— De onde veio isso de repente? — Lasar perguntou. — Você pensou nessa dívida por mais de um ano, e agora simplesmente diz que está tudo resolvido? Parece uma perda de tempo para mim.
Gravis não se irritou com o comentário. A essa altura, ele já havia recuperado a calma. — Não tenho outra escolha — respondeu.
Lasar levantou uma sobrancelha. — Isso soa estranho. O que aconteceu?
Enquanto esperava a resposta de Gravis, Lasar informou ao Patriarca e ao Grande Ancião, que ainda estavam presentes, que deveriam esperar um minuto. Ele estava no meio de explicar como Gravis havia se tornado tão forte, mas teve que interromper devido ao contato de Gravis.
Gravis contou a Lasar tudo o que aconteceu nos últimos minutos e também suas previsões sobre a situação. Depois que Gravis terminou de explicar, Lasar coçou o queixo com os dedos.
— Isso é interessante — Lasar disse pensativo. — E você diz que é basicamente o mesmo sentimento que teve quando estava sob a influência da Disposição do Raio na Guilda-Proxy do Relâmpago?
— Sim, exatamente o mesmo — Gravis respondeu.
— Huh, acho que sei o que está acontecendo com você — Lasar disse. — Você pode saber mais sobre como o Céu e o mundo funcionam, mas não se esqueça de que sou o Mestre da Seita do Relâmpago há muito tempo. Tenho muita experiência nesse assunto e vi muitas pessoas sendo influenciadas pela Disposição do Raio. Então, por favor, leve a sério o que vou dizer, certo?
Gravis assentiu. — Claro, mas você não precisava demonstrar sua autoridade sobre o assunto assim. Eu levaria suas palavras a sério de qualquer forma.
Lasar sorriu um pouco. — Bom saber. Enfim, acho que você está sendo constantemente influenciado pela Disposição do Raio, mesmo quando está calmo.
Gravis franziu as sobrancelhas. — Não sei se isso faz sentido. Afinal, eu não saio matando alguém só porque me olha de maneira errada.
— Deixe-me terminar — Lasar disse. — Digamos que temos dois tipos de personalidades que um cultivador elemental sempre possui. Uma personalidade é a própria do cultivador, enquanto a outra é a personalidade de seu elemento. Isso faz sentido, certo?
Gravis assentiu. — Faz sim.
Lasar levantou um dedo. — Então, podemos dizer que essas personalidades vivem no mesmo corpo, ou sob o mesmo teto, se preferir assim. A personalidade principal está sempre no controle e é a que age, enquanto a segunda personalidade fica escondida. Mas, quando a personalidade principal faz algo que a segunda personalidade é totalmente contra, a segunda personalidade se manifesta para mostrar seu descontentamento.
Lasar continuou explicando. — Dependendo da segunda personalidade, ou seja, do elemento, ela reage de maneiras diferentes. No caso do elemento terra, por exemplo, ela simplesmente se afasta. No caso do raio, como ele não gosta de ser contido, tenta assumir o controle. É aí que a pessoa é afetada pela Disposição do Raio. Faz sentido até agora?
Gravis assentiu. — Sim. Acho que é uma boa analogia.
Lasar também assentiu. — Agora, nesse caso, as duas personalidades são entidades completamente separadas que não podem se comunicar entre si. A segunda personalidade apenas observa e julga tudo com base nas ações, sem se importar com os motivos ou o raciocínio por trás dessas ações.
— No seu caso, acho que isso funciona de maneira diferente — Lasar disse. — Porque seu Espírito está adaptado ao raio, essa segunda personalidade se fundiu com você até certo ponto. Não acho que tenha se fundido completamente, mas em certa medida. E essa fusão permite que as duas personalidades troquem conceitos.
Gravis continuou ouvindo com interesse. — O que te deu essa ideia? — ele perguntou.
