Os dois permaneceram em silêncio por alguns segundos.
— Se você fosse mais poderosa do que eu, o que isso mudaria? — Gravis perguntou.
— Eu teria sido capaz de te ajudar com sua Aura do Pecado — Stella respondeu imediatamente.
— E eu não teria compreendido a Lei Verdadeira do Sofrimento. Por não ter sido de muita ajuda, você me ajudou mais do que poderia ter ajudado ao realmente me ajudar — Gravis respondeu.
Stella franziu a testa.
— Deixe-me terminar — Gravis interveio antes que Stella pudesse dizer algo. — Eu sei que minhas palavras soaram muito duras, mas há um ponto importante nisso tudo.
Stella reprimiu seu desejo de interromper Gravis.
— Agora, se ignorarmos essa questão da Aura do Pecado… Se você fosse mais poderosa do que eu, o que poderia fazer por mim? — Gravis perguntou.
— Eu poderia te proteger quando… — Stella começou, mas não terminou a frase ao perceber algo.
Gravis assentiu. — Exatamente — disse ao ver que Stella havia entendido o significado de suas palavras. — Qualquer coisa que ameace minha vida é um refino, e se eu quero me tornar mais poderoso, não posso receber ajuda com isso. Assim que perceber que minha vida realmente não está em perigo, pois você interviria, minha Aura de Vontade não poderá mais crescer.
— Agora, vamos supor que você pudesse me dar um monte de Leis que eu não conheço, e todas essas Leis aumentassem minha Força de Batalha em um nível inteiro. Isso me tornaria mais seguro?
Stella fez uma careta.
— Não, não tornaria — Gravis acrescentou. — Porque, quando minha Força de Batalha cresce, eu também preciso lutar contra oponentes ainda mais fortes para o refino. De certa forma, se você me desse mais Leis, isso poderia, na verdade, me colocar em mais perigo do que se não me desse. Meu poder aumentaria, e, para permitir o crescimento da minha Aura de Vontade, eu precisaria me colocar em ainda mais perigo.
— Então, quando eu estivesse realmente em perigo de perder minha vida, você teria que recuar para bem longe para que não pudesse intervir de forma alguma. Caso contrário, eu não conseguiria me refinar.
— Assim, se você fosse mais poderosa do que eu e pudesse me dar muitas Leis mais poderosas, isso não tornaria minha vida mais segura.
— O mesmo se aplica ao equipamento incrível. Se eu tivesse um equipamento muito poderoso, minha Força de Batalha aumentaria, o que significaria que eu precisaria lutar contra inimigos ainda mais poderosos.
— Agora, e se surgisse um inimigo contra quem eu simplesmente não pudesse vencer? Claro, você poderia salvar minha vida e matá-lo por conta própria, mas, nesse ponto, você não seria muitas vezes mais poderosa do que eu novamente?
— Não seria a mesma dinâmica, só que com os papéis trocados?
A mente de Stella tentava processar o que tinha ouvido.
Ela nunca havia enxergado essas coisas por essa perspectiva.
— Certo, então, o que eu posso fazer por você com meu poder? — Gravis perguntou.
Stella pensou em proteção, mas isso nem era verdade.
Orfeu e os Deuses Ancestrais estavam lá, e eles eram ainda mais poderosos do que Gravis. A interferência de Gravis não faria diferença.
Equipamento?
Gravis já havia desmentido essa possibilidade.
Então, o que Gravis realmente fazia por Stella?
— Você ainda me dá tantas Leis — Stella disse. — Baseando-se apenas nos meus próprios méritos, eu não mereceria ser tão poderosa quanto sou agora.
Surpreendentemente, Gravis riu, e Stella franziu a testa.
— Não se trata da sua Força de Batalha — Gravis disse. — Deixe-me colocar dessa forma: se eu tivesse dado todas essas Leis a outra pessoa, essa pessoa ainda estaria viva?
— O que você quer dizer? — Stella perguntou.
— A habilidade de transcender refinos — Gravis explicou. — A maioria dos nossos amigos morreu durante os refinos. Claro, alguns também foram mortos por Cultivadores muito mais poderosos, mas muitos deles simplesmente morreram porque perderam contra seus oponentes. Eles poderiam ter vencido teoricamente, mas não venceram.
— Se tivessem mais Leis, teriam enfrentado inimigos ainda mais poderosos. Eles teriam sobrevivido contra esses inimigos?
— Eu não acho — Gravis acrescentou com um leve aceno de cabeça. — Força de Batalha é algo bom, mas você também precisa ter a capacidade de triunfar sobre seu oponente quando ele tem o mesmo nível de poder que você. Quando dois oponentes igualmente poderosos lutam, a Força de Batalha se torna irrelevante. Afinal, eles já são igualmente poderosos. A Força de Batalha dita contra quem você luta para o seu refino, não se você vence.
— Nessa situação, o mais importante é sua capacidade de crescer sob pressão. Se sua capacidade de crescimento sob pressão for inferior à do seu oponente, você morrerá. Afinal, se ambos têm o mesmo ponto de partida, a vitória depende de quem pode crescer mais.
— Só você tem controle sobre essa sua habilidade. Quanto mais você quer viver, maior se torna sua concentração nessas circunstâncias.
— E daí se eu te dei algumas Leis? — Gravis acrescentou com um sorriso. — Você está lutando dois ou três níveis acima de si mesma. Claro, isso não seria nada especial se outras pessoas também pudessem obter essas Leis, mas o impressionante é que você conseguiu sobreviver mais de uma vez.
