— Deus Demônio, está tudo bem?
— …É você, Parion?
— Sim.
O Deus Demônio levantou o corpo de cima de sua luxuosa cama. Ele estava descansando a fim de remover as impurezas que o afligiram quando se fundiu ao [Venenoso Satou], uma armadilha criada pelo Panteão.
No momento em que Parion iria inocentemente tentar abraçá-lo como sempre fazia, o Deus Demônio a impediu.
— Deus Demônio?
Ela ficou confusa, pois sabia que sempre que o abraçava em sua forma material, isso deixaria o Deus Demônio em um estado de pura alegria.
— Eu posso acabar lhe passando alguma impureza.
— Tudo bem… eu entendi…
Pelo visto ela ainda não tinha se acostumado a usar o seu novo corpo físico visto que o rosto dela continuava inexpressivo.
— Mas fico impressionado que você tenha conseguido chegar até aqui.
Impressionado pelo fato dela ter conseguido chegar até a parte mais profunda do Submundo, repleta de demônios que absolutamente guardam rancor aos Deuses, sem causar uma única comoção.
— Autoridades cultivadas!
— Ah, compreendo. Bom trabalho, Parion. Você é uma boa menina.
Elogiada pelo Deus Demônio, Parion estufou o peito, cheia de orgulho. Foi então que um objeto com a qual ela não estava familiarizada entrou em sua visão.
— Deus Demônio, o que é isso?
Parion mudou sua atenção para a foice perolada, recoberta por uma aura multicolorida, dentro do quarto.
— [Foice Ceifadora de Deuses]… Uma arma capaz de ceifar a vida dos Deuses.
— Ceifar a vida dos Deuses?
Ela pegou a arma nas mãos e murmurou para si. Aparentemente, era algo muito pesado para Parion, que começou a cambalear perigosamente com a arma nas mãos.
— Parion, esse é um objeto muito perigoso. Coloque-o de volta onde você achou.
— Parion vai devolver, mas tem que antes ir matar primeiro.
Ela tomou uma pose instável de batalha com arma nas mãos.
— Infelizmente, ainda está incompleta?
— Incompleta?
O seu rosto inclinou em confusão.
— Sim, não há divindade dentro dela ainda.
— É preciso divindade?
— A razão pela qual eu criei as torres púrpuras foi para coletar divindade para esta arma. Elas deverão ter o suficiente para preenchê-la dentro de dez mil anos.
— Por que não usar as Nymphas?
— A quantidade de divindade que as Nymphas possuem é muito pequena. Mesmo que se usássemos a todas elas, ainda não seria o bastante para preencher a foice.
— Quanta divindade?
— O equivalente a de um Deus.
Os olhos de Parion se arregalaram ao ouvir o volume absurdo necessário para ativar a [Ceifadora de Deuses].
— O que fazer…?
Parion inclinou a cabeça fazendo um rosto completamente franzido. Ela nunca imaginou que para completar uma arma para matar um Deus, seria necessário primeiro matar um Deus.
— Volto depois.
Ela deixou essas palavras para trás quando saiu do palácio do Deus Demônio.
— Deus Demônio, eu tive uma ideia!
Em sua segunda visita, Parion foi direto ao ponto. Desta vez, o deus Demônio não estava na cama dormindo, o que significava que ele havia se livrado do veneno de Satou.
— Bem-vinda de volta, Parion. Que ideia você teve?
— Vamos usar o [Cristal Radiante Branco]!
— Fala daquele que fica escondido na camada mais profunda do Reino dos Deuses?
— Sim.
O Deus Demônio entendeu o que Parion queria quando percebeu o olhar radiante dela em direção à [Ceifadora de Deuses].
— É o bastante?
— A forma cristalizada de divindade é de fato o suficiente… Mas não posso concordar com isso.
— Não pode?
— Aquele cristal é mais um artifício para proteger o mundo humano que ao Reino dos Deuses.
Era graças a barreira erguida pelos Deuses dos Sete Pilares que o mundo humano continuava a salvo dos [Invasores] que vagavam pelo espaço e o [Cristal Radiante Branco] a mantinha de pé.
Essa era a extensão do conhecimento que o Deus Demônio possuía.
— Está tudo bem.
Parion estufou o peito, confiante.
— Mesmo?
— Sim, todo mundo tem divindade sobrando.
Ela insistiu que os Deuses poderiam criar um novo cristal se abrissem mão da divindade que estavam escondendo por debaixo dos panos.
— Sendo esse o caso, nossa ambição poderá ser realizada, então.
O Deus Demônio ponderou.
Seria possível libertar a humanidade sob o domínio dos Deuses caso ele possuísse uma arma de persuasão, a [Ceifadora de Deuses], para intimidá-los.
Apenas, o que será que passava no rosto sorridente de Parion…
— Vamos fazer!
— Tudo bem. Conto com você Parion, para me guiar até o Reino dos Deuses.
— Conte comigo!
Assim, uma aliança entre a Deusa Parion e o Deus Demônio foi criada, acarretando no furto do [Cristal Branco Radiante] dentro do próprio Reino dos Deuses.
— Deus Demônio, está tudo bem?
— Pa-Parion…?
