Quase todas as bestas perceberam o que tinha acontecido. Afinal, a chefe ficava na linha de frente, longe de todas as outras, tornando-se bem evidente. Quando Gravis a matou, quase todas prenderam a respiração em choque. Uma Besta Espiritual de grau médio tinha matado uma Lorde? Isso era impossível!
O que aconteceria com eles agora? Deveriam ficar e esperar? Poderiam fugir? O que deveriam fazer?
— Está pensando o que eu estou pensando? — Gravis perguntou a Orthar com um sorriso.
— Se a chefe estava confiante o suficiente para liderar um grupo de ataque à terra com a força que tinha, a resistência na terra não deve ser algo que ela não pudesse lidar — Orthar respondeu.
O sorriso de Gravis se alargou, e ele assentiu. — Exatamente. Agora tenho uma Besta-Unidade para comer, mas vou precisar de mais uma para chegar ao Reino-Unidade. Devo conseguir encontrar uma adequada na costa. Afinal, as bestas em terra não deixariam seus territórios desprotegidos.
Orthar olhou para as bestas atônitas atrás deles. — Pretende usá-las? — ele perguntou.
— Não — Gravis respondeu imediatamente. — Não sou fã de forçar pessoas ou bestas a servirem. Podem me seguir se quiserem, mas não precisam.
— Fico feliz em ouvir isso, Gravis — Orthar disse. — Também não gosto de forçar ninguém a fazer o que eu quero, desde que não tenham mostrado agressão contra mim.
— Acho que devo falar com elas — Gravis disse, virando-se para as bestas. Nem todas estavam dentro do alcance do Espírito dele, mas a maioria estava.
Quando as bestas viram Gravis olhando na direção delas, ficaram em pânico. Se quisessem fugir, essa era a chance.
Whoosh! Whoosh!
Muitas bestas começaram a fugir com todas as forças, enquanto outras decidiram ficar. Não era que quisessem invadir a terra, mas sabiam que Gravis provavelmente poderia matá-las se fugissem. Ir contra a possível vontade dele poderia selar seu destino.
Mas, ao contrário do que esperavam, Gravis não perseguiu nenhuma das bestas. Apenas as deixou partir. Quando as que hesitavam perceberam isso, muitas também decidiram fugir. Invadir a terra? Não eram suicidas! Seus instintos gritavam que havia perigo, e elas seguiram essa orientação.
Depois de um minuto, apenas cerca de 10% das bestas permaneceram. Gravis achou interessante o fato de tantas terem ficado, mesmo sabendo que invadir a terra era praticamente uma sentença de morte. Quando não restavam mais bestas fugindo, Gravis nadou para frente.
— É interessante que vocês tenham decidido ficar — Gravis transmitiu para elas. — Sabem que a terra tem comida para mim, o que também me atrai. Por que decidiram ficar?
A maioria das bestas ficou em silêncio. Elas nem sabiam direito por que não tinham fugido. Talvez só estivessem indecisas?
Mesmo após alguns segundos, ninguém respondeu Gravis.
— Enfim — Gravis transmitiu — não importa o que querem fazer. Podem ir embora, não vou impedi-las. Mas, se quiserem, podem ficar. Tenho algumas boas ideias para atacar a terra.
As bestas se entreolharam, incertas. Invadir a terra era um suicídio, mas isso só era verdade se fossem forçadas a atacar como um grupo de sacrifício. Cada besta queria se tornar mais poderosa. Uma incursão ao continente não seria perfeita para isso?
— Como pretende atacar? — uma das bestas transmitiu.
Gravis ficou um pouco surpreso com a mensagem clara. Aparentemente, essa besta não era burra. Ele rapidamente identificou o falante.
Era uma cobra fina e azul, com quase 200 metros de comprimento. Seus olhos pareciam interessados, astutos e controlados. Gravis percebeu imediatamente que a cobra se orgulhava de sua esperteza.
Gravis coçou o queixo enquanto a observava.
— Sabe de uma coisa? — Gravis transmitiu com um sorriso. — Eu tinha alguns planos para o ataque, mas parece que você tem uma ideia melhor. Do contrário, não teria falado assim, certo?
A cobra estreitou os olhos por um instante, enquanto sua língua espiava pela boca. Ela estava pensando em várias coisas ao mesmo tempo. Esperava muitas respostas diferentes de Gravis, mas não essa.
Era raro a cobra errar na previsão das ações dos outros. Isso jogava todos os seus planos no lixo. — Por que está me perguntando? — ela retrucou.
O sorriso de Gravis se intensificou. Ele preferia conversar com seres inteligentes.
— Seus olhos mostram astúcia e ganância — Gravis transmitiu apenas para a cobra, mantendo as outras bestas fora da conversa. — Acho que seu objetivo é o poder, mas em um sentido diferente do que a maioria das bestas interpreta.
— Continue — a cobra disse, com os olhos semicerrados. Aquela criatura estranha à sua frente era assustadora. Nunca havia sido tão facilmente decifrada assim antes.
— Acho que você está interessada em autoridade — Gravis transmitiu. — Está atrás de poder para governar sobre os outros. Quer respeito, seguidores, riquezas, companheiros atraentes e muitas outras coisas. Acertei?
