— Nick, escuta, me desculpe pelo que eu disse antes — disse Carl. — Eu não quis dizer…
— Está tudo bem — Nick interrompeu. — Eu entendi o que você quis dizer. Não precisa se desculpar.
Carl olhou para Nick com alívio.
— Na verdade — Nick continuou — sou eu quem deveria pedir desculpas.
— Você só estava perguntando o que aconteceu, mas eu imediatamente concluí que você queria enterrar toda essa questão e me silenciar.
Nick suspirou. — Quase te matei por causa de uma especulação infundada.
— Conversamos sobre isso antes — disse Carl. — Ambos cometemos um erro. Dois idiotas, certo? — acrescentou com um sorriso.
— Dois idiotas — Nick repetiu, com um pequeno sorriso próprio.
Os dois ficaram em silêncio.
Era um alívio poder conversar assim, mas ainda havia um assunto óbvio que não havia sido resolvido.
Nick olhou para Irwin, que se recusava a encará-lo.
Irwin estava virado para o lado, e Nick mal conseguia ver a lateral de um de seus olhos.
Naturalmente, Nick podia dizer o que Irwin estava sentindo.
Vergonha.
No entanto, havia uma coisa que Nick não tinha certeza.
Irwin sentia vergonha pelo que fez ou sentia vergonha por não ter conseguido?
Se Irwin tivesse tido sucesso e algumas horas ou dias se passassem, ele se arrependeria de suas ações?
Até que ponto a mente de Irwin estava ligada às suas emoções?
Uma pessoa pode fazer algo horrível quando está enfurecida, algo que nunca faria sob circunstâncias normais.
No entanto, a forma como o ser humano age depois do ato varia de pessoa para pessoa.
Alguns não se arrependem porque conseguiram o que queriam.
Ou seja, desde que não houvesse consequências externas, eles não se sentiriam realmente mal.
Mas também havia aqueles que se sentiam horrorizados e enojados com o que fizeram.
Para alguns, não sofrer consequências externas era ainda pior do que sofrer.
Algumas pessoas eram consumidas por tanta culpa que suas vidas chegavam ao fim.
Nick sabia muito bem como era carregar uma culpa tão pesada.
Então, que tipo de pessoa era Irwin?
Ele se arrependeria de suas ações se tivesse tido sucesso ou não?
Nick não tinha certeza.
Ele era um bom sujeito que cometeu um erro, ou apenas fingia ser um, e sua verdadeira natureza veio à tona agora?
— Vamos lidar com essa questão quando voltarmos — disse Nick, virando-se para Carl. — Acho que não podemos continuar nossa excursão agora.
Carl soltou um suspiro.
Naturalmente, ele odiava Irwin pelo que ele fez, mas ainda assim sentia pena dele.
Se Nick tivesse perdoado Irwin, ele teria dito isso agora.
No entanto, Carl não podia culpar Nick.
Irwin tentou matá-lo.
Isso era tão grave quanto possível.
Se houvesse algo verdadeiramente imperdoável no mundo, provavelmente seria isso.
— Claro — respondeu Carl. — Nick, você pode andar atrás de mim.
Nick assentiu.
— Irwin — Carl disse, e Irwin olhou de relance para ele. — Ande na minha frente, por favor.
Irwin respirou fundo, suspirou e assentiu.
— Vá — disse Carl.
Irwin começou a correr para o oeste, e Carl o seguiu.
Nick corria logo atrás de Carl.
Os três chegaram ao túnel e passaram por ele correndo.
Quando saíram do outro lado, continuaram correndo para o oeste.
As coisas que Nick havia visto já deveriam ter ido embora.
E, de fato, após alguns minutos correndo, não viram mais ninguém.
Eventualmente, chegaram à área sem vida ao norte da cidade.
Em vez de pularem para dentro da cidade, contornaram-na no sentido anti-horário.
Logo, avistaram os Campos de Carbono e os guardas que estavam lá.
Depois de trocar algumas palavras com os guardas, passaram pelos Campos de Carbono.
Os Campos de Carbono eram cheios de arbustos verdes que não produziam frutas nem flores.
Eram basicamente feitos apenas de folhas verdes e casca marrom.
Após saírem dos Campos de Carbono, rapidamente chegaram à entrada sul da cidade.
Cumprimentaram os guardas e entraram no túnel.
— Algum Espectro? — perguntaram os dois Peritos que guardavam a ponte.
— Não — disse Carl.
Um dos guardas assentiu e fez sinal para que os três passassem.
Momentos depois, os três entraram novamente na cidade.
Eles estavam de volta para casa.
Era impressionante como essa excursão foi curta.
Desde o momento em que saíram da cidade até o momento em que voltaram, mal havia passado uma hora.
E, ainda assim, tanta coisa aconteceu dentro desse curto período.
— Nick — disse Carl, olhando para ele. — Vou levar Irwin até Solace e contar para Hera e Marion o que aconteceu. Se tiver tempo, venha nos contar o que viu. Você ainda não nos disse o que eram aquelas coisas que estavam nos procurando.
— Certo — respondeu Nick.
Irwin lançou um olhar rápido para Nick antes de cerrar os dentes.
Ele parecia querer dizer algo.
Mas apenas desviou o olhar novamente.
Nick olhou para Irwin, que continuava se recusando a encará-lo.
Carl respirou fundo, colocou a mão no ombro de Irwin e o guiou em direção à Cidade Interna.
Os dois deixaram Nick para trás na Cidade Externa.
Por um tempo, Nick não se moveu.
Eventualmente, ele saltou para o lado e começou a se mover de telhado em telhado.
Depois de alguns segundos, Nick alcançou o telhado de uma casa familiar.
Fazia muito tempo desde a última vez que esteve ali.
Da última vez, ele estava pensando no que fazer com Wyntor.
Foi também quando Julian apareceu.
Por um tempo, Nick apenas olhou para a cortina vermelha de névoa à sua frente.
Irwin tentou matá-lo.
Ele merecia morrer.
E, no entanto, enquanto Nick olhava para a cortina vermelha, uma imagem surgiu em sua mente.
Era uma imagem de si mesmo.
E essa imagem se sobrepôs à de Irwin.
Nick via muito de si mesmo em Irwin.
Ele havia feito muitas coisas das quais se arrependia, e ainda sentia uma culpa indescritível.
Não era exatamente por isso que Nick estava fazendo tudo isso?
Não era porque ele estava buscando redenção?
Não era porque ele estava em busca de perdão?
Nick pensou em Irwin.
Depois, pensou em si mesmo.
“Mas eu sequer mereço perdão?”