Nick não conseguia parar de pensar em contar a Aria sobre seu poder.
“Eu só preciso contar para eles”, repetia em sua mente.
“Conte para eles.”
“Se você contar, tudo o que fez será recompensado.”
“É só contar para ela.”
Nick começou a ranger os dentes enquanto Aria o encarava com uma mistura de compreensão e desaprovação.
Por um lado, ela entendia que Nick estava completamente fora de si, já que um Caído havia dito que ele era o alvo.
Por outro, Nick trabalhava com Espectros há anos e era um Chefe Extrator Zephyx. Alguém nessa posição deveria ser capaz de distinguir entre medo racional e irracional.
Obviamente, Inveja não estava atrás de Nick. Afinal, ele era apenas um João.
Aria esperava que alguém como um Chefe Extrator Zephyx mantivesse a compostura nessa situação.
Por vários minutos, nenhum dos dois disse nada.
“Faça isso!” pensava Nick, com os dentes cerrados.
“Faça!”
“Conte para eles!”
“Pare de ser tão covarde!”
“Pare de ser tão egoísta!”
Ding!
A porta se abriu, e Nick olhou para ver quem entrava.
Eram duas pessoas.
Uma delas era o governador.
A outra era um homem que aparentava estar na casa dos trinta.
Ele tinha cabelos ruivos brilhantes, que pareciam chamas ardentes. Vestia um uniforme branco, diferente dos uniformes dos Extratores Zephyx. Havia um emblema no uniforme, representando um escudo com sete estrelas.
Nick sabia quem era aquele homem e respirou fundo.
O homem de cabelos ruivos avançou e olhou para Nick com uma expressão séria.
— Você viu o retransmissor? — perguntou.
— Retransmissor? — respondeu Nick.
— O círculo de pedras — esclareceu o governador.
— Sim, eu vi — confirmou Nick.
O homem assentiu.
— Meu nome é Simon Francium. Sou um Protetor da Égide — disse.
“Exatamente como esperado”, pensou Nick.
— Conte-me o que aconteceu depois que você entrou em contato com o retransmissor — ordenou Simon.
Nick assentiu e começou a narrar novamente o encontro com Inveja. Simon apenas o observava enquanto ouvia.
Nick contou tudo, exceto a parte sobre o Eterno.
Quando terminou, o silêncio tomou conta do ambiente.
Simon permaneceu esfregando o queixo, pensativo, enquanto olhava para baixo com a testa franzida.
— Certo, você pode ir — disse Simon.
As sobrancelhas de Nick se ergueram em surpresa.
Ele podia ir? Assim, tão fácil?
— Espero não precisar mencionar que tudo isso deve ser mantido em segredo — disse Simon.
— Ah, não, senhor — respondeu Nick.
— Ótimo. Então, vá — disse Simon, gesticulando em direção à porta.
Nick olhou para a mesa, atordoado.
“Certo.”
“Eu sou só um João.”
“Essas coisas estão muito além do meu nível.”
“Não há motivo para que eles falem comigo ou me incluam na investigação.”
“Sou apenas alguém que relatou um crime.”
“Isso não significa que eu automaticamente me torne parte dos investigadores.”
— Se está preocupado com as palavras de Inveja, não esteja — disse Simon, notando que Nick não havia saído. — Inveja mente o tempo todo para causar confusão e pânico.
— Embora esteja certamente irritado por você ter descoberto sua operação, duvido que ele realmente venha até aqui.
— Neste momento, Inveja está preso em um local secreto, cercado por vários Protetores.
— Tentar escapar agora seria estúpido e perigoso.
— Talvez ele tenha dito que destruiria esta cidade apenas para atrair um de nós para longe de outro campo de batalha.
— Por enquanto, Inveja está praticamente contido. Não em uma Unidade de Contenção real, mas ele não pode sair de onde está.
— Enquanto nada significativo o libertar, não há chance de ele aparecer aqui, e, mesmo que consiga, não virá para cá.
— Ele já disse que viria, o que significa que a Égide está de olho nesta cidade.
— Se ele vier, será cercado novamente, e, desta vez, pode até ser realmente suprimido.
— Não há motivo para se preocupar — concluiu Simon calmamente.
Nick respirou fundo.
Embora algumas partes do discurso de Simon o tenham acalmado, outras apenas o deixaram mais nervoso.
Inveja realmente tinha motivos para aparecer ali.
Mais uma vez, o coração de Nick disparou.
Segundos se passaram.
— Eu disse que você pode ir — repetiu Simon, com um tom de irritação.
Nick cerrou os dentes e apertou os punhos.
— Ele disse para você sair — reforçou o governador, caminhando até a mesa e segurando o braço de Nick.
O governador puxou levemente, mas Nick recusou-se a mover, o que fez o governador franzir a testa.
Nick estava apenas assustado?
Ele havia demonstrado muito medo até então, mas isso estava começando a ultrapassar os limites do razoável.
— Nick — disse o governador, com a voz baixa.
— Há algo que você tem medo de nos contar?
Os outros dois olharam para Nick com expressões sérias.
Havia mais alguma coisa?
Ele não sabia que esconder informações nesse momento poderia colocar todos em risco?
O corpo de Nick tremia.
Era como se estivesse diante de um abismo.
Ele precisava pular.
Ele precisava pular.
Ele precisava pular.
Se não pulasse, o Protetor iria embora, e toda a Cidade Fungo Carmesim seria destruída assim que Inveja conseguisse escapar.
Pior ainda, e se Inveja conseguisse informar um dos outros Caídos, ou até seu superior, sobre o poder de Nick?
Claro, mesmo que Inveja estivesse ocupado, outro Caído poderia decidir capturar Nick e absorver seu poder.
No instante seguinte, Nick agarrou dois punhados de seu cabelo enquanto seus braços tremiam e seus olhos refletiam um conflito interno monumental.
Os presentes perceberam que algo estava acontecendo.
— Saiam da sala.
O governador e Aria olharam para Simon com surpresa.
Dessa vez, Simon havia se dirigido a eles, e não a Nick.
— E desliguem a energia da Unidade de Contenção — acrescentou Simon. — Não quero que nada disso seja gravado.
Aria e o governador trocaram olhares incertos, mas Simon lançou um olhar sério para eles.
— Claro — disse o governador.
Ele e Aria lançaram um último olhar a Nick antes de saírem.
Alguns momentos depois, os sons vindos das paredes da Unidade de Contenção cessaram, e Simon sentou-se em uma cadeira à frente de Nick.
— Diga-me o que você está tão desesperado para dizer.