O policial largou o jornal e avaliou Lumian, visivelmente nervoso com sua confiança descarada. Ele apontou para o caderno e a caneta-tinteiro à sua frente, dizendo: — Mostre-me sua licença de advogado e registre seu nome e o propósito da visita.
“Uma licença? Sério?” Lumian, o falso advogado, sentiu uma onda de pânico.
Não tinha lido em inúmeras novels e jornais que bastava identificar-se como advogado para ter acesso a um cliente?
Quando Lumian pegou a caneta-tinteiro preta, sua mente disparou, formulando um plano.
De repente, notou que o policial à sua frente havia voltado sua atenção para o exemplar recentemente descartado de Juventude de Trier, focado na corrida anual de ciclismo de Trier.
“Ele parece não se importar com a licença do advogado…” Uma ideia passou pela cabeça de Lumian. Imitando a caligrafia de Aurore, ele rabiscou seu ‘nome’: “Guillaume Pierre, advogado pro bono. Conhecendo o cliente, Charlie Collent.”
Depois de anotar, Lumian se levantou e olhou ao redor com indiferença.
Fingindo alegria, ele ergueu o braço e exclamou: — Meu repolhozinho, faz muito tempo que não te vejo!
Rostos confusos se viraram em sua direção. Lumian voltou-se para o policial e murmurou: — Vi um amigo.
A mensagem tácita: ele apresentaria sua licença de advogado mais tarde.
Sem esperar resposta, Lumian foi até um canto do corredor.
O policial deu uma olhada rápida no registro antes de voltar seu olhar para o jornal.
Uma vez no canto, Lumian deu uma espiada no policial preocupado e depois se virou para os espectadores perplexos com um sorriso de desculpas.
— Sinto muito, confundi você com outra pessoa.
Agarrado à pasta, aproximou-se do policial que havia escolhido anteriormente, que agora vinha do cartório.
Lumian ergueu o queixo e exigiu com altivez: — Quero ver meu cliente, Charlie Collent.
Na República Intis, os advogados tinham um status social muito mais elevado do que os policiais comuns.
O oficial olhou para o cartório, não viu motivo para preocupação e assentiu.
— Entrarei em contato com a pessoa responsável por esse caso para você.
Quinze minutos depois, Lumian se viu cara a cara com Charlie em uma sala segura, com dois policiais montando guarda na porta.
— Quem é você? — Charlie perguntou, sentado em uma cadeira do outro lado da mesa, com os olhos cheios de confusão.
Suas bochechas outrora rosadas estavam agora pálidas, o medo gravado em cada linha de seu rosto.
Ele tinha ouvido falar de advogados pro bono enquanto conversava com outros funcionários do hotel e sabia que eles eram fornecidos por agências governamentais ou organizações filantrópicas para suspeitos necessitados. Ele nunca esperou que um chegasse apenas meio dia após sua prisão.
Lumian sorriu, tirou os óculos de armação preta, piscou o olho direito e falou com sua voz natural: — Você não me reconhece? Sou seu advogado pro bono.
Charlie olhou, estupefato. Depois de alguns segundos de exame cuidadoso, uma faísca de reconhecimento iluminou seu rosto.
Mas antes que pudesse falar, Lumian colocou os óculos de volta e disse: — Quieto. Escute-me.
— Tudo bem, tudo bem. — Charlie prestou atenção.
O sorriso de Lumian desapareceu, substituído por uma expressão séria.
— Preciso saber todos os detalhes do que aconteceu. Essa é a única maneira de limpar seu nome.
— Sério? — Charlie perguntou, com desespero em sua voz, como um homem se afogando agarrando-se a uma tábua de salvação.
Fingindo seu profissionalismo, Lumian questionou: — Até que horas você ficou no quarto com a dona Alice?