— O fato de você ter conseguido acalmar seu raio ao abrir mão da dívida — Lasar explicou. — Pense bem, quando você estava sob a influência da Disposição do Raio, alguma racionalidade ou raciocínio teria impedido você de enlouquecer?
Gravis pensou por um momento e balançou a cabeça. — Duvido. Eu estava completamente cego pela raiva.
— Exatamente! — Lasar transmitiu com mais entusiasmo. — Agora, pense no que você fez agora. Suas emoções só se acalmaram depois que você oficialmente abriu mão da dívida ou quando tomou a decisão? Isso é importante!
Gravis não precisou pensar muito para responder. — Assim que decidi abrir mão da dívida, minha raiva diminuiu rapidamente. Eu já estava totalmente calmo antes de te contatar.
Lasar assentiu. — Exatamente como eu imaginei. Lembra como eu disse antes que a segunda personalidade só se importa com as ações e não com o raciocínio por trás delas? No seu caso, o raio foi capaz de entender sua intenção e seu raciocínio e se acalmou antes mesmo de você agir. Isso não é o que acontece com as pessoas normais.
Gravis percebeu várias coisas e ficou pensativo. — Faz sentido. Se eu não pudesse racionalizar com meu raio, eu não teria conseguido me segurar até você chegar. Eu teria simplesmente matado o velho. Mas, devido à minha fusão incompleta, o raio ainda exigia justiça. Ele se conteve porque entendeu que a raiva não ajudaria.
Gravis franziu as sobrancelhas. — No entanto, qualquer outro cultivador de raio não teria uma reação tão violenta devido a apenas um incidente. Normalmente, seriam necessários vários incidentes desse tipo para criar um conflito tão grande. Mas, no meu caso, isso aconteceu logo na primeira vez.
Gravis respirou fundo. — Então, para resumir, por um lado, meu limite é mais flexível do que o dos outros porque tenho mais influência sobre meu raio. Mas, por outro lado, meu raio também tem mais influência sobre mim, o que torna o fracasso em seguir seus princípios muito mais devastador.
Gravis olhou para o céu. — A interação entre cultivadores normais e seu elemento é como a relação entre dois amigos ou colegas. Se alguém insulta o outro, um pode ficar irritado ou bravo, mas isso é o máximo. Enquanto isso, minha relação com meu raio pode ser comparada a uma parceria próxima. Um insulto pode gerar uma enorme briga, já que ambos levam as ações do outro muito a sério. Agora, será que isso é melhor ou pior?
Lasar ouviu o monólogo de Gravis. Afinal, Gravis queria mantê-lo a par de seus pensamentos. — Acho que é uma boa comparação. Na minha opinião, acho que isso é mais positivo do que negativo. No seu caso, você não precisa se preocupar com sua sincronia com o raio caindo, já que vocês dois estão se comunicando de perto. Você ainda pode fazer o que quiser.
— Pense bem. Mesmo sem o seu raio, você ficaria satisfeito em não atacar Reginald depois que ele te atacou? — Lasar perguntou.
Gravis pensou sobre isso e balançou a cabeça. — Mesmo sem meu raio, eu não ficaria satisfeito em deixar isso passar. Não importa se ele estava justificado ou não. Ele me atacou, e, portanto, estou no meu direito de retaliar. É o que acredito.
Lasar sorriu um pouco. — Então, ao não atacar Reginald, você não só foi contra o seu raio, mas também contra si mesmo. Isso soa como uma restrição para você?
Gravis coçou o queixo pensativo. — Se você colocar dessa forma, acho que concordo. Eu não estava apenas agindo contra meu raio, mas também contra mim mesmo. Isso foi o que me deixou tão irritado. — Então, Gravis suspirou de alívio. — Obrigado, Lasar. Eu estava preocupado com a ideia de que meu próprio raio poderia me suprimir, mas não percebi que também estava agindo contra mim mesmo. Enquanto eu permanecer fiel a mim mesmo, meu raio não vai interferir.
