— Seu tempo como Governador acabou — disse Nick.
Markus franziu a testa. — E quem é você para fazer esse julgamento?
— Não sou eu quem está fazendo. É a Égide — disse Nick.
Markus olhou para Simon.
— Markus Julius, a Égide não está satisfeita com a forma como você administrou a Cidade Carmesim. A Braço Esquerdo o considerou corrupto, e você ficará responsável por guardar a entrada da fortaleza local pelos próximos tempos.
— Corrupto?! — Markus gritou, tomado pela raiva e pelo choque. — Como sou corrupto?! Eu sempre entreguei à Égide o tributo todo santo ano, sem falhar! Mesmo quando metade da cidade foi destruída pelo Mar Carmesim, eu ainda consegui coletar Zephyx suficiente para a Égide! Um Governador corrupto teria dito que não podíamos pagar, mas eu paguei tudo!
Simon não parecia impressionado. — Essa não é minha decisão, mas a da Braço Esquerdo. Você pode enviar uma carta de protesto e apresentar seu caso, mas eu não teria muitas esperanças.
Na opinião de Simon, o atual Governador parecia relativamente neutro até então.
No entanto, ao ver o ‘escritório’ do Governador, também sentiu certo desgosto.
Ele não era tão extremo quanto Nick, mas a quantidade de riqueza presente naquela sala sozinha provavelmente poderia pagar todo o tributo anual.
Obviamente, a Cidade Carmesim tinha dinheiro de sobra.
Claro, de certa forma, Markus poderia fazer o que quisesse com seus lucros, mas isso não impedia Simon de sentir certo desprezo.
Markus cerrou os punhos e rangeu os dentes. — Isso é uma injustiça!
Então, apontou para Nick. — E quem é ele para entrar aqui e falar comigo desse jeito?!
— Sou o novo Intermediador da Cidade Carmesim — disse Nick.
— Intermediador? — Markus perguntou, franzindo as sobrancelhas.
— Vou governar junto com a nova Governadora. Implementarei reformas que levarão a um aumento de 20% no tributo dentro de cinco anos.
— Posso dar mais à Égide do que você, Markus — disse Nick com neutralidade.
— 20%?! — Markus gritou. — Isso é impossível! Você não tem ideia de quanto a Égide exige todo ano! 20% levariam a cidade à falência completa!
Nick apenas o encarou. — Porque você a administrou de forma ineficiente. A Cidade Carmesim é uma mina de ouro. O Fungo Carmesim tem uma cidade inteira de onde extrair Zephyx, mas você usa apenas 20% disso.
Markus bufou. — O quê? Você quer expandir ainda mais os Dregs? Você sempre falou sobre os pobres, e agora quer que eles sofram ainda mais?
— Não — respondeu Nick. — Muito pelo contrário.
Markus apenas zombou enquanto Nick continuava.
— O imposto de sangue deixará de ser voluntário e se tornará obrigatório. A quantidade de sangue paga será reduzida, mas todos terão que pagar.
— Cidade Interna, Cidade Externa, camada inferior, camada intermediária, camada superior, Extratores. Todos.
Markus ficou surpreso.
Então, começou a rir.
— Que ingenuidade! — gritou. — Você quer fazer esses leões pagarem com sangue? Você não tem ideia do que eles podem fazer! Você estará morto dentro de um ano, e os pobres sofrerão ainda mais depois disso!
— Eles querem o dinheiro deles, e vão consegui-lo de qualquer forma! Se tiverem que pagar com o próprio sangue, vão querer créditos em troca que superem em muito o valor do sangue que deram, e vão conseguir isso! Quer você goste ou não!
Nick não pareceu impressionado. — Os poderosos têm poder, mas no fim, também são apenas humanos.
— Em sua indulgência sem fim, você se tornou medroso. Tem medo de esmagar um rato porque teme ser mordido.
— Seu vasto armazenamento de Zephyx está sendo desperdiçado. Seu poder está apodrecendo em suas mãos.
Nick olhou para Markus. — Nenhum empresário deixaria seu dinheiro simplesmente apodrecer em uma conta bancária. Você precisa investir para ganhar mais dinheiro.
Markus também não parecia impressionado com as palavras de Nick. — Falando como uma criança ingênua que nunca teve que lidar com a verdadeira elite da cidade.
— Você quer dizer você mesmo? — Nick perguntou. — A única coisa que vi você fazer com a elite foi lamber suas botas.
— Você nunca esteve no controle da Cidade Carmesim. Kugelblitz, Anatomy e os Laboratórios Ghosty estavam.
— Mas vamos entreter essa ideia por um momento. Suponhamos que eu tivesse que lidar com o empresário mais astuto de toda a Cidade Carmesim, alguém muito mais experiente e sagaz do que eu. Quem sairia com mais dinheiro? — perguntou Nick.
Markus zombou. — Está dizendo que seria você? — perguntou, descrente.
— Sim, estou dizendo — afirmou Nick.
— Como? — Markus perguntou, soltando um riso debochado. — Está dizendo que é mais astuto do que eles, quando você mesmo disse, na sua hipótese, que eles são os mais astutos?
