Sienna e Signard foram apanhados em um reencontro choroso, e Eugene sentiu numerosos olhares flagrantes fixados nele. Ninguém havia falado ainda, mas Eugene estava bem ciente do que esses olhares exigiam dele.
— Ahem… — Eugene pigarreou enquanto dava um passo à frente.
Eugene olhou brevemente para Gilead, que entendeu as intenções de Eugene e mandou abrir caminho. Até Gilead, que manteve uma expressão severa, teve que engolir em seco em antecipação ao que estava prestes a ser revelado. Seus olhos estavam brilhando.
— Tudo bem, tudo bem. Eu sei o que todos vocês estão esperando, então, por favor, recuem um pouco. Isto é bastante grande e precisa de espaço suficiente. — Disse Eugene.
Assim que espaço suficiente foi criado, Eugene fez cálculos aproximados em sua cabeça antes de voar para o céu. Então, tirou o manto e sacudiu-o levemente em direção ao chão.
Kwooong!
O enorme cadáver de um dragão caiu de dentro do manto esvoaçante. As pessoas gritaram de terror e espanto ao ver o corpo do dragão, que era ainda maior que a mansão.
— Espera, espera. Não chegue perto. Está morto e não voltará à vida de repente, como todos sabem! Porém, este é o corpo do Dragão Demoníaco Raizakia, certo? Ainda não foi totalmente purificado, então se tocá-lo descuidadamente, poderá pegar uma doença estranha. — Disse Eugene.
Tudo o que ele fez foi lacrá-lo para que não exalasse o cheiro de dentro do manto. Devido ao enorme tamanho de Raizakia, Eugene não foi capaz de prosseguir com a purificação durante sua viagem de regresso de Samar.
— Um dragão!
— É um dragão de verdade!
O clã Lionheart era a família de guerreiros mais famosa do continente. Mesmo que não descendessem da linhagem da família principal, quase todos os que cresceram com o nome Lionheart tornavam-se cavaleiros ou oficiais militares.
Consequentemente, as pessoas do clã Lionheart eram expostas a monstros desde tenra idade, e aqueles que se juntaram aos Cavaleiros Leã Negro normalmente recebiam um wyvern cada.
De todos os monstros que tinham visto até agora, o wyvern era o mais próximo que já tinham conhecido de um dragão.
No entanto, eles agora perceberam o quão ridícula e desrespeitosa era tal comparação com a raça dos dragões. Todos que viram o cadáver de Raizakia sentiram a presença avassaladora, mesmo vindo de um cadáver; a criatura era algo que não poderia ser simplesmente descartado como um monstro.
— Quando a purificação estiver completa. — Eugene começou sua explicação, sentando-se em cima da cabeça de Raizakia. — Este enorme troféu, é claro, se tornará propriedade da casa principal do clã Lionheart. É grande demais para eu monopolizar.
O coração do dragão foi destruído e o sangue de Raizakia ficou inutilizável. No entanto, muitas coisas poderiam ser usadas como materiais do cadáver de um dragão, incluindo escamas, couro, ossos e dentes.
Dado o enorme tamanho de Raizakia, o cadáver forneceria materiais suficientes para armar todos os Cavaleiros Leão Branco e Leão Negro.
“Armaduras e armas… Devem ser suficientes. Se houver escassez, eles poderão usar os materiais apenas nas partes cruciais.”
Esta deveria ser uma ampla penitência pela comoção que causou até agora, para não mencionar quaisquer futuras que pudesse provocar.
Enquanto Eugene contemplava a situação, seu olhar desviou-se naturalmente para Ancilla. Ela, sempre uma imagem de graça nobre, tinha o hábito de esconder o rosto atrás do leque quando suas emoções ameaçavam traí-la. No entanto, hoje, ela ficou boquiaberta, com os olhos fixos no cadáver de Raizakia. Ficou claro que ela não foi capaz de fazer qualquer tentativa de compostura. A enorme montanha de preocupações financeiras que ela tinha sobre sua propriedade — o custo de vida dos elfos, impostos e muito mais — estava agora derretendo como neve em sua mente.
Infelizmente, porém, não era tão simples quanto parecia.
Mesmo se alguém procurasse por todo o continente naquele momento, encontraria um artesão capaz de trabalhar com materiais de um dragão? Se tal artesão existisse, provavelmente seria um anão, mas mesmo um anão não teria experiência em trabalhar com um dragão.
É claro que essas preocupações não cabiam imediatamente a Eugene ponderar. Arranjar um artesão adequado seria uma tarefa para Gilead e Ancilla. Tudo o que Eugene precisava fazer era entregar os despojos e deleitar-se com os louvores da bênção da família.
— Eugene Lionheart!
— O Leão de Sangue!
