Um minuto depois, o corpo de um jovem foi jogado na pilha de cadáveres por Nick.
— Certo, terminei — disse Nick, soltando um suspiro.
O guarda à frente assentiu.
— Você quer ficar com os corpos, certo? — perguntou.
Nick assentiu sem dizer nada.
— Tudo bem, colocaremos no carro fúnebre e calcularemos o preço no posto avançado — disse o guarda.
Nick assentiu novamente enquanto passava por eles.
Quando Nick saiu do corredor, olhou para trás.
Ele viu um dos guardas colocando um dos corpos nos ombros do outro, mas não prestou muita atenção.
No momento, os pensamentos de Nick estavam em outro lugar.
“Eu fiz a coisa certa, certo?” pensou Nick.
“Os Atacantes Riker são uma gangue horrível que estupra e mata pessoas o tempo todo sem contribuir com nada.”
“O Centro traz muitos empregos e mantém as gangues sob controle.”
“Os Ambulantes são a razão de haver tanta gente nos Dregs, já que trazem boa parte da comida.”
“A Gangue do Seguro dá às pessoas uma forma de proteger seus pertences.”
“Todos eles contribuem para os Dregs.”
“Mas os Atacantes Riker não contribuem com nada.”
“Eles apenas roubam, saqueiam, estupram e matam.”
Naquele momento, um dos guardas passou por Nick com um dos corpos nos ombros.
Nick não olhou para o corpo, mas teve a sensação de que ele o encarava com os olhos abertos e mortos.
A mente de Nick reproduziu as cenas que ele havia testemunhado dentro do corredor.
Pessoas gritando.
Pessoas aterrorizadas.
E, ainda assim, Nick apenas sentia que havia se livrado de algumas pragas.
Obviamente, eram pessoas, mas Nick as via como baratas ou ratos.
De certa forma, essas ‘pessoas’ eram até piores do que ratos ou baratas, já que esses podiam ao menos servir de alimento.
Nick sentia que deveria estar sentindo mais.
Ainda eram humanos, certo?
Não deveria sentir algo ao matar humanos?
Nesse momento, Nick se lembrou da primeira vez que matou alguém.
Quando tinha apenas 13 anos, estava à beira da fome, e, por pura sorte, conseguiu matar um rato.
Quando deu sua primeira mordida, uma mulher alta e grosseira o empurrou e pegou o rato.
Naquele momento, Nick foi tomado pelo pânico e usou toda a sua força para empurrar a mulher quando ela virou de costas para ele.
Surpreendentemente, a mulher foi lançada longe e caiu em cima de uma grade enferrujada, que se quebrou.
Um momento depois, ela gritou em terror enquanto caía no esgoto.
O jovem Nick apenas olhou, apavorado, para o buraco no chão.
Não teve coragem de olhar para dentro.
Ele só ouviu o som de muitas coisas pequenas caindo na água junto com os gritos da mulher, que se tornaram mais agudos e roucos.
Logo, os gritos cessaram, e um minuto depois, um rato saiu do buraco.
— Obrigado — disse o rato com um sorriso enquanto parava na frente de Nick. — Pode ficar com este corpo como recompensa. Se precisar de comida, é só jogar outra pessoa nos esgotos.
E então, o rato simplesmente caiu.
Os dias seguintes foram os mais horríveis da vida de Nick.
Dormir se tornou quase impossível.
Comer ficou difícil.
Trabalhar se tornou insuportável.
Viver ficou insuportável.
Nick foi assombrado pelas memórias daquele dia por semanas.
No entanto, de certa forma, as memórias o ajudaram.
Nick temia tanto confrontá-las que passou a se manter ativo durante todos os momentos em que estava acordado.
Ele temia o silêncio que permitia que pensasse e fazia de tudo para evitá-lo.
Isso resultou em um corpo mais forte e em mais dinheiro, já que trabalhava mais.
E, eventualmente, Nick aprendeu a conviver com tudo.
Finalmente, quando completou sua terceira missão de assassinato para O Centro, ele fez as pazes com aquele evento.
Nick nunca foi fã de matar, mas precisava de dinheiro para sobreviver e construir um futuro. Por isso, aceitou essas missões.
Era algo que ele simplesmente precisava fazer para seguir em frente.
Mendigos literalmente não podem ser exigentes.
— Senhor, terminamos.
Nick foi tirado de suas memórias quando um dos guardas o chamou.
Ele se virou para a entrada do beco e viu o carro fúnebre completamente cheio.
No momento seguinte, Nick lançou um último olhar para a entrada do corredor.
“Eu fiz a coisa certa”, disse a si mesmo em pensamento.
Depois de balançar a cabeça para recobrar o foco, Nick foi até o carro fúnebre.
— Vamos voltar — disse ele.
— Claro, senhor — respondeu o guarda à frente.
A essa altura, o segundo guarda se juntou ao terceiro para puxar o carro fúnebre, já que ele havia ficado bem mais pesado.
Os quatro atravessaram os Dregs em silêncio absoluto.
Ninguém falou, e nada ao redor fazia barulho.
Era quase como se estivessem atravessando uma ruína.
Eventualmente, eles chegaram à Cidade Externa.
Mais pessoas apareceram nas ruas, mas, ao verem o carro fúnebre, taparam os narizes e evitaram se aproximar.
Alguns minutos depois, os quatro chegaram ao posto avançado dos guardas.
O carro foi estacionado na entrada enquanto eles entravam.
Nick foi levado para um escritório separado, e o guarda à frente pegou várias folhas de papel.
Depois de ler todos os documentos e explicá-los a Nick, o guarda entregou alguns para ele assinar.
Nick assinou tudo, e o guarda guardou os papéis.
— E é isso. Obrigado, senhor — disse o guarda com um sorriso educado.
Nick assentiu e se levantou. — Eu que agradeço.
— Não há de quê. Só estou fazendo meu trabalho.
Nick assentiu novamente e deixou o escritório.
— Por favor, devolva o carro até amanhã — gritou o guarda antes de Nick fechar a porta.
Depois de sair do posto, Nick olhou para o carro cheio de corpos.
Alguns segundos depois, ele o agarrou em silêncio e começou a puxá-lo.