Shira já conhecia o plano de Gravis. Por isso, não ficou nem um pouco surpresa quando ele falou aquilo. Em vez disso, ficou furiosa e frustrada. “Tentei matar essa víbora porque ela vai ser um oponente poderoso. Isso vai ser problemático”, pensou.
Enquanto isso, a víbora não sabia bem o que pensar. Não ia morrer? E o que aquela besta tinha acabado de dizer?
— Tá brincando comigo? — a víbora transmitiu para Gravis com uma voz irritada.
— Não, não estou — respondeu Gravis.
— Então agora você não quer nos matar? Vai querer matar todo mundo mais tarde? Qual é o seu objetivo com isso? — a víbora retrucou.
Gravis apenas deu um sorriso de canto. — Ah, eu conheço suas leis estabelecidas — disse. — Vamos até a Torre. Podemos discutir isso publicamente, para que todas as bestas da Tribo Rio vejam que estou falando sério.
Whoosh!
Gravis nadou em direção à Torre, e a víbora observou. Enquanto isso, Shira lançou um olhar mortal para a víbora. — Não se meta no meu caminho, ou você nem vai saber como morreu — ela disse antes de seguir Gravis.
A víbora ainda estava furiosa. O que Gravis havia proposto era praticamente um suicídio! Mesmo assim, ela os seguiu.
Splash!
Os três saíram da água. Gravis foi em direção à Torre e começou a escalá-la até uma altura suficiente para que todas as bestas pudessem vê-lo. Shira e a víbora retornaram para seus respectivos acampamentos e ficaram à frente de seus grupos.
A horda marinha não demonstrava muito respeito por Shira. Para eles, ela só havia provado ser inteligente, e nem a conheciam há muito tempo. Além disso, ela não havia demonstrado sua força. Quase todos os sobreviventes haviam matado uma besta do mesmo nível que eles, enquanto Shira não venceu.
Por outro lado, as bestas terrestres se posicionaram respeitosamente atrás da víbora, mostrando que a reconheciam como líder. Nenhuma delas ousou se aproximar demais dela.
Quando Shira viu aquilo, estreitou ainda mais os olhos. “Me aguarde”, pensou com desprezo.
Agora, todas as bestas haviam se reunido em frente à Torre, e Gravis olhava para elas.
— Todos os sobreviventes continuarão vivos e se juntarão à minha tribo, a Tribo Rio — Gravis anunciou.
As bestas terrestres olharam para Gravis com ceticismo e depois para as bestas marinhas com desdém. Não sabiam se Gravis falava sério, mas mesmo que falasse, não queriam se aliar a uns camarões.
As bestas marinhas sabiam que Gravis estava falando sério, mas não eram grandes fãs dessa ideia. Haviam participado da batalha apenas para conseguir comida, que, aliás, ainda estava boiando morta na água. Elas preferiam ir buscar sua refeição em vez de ouvir Gravis.
— Você sabe que é contra as leis unir bestas do mar e da terra, não é? — a víbora transmitiu com raiva para todos ao redor. Essa era uma discussão pública.
— Sei — Gravis respondeu. Ele havia falado bastante com Shira sobre esse assunto enquanto elaboravam o plano.
A víbora esperou que Gravis continuasse, mas aparentemente ele já havia terminado. Isso a deixou ainda mais irritada. — Isso vai transformar todos aqui em inimigos de todas as tribos marinhas e terrestres. Isso é suicídio! Se você quer nos matar, por que não faz isso logo?
Gravis apenas sorriu. — Eu sei. E daí? — ele perguntou.
A víbora ficou surpresa. — Como assim ‘e daí’? Isso vai nos matar! — ela gritou com raiva e frustração.
— E se seguíssemos as leis, as outras tribos não tentariam nos matar? — Gravis perguntou.
— Sim, ainda tentariam, mas não seríamos o principal alvo de todas as tribos ao redor — a víbora rebateu imediatamente. — Isso vai dar às tribos vizinhas um motivo para se unirem e nos atacarem como uma força conjunta!
Gravis riu um pouco. — No fim, tudo se resume a se tornar mais poderoso. Você está dizendo que as leis são apenas um meio para encontrar uma razão arbitrária para nos atacar. É isso?
A víbora ficou em silêncio por alguns segundos, refletindo sobre as palavras de Gravis. — Sim, é isso — respondeu. — Mas isso não muda a realidade da situação. Seremos inimigos de todo o mundo.
— Deixe-me te dar algumas situações hipotéticas — Gravis disse.
— Vá em frente — a víbora respondeu, irritada.
— Quando somos mais fracos que uma tribo vizinha, eles nos atacariam? Quebrar as leis faria alguma diferença nessa situação? — Gravis perguntou.
— Não, não faria — a víbora respondeu rapidamente. — Quando uma fonte de poder é fraca demais para se defender, ela é engolida por bestas mais fortes.
Gravis assentiu. — E quando somos mais fortes que uma tribo vizinha, eles nos atacariam?
— Não sozinhos. Mas poderiam encontrar aliados em outras tribos para nos derrubar, afinal, seríamos uma ameaça para eles — a víbora respondeu.
Gravis sorriu. — Isso não soa como a mesma situação que se quebrássemos as leis?
— Sim, mas… — a víbora começou, mas parou. Queria rebater aquele argumento, mas não conseguia. Não era uma besta tola que acreditava sempre estar certa. Ela era inteligente porque analisava constantemente seu próprio pensamento e buscava erros.
Após alguns segundos a mais, os olhos da víbora se estreitaram enquanto refletia. Agora, ela começou a avaliar a situação honestamente, comparando as relações com outras tribos em ambos os cenários. No entanto, mesmo depois de meio minuto, não encontrou diferença. No fim, tudo terminaria na mesma luta, apenas por caminhos diferentes.
Os olhos da víbora continuavam semicerrados, mas por um motivo completamente diferente. Agora, ela estava planejando e avaliando todas as possíveis vantagens e problemas que tal fusão traria. Não era mais contra a ideia.
— No fim das contas, não importa — Gravis disse, ao perceber que a víbora havia parado de reagir por um tempo. Ele teria deixado ela pensar mais se essa fosse uma conversa privada, mas estava ficando estranho esperar tanto nessa situação pública. — Se você é fraco, você morre. Se você é forte, os fracos temem por suas vidas e se unem contra você.
A víbora saiu de seus pensamentos e voltou sua atenção para Gravis.
— Pense nisso — Gravis disse enquanto deslizava para baixo da Torre. — Se quebrarmos as leis e o inimigo for mais forte que nós, ele não vai buscar ajuda. Ele vai nos atacar imediatamente. Se quebrarmos as leis e o inimigo for mais fraco, ele vai buscar aliados. Mas o mesmo aconteceria se não quebrássemos as leis. Não faz diferença.
Agora, Gravis estava na frente da víbora. A víbora tinha 200 metros de comprimento, mas não usava toda sua altura para se erguer. Assim, ela e Gravis se encaravam no mesmo nível.
Gravis nunca tinha estado tão próximo da víbora antes, e ela sentiu o poder dele pela primeira vez. Ficou bastante chocada, não por quão forte Gravis era, mas por quão fraco ele parecia. Era óbvio que esse era o líder da horda marinha, mas ele nem sequer era um Lorde.
Isso deixou a víbora completamente perplexa. Como essa criatura conseguiu matar o Lorde deles? Nenhuma besta comum tinha poder para derrotar um Lorde. Era impossível!
Gravis percebeu as sutis mudanças nos olhos da víbora e entendeu o que ela estava pensando. — Você duvida da minha força — comentou Gravis. — Se quiser, pode tentar me matar agora mesmo. Eu juro que não vou te matar em troca. Também não usarei o poder que me permitiu matar seu Lorde. Você só precisa enfrentar o meu corpo, nada mais.
A víbora hesitou por alguns segundos enquanto observava Gravis. Então, seu rosto relaxou.
— Não, eu não duvi…
Whoosh!
A cabeça da víbora disparou de repente, tentando morder Gravis. Era a oportunidade perfeita. Seus corpos estavam muito próximos, e o golpe da víbora foi rápido. Se conseguisse mordê-lo, o veneno certamente o mataria.
No entanto, Gravis girou facilmente a parte superior do corpo para o lado, desviando do ataque. Os olhos da víbora se arregalaram de choque ao ver isso. Em um instante, o peito largo de Gravis estava bem à sua frente, mas agora, ele havia se movido para o lado. A víbora nunca tinha visto uma técnica como essa antes.
O tronco superior de um humano era muito flexível e largo, mas relativamente fino em comparação com outras bestas. Com a cintura flexível, um peito que parecia massivo e largo podia escapar de um ataque apenas girando um pouco a parte superior do corpo, sem mover muito a parte inferior. Naturalmente, o corpo de Gravis era semelhante ao de um humano.
PACK!
Antes que a víbora pudesse se preparar para um novo ataque, a mão de Gravis agarrou sua garganta. A víbora sentiu uma pressão incrível ali, gerando pânico em sua mente. A parte mais vulnerável de seu corpo estava agora nas mãos do inimigo.
PACK!
A víbora usou sua cauda recém-regenerada para atacar Gravis pelo lado direito. Como ele estava usando a mão direita para segurar seu pescoço, não teria como bloquear esse golpe, já que sua mão estava ocupada.
Mas Gravis simplesmente girou a parte superior do corpo em 180°. Assim, sua mão esquerda agarrou a cauda da víbora. O corpo dela começou a se contorcer desesperadamente, tentando escapar do