O céu azul estava salpicado de nuvens brancas e fofas, suavemente sopradas pela brisa primaveril que carregava consigo a fragrância da floresta. Gansos brancos bicavam a grama exuberante, pastando ao lado do rio sinuoso. Uma moça, vestida com um vestido branco acinzentado, observava-os atentamente com uma longa vara na mão.
Seu semblante estava banhado pelos raios dourados do sol, expondo seus cabelos finos e felpudos. As tranças marrons da menina, elegantemente amarradas com um pano branco, revelavam seus traços jovens e vibrantes.
Olhando para Lumian sentado sob uma árvore à beira do rio, Ava Lizier franziu levemente o rosto.
— Não estamos aqui para discutir qual lenda é mais fácil de investigar? Por que você se transformou em uma estátua de pedra que lembra as da catedral?
Ava era filha de Guillaume Lizier, o sapateiro. Sendo uma das poucas jovens da aldeia, ela tinha um relacionamento amigável com Lumian e Reimund.
— Estou pensando em um problema, — respondeu Lumian, ainda olhando para os gansos brancos e as águas ondulantes.
— Que problema? — perguntou Reimund Greg, que cuidava do bando de gansos de Ava.
Lumian ponderou antes de responder: — E se você encontrasse uma fera com uma pele tão grossa que sua arma não consegue perfurar, o que você faria?
— Obviamente, eu encontraria uma maneira de fugir. As montanhas estão repletas de feras. Não precisamos caçá-las, — respondeu Ava, sentindo que não havia nada com que se preocupar.
Lumian grunhiu em desacordo.
— E se esse animal for excepcionalmente raro e os senhores da cidade o adorarem e estiverem dispostos a pagar cem Louis d’or pela sua carcaça?
— Cem Louis d’or, dois mil verl d’or… — Reimund respirou pesadamente.
Ele nunca tinha visto um Louis d’or antes, nem usado um. Seu instinto foi primeiro convertê-lo em verl d’or.
Com uma quantia tão grande de dinheiro, ele poderia abrir um pequeno negócio em Dariège. Ele não teria mais que se preocupar com o pastoreio.
Ele rapidamente pensou e sugeriu: — Pegar uma espingarda emprestada?
— A pele da fera não pode ser penetrada, — Lumian rejeitou categoricamente.
Mesmo sabendo que a presa era apenas uma invenção da imaginação, sem valor no mundo real, ela não conseguiu evitar.
— É uma criatura poderosa? Feroz?
Lumian fez uma pausa para considerar sua pergunta.
— É tão feroz quanto eu.
Essa era toda a segurança que ele precisava para continuar sua caçada.
Reimund, que estava prendendo a respiração, soltou um suspiro de alívio. — Bom. Volte para a aldeia e reúna algumas pessoas. Vamos cercar a fera e drenar sua força. Assim que ela cair, vamos amarrá-la.
Ele sabia que Lumian poderia lutar, mas isso era tudo.
— Nesse caso, só podemos esperar dez Louis d’or, ou até menos, — lembrou Lumian.
Ava, com seus deslumbrantes olhos azuis como o lago, teve uma ideia. — Já os vi caçar antes. Talvez possamos cavar uma armadilha e fazê-la cair. Dessa forma, não teremos que nos preocupar com a possibilidade de ela voltar.
Lumian acenou com a cabeça em aprovação. — Essa é uma boa ideia.
Percebendo que Ava e Reimund tinham pouco a oferecer em termos de planejamento, Lumian assumiu o controle da conversa.
— Qual lenda vocês acham que devemos focar em seguida? — ele perguntou.
Ava balançou a cabeça. — Nenhuma delas se enquadra no perfil. Elas têm séculos de idade ou foram vistas apenas por uma pessoa, que já morreu há muito tempo.
Reimund concordou. — Isso mesmo.
— Se você não perguntar às pessoas certas, como saberá que não há pistas? — Lumian estalou a língua e riu. — Vocês não têm coragem. Se quiserem desistir ao primeiro sinal de problema, é melhor cuidar de gansos e ovelhas pelo resto de seus dias.
Ava e Reimund estavam furiosos com as palavras de Lumian.
Quando se tratava de irritar as pessoas, Lumian era um dos melhores de Cordu.
Ava deixou escapar: — Não acho que nenhuma delas seja adequada porque existem outras mais adequadas.
— Quais? — Os olhos de Lumian brilharam de interesse.
Assim que Ava falou, ela se arrependeu, mas estava planejando trazer esse assunto à tona. Só não queria revelar isso para Lumian e Reimund tão facilmente.
Após alguns segundos de silêncio tenso, ela olhou feio para Lumian.
— Há uma bruxa de verdade na aldeia.
— Quem é? — O coração de Lumian apertou.
Poderia ser Aurore?
Se Ava descobrisse que Aurore era uma Bruxa, ele e Aurore teriam que fugir de Cordu e ir para outro lugar para evitar a ira da Inquisição.
Ava olhou em volta nervosamente e baixou a voz. — Madame Pualis.
“Madame Pualis, esposa do administrador e amante do padre?” Lumian achou difícil de acreditar.
— Você está falando sério?
Se Pualis era de fato uma bruxa, como poderia Lumian não ter percebido quando descobriu o caso da mulher com o padre?
— Sem chance… — Reimund ficou excepcionalmente surpreso.
Ava andou na ponta dos pés e olhou na direção da entrada da aldeia.
— Não tenho certeza, mas Charlie, o valete do administrador, deixou escapar uma vez.
— Ele me disse que Madame Pualis é uma mensageira de almas que pode falar com os mortos e ajudá-los a voltar para casa. Ele também disse que ela pode criar remédios e amuletos secretos.