— Assassino de dragão!
— A Reencarnação do Grande Vermouth!
— Herói!
Elogios como esses, que eram embaraçosos e desconfortáveis há poucos momentos, começavam a aquecer seu ânimo.
Dizia-se que a bajulação poderia fazer até um urso dançar, e Eugene não era tão simplório quanto um urso. Ele tentou reprimir o sorriso que começava a se formar em seu rosto. Ele deveria erguer o punho em triunfo? Não, ele achou melhor evitar qualquer gesto grandioso e mesquinho que mais tarde pudesse enchê-lo de arrependimento.
E então, Eugene não fez nada. Ele simplesmente deixou os aplausos tomarem conta dele e, quando chegou a hora certa, ele desceu do topo da cabeça de Raizakia.
“Ah… Irmã, você viu o sorriso de Sir Eugene agora há pouco? Foi realmente digno de um herói que salvou o mundo”, pensou Kristina com as mãos cruzadas sobre o coração. No entanto, incompatível com sua personalidade, Anise permaneceu em silêncio diante do comentário de Kristina.
Anise nunca negou sua paixão por Hamel, assim como Kristina não escondia a dela. Mas ultimamente, Anise começou a notar uma preocupante intensificação na adoração de Kristina.
Devido à sua educação, Kristina possuía inerentemente um certo cinismo. Tendo compartilhado um ambiente semelhante, Anise poderia se identificar com esse aspecto da personalidade de Kristina.
No entanto, desde a sua salvação pelas mãos de Eugene, a mente de Kristina floresceu como um jardim de flores quando se tratava de qualquer pensamento sobre ele. Infelizmente, não era um jardim apenas de flores brilhantes e bonitas, mas um jardim sombrio e sinistro, influenciado por sua coabitante, Anise.
Parecia que essa era uma característica inerente de Kristina e algo que ela compartilhava com Anise. O problema era que os desejos e visões ameaçadores de Kristina começaram a superar até mesmo a imaginação de Anise, o que fez Anise temer que ela pudesse ter despertado esses desejos monstruosos em sua contraparte.
— Ter essa idade… E não sentir vergonha. — Resmungou Signard baixinho. Ele sabia que Eugene era a reencarnação de Hamel de trezentos anos atrás.
Assim, enquanto Eugene se deleitava com os aplausos da multidão, Signard não pôde deixar de achar o espetáculo de deleite bastante lamentável em sua exibição flagrante.
— Sienna, você vê que Hamel parece um pouco embriagado pela emoção… Por que essa cara? — Disse Signard.
— Não é nada, absolutamente nada, irmão.
Sienna se entregou a uma alegria ainda maior do que Eugene em Aroth. Ela havia saboreado os aplausos de dezenas de milhares de pessoas na multidão enquanto subia ao céu com alegria. Durante seus passeios pelas torres e pela guilda, ela orgulhosamente se exibia para os magos da era atual, como se isso fosse algo natural.
Então, quando ouviu as palavras de Signard, elas apunhalaram seu coração.
— Ouvi dizer que você foi afetado pela Doença Demoníaca, está realmente bem?
Ela tinha ouvido falar de Signard por Eugene. Pelo que ela lembrava, o último encontro de Sienna com Signard foi depois do fim da guerra. Foi durante o réquiem dos elfos, realizado em frente à Árvore do Mundo.
Elfos não eram inerentemente prolíficos e seu número raramente aumentava. Além disso, muitos elfos morreram na guerra, trezentos anos atrás.
O massacre foi liderado pelos elfos negros sob o comando da Princesa Rakshasa Iris, que servia ao Rei Demônio da Fúria.
A própria Iris foi uma elfa patrulheira e, tendo uma compreensão completa dos elfos, ela liderou os elfos negros para caçar os elfos de maneiras inimagináveis. Eles queimaram florestas inteiras, fizeram elfos como reféns, torturaram-nos e assassinaram-nos brutalmente antes de exibirem seus cadáveres para todos verem.
Por que ela não matou Iris?
Por que ela não vingou seus irmãos?
Muitos elfos perguntaram isso a Sienna durante o réquiem.
Naturalmente, Sienna também queria matar Iris. Ela havia matado o Rei Demônio da Fúria, mas não conseguiu matar Iris e Oberon. Como um povo-besta, Oberon não era da preocupação de Sienna, mas Iris era uma inimiga que ela precisava matar.
Mas na época, ela não teve a oportunidade de caçar Iris.
O Rei Demônio do Encarceramento mostrou misericórdia, e eles mal conseguiram a paz através de Vermouth. A guerra finalmente terminou assim, então como Sienna poderia simplesmente ter marchado para Helmuth e matado Iris? Ela simplesmente não poderia fazer tal coisa.