— Não, não estou — disse Nick — e o fato de você não enxergar a resposta mostra o quão distorcida é sua percepção da realidade.
Nick virou-se para Simon. — Deveria ser óbvio para você por que eu sairia com mais dinheiro.
Simon franziu a testa.
— Sim, mas eu não gosto da resposta — disse ele.
Nick virou-se para Markus. — É pelo mesmo motivo que os Dregs sofrem e a camada superior prospera.
— Poder.
Markus franziu a testa.
— Sou mais poderoso do que eles. O empresário mais astuto nunca se esquecerá dessa verdade.
— Desagradar o governo é o caminho mais rápido para o além.
— O empresário mais astuto é tão astuto que percebe isso. Ele perderá de propósito para ficar do meu lado, esperando ganhar meu apoio no futuro.
Markus apenas balançou a cabeça diante daquela idiotice. — Não é assim que a sociedade funciona. Todos nós temos que seguir as mesmas regras. Caso contrário, a sociedade deixaria de existir.
Nick olhou para Markus com neutralidade. — Agora sou eu quem faz as regras, e todos terão que segui-las.
— E minha regra é que a Égide vem em primeiro lugar!
Markus continuou balançando a cabeça diante das palavras estúpidas e ingênuas de Nick.
— Vou deixar que descubra sozinho — disse Markus, com uma voz que mostrava que ele havia desistido de tentar convencê-lo. — Claro, ficarei guardando os portões da fortaleza local. — Markus sorriu de lado.
— Mas ainda assim, esse é um destino melhor do que ser assassinado por algum padeiro aleatório que viu seus lucros diminuírem em um único dígito percentual. — Markus olhou para Simon. — Estou pronto para ir. Precisa de alguma coisa? — perguntou.
Simon pediu vários itens necessários para administrar a cidade de maneira eficiente.
A chave do console central, contratos especiais, contatos, manuais, planilhas financeiras e algumas outras coisas.
Foram quase duas horas para Simon organizar tudo.
Nick apenas ficou de lado em silêncio.
Por fim, todos esses itens foram deixados sobre a mesa.
Nick caminhou até eles e guardou todas as coisas importantes sob a supervisão de Simon.
Ele compartilharia tudo com Aria, que teria que exercer dois cargos ao mesmo tempo por algumas semanas.
O governo apenas funcionaria o mínimo necessário para continuar existindo pelo tempo que Aria precisasse, e ela lidaria apenas com as questões mais urgentes nesse período.
Todo o resto teria que esperar até que ela assumisse oficialmente o cargo de Governadora.
No final, os três saíram do escritório, e Nick trancou a porta com a chave.
Ninguém teria permissão para entrar no escritório, exceto Aria e ele.
Simon instruiu os guardas do castelo sobre o que fazer nas próximas semanas.
Essencialmente, eles deveriam encaminhar as questões mais urgentes para Aria enquanto acumulavam os assuntos menos importantes.
Naturalmente, os guardas ficaram extremamente chocados.
O Governador estava partindo?!
Aria seria a nova Governadora?!
Embora, depois de pensarem por um tempo, os guardas perceberam que isso fazia sentido.
O recente conflito com a Anatomy foi realmente desastroso.
Fazia sentido que o Governador fosse responsabilizado.
Não demorou nem duas horas para que todos na camada superior soubessem da saída do Governador.
Os três seguiram para a camada inferior e deixaram a megaestrutura.
Fora da megaestrutura, Simon se virou para Nick.
— Alguém virá buscar Ghosty nos próximos dias. Já cuidei dos Heróis da Anatomy antes de irmos à Égide.
— Tudo foi resolvido. Agora você e Aria estão no comando.
Nick assentiu. — Obrigado.
Simon olhou para Nick com uma expressão fechada.
— Espero, pelas vidas que terminaram injustamente, que você tenha sucesso — disse ele friamente.
— Se eu não tiver, morrerei — respondeu Nick com calma.
— Vou cobrar essa sua palavra — disse Simon, ameaçador.
— Fique à vontade — respondeu Nick.
Simon encarou Nick.
Não viu nenhum sinal de desonestidade.
Nick parecia mortalmente sério.
Ele realmente estava apostando sua vida nisso.
De certa forma, isso acalmou Simon.
Nick podia ser irredimível, mas ainda podia fazer algo de bom pelo mundo.
Talvez houvesse algo verdadeiro nas palavras de Nick.
Afinal, até mesmo os Espectros podiam conceder poder e esperança à humanidade ao produzir Zephyx e conceder habilidades.
Se até um Espectro podia ser usado para ajudar a humanidade, por que um monstro como Nick não poderia?
Um momento depois, Simon partiu com Markus sem dizer uma palavra de despedida.
Ele não gostava de Nick, mas queria que ele tivesse sucesso.
Seus métodos e valores eram diferentes, mas ambos tinham o mesmo objetivo.
A prosperidade da humanidade.
Simon esperava que Nick se saísse bem, mesmo que isso significasse que mais um monstro continuaria vivendo neste mundo.