Lasar assentiu. — Sem problemas. É para isso que os mais velhos estão aqui. Vivemos mais tempo e vimos mais coisas. Agora que isso está resolvido, acho que tenho uma solução que não desperdiçará o seu ano de reflexão sobre sua dívida e também fará você ficar bem com a situação.
Gravis levantou uma sobrancelha. — Ah é? Me diga.
Lasar sorriu. — Deixe-me conversar com Reginald por um momento. Enquanto isso, pode chegar mais perto? Aguardando fora do Clã Freya já seria suficiente.
Gravis assentiu e se aproximou do Clã Freya. Afinal, estavam conversando de uma distância considerável. Enquanto isso, Lasar conversava com Reginald e Marvin, explicando rapidamente várias coisas sobre Gravis e sua ideia.
— Não concordo — Marvin disse. — Agimos corretamente! Não tentamos matá-lo, apenas queríamos que ele aguardasse o julgamento para descobrir a verdade.
Reginald permaneceu em silêncio, refletindo.
Lasar cruzou os braços, e sua expressão mudou de um sorriso para uma expressão de desagrado. — Você se esqueceu de uma coisa — disse Lasar de forma calma.
Marvin ficou um pouco nervoso com a mudança de tom de Lasar, mas ainda acreditava plenamente que estava agindo de maneira correta. — O quê? — ele perguntou.
— Se Gravis não fosse tão poderoso quanto é agora, vocês o teriam espancado, capturado e talvez até punido sem sequer consultar minha Seita do Relâmpago. Isso poderia ser considerado agir corretamente? — Lasar perguntou friamente.
Marvin rangeu os dentes. — Não, mas isso não aconteceu. Poderia ter acontecido, mas não aconteceu. Não vejo erro em nossas ações. Julgar a situação com base em hipóteses é ridículo!
Lasar o encarou calmamente. — Certo, então você provavelmente não se importará se minha Seita do Relâmpago agir da mesma forma que vocês agiram hoje, certo?
Os olhos de Marvin se estreitaram. — Isso é diferente! Nós somos a parte mais fraca…
— Ah, e de repente, a fraqueza se torna importante, né? — Lasar o interrompeu.
Marvin ficou mais irritado, mas uma mão o impediu de dizer mais alguma coisa.
Reginald olhou para Marvin. — O Mestre da Seita está certo — ele disse. — Temos sido suprimidos por outras forças por tanto tempo que, desesperadamente, queríamos que aparecesse um intruso mais fraco só para podermos mostrar aos outros que não somos fracos. Queríamos desesperadamente provar nosso poder ao suprimir um oponente mais fraco. Em vez de atacar, poderíamos ter conversado com ele e pedido para que aguardasse do lado de fora enquanto verificávamos seu status com a Seita do Relâmpago. Esta era uma opção que não tomamos.
As palavras de alguém próximo penetraram mais profundamente do que as de um estranho. Quando Reginald disse isso, Marvin começou a refletir sobre a situação, e não conseguiu encontrar uma razão para não terem feito o que Reginald acabara de sugerir. Marvin percebeu que eles praticamente atacaram Gravis assim que o consideraram um inimigo.
Depois de um tempo, Marvin respirou fundo e soltou um grande suspiro. — Fui cegado pelo status do Clã e pela forma como os outros o percebiam. Isso me cegou para as minhas ações. Hoje, nosso clã cometeu um erro. — Então, ele se virou para Reginald. — Se você quiser aceitar a proposta, eu não vou te impedir. Faça o que achar melhor. Preciso pensar em algumas coisas.
Reginald e Lasar sorriram ao ouvir isso. Era sempre bom ver alguém genuinamente aceitar que cometeu um erro. Algo assim exigia um caráter forte.
Reginald se virou para Lasar, sem hesitação nos olhos. — Eu aceito.