Gravis não tinha certeza do que Sear queria dizer com ‘Discussão de Cultivo’. — O que é exatamente essa Discussão de Cultivo a que você se refere? — ele perguntou, levantando uma sobrancelha.
Sear riu levemente. — Na verdade, é bem simples — ele disse, gesticulando para os outros. — Já se perguntou por que estamos conversando assim, mesmo que nossas guildas devam estar em guerra?
Gravis assentiu. — Essa seria minha próxima pergunta. Logicamente, vocês deveriam estar em confronto.
Sear olhou para os outros, que estavam ocupados com suas próprias atividades. — Na verdade, somos todos velhos amigos.
Gravis franziu as sobrancelhas. — Como vocês fizeram amizade, considerando que suas guildas estão em constante guerra?
Sear sorriu de forma astuta. — Veja bem, já éramos amigos antes de nos unirmos às nossas respectivas guildas.
Agora Gravis olhava para eles surpreso. — Antes de vocês se juntarem às guildas? Isso significa que vocês se conhecem desde antes de saírem do Reino de Refinamento Corporal? — ele perguntou, incrédulo.
Ter amigos não era nada surpreendente, mas cinco pessoas que se conheceram enquanto ainda eram cultivadores no Reino de Refinamento Corporal e todas alcançaram o Reino de Formação do Espírito parecia algo quase irreal. Quais eram as chances de isso acontecer?
Quando Sear viu a expressão de surpresa de Gravis, começou a rir. — Eu sei, certo? Ficamos tão surpresos quanto o tempo passou e nosso poder aumentou. Quem teria esperado que cinco pessoas do Continente Exterior, da mesma cidade, chegariam todas ao Reino de Formação do Espírito? Eu certamente não esperava!
Gravis apenas assentiu em confirmação. Isso era basicamente um milagre.
Sear riu levemente e coçou a parte de trás do pescoço. — Não queríamos deixar nossas guildas destruírem nossa amizade, então nos reunimos e criamos essa Discussão de Cultivo. A cada poucos meses, deixamos nossas guildas e nos encontramos. Quando nos reunimos, conversamos casualmente e contamos o que aconteceu recentemente.
Gravis olhou para o chão, pensativo. — Seus Mestres da Guilda não desconfiam de vocês sumirem ao mesmo tempo? — ele perguntou.
Sear sorriu. — Eles sabem o que estamos fazendo — disse com confiança.
Gravis levantou a cabeça e olhou nos olhos de Sear. — Eles sabem? E estão de acordo com isso? — perguntou.
Sear assentiu. — Claro. Contanto que não discutamos nada sensível sobre nossas guildas, tudo é permitido — Sear então se virou para seus amigos com um sorriso. — Agora, não somos Vice-Mestres de Guildas, somos apenas amigos. — Então, Sear voltou-se para Gravis. — E aí, vai participar?
Gravis coçou a parte de trás do pescoço, sentindo-se um pouco desconfortável. — Isso não destruiria o propósito das suas reuniões? Eu não venho da mesma cidade que vocês, e meio que sou um estranho aqui.
Sear se virou e olhou para o verde do Continente Central com um sorriso. Eles estavam em um prado verde, cheio de animais correndo por ali. — Bem — Sear começou a dizer — isso seria verdade, mas à medida que nosso poder aumentou, nossos objetivos também começaram a mudar.
— O que você quer dizer? — perguntou Gravis.
Sear então se virou para Gravis. — Diga, qual você acha que é o objetivo da cultivação, Gravis? — ele perguntou.
Gravis ficou surpreso com a pergunta. Outros poderiam achar que essa era uma pergunta tão profunda quanto a razão da própria existência, mas para Gravis, a resposta parecia óbvia demais. — Ganhar poder — ele disse.
A resposta não surpreendeu Sear. — E por que você quer poder? — ele perguntou.