Ela se conteve. Queria matar Iris, mas Sienna decidiu esperar até estar pronta. Os elfos no réquiem aceitaram sua determinação.
Signard também aceitou naquele momento. Mas os elfos viveram muito. Décadas se passaram e Signard ainda sonhava com o campo de batalha quando era um jovem elfo, ainda se lembrando dos amigos que foram mortos por Iris.
Então, deixou a floresta dos elfos. Ele não foi ver Sienna em Aroth. Em vez disso, partiu para Helmuth, armado apenas com o desejo de vingança e ódio. Ele não havia considerado se isso era possível. Ele tinha acabado de encher sua mente com a ideia de matar Iris.
Se ele não tivesse saído da floresta, Signard não teria contraído a Doença Demoníaca, e mesmo depois de contrair a doença, Signard vagou pela Floresta de Samar por centenas de anos sem retornar à sua terra natal.
Foi porque Sienna escondeu a localização da grande floresta. Sienna só podia se sentir culpada por esse assunto em relação a Signard.
— Eu estou bem. Embora não seja uma doença que melhore aos poucos, não piorou.
Signard conhecia Sienna desde que ela era criança. Apesar de não compartilhar o mesmo sangue ou ser da mesma raça, Signard realmente pensava em Sienna como sua irmã mais nova. Ele ficou angustiado e triste ao ver Sienna se sentindo culpada, então deu-lhe um grande sorriso como se quisesse provar algo.
— Algum dia, algum dia… Está fadado a melhorar. Depois que todos os Reis Demônios forem mortos, não há como esta doença persistir. E logo, Iris, aquela elfa traidora também encontrará seu fim. — Sienna falou enquanto desviava o olhar para Eugene.
Signard observou a mudança de expressão de Sienna através das fendas dos olhos. Apesar de sua aparência obstinada e um tanto irritante, não havia nenhum traço de zombaria no rosto de Sienna.
— Sienna, com certeza você ainda não está presa ao Hamel, não é? — Signard perguntou depois de um tempo.
— I-Irmão, o que você está dizendo de repente?! — Sienna retrucou, aparentemente surpresa. Os olhos de Signard ficaram mais frios com a resposta dela.
Ela achava que seus sentimentos por Hamel haviam permanecido ocultos durante séculos, mas isso não era verdade. Talvez pudesse ser o caso daqueles com quem ela teve apenas uma breve interação, mas qualquer pessoa que tivesse formado um relacionamento substancial com Sienna, por mais obtuso que fosse, teria reconhecido sua atenção persistente por Hamel.
“Embora aquele idiota do Hamel parecesse não saber…”
Signard continuou a observar Sienna com os olhos semicerrados.
Trezentos anos de idade? Era um tempo surpreendente para os padrões humanos, mas não para um elfo. Assim, Signard percebeu que sua irmã mais nova ainda estava no auge da juventude. Além disso, ele a via tão bonita quanto qualquer elfo. Isso era tudo? Sienna era considerada a Sábia Sienna pelo mundo inteiro. Poderia haver outra mulher com tais credenciais?
Por outro lado, e Hamel? Ele foi um homem que morreu há três séculos e ressuscitou… Signard reconheceu que mesmo em sua vida anterior, Hamel teve muitos méritos. Após a reencarnação, esses méritos pareciam ter se multiplicado — o prestígio de sua família, suas próprias capacidades e até mesmo sua aparência física!
“Mas, mas…”
Apesar de tudo isso, Signard acreditava que Sienna merecia coisa melhor. Hamel, o Tolo, parecia não ter percebido os sentimentos de Sienna mesmo depois de trezentos anos, o que apenas fortaleceu os pensamentos de Signard.
E a julgar por seu ato consistente e indiferente, Sienna também parecia não ter intenção de confessar seus sentimentos a Eugene. Naquele breve momento, Signard se viu imerso em pensamentos profundos. Pessoalmente, achava melhor que Sienna encontrasse outra pessoa, alguém melhor que Hamel.
Ele não teve esses pensamentos só porque Hamel lhe deu uma boa surra no passado.
Acontece simplesmente que Signard não queria entregar sua irmã inegavelmente brilhante a um tolo assim.
Mas esse era apenas um desejo pessoal de Signard. Como um elfo que viveu durante séculos, ele entendia que os desejos de sua irmã eram mais importantes que os seus em assuntos como este.
— Eu vou ajudá-la. — Disse Signard.
— Hein? O quê?
— Sienna. Conhecendo você, provavelmente ainda não confessou seus sentimentos a Hamel. Então, deixe-me ajudá-la.
Assim como Signard teve uma enxurrada de pensamentos naquele momento fugaz, Sienna também teve. Ficou claro que seu irmão estava passando por algum mal-entendido significativo. Sentimentos não confessados? Eles já haviam expressado suas emoções um ao outro e até se beijaram.