Charlie esfregou o rosto, lutando para lembrar em meio à névoa de confusão e dor: — Madame Alice pediu serviço de quarto. Entrei no quarto dela antes das 20h e fiquei até ela se cansar. Só saí à meia-noite. Naquela hora, ela tinha acabado de se deitar e ainda estava acordada. Ela ainda estava viva!
“Das 20h à meia-noite? Diariamente? Esses 500 verl d’or não são fáceis de ganhar…” Lumian refletiu, depois adotou um tom de advogado: — Você tem que ser honesto comigo. Esconder qualquer coisa só vai te machucar no final.
— Eu não estou mentindo. Essa é realmente a verdade! — As palavras, ações, postura e tom de Lumian convenceram Charlie de que ele era realmente seu advogado de defesa.
Depois de verificar mais alguns detalhes, Lumian perguntou: — Depois que você ganhou o favor da Madame Alice, alguém expressou ciúme?
— Muitos. Aprendizes e atendentes, todos tinham inveja de mim, — Charlie lembrou.
Eles discutiram o assunto um pouco antes de Lumian tirar uma foto, entregando-a a Charlie.
— Veja se você reconhece essa pessoa.
Charlie engasgou: — Não é a Saint Viève?
Por que ela estava vestida de forma tão provocante, com o peito exposto?
— Confirmei que o retrato em seu quarto não é de Saint Viève. Pertence à famosa prostituta Susanna Mattise. — Lumian substituiu com tato ‘cortesã’ por ‘prostituta’ para evitar que Charlie ficasse muito chateado.
— Huh? — O rosto de Charlie se contorceu em confusão.
“Rezei para uma prostituta, não para um anjo?”
“Mas por que minha sorte mudou para melhor?”
“Não, se realmente tivesse melhorado, eu não teria sido preso…”
Lumian pegou outra foto. Ainda retratava Susanna Mattise, mas ele já havia alterado a cor do cabelo da prostituta e feito algumas edições.
— Dê uma olhada nisso e me diga se você reconhece essa pessoa.
Charlie examinou a imagem por alguns segundos antes de sua expressão se transformar em choque.
— O que… Ela! Como isso pode ser?
— Então você a conhece? — Lumian sorriu.
Charlie olhou para cima, sua voz vazia, — E-ela é… Ela é a mulher dos meus lindos sonhos.
— Eu não te contei? Tive esses sonhos incríveis por alguns dias. Sonhei em fazer amor com ela. Ela era tão apaixonada e gentil…
— C-como você sabia que eu sonhei com ela? Eu não contei a ninguém! Por que você tem uma foto dela?
O olhar de Charlie, agora fixo em Lumian, mudou completamente.
“Este é realmente o garoto do sul que conheço?”
“Além de seu talento para brincadeiras e boa aparência, não havia nada de extraordinário nele!”
Os lábios de Lumian se curvaram em um sorriso enquanto ele olhava para Charlie.
— Dê uma olhada mais de perto em quem está na foto.
Charlie olhou fixamente para a imagem da mulher de cabelo verde.
Ao examiná-la, sua expressão se transformou em puro terror. Ele recuou involuntariamente, fazendo a cadeira ranger.
— Não, isso é impossível! Susanna, Susanna, ela é aquela prostituta! — Charlie gritou, incapaz de reprimir suas emoções.
Esta revelação fez com que ele se sentisse como se tivesse encontrado um espírito malévolo.
Depois de orar para o retrato de uma prostituta, ele não apenas escapou da fome e encontrou um novo emprego, mas também sonhou com ela e dormiu com ela!
Isso não era semelhante a encontrar um fantasma?
Lumian assentiu com aprovação.
— Parabéns. Pelo menos você não é cego.
Ele pretendia ajudar Charlie e divulgar informações como uma brincadeira para assustá-lo, mas os dois assuntos não tinham relação.
A porta da sala de interrogatório se abriu. Um policial de guarda do lado de fora perguntou cautelosamente: — O que aconteceu? Por que você está gritando?
