Elena logo levantou a cabeça. Ela já fora machucada por esse mesmo discurso tantas vezes que não sentia muita dor com isso. Assim, podia falar com indiferença.
— Está tudo bem. Já imaginava.
Todavia, os dois que a observavam sabiam que ela ainda estava ferida. Lyla e até mesmo Zich se incomodaram com a situação.
“Não importa quantas vezes se machuque, há dores com as quais nunca consegue se acostumar.”
Pelo que ele viu, Elena exemplificou isso com perfeição. Mesmo que ela tenha falado aquilo, era como se o sangue estivesse saindo de seu coração. E não era porque ele se chamava de vilão que teria zero empatia. Mas continuava sendo bem pouco, afinal, era o Zich.
— Posso dar uma olhada na sua mana? Como geral que viu era mago, talvez um não mago possa fornecer uma perspectiva diferente.
— Ah, sim! Pode ser verdade!
Esperançosa, ela estendeu a mão. Sem gostar da decisão, Lyla olhou com estranheza para ele, pois mesmo que ele tivesse razão, a chance de destruir as esperanças de Elena de novo eram altíssimas.
— É, nego, também não consigo ver nada.
— Ah, entendo — respondeu Elena, a voz meio trêmula.
— Vamos parar por hoje? — sugeriu Lyla. — Começamos hoje; acho que já deu por enquanto.
Depois de deixarem Elena, Zich e Lyla voltaram para seu alojamento. Ela expressou irritação no olhar, mas só fez suspirar pesado e não disse nada. Tudo o que fez foi dar um fraco tapa no ombro dele quando ele fingiu não ter consciência do que aconteceu com Elena.
— Como foi? — perguntou ele.
— Ela é muito boa. Já tinha pensado nisso, mas acho que ela é ainda mais talentosa do que pensei quando falei com ela antes. Se tivesse mana, seria uma maga incrível.
— Não, disso já sei. Descobriu alguma anomalia nela?
— Não — negou com a cabeça —, não vi nada. Tive muito cuidado, mas o desenvolvimento da mana era idêntico ao de quem não despertou ainda. Ou ela pode só não ter mana inata.
— Não é isso nem ferrando. A única possibilidade viável é que a mana dela ainda não despertou.
— Mas isso também não é verdade, a mana que ela tem não é tão extraordinária para demorar tanto assim. E você, Zich?
— A mesma coisa.
— Hum. Voltamos à estaca zero.
— Bem, não criei expectativa nenhuma. Temos que observá-la devagar a partir de agora. Não só ela, mas o pai e o avô também.
— Então, é só eu continuar a ajudando, certo?
— Você parece feliz. Está satisfeita com isso?
— Ela é pelo menos mais bonita do que você.
— É o quê? Ela? Mais bonita do que eu? Como pode ignorar a minha fofura? Vamos, vou te mostrar o charme que treinei como Lorde Demô…
— Pelo amor, cala a boca!
Continuaram a rotina padrão de ensino. Elena absorvia tudo o que era ensinado a ela com fervor. Todavia, em comparação com o crescente respeito deles, havia cada vez mais pessoas indelicadas. Lyla e Elena ignoravam os olhares, mas mesmo que não fizessem nada, os outros não fariam o mesmo.
— Vamos conversar um pouco.
Por mais que planejassem ir à torre, os três se voltaram para a fonte da voz: um aparente jovem, mas com vestes que não deixavam dúvidas de que ele era um mago. Usava um manto longo e um cajado com cristais incrustados.
— Qual é a boa aí? — Zich entrou no meio.
— Veja bem — ele ficou alternando o olhar entre Elena e Zich —, eu tenho negócios com a pessoa atrás de você. Poderia se afastar um pouco?
— Melhor não. Como vê, estamos ocupados.
A fala deixou o jovem com um olhar de raiva. Zich podia dizer que ele vinha de uma família estimada só pela sua feição aborrecida.
“Parece que ele quer reclamar com Elena por uma coisa bem óbvia.”
Apenas o fato de ela entrar e sair de uma torre mágica, embora tenha recebido uma sentença de morte como maga, irritou outros magos.
“Mas isso não é o suficiente para começar uma briga dessas. Deve ter mais coisas, e comigo e Lyla envolvidos… É, ele deve achar que estamos enganando Elena.”
Deixá-lo ou aumentar as apostas? Poderiam simplesmente ir embora, até porque têm uma Dwayne de companhia. Contudo, ele não achou uma má ideia arriscar mais.
“Eu vi ela por vários dias e não encontrei nada de especial. Vamo botar pra foder!”
Ele ergueu um dos braços e gesticulou para Lyla ficar parada. Elena não sabia o que fazer; pensou que uma briga aconteceu por causa dela. Para ajudar, estava prestes a dar um passo à frente, mas Lyla a impediu.
— É melhor você se afastar enquanto estou calmo — disse o jovem.
— Enquanto está calmo… Acho que ter calma significa algo diferente em Sunewick. Não importa o ponto de vista, senhor, parece que você quer matar alguém.
— Não tenho intenção de trocar palavras com você, então mova-se agora mesmo!
— Se não quer, apenas siga o seu caminho, senhor. — Levantou as mãos para o lado, abrindo caminho.
— Basta! Dwayne, quando vai parar de perseguir o inalcançável?! Você não sente vergonha pelo seu avô e seu pai?!
Como Zich aparentava não querer sair, o rapaz decidiu expressar o que queria em voz alta. Com as palavras ditas, Elena baixou a cabeça.
— Qual é, senhor, você fala alto demais. Pra quê essa boquinha nervosa aí? — reclamou Zich, tapando os ouvidos de modo exagerado. — Além disso, você também é muito rude. É tão bonzão ao ponto de aumentar o tom de voz para a discípula da minha amiga?
— Discípula?
— Sim, senhor. Discípula. Minha amiga gatona aqui atrás é a instrutora temporária de Elena Dwayne. Por isso, não posso deixar a sua falta de educação passar batida assim.
— Hmph! Como alguém que parece ter acabado de chegar aos vinte pode ensinar? Em vez de mentir para parecer legal, trabalhe para se desenvolver!
— Elas que decidem, senhor. Além do mais, ela é um gênio extraordinário. Não tem nenhum problema com o papel dela.
— Gênio? Pfff! Ei, mentirosos, não sei de onde souberam da situação dela, mas acordem do sonho de vocês e voltem calados aonde diabos vocês vieram. Se acham que podem enganá-la oferecendo aulas de magia… Bem, sendo honesto, vendo que essa idiota parece ter caído, eu diria que o plano de vocês está bem no geral. Ou talvez ela seja ainda mais imbecil do que eu pensava.
“Mas nem a torre mágica nem Sunewick são desprezíveis para que vocês dois possam vagar por aí. Obviamente, a família dessa burra também não é motivo de riso. Isso é um aviso. Se desistirem e meterem o pé, ainda podemos agir como se isso fosse um acontecimento cotidiano.”
— Calma aí, doidão. Não sei de qual família de classe alta você é, mas a julgar pela forma como acusa quem conhece de mentiroso, parece que não foi educado muito bem.
— Olha aqui, seu…
— Tanto faz. Parece que compartilhamos as mesmas opiniões um sobre o outro, então só há uma maneira de resolvermos este assunto. Julgando pelo que disse, parece ser um mago muito talentoso entre os seus colegas.
— Sim. Pelo menos tem um bom olho.
— Então por que não paramos de discutir e resolvemos o assunto assim? — apontou para Lyla. — Veja por si mesmo se somos mesmo mentirosos e se a minha amiga tem as qualificações para ajudar a senhorita Dwayne.