Mas isso tinha alguma importância agora? Sienna se concentrou na oferta de Signard de… Ajudar. Isso não implicava que ela havia ganhado um aliado absoluto que estava inequivocamente ao seu lado?
Anise e Kristina eram como lobos.
Mer informou a Sienna quão astutamente Anise e Kristina agiram na casa dos Lionheart.
“Usando seu status de Santa capaz de exercer o poder divino, elas têm curado pequenos ferimentos dos Cavaleiros Lionheart todos os dias e acumulado boa vontade, não é?”
Sem dúvida, o nome ‘Sábia Sienna’ tinha um peso significativo na mansão Lionheart, mas como todos perceberiam o relacionamento entre um jovem de vinte e um anos e uma Arquimaga que viveu por trezentos anos? Os cavaleiros Lionheart não pensariam que a jovem santa de vinte e poucos anos combinava melhor com Eugene do que com a companheira de seus antepassados?
A idade não era importante. Especialmente para uma maga como Sienna, a idade era apenas um número. Mesmo assim, ela se sentia incomodada com isso, o que significava que Sienna não pensava na idade simplesmente como um número. Sienna tentou não ter consciência disso.
— Hmm… Hum… Não sei exatamente o que você está dizendo, irmão. Mas se está se oferecendo para ajudar, por que eu, sua irmã mais nova, recusaria? — Respondeu Sienna.
— Então eu vou te ajudar agora mesmo. Você ama Hamel. Não, não podemos usar esse nome aqui, não na frente de todo mundo. Então… Dizemos a todos que você ama Eugene. — Sugeriu Signard.
Os elfos não entendiam o coração dos humanos, e esse fato foi martelado em Sienna mais uma vez.
— Você está louco? Pare com essa bobagem, irmão. Apenas… Apenas fique parado por enquanto. Não faça nada até a próxima vez que eu precisar da sua ajuda.
Sienna rapidamente interrompeu Signard, fazendo-o calar a boca.
* * *
Eles enfiaram a enorme carcaça de Raizakia de volta no manto. Depois disso, Eugene, Kristina e Sienna entraram na Mansão sob o olhar admirado de todos.
— Por que a cara fechada? — Perguntou Eugene.
— O que… O que há de errado com meu rosto? — Respondeu Gerhard.
— Parece que você está preso em um lixão há três dias. É assim que você quer ficar ao cumprimentar seu filho, que voltou depois de tanto tempo?
O rosto de Gerhard se contraiu com a piada de Eugene. Enquanto olhava para seu filho, que sorria maliciosamente, ele também olhou de relance para Sienna.
Em circunstâncias normais, ele teria repreendido o filho por zombar dele, mas não poderia fazer isso agora. Não na presença da Sábia Sienna.
— Sir Gerhard Lionheart.
Sienna percebeu que Gerhard estava consciente dela.
Ela deu um sorriso suave. Ela sutilmente mudou o corpo para o lado, inclinando o ombro na direção de Eugene, e encontrou o olhar de Gerhard.
— O sucessor que escolhi, Eugene Lionheart, foi criado de forma notável, um feito inteiramente atribuído aos seus esforços, Sir Gerhard. — Continuou Sienna.
— Não… De jeito nenhum. Eu não fiz nada para criar meu filho…
— Você não confiou em seu filho e não apoiou todas as suas necessidades e aspirações?
— Ahem… Bem… Sim…
Os lábios de Gerhard se curvaram com o elogio.
Na verdade, mesmo segundo sua própria avaliação, Gerhard não o considerava um péssimo pai. Após a morte de sua esposa, Gerhard ajustou todo o seu estilo de vida e ambições para se adequar ao seu filho recém-nascido, Eugene.
“Embora seja difícil acreditar que ele é meu filho, dado o quão notável é…”
Ele nunca havia ensinado a espada a Eugene pessoalmente. Mas, se Eugene precisasse de uma espada de madeira, ele imediatamente a encontraria para ele. Ele fez o melhor que pôde, encontrando para Eugene um instrutor de espada, se ele pedisse.
Sienna não pôde deixar de sorrir interiormente quando viu a tensão se dissipando lentamente do rosto de Gerhard.
Foi como esperado. Elogiar seu filho foi a resposta certa.
De fato, Gerhard é muito subestimado… Ele teve uma vida difícil sustentando o pequeno, e mesmo que Hamel não tivesse reencarnado como Eugene, ele com certeza estaria até hoje dando o melhor de si pra criar a criança. Então mesmo ele sendo inútil em questão de batalha, ele apoiou o filho como pôde. Achei legal essa menção ao comum Gehard pai de família