ‘linha’ que deve ser observada. Por exemplo, anexando um servo desajeitado para ser seu atendente pessoal, designando-lhes um anexo não utilizado e assediando-os por assuntos triviais; não importa quanta confusão essas coisas provocassem, elas ainda não estavam cruzando a ‘linha’.
No entanto, se essa linha fosse ultrapassada, os Guardiões dos Mandamentos da Família entrariam na situação.
Só de imaginar isso, o corpo de Ancilla tremeu de horror. Ancilla não queria se envolver com os Guardiões, especialmente por um assunto tão vergonhoso.
— Entendido, mãe.— disse Ciel, com um aceno de cabeça e um sorriso suave, após alguns segundos de reflexão. “Vou me certificar de chegar perto de Eugene. Isso é tudo que eu preciso fazer, certo?”
Ciel estava sentindo uma intensa curiosidade sobre esse parente inescrutável dela.
Suruba