— Para liberdade. Não quero estar sob o domínio ou opressão de ninguém. Quero controlar meu próprio destino — Gravis disse com convicção.
Sear riu de forma astuta. — Parece que você sabe o que quer, mas por que você precisa dessa liberdade em primeiro lugar? O que está te impedindo de ser livre agora? — ele perguntou.
Gravis também tinha uma resposta pronta para essa pergunta. — Outras pessoas — ele disse, preferindo não mencionar o Céu, pois isso abriria uma nova discussão. — Os humanos são gananciosos, e as pessoas matam por recursos e riqueza. O ditado ‘um mendigo carregando ouro é um crime’ existe por um motivo. Se você tiver algo que os outros desejam e não tiver capacidade para protegê-lo, você perderá essa coisa e, provavelmente, morrerá — Gravis explicou.
Sear piscou e levantou o dedo indicador direito. — Exatamente! — disse ele. — Para se proteger, você precisa de poder, e para obter poder, você cultiva, mas e se as outras pessoas nunca te atacarem, por mais poderoso que você seja?
As sobrancelhas de Gravis se ergueram em surpresa. Não era que ele nunca tivesse pensado nisso, mas essa resposta parecia ingênua demais em seus olhos. — Isso é impossível — ele disse com uma voz grave.
Sear continuou sorrindo. — Quem disse? — ele perguntou.
— A ganância inerente da humanidade e a lógica — Gravis respondeu imediatamente.
— Não posso discordar de você nisso — disse Sear. — Não podemos mudar a ganância inerente das pessoas, mas com poder suficiente, podemos suprimi-la.
Agora Gravis entendia o que Sear queria dizer. — Então — começou Gravis — com essa Discussão de Cultivo, vocês tentam reunir pessoas com o mesmo pensamento. Com mais pessoas compartilhando o mesmo objetivo, vocês querem criar uma organização que imponha a paz. É isso? — ele disse.
Sear ficou um pouco surpreso por Gravis ter conectado todos os pontos com tão pouca informação. — Sim, é exatamente isso que queremos — ele disse. — Ainda somos fracos agora, mas ficaremos mais poderosos com o tempo e com mais pessoas. Eu vi que você é uma pessoa fora de qualquer guilda, então achei que você entenderia nosso objetivo. Por isso te convidei.
Gravis não ficou impressionado. — Embora eu concorde com o seu objetivo, não acho que seja viável — ele disse diretamente. — Mesmo que vocês consigam unir todos e se tornem mais poderosos que as Seitas Elementais, ainda terão que lidar com a Seita Celestial, que tem o apoio do próprio Céu.
Sear não pareceu surpreso com a resposta. — E se o Céu estiver nos apoiando? — ele perguntou.
Agora, Gravis ficou novamente surpreso. — O Céu está apoiando vocês? Como isso seria possível?
Sear apenas sorriu. — Já pensou por que o Céu permite que as pessoas cultivem e ascendam?
Gravis, obviamente, sabia a resposta. Ele sabia melhor do que qualquer um neste mundo inferior. No entanto, ele balançou a cabeça, curioso para saber o que eles pensavam.
Sear sorriu como se soubesse algo que Gravis não sabia. — Pense nisso. Se o Céu não quisesse que as pessoas ascendessem, por que não destrói quem alcança o pico do Reino de Formação do Espírito? Seria uma solução simples. Considerando tudo isso, o Céu quer cultivadores poderosos. Não sei por que, mas não vejo outra razão. O estado atual do mundo, que favorece os fortes, também confirma isso.
Gravis apenas assentiu, pensando profundamente.
Sear parou de sorrir pela primeira vez. — Mas e quanto aos inúmeros talentos que morreram devido a circunstâncias incontroláveis? — ele disse. — Devido à sorte, de pessoas mais fortes cobiçando seus tesouros e de traições, esses talentos morrem jovens. Eles tinham o potencial de alcançar o Reino da Unidade, mas suas jornadas foram interrompidas.
