O Cavaleiro Bennett estava vestindo uma chita branca simples enquanto se sentava à mesa de jantar. Como de costume, tinha um olhar sério em seu rosto. Abel nunca o viu demonstrar muita emoção.
Na verdade, nunca foi um exagero. A última vez que o viu fazer qualquer expressão foi há cerca de um ano, quando acordou do coma. Não poderia esquecer a alegria no rosto de seu pai quando foi trazido a este mundo.
Sua mãe. Nora, era uma mulher gentil. Foi ela quem o alimentou durante a recuperação de seus ferimentos. Foi ela a razão pela qual ele reconheceu fazer parte desta família.
Não se acostumou a dar sua graça antes de uma refeição. Na sua vida anterior tinha sido ateu por todos os trinta anos de sua vida. Só agora que veio orar à Santa Luz, à qual quase todos neste mundo devotaram sua adoração.
Ninguém falava durante as refeições. Os cavaleiros eram os mais humildes entre a realeza, mas essa família ainda mantinha suas maneiras mesmo quando estavam sozinhos.
Para o jantar desta noite, foi um grande pedaço de carne dividido em quatro pedaços. O seu pai e Zach receberam uma porção maior, enquanto sua mãe e Abel deveriam receber muito menos. Como a ingestão de alimentos era necessária para aumentar o suprimento de Qi de um cavaleiro, não havia como dividir a comida entre todos igualmente.
Mas ainda assim, mesmo como treinador de fisiculturismo, Abel nunca havia comido tanta carne durante seu tempo na Terra. Havia cerca de meio quilo de carne em seu prato, e tinha apenas doze anos. Além disso, havia também um pouco de mingau. Não era como se não pudesse terminar sua comida, no entanto. Ele acabou comendo tudo em apenas alguns minutos.
“Aqui, tome um pouco mais.” Disse uma voz gentil. Era a mãe de Abel, Nora. Ela acabou lhe deu mais da metade de sua carne.
O Cavaleiro Bennett lançou um rápido olhar para Abel, mas não lhe disse nada. Em vez disso, continuou comendo. Suas mãos estavam um pouco rígidas enquanto tentava cortar a carne com sua faca. Houve um leve ruído de fricção da faca com o prato, algo muito incomum.
Zach se deu conta disso, mas foi silenciado pelo olhar do Cavaleiro Bennett.
“Obrigado, mãe.” Abel agradeceu a Nora ao aceitar uma fração de sua refeição.
Como essa era a maneira de Nora demonstrar seu amor, o correto a fazer aqui é aceitar.
Como parte da rotina da família, o Cavaleiro Bennett fez com que Zach o acompanhasse para um treinamento pessoal após o jantar. Abel, por outro lado, não foi autorizado a participar até que fosse um cavaleiro de nível 1, o que poderia se tornar antes do amanhã chegar.
Sem perder mais tempo, voltou direto para seu quarto e iniciou uma sessão de respiração. Tendo uma refeição completa naquele momento, a quantidade de Qi que acumulou ao longo do dia foi suficiente para progredir.
As técnicas de respiração de um cavaleiro eram a parte mais crucial de suas habilidades.
Quer tenha sido transmitido pela família ou aprendido na Academia de Cavaleiros, cada cavaleiro tinha suas próprias técnicas especiais de respiração. Se fizesse muitas contribuições no campo de batalha, poderia transferir seus esforços de guerra em troca de melhorias em suas técnicas.
Após se sentar em um piso cimentado, acalmou sua mente para sua sessão. O ritmo em que inalava o ar passou de lento para rápido, seu estômago se encheu como um tambor. Exalou um fio de essência branca e enevoada, que desapareceu no ar como uma flecha disparada.
A comida em seu estômago estava sendo digerida, enquanto fazia isso.
Depois de respirar por cerca de vinte vezes seguidas, o Qi adquirido durante o dia começou a se formar em um único canal meridiano.
Este canal meridiano estava bastante instável no início. Ele pensou que havia falha de novo. Então, um poder emergiu de seu meridiano por todo o corpo. Não tinha certeza do que era, mas tanto seu corpo quanto sua mente lhe dava a sensação de que havia acabado de sair da cama ao amanhecer
E, finalmente, se tornou um cavaleiro novato de primeira classe. Um ano atrás, após ver seu pai corta um grande tronco de árvore, percebeu a existência de forças sobrenaturais neste novo mundo. Ao contrário de sua casa no planeta Terra, a força é crucial para a sobrevivência.
Ao pedir a seu pai que o treinasse para se tornar um cavaleiro, recebeu uma explicação detalhada das circunstâncias da família em resposta. Pelo que o Cavaleiro de Bennet lhe disse, um segundo filho só deveria treinar sozinho sem interferir no progresso do filho mais velho.