Lumian ouviu atentamente, mas permaneceu cético.
Com revistas como Física, Lótus e Véu Oculto inundando o mercado, não era incomum que a esposa do administrador estivesse familiarizada com tais termos e enganasse os servos e aldeões.
— Devíamos ir à catedral e delatar, — disse Reimund, com os olhos arregalados de entusiasmo.
Lumian fez uma pausa antes de responder:
— Se Charlie sabe que Madame Pualis é uma bruxa, então o administrador também deveria saber, não?
— Oui, — concordou Ava.
Lumian continuou: — Madame Pualis também é amante do padre. Se formos à catedral e delatá-la, provavelmente seremos enviados diretamente ao administrador.
— O quê?
— Madame Pualis é amante do padre?
Ava e Reimund ficaram chocados.
— Eu vi com meus próprios olhos. — Lumian riu. — Finjam que não sabem. Não contem a ninguém. Caso contrário, vocês podem desaparecer.
Ava e Reimund concordaram em uníssono, suas expressões extraordinariamente solenes, o medo do padre e da bruxa entrelaçados.
— Se pudermos confirmar que Madame Pualis é uma bruxa, iremos a Dariège e contaremos ao bispo na missa, — assegurou-lhes Lumian.
— Oui, — Reimund assentiu fervorosamente.
Eles tinham que ter certeza antes de delatar. Caso contrário, estariam em apuros se Madame Pualis fosse inocente.
Depois de discutir esses assuntos, Lumian, que não queria perder tempo, levantou-se e disse a Ava e Reimund: — Estou indo, voltarei aos estudos. Caso contrário, Aurore estaria me perseguindo com uma vara de madeira. Vocês dois cuidem dos gansos.
— OK. — Reimund ficou emocionado com a perspectiva de ficar sozinho com Ava.
Ava parecia descontente.
……
À medida que Lumian se aproximava de Cordu, ele começou a esconder seus rastros, prestando constantemente atenção se havia alguém por perto.
Ele precisava ter cuidado, especialmente agora que o Padre e sua gangue estavam atrás dele.
Segundo suas observações, o padre Guillaume Bénet não perdoava facilmente.
Ele seguiu em direção ao Antigo Bar, tentando permanecer o mais discreto possível.
De repente, ouviu o som de sinos tocando ao longe.
Lumian se virou para ver Ryan, Leah e Valentine se aproximando de Naroka e dos outros.
Os sinos no véu e nas botas de Leah tocaram clara e melodiosamente.
“Eles estão vagando pela vila há dois dias, conversando com as pessoas e fazendo perguntas. Não sei o que eles estão tramando…” Lumian ficou confuso e um pouco cauteloso.
Ao pensar na praça deserta da cidade e no pastor Pierre Berry, que havia retornado inesperadamente à aldeia, Lumian sabia que algo estava prestes a acontecer.
“Alguma coisa está para acontecer na aldeia?” Ele precisava falar com Aurore, sua irmã inteligente e experiente, e saber a opinião dela.
Lumian conseguiu entrar furtivamente no Antigo Bar e avistou a mulher que lhe deu a carta de tarô sentada em seu lugar habitual, comendo.
Lumian se inclinou e deu uma olhada.
— Omelete com carne? Você não acha um pouco enjoativo?
Em Dariège, este prato era a escolha das pessoas comuns para impressionar seus convidados sofisticados. Lumian, porém, tinha dúvidas de que fosse muito gorduroso e pesado para as mulheres da cidade.
A mulher saboreou uma lenta mordida na omelete dourada e fechou os olhos para saboreá-la.
— É uma verdadeira joia. Tem um sabor local que é simplesmente requintado.
— Você está almoçando tão cedo? — Lumian perguntou, sentado à sua frente.
Os olhos azuis claros da senhora revelaram uma pitada de exaustão quando ela sorriu e respondeu: – É café da manhã.
“Que horas são…” Lumian não se atreveu a deixar escapar seus pensamentos.
Ele examinou o Antigo Bar quase vazio e silenciou a voz.
— Eu vi uma ruína em meu sonho e me deparei com um monstro.
— Oh. — A mulher nem piscou. Sua expressão ainda continha um toque de provocação que Lumian não conseguiu decifrar.
Lumian se recompôs e contou sua história.
— Como faço para derrotar esse monstro?
A mulher sorriu e respondeu: — Está vivo ou morto?
— Ainda está se movendo muito bem. Não consigo matá-lo… – Lumian parou e respondeu por reflexo.
Ele ponderou seriamente por um momento antes de responder lentamente: — Posso senti-lo respirando. Então, deve estar vivo.
— Se ainda estiver respirando, tente mais. Corte sua cabeça. Ou despeje óleo e acenda. Enterre-o vivo, até. Quem sabe? Ele pode simplesmente desistir, — sugeriu a mulher com indiferença enquanto saboreava sua refeição. — Quando você tiver esgotado todas as opções e ainda assim não conseguir, venha até mim. Mas eu não sou sua babá que vai mimar você em cada pequeno problema. Se você quiser aprender, você tem que descobrir isso por si só.
“Ela é muito encantadora…” Lumian não ficou desanimado ou desanimado. Parecia que a mulher estava insinuando que ajudaria se as coisas ficassem realmente difíceis. E um monstro como esse nem valia a pena mencionar.
“Mas o que é trivial pode ser uma verdadeira dor de cabeça…” Lumian sentiu uma enxaqueca chegando.
Ele resolveu seguir o conselho da mulher. Ele começaria tentando decapitá-lo, queimá-lo, enterrá-lo vivo e qualquer outra coisa que pudesse imaginar.