Sear olhou nos olhos de Gravis com determinação. — Se conseguirmos unificar o mundo, podemos proteger esses talentos e dar a eles um ambiente seguro para crescer. Claro, ainda haverá mortes. O refino de vida e morte é inevitável no caminho para o poder, mas podemos, pelo menos, garantir lutas justas. Sem traições, sem pessoas mais fortes cobiçando os bens dos mais fracos. Acho que, assim, podemos aumentar o número de ascendentes. Acho que o Céu gostaria disso — ele disse.
Gravis refletiu sobre isso por um momento. O que Sear disse era verdade. Isso realmente aumentaria o número de pessoas que ascenderiam. Contudo, e o que aconteceria com esses ascendentes depois que chegassem ao mundo intermediário? Sear não conhecia a estrutura dos diferentes mundos. Ele provavelmente nem imaginava que existiam mundos ainda mais elevados do que os intermediários.
Se alguém tivesse lutado apenas em combates justos, não estaria acostumado a lutas injustas ou a recuar diante de uma crise. As chances de morrer no mundo intermediário seriam multiplicadas. O número de ascendentes aumentaria, sim, mas muito menos pessoas desse mundo conseguiriam alcançar um mundo superior.
Tudo isso era uma solução de curto prazo. Basicamente, trocariam uma pessoa refinada por cinco flores de estufa. O mundo era assim porque apenas um ambiente difícil e desafiador produzia verdadeiros gênios.
Os gênios podem nascer, como Gravis era um bom exemplo, mas os verdadeiros gênios tinham que ser criados. Se alguém fosse ótimo em cultivar e tivesse uma vontade poderosa, suas chances de alcançar mais poder seriam maiores, mas isso pararia em algum ponto. Somente sobrevivendo a inúmeras crises injustas alguém se tornaria um verdadeiro gênio. Um verdadeiro gênio sabia como reagir perfeitamente a todas as circunstâncias em constante mudança.
Gravis era um excelente exemplo disso. Se tudo tivesse sido justo para ele neste mundo inferior, o Céu não teria interferido em seus assuntos. Ele não teria tanta experiência em fugir ou em perceber esquemas ocultos. Gravis tinha certeza de que, se alguém tivesse os mesmos poderes que ele, ele ainda seria capaz de derrotar essa pessoa. Ela não teria passado pelas mesmas dificuldades que ele, tornando-a menos experiente.
— Desculpe, mas não estou interessado — disse Gravis, após vários segundos de silêncio.
As palavras de Gravis surpreenderam Sear. — Não está? — ele perguntou, incrédulo.
Gravis balançou a cabeça. — Desculpe, mas isso não corresponde às minhas crenças — ele respondeu. Explicar tudo isso levaria muito tempo e revelaria conhecimento demais. Expor os caminhos do Céu nunca era uma boa ideia. Especulações eram uma coisa, mas se Gravis contasse toda a verdade, o Céu poderia matá-los para proteger seus segredos.
A única razão pela qual Gravis havia exposto tantas coisas para Aion, quando acabou de alcançar seu avanço, era porque Aion já estava em um beco sem saída como um Nascido do Céu. Além disso, sua lealdade era com o Céu. Ele não contaria a outros o que Gravis havia lhe dito. Essas pessoas, no entanto, eram diferentes.
Sear parecia um pouco dividido, mas suspirou logo em seguida. — Tudo bem, se isso vai contra suas crenças, não vou insistir. Pode, pelo menos, nos prometer que não vai se opor a nós no futuro? — ele perguntou.
Gravis assentiu. — Contanto que vocês não me ataquem, não me importa o que façam.
Sear voltou a sorrir, mas seu sorriso não era tão genuíno quanto antes. — Bem, quer ficar para o jantar, pelo menos?
Gravis deu de ombros. — Claro, por que não?