— Sim
O Deus Demônio estava incapaz de até mesmo levantar da cama quando, em agonia, olhou para a inocente Parion. A Divindade fluindo para fora de seu corpo era muito superior ao montante normal, mas estava incrustada pelo lodo negro.
A névoa de miasma que cobriu a todo o Submundo parecia ter saindo de dentro do corpo do Deus Demônio.
— O que aconteceu?
— Os Deuses me pegaram. Tinha malícia escondida dentro do cristal.
Provavelmente era necessário tomar a divindade para si antes de transferi-la para a foice.
— Quem!?
— É quase certo que foi Zaikuon. Ele é o único idiota o suficiente para se auto sabotar dentre os Deuses.
— Sim.
Parion assentiu com uma expressão vazia.
— Ela foi preenchida?
Enquanto olhando para a [Ceifadora de Deuses], Parion perguntou ao Deus Demônio.
— Infelizmente, não.
O descontentamento ficou evidente no rosto da Deusa, quando ouviu a resposta do Deus Demônio.
— Não?
— Se eu fizesse isso, a [Ceifadora de Deuses] ficaria repleta de impuridades também. Seria uma repetição do que houve da última vez, então.
— Sim.
Parion caminhou em direção a foice e então um demônio vestido de santa se manifestou para impedi-la no momento em que ia tocar na [Ceifadora de Deuses].
— Saia!
— Você não deve.
— Eu não posso matar se não tiver isso!
A santidade olhou para a determinada Parion sem saber o que dizer. No entanto, sua guarda era impecável, não permitindo que a pequena Deusa se aproximasse da foice.
— Já é o bastante, Pario. Você não precisa se vingar de Zaikuon.
— Mas!
— Não se preocupe. Meus vassalos mais leais estão cuidando de criar um bode-expiatório para me livrar das impurezas. Vamos pensar em alguma forma de ameaçar os Deuses depois disso.
— …Tudo bem.
Parion relutantemente concordou.
— Está na hora de você deixar o Submundo.
— Deixar o submundo?
— Sim, eu não serei mais capaz de conter as impurezas a esse ritmo.
Se ele falhar em sua contenção, então o Submundo ficará contaminado por tanta impureza que poderia acabar corrompendo-a. O maior medo do Deus Demônio era que o seu próprio poder acabasse fazendo mal a pequena Deusa.
— Não posso permitir que o mundo humano seja corrompido também. Irei fechar os portais ligando o Submundo a ele e para isso preciso que você parta antes que seja tarde.
Ele parecia estar ciente de que ela atravessava o mundo humano sempre que o vinha visitar no Submundo.
— Volto depois.
Depois de dizer isso com sua expressão vazia, a Deusa Parion deixou o Deus Demônio. Graças as autoridades dela, nenhum dos demônios indo e vindo pelas passagens, conseguiu notar a sua presença.
— Um bode-expiatório para se livrar das impurezas…
Parion murmurou para si.
— …Há um.
Ela sabia.
Que o Satou com quem o Deus Demônio se fundiu era um falso criado pelos Deuses, mas ela não contou nada. Isso porque acreditava que ele já era perfeito da forma como estava e não precisava tomar o Satou para si.
Parion então pensou: Um corpo similar ao do Deus Demônio seria o melhor bode-expiatório para se transferir as impurezas.
Então, ela elaborou um plano para obrigá-lo a vir até o Submundo, onde a transferência poderia ser realizada.
— …Aqui.
No local onde seus olhos estavam apontando, estava uma menina de cabelo cor-de-rosa. Ela estava correndo sem destino pelo meio do corredor, enquanto dizia coisas como “Essa não~”, “O que podemos fazer~”, sem parar.
Parion se aproximou da menina que estava separada das demais do seu grupo. Na medida em que ia andando, ela corrigiu o seu rosto inexpressivo para algo mais digno de uma Deusa.
Os seus 100 milhões de anos de experiência não foram atoa. Parion era perfeitamente capaz de atuar como uma perfeita e sublime Deusa quando bem entendesse.
— Diga, criança. Você deseja salvar a vida do Deus Demônio?
— Eh? Quem é?
— Uma velha amiga de seu Mestre.
Ouvindo aquela voz gentil, a menina relaxou sua guarda.
— Tenho para você, a mais apaixonada de suas irmãs, a mais importante das missões.
— Que tipo de missão?
— Uma que fará com que você salve a vida do Deus Demônio, caso a cumpra.
— Mesmo!? Promete!?
— Sim, prometo. Você irá se encarregar dela?
— SIM!
Assim, Parion enviou a inocente menina para onde Satou estava no mundo humano e ainda lhe deu a autoridade para abrir os portais outrora fechados. Embora fosse impossível que uma Deusa como ela não soubesse que suas ações poderia trazer uma calamidade sobre o mundo humano.
— Kufuu, kufufufufu.
Ela rio de maneira alegre e inocente.
— Finalmente vou colocar as minhas mãos na [Ceifadora de Deuses]. Uma arma capaz de tirar a vida de um Deus.
O sussurro de Parion desapareceu dentro da fenda dimensional sem alcançar qualquer ouvido.
Ninguém estava ciente da verdadeira natureza de Parion.