Zach é a prioridade da família, basicamente. Todos os recursos deveriam ser dados a ele primeiro, e Abel só teria o resto. Porém, ainda teria acesso a aprender as maneiras de ser um cavaleiro.
Apesar de sua circunstância infeliz, ele aprendeu muito com seu pai. Durante os vários meses que se recuperou de seus ferimentos, aprendeu a como cuidar dos cavalos, e fazer manutenção em suas armas, bem como o manuseio de arco e flecha.
Também aprendeu a etiqueta apropriada de um cavaleiro, e muitas outras coisas para as quais tinha que se preparar antes de iniciar seu treinamento oficial, o que só aconteceu há cerca de dois meses.
Ainda orgulhoso pelo progresso que fez, notou que o meridiano em seu braço direito estava perdendo sua essência. Felizmente parou depois de alguns segundos. Se continuasse, poderia perder todo o seu progresso, sem poder fazer nada a respeito.
A sessão dessa noite não resultou em fracasso completo. Mesmo perdendo um pouco de Qi no final, conseguiria recuperá-lo após um ou dois dias de treinamento. Não iria perder seu posto de cavaleiro novato.
Mas ainda assim, ter seu Qi drenado era um fenômeno um tanto bizarro. Para satisfazer sua curiosidade, puxou a manga direita e encontrou uma leve sombra em seu braço. Foi meio difícil perceber isso à primeira vista.
Não tinha certeza do porquê, mas aquilo parecia meio familiar.
“É um Cubo Horádrico.” Abel pulou do chão depois que descobriu. Não havia dúvida sobre isso. Como um ávido jogador de Diablo II por tantos anos, nunca teria confundido um item importante como este.
“Ele me seguiu até este mundo?” Abel andava empolgado pelo quarto. Foi como encontrar uma garrafa de água no meio de um deserto.
Pelo que parecia, o Cubo sempre esteve aqui. A razão de não ter aparecido antes era porque não havia energia para ativá-lo. Desde que se tornou um cavaleiro novato, esta parte do Qi que perdeu naquele momento foi para dentro do cubo.
Suspenso em seu braço direito, tocou com o dedo, de repente, diante dos seus olhos apareceu uma janela mostrando um espaço do seu inventário. Havia doze vagas no total, e duas delas estavam ocupadas por um único livro azul.
O Pergaminho do Portal da Cidade. Reconheceu na hora. A mesma cópia que modificou antes de ser atingido por um raio. Pelo que podia ver dentro de sua mente, a quantidade deste Portal se regeneraria uma vez a cada poucos minutos.
Vou tirar este Pergaminho do Cubo. Pensou Abel, o pergaminho surgiu em sua mão. Um livro bem grande, quase tão grande, quase tão grande quanto uma revista que se encontraria na Terra. Sua capa azul opaca decorada com franjas douradas escuras emitiam uma faísca ocasional para significar o quão valioso era.
Posso ir para casa se eu usar isto? Seu coração começou a bater muito rápido. Queria ver seus pais verdadeiros. Queria provar a comida de sua mãe, sentir o cheiro de sua cidade natal. Durante todo o ano em que esteve neste mundo, sentia muita falta da sua casa.
Após abri-lo, vinte pergaminhos diferentes apareceram. Foram escritos em folhas de lã branca e amarrados com fitas azuis. Precisava apenas puxar as fitas.
Tentou colocar a mão em um dos pergaminhos, mas por algum motivo, seu dedo ricocheteou enquanto tentava fazer contato. Tentou novamente com um pouco mais de força, conseguiu tirar a fita com sucesso.
Para sua consternação, nenhum portal apareceu em sua frente. Ao invés disso, surgiu uma bola de fogo. Abel atirou-a de sua mão no momento em que percebeu o que era, o que fez um buraco queimar no tapete onde estava. Foi irritante, claro, mas pelo menos não incendiou a casa inteira.
Por que não funcionou? Por que saíram bolas de fogo saíram? Abel tentou mais algumas vezes, mas os resultados eram sempre os mesmos. Toda vez que tentava abrir o Pergaminho, chamas saíam e incineravam uma parte de seu tapete em uma pilha de cinzas.
Chorou por um tempo, depois foi dormir cansado de chorar.
Enquanto dormia, um raio de luar brilhou pela janela e iluminou seu rosto. As lágrimas em seu rosto foram sopradas pela brisa da noite, que o fez sentir um pouco de frio mesmo em seus lençóis.
“Ba Ba, Ma Ma.” Uma voz jovem e vulnerável gritou na noite. O chamado desesperado de um filho para seus pais. Ninguém entenderia, pois era falado em uma língua que não pertencia a este mundo.
O idioma em Mandarim, a língua comum que ele usava em casa.