— Não é por isso que toda besta tenta se tornar mais forte? — a cobra respondeu, sem negar a alegação de Gravis. — Todas querem segurança e viver a vida ao máximo.
— Aí é que você se engana — Gravis disse.
A cobra estreitou os olhos. — Como estou errada? — perguntou.
— Você está atribuindo seus valores aos outros. Eu, por exemplo, não tenho interesse em governar ninguém. Quero poder para ser livre e sem restrições. A vida das bestas mais fracas é irrelevante para mim. Por que eu me importaria com o que uma formiga pensa de mim?
— Algumas bestas têm os mesmos objetivos que você, mas muitas outras perseguem poder por razões diferentes. Vingança, liberdade, riquezas, respeito, proteção, sobrevivência e até conhecimento são motivações para outros.
A cobra olhou para as outras bestas, refletindo sobre aquelas palavras. Normalmente, não se deixaria influenciar por qualquer comentário, mas Gravis havia demonstrado inteligência ao decifrar seu plano. Além disso, ele era claramente poderoso. Suas palavras poderiam conter conhecimento valioso.
— É por isso que perguntou diretamente sobre meu plano? — a cobra perguntou.
Gravis assentiu. — Sim. Provavelmente você queria participar da invasão e usar sua astúcia para ganhar seguidores.
A cobra ficou em silêncio por um momento. — Tenho que admitir que você está certo. Mas, mesmo sabendo do meu objetivo, por que ainda me perguntou? — ela perguntou, interessada. Não entendia por que Gravis estava lhe dando uma parte de sua autoridade de forma tão direta. Parecia que ele estava entregando parte de seu poder sem motivo aparente.
Gravis riu um pouco. — Porque, como eu disse, não ligo para governar os outros. Só me importo em ficar mais forte. Quero liberdade. Governar sobre outros inevitavelmente me obrigaria a dobrar minha vontade ao bem-estar deles. Isso seria apenas uma restrição.
— Um verdadeiro governante não se curva a ninguém — a cobra respondeu.
— Depende do seu objetivo — Gravis respondeu. — Se você suprimir todos abaixo de você, eles vão se sentir sufocados. À medida que seu séquito cresce, os dissidentes podem começar a se multiplicar e se revoltar. Talvez fujam para um inimigo e revelem seus planos. Enquanto você governar pelo medo, seu domínio será superficial.
— Se alguém fugir, eu simplesmente mato — disse a cobra.
— Isso funciona uma vez, talvez duas, mas quanto mais você fizer isso, mais seus seguidores temerão por suas próprias vidas. Eles começarão a sentir medo mesmo sem nunca terem planejado trair você. Nesse ponto, só restará uma opção para eles: fugir. Com sua força sozinha, talvez você consiga manter sua posição atual, mas não conseguirá subir.
A cobra ainda não estava totalmente convencida. Aquilo ia contra toda a sua ideologia. No entanto, permaneceu em silêncio, pois seus argumentos pareciam fracos naquele momento.
— Por exemplo — disse Gravis. — Se eu te forçasse a me servir, você buscaria toda oportunidade possível para se afastar de mim, correto?
A cobra estreitou os olhos novamente.
— Porém, se eu te der a autoridade que você quer, você não iria contra mim. Afinal, seríamos aliados. Enquanto eu não atrapalhar seus objetivos, eu seria um recurso, não um obstáculo.
A mente da cobra fervilhava. Aquela besta estranha estava provando suas alegações ao usar a cobra como exemplo. A cobra sabia exatamente o que faria nas situações descritas por Gravis, e também sabia que ele estava certo.
Depois de alguns segundos, a cobra esboçou algo que parecia um sorriso — ou, pelo menos, foi o que Gravis achou que viu.
— Quero autoridade e conhecimento — disse a cobra. — Em troca, eu lidero a batalha e organizo as bestas.
Gravis balançou a cabeça. — Como eu disse, não pretendo governar sobre ninguém. Não estou interessado em encontrar ou fundar um grupo.
Mas os olhos da cobra permaneceram confiantes. — Você é novo por aqui, não é? — ela perguntou.
Gravis franziu a testa. — Sou. E daí? — ele respondeu.
— Eu imaginei — disse a cobra. — Se você quer se tornar mais forte que um Lorde de nível um, vai precisar de um grupo. Sem um grupo, é impossível.
— Como assim? — Gravis perguntou.
— Porque os Reinos e Impérios não permitem que qualquer um entre em seus territórios — a cobra explicou. — Claro, você pode entrar como presa e viver por lá. Afinal, se todas as bestas forem caçadas, os territórios perderão seu valor.
— Mas — continuou a cobra, com um brilho astuto nos olhos — a presa tem a função de fortalecer o Império ou Reino, não de enfraquecê-los. Poucas bestas sabem disso, mas assim que uma presa mata um certo número de recursos desses territórios, alguém muito acima de sua classe será enviado para eliminá-la.
Gravis estreitou os olhos enquanto encarava a cobra.
Enquanto isso, a cobra apenas sorriu com malícia.