Gravis ficou um pouco surpreso no início, mas após pensar por alguns segundos, percebeu que fazia sentido. Quão grande era sua família? Além disso, quanto tempo seus irmãos viviam? Nos primeiros cinco a quinze nascimentos, os irmãos podiam ter algum interesse, mas depois disso?
Chegava um momento em que se tornava apenas mais do mesmo. Ao mesmo tempo, não havia muito que os conectasse aos pais. Sim, durante os primeiros cem ou duzentos anos, eles ainda poderiam sentir uma conexão com os pais, mas e depois?
A maioria de seus irmãos havia sido elevada ao Reino Imperador Imortal pelo pai. Eles já teriam suas próprias famílias, e a limitação de visitar o pai apenas algumas vezes poderia criar um distanciamento.
Eles vinham visitar seus pais, e nada mudava. O pai permanecia em seu quarto, enquanto a mãe quase não saía. Seus pais tinham vivido tanto tempo que já tinham visto de tudo e não havia mais empolgação em viajar.
— Huh, faz bastante sentido — disse Gravis.
Orpheus suspirou. — Desculpa não ter contado antes.
— Tudo bem, eu entendo — respondeu Gravis. — Eu era jovem, e saber que minha família não se importava comigo teria me machucado muito naquela época.
Orpheus tomou mais um gole de seu café. Gravis, sem muito interesse na bebida, deixou Orpheus beber sozinho. — Mas você não se importa mais, não é? — perguntou Orpheus com um sorriso.
Gravis balançou a cabeça lentamente. — Faz sentido, e eu não sou mais uma criança. Se não há amor ou companheirismo, o que resta é o sangue. E de que isso vale? Não estou bravo com eles, porque penso o mesmo. Por que eu deveria visitar irmãos que não se importam comigo? Isso seria apenas uma situação desconfortável para ambos. — Gravis explicou.
Orpheus suspirou mais uma vez. — Não julgue eles tão mal. Muitos ainda mantêm contato com nossos pais. Só que a maioria se tornou insensível à ideia de uma família crescente. Nossa família se parece mais com um clã do que com uma família.
— Mas, ao contrário de um clã normal, não compartilhamos os mesmos problemas nem o mesmo espaço. Experiências ruins conectam as pessoas — explicou Orpheus.
Gravis apenas assentiu.
— Vamos mudar de assunto — sugeriu Orpheus. — Então, você vai para um Mundo Natural a seguir?
Gravis franziu as sobrancelhas. — Não, por que eu iria? Estou mais interessado nas Técnicas de Batalha de um Mundo de Batalha.
Orpheus ficou confuso por um momento, mas então percebeu algo. — Ah — ele disse lentamente. — Você ainda não falou com o pai sobre seu cultivo, não é?
Gravis sentiu que havia algo por trás disso. — Não, ainda não — respondeu.
Orpheus riu. — Acho que tirei um pouco da surpresa, mas tenho certeza de que o pai não vai se importar — disse, tomando mais um gole de seu café.
Gravis olhou desconfiado para Orpheus. — E estou supondo que você não vai me explicar o que é?
Orpheus balançou a cabeça com um sorriso. — O pai explicaria melhor. Então, se prepare para uma surpresa em relação ao seu cultivo quando falar com ele.
Gravis sorriu de leve. — Tudo bem. Não tenho problema com surpresas. Elas deixam a vida mais interessante. — disse ele.
Orpheus assentiu, e eles ficaram em silêncio por alguns segundos. Depois, ele sorriu novamente. — Você pode me mostrar? — perguntou.
— Mostrar o quê? — Gravis questionou.
Orpheus soltou uma risadinha. — Quero ver o corpo do Céu — disse em um tom amigável, mas Gravis percebeu a empolgação na voz dele. — Nunca vi um Céu antes.
Gravis também sorriu. — Claro.
Whooop!
Um verme negro de um metro de comprimento, coberto de olhos, apareceu sobre a mesa. Orpheus o examinou com curiosidade. — Uau, é bem diferente do que eu imaginava. Achei que seriam mais parecidos com humanos.
Gravis recolocou o corpo em seu Espaço Espiritual. — Eu também pensei assim. Eles agem de forma muito humana e parecem se importar apenas com humanos. Achei que teriam um corpo parecido com o nosso, mas aparentemente não é o caso.
Orpheus coçou a têmpora, pensativo. — Me pergunto se todos os Céus têm essa aparência ou se é só o caso dos Céus inferiores.
— O que você quer dizer? — perguntou Gravis.
— Bem, e se isso for apenas uma versão infantil do Céu? Afinal, os mundos inferiores são os mais fracos. Pode ser que isso seja apenas uma criança — sugeriu Orpheus.
Gravis refletiu por um momento. — É possível, mas não tenho certeza. Embora ele tenha se comportado de forma meio infantil.
Depois disso, o assunto mudou para outras coisas, mas os tópicos mais importantes já haviam sido discutidos. No entanto, ainda havia uma última surpresa.
— A propósito — disse Orpheus — você sabia que o pai suspendeu a regra de visitas uma vez por século há cerca de uma semana? Fiquei bem surpreso com isso.