— Se todas as suas Leis tivessem vindo de mim, você não conseguiria compreender novas Leis durante o refino, e inevitavelmente morreria ao enfrentar um oponente que compreendesse uma nova Lei durante a luta.
— Isso obviamente já aconteceu com você antes, mas, mesmo assim, você conseguiu triunfar.
— Mesmo se eu não te desse nenhuma Lei, você ainda seria capaz de lutar, pelo menos, um nível acima de si mesma, talvez até dois. Isso ainda é extremamente impressionante.
— Não se esqueça, você conseguiu se tornar a Donzela Sagrada de uma Seita no Pináculo no mundo superior mais poderoso que existe. Você conquistou isso por conta própria.
— Não pense que você é indigna do seu Reino.
Stella olhou para a mesa com as sobrancelhas franzidas.
— Agora! — Gravis acrescentou com um grito repentino. — Vamos falar sobre o que você realmente contribui para esse relacionamento.
Stella olhou para Gravis.
— Vamos imaginar que você tivesse ficado em casa apenas esperando por mim.
— Se você tivesse feito isso, Manuel, Dorian, Azure, Aris, Ferris e Exar teriam morrido em sua guerra feroz contra as outras Seitas. Sem você, mais um Deus Estelar poderoso teria se somado à pilha de inimigos, e todos teriam sido mortos — Gravis explicou.
— Você salvou a vida de quase todos os meus amigos e do meu filho, assim como eles salvaram a sua na guerra. Eu consigo lidar com algumas mortes, mas, se todos tivessem morrido tentando me ajudar, não sei se conseguiria me perdoar.
Stella olhou ausente para a facção de Manuel.
— Próximo — Gravis disse. — Se eu não soubesse o quanto minha morte te machucaria, eu já estaria morto.
O olhar de Stella disparou para Gravis, chocada.
Gravis suspirou.
— A Aura do Pecado foi inimaginavelmente aterrorizante — Gravis disse. — Eu estava constantemente lutando contra o desejo de me matar. Eu só queria que essa tortura terminasse, não importava como.
— Durante aquele tempo, eu não pensei no meu pai, ou no Céu, ou em qualquer outra coisa.
— Eu sabia que Aris, Yersi e, especialmente, Cera conseguiriam lidar com minha morte. Claro, Aris e Yersi sofreriam por mim, mas eles superariam isso.
— Os três não precisam de mim. É bom me ter por perto, mas eles são meus filhos. Eles não precisam de mim tanto quanto eu preciso deles. A morte de um pai é horrível, mas os filhos conseguem lidar com isso. No entanto, se um filho morre, os pais provavelmente nunca se recuperam.
— Enquanto estava sob os efeitos da minha Aura do Pecado, eu tive muitos pensamentos horríveis — Gravis disse, desviando o olhar com uma expressão dolorosa. — Eu não me importava com os problemas do meu pai. Eram problemas dele, não meus. Isso não teria me impedido de me matar.
— Mortis? Claro, eu sentiria muita culpa por me matar, mas, naquela época, Mortis não tinha ninguém. Eu poderia aceitar tirar a vida dele também, contanto que essa tortura terminasse.
— Meus amigos? Eles conseguiriam superar minha morte, assim como eu superei a deles. Parece frio, mas é assim que a vida funciona.
— Nada estava me impedindo de acabar com tudo.
Gravis olhou para Stella.
— Exceto você.
Stella respirou fundo.
— Eu sabia que você sentiria uma dor inimaginável. Uma parte de mim até acreditava que você também poderia acabar se matando.
— O amor entre dois amantes é diferente de qualquer outro tipo de amor. Um pai precisa de seus filhos, mas os filhos não precisam dos pais depois que se tornam adultos.
— Amigos querem estar juntos, mas não precisam um do outro.
— No entanto, amantes precisam um do outro. Eu preciso de você, e você precisa de mim. Se um de nós morresse, o outro nunca mais se sentiria completo. Seria como se uma parte de nós estivesse faltando.
— Quando eu estava naquele lugar escuro, você foi a única coisa que me manteve seguindo em frente — Gravis disse, olhando profundamente nos olhos de Stella.
— O pensamento de te causar tanta dor me impediu de acabar com meu sofrimento.
— Sua existência salvou minha vida, e ninguém mais poderia ter feito isso nessas circunstâncias — Gravis disse com um suspiro.
Um breve momento de silêncio se passou antes de Gravis continuar.
— Agora, a próxima coisa — Gravis disse. — Minhas duas prioridades principais na vida são felicidade e liberdade. O poder vem depois.
— Eu posso me tornar poderoso sozinho.
— Eu posso me tornar livre sozinho.
— Mas eu não posso ser feliz sozinho.
— Sua existência é a única maneira de eu alcançar a felicidade nesta vida — Gravis disse. — Sem você, liberdade e poder se tornam insignificantes.
— Você falou tanto sobre me ajudar no aspecto do poder, mas não percebeu que o poder não é minha prioridade.
— Eu quero ser feliz, não poderoso.
— E, quando você não está feliz, eu não estou feliz — Gravis acrescentou.
— Então, por favor, não tente destruir sua felicidade por algo tão insignificante quanto o poder — Gravis disse, aproximando-se de Stella.
Então, Gravis pegou levemente sua mão.
— Por favor — Gravis disse.
Depois, ele olhou para o chão.
— Eu só quero que você seja feliz.
As palavras sinceras de Gravis tocaram Stella, e ela sentiu seus olhos marejarem.
O amor congelado havia derretido.
Stella tocou o rosto de Gravis e o puxou para mais perto.
Então, eles compartilharam um beijo longo.
Era como se nunca tivessem se separado.