— Eu o ajudei a lembrar alguns detalhes importantes, — explicou Lumian calmamente.
Charlie saiu de seu estupor.
— Sim, lembro de algo muito importante.
E de fato, foi!
O policial não pressionou mais e fechou a porta novamente.
Vendo isso, Charlie se inclinou para frente, agarrando-se à borda da mesa e perguntou ansiosamente: — Eu encontrei uma mulher fantasma maligna?
— Pode não ser um espírito vingativo ou maligno, — disse Lumian, observando a expressão de Charlie suavizar um pouco antes de acrescentar: — Pode ser ainda mais problemático do que isso.
Com essas palavras, o rosto de Charlie ficou pálido.
Após uma breve pausa, ele perguntou apreensivo: — Você… você quer dizer que Madame Alice foi morta por aquele espírito maligno?
— Eu ainda não tenho certeza. — Lumian levantou-se. — Preciso examinar o cadáver de Madame Alice.
— Você sabe ao menos como investigar um cadáver para determinar a verdadeira causa da morte? — Charlie achava seu vizinho cada vez mais enigmático.
Lumian sorriu, mas não respondeu.
Como advogado de defesa de Charlie, Lumian tinha o direito de inspecionar o cadáver sob supervisão policial e poderia até contar com a ajuda de um patologista independente. Assim, após assinar dois documentos sob o nome de Guillaume Pierre, Lumian foi escoltado até o porão da sede da polícia do bairro mercantil e até o necrotério onde o corpo estava guardado.
O policial que o conduzia abriu o armário, abriu o zíper do saco para cadáveres e apontou para o cadáver feminino.
— Esta é Madame Alice.
Em vida, Alice preservou muito bem sua aparência, com apenas leves rugas nos cantos dos olhos e da boca. Suas grossas sobrancelhas castanhas emolduravam seu rosto, suas bochechas caíam ligeiramente e sua pele adquiria uma palidez mortal.
Lumian olhou casualmente para o corpo e disse ao policial: — Estou bem.
Ele não era um patologista que veio fazer um exame genuíno; seu objetivo era apenas identificar a localização aproximada dos restos mortais de Madame Alice.
Depois de sair do necrotério, Lumian virou-se para o policial que o acompanhava e perguntou: — Onde fica o banheiro mais próximo?
— Vire à direita no final do corredor, — respondeu o policial, apesar de sua crescente impaciência.
Lumian apressou os passos e entrou no banheiro do porão.
Uma vez lá dentro, trancou a porta de madeira e executou a Dança de Invocação no espaço apertado.
Em meio à dança frenética e contorcida, um vento gelado entrou no banheiro. Figuras vagas se materializaram uma por uma, seus rostos pálidos ou branco-azulados olhavam para Lumian com olhos vazios.
Estas eram as obsessões persistentes dos que partiram.
Lumian nunca tinha testemunhado uma visão tão espetacular antes. Por um momento, sentiu como se estivesse cercado por espectros fantasmagóricos.
Ele se firmou e continuou a segunda metade da dança enquanto procurava Madame Alice.
Logo, avistou a senhora de aparência feroz com grossas sobrancelhas castanhas.
Lumian desembainhou a adaga de prata ritualística e infligiu um ferimento, ordenando que Madame Alice se ligasse a ele.
Madame Alice consumiu a gota de sangue e entrou no corpo de Lumian.
Imediatamente, Lumian sentiu um arrepio percorrer sua espinha e seu peito ficou pesado.
Sua respiração era ofegante.
Sem hesitar, Lumian ampliou a obsessão de Madame Alice, renunciando a qualquer seleção de suas características ou habilidades.
Quase instantaneamente, a visão de Lumian escureceu e ele viu Madame Alice deitada na cama, a boca e o nariz sufocados por um travesseiro de plumas. No entanto, não havia ninguém pressionando o travesseiro em sua visão!