Gravis também ficou um pouco surpreso, mas logo entendeu o motivo. Seu pai finalmente havia reconhecido alguns de seus sentimentos, e talvez se aproximar dos filhos ajudasse. Mas Gravis não comentou isso com Orpheus. Descobrir que um dos pais nunca os amou é um golpe difícil. Era algo que cabia aos pais revelar.
Orpheus notou a mudança na expressão de Gravis. — Você sabe de algo — comentou.
Gravis assentiu. — Sim, mas eu não deveria ser o responsável por explicar. Pergunte ao pai quando o visitar. É algo que ele deve contar.
Orpheus soltou um riso. — Ótimo. Primeiro, eu te mantenho no escuro sobre sua surpresa de cultivo, e agora você faz o mesmo comigo. Acho que mereci — disse com uma risada e tomou mais um gole de café.
Em vez de sorrir, Gravis apenas suspirou. Orpheus tentou aliviar o clima, mas esse assunto não era leve.
Claro, Orpheus também percebeu que Gravis não entrou na brincadeira, o que o fez franzir as sobrancelhas. Pelo visto, o motivo não era tão simples.
Após mais alguma conversa, Gravis se despediu. Estava na hora de falar com o pai sobre seu cultivo. No entanto, uma surpresa o aguardava quando chegou em casa.
— Espere um pouco. Seu pai está conversando com uma de suas irmãs agora — sua mãe transmitiu para ele.
Gravis ficou um pouco surpreso, mas deu de ombros. — Claro — disse, encostando-se à parede ao lado da porta. Era só esperar até que terminassem a conversa.
Ele esperou por cerca de dez minutos até que a porta se abriu.
Uma mulher jovem e bonita saiu. Naturalmente, com seu poderoso cultivo, sua idade real não poderia ser determinada apenas pela aparência. Ela usava muitas joias e vestes magníficas que emanavam uma aura de calma. No geral, ela parecia uma mulher amorosa e gentil.
— Tch — ela resmungou com um olhar de desprezo ao sair, e, naquele instante, todo o bom pressentimento que Gravis sentia evaporou. Aquele desprezo em seu rosto destruiu por completo a imagem calma e amigável que ela havia transmitido. Era impressionante que ela tivesse coragem de agir assim após falar com o pai. Ela devia saber que ele havia visto aquilo.
Isso só podia significar que ela não se importava com o que o pai pensava. Gravis percebeu imediatamente que ela era uma das irmãs que não se importava com a família. Imaginar não ver o pai por cem anos e depois sair com um olhar de desprezo assim…
Bem, se seu pai tivesse feito algo terrível, Gravis entenderia. Mas ele conhecia o pai muito bem. Seu pai era justo com todos e evitava interferir nos assuntos alheios. Ele não forçaria ninguém a fazer nada. Deixava que seus filhos fizessem o que quisessem.
A mulher notou Gravis e demonstrou surpresa por um breve instante. Em seguida, sua expressão mudou instantaneamente para um sorriso doce. Ao ver isso, o nojo de Gravis cresceu. “Eu odeio hipocrisia”, ele pensou.
— Você é o filho-central da vez, certo? — ela perguntou, mantendo o sorriso doce. — Queria ter te conhecido antes, mas estive muito ocupada. Sinto muito — disse em um tom triste. — Meu nome é Melody. Qual é o seu? — completou, estendendo a mão com um sorriso.
Gravis manteve os braços cruzados. Olhou para a mão estendida por um instante e depois encarou os olhos de Melody.
— Se você realmente quisesse me conhecer, já saberia meu nome. Não precisa fingir que se importa comigo.
Melody exibiu uma expressão ofendida. — Que rude! — exclamou com indignação. — Você não deveria falar assim com sua irmã mais velha! Seria bom aprender um pouco de educação, porque no futuro você não estará mais sob a proteção do nosso pai. E, quando esse momento chegar, falar desse jeito pode te trazer muitos problemas!
Gravis a observou com um olhar entediado. — Como eu disse, você não precisa fingir que dá a mínima. Não há nenhuma conexão entre nós, então a minha opinião não tem relevância pra você — respondeu enquanto se afastava da parede e caminhava lentamente em direção à porta do quarto de seu pai.
Melody ficou novamente ofendida, mas logo bufou e ergueu o nariz, como se ele fosse insignificante. Como esse fraco ousa falar assim comigo? Ela pensou. Ele não sabe que eu poderia matá-lo com um simples pensamento?
Contudo, em vez de continuar a conversa, ela balançou a cabeça e se afastou. — Algumas pessoas realmente precisam aprender o seu lugar — murmurou, sabendo muito bem que Gravis a ouviria.
Gravis não se importou com o que Melody disse. A opinião dela era irrelevante para ele.
Em vez de responder, ele entrou no quarto de seu pai. Como nas vezes anteriores, seu pai estava na mesma posição habitual.
— Terminou de lidar com suas emoções? — perguntou seu pai, abrindo os olhos.
Gravis assentiu com um sorriso. — Sim, estou me sentindo bem melhor agora — respondeu enquanto se sentava à frente dele.
Seu pai também assentiu.— Ótimo, porque tenho más notícias para você — ele disse.
As sobrancelhas de Gravis se franziram.
— Sim? — perguntou.
— Um de seus amigos morreu há alguns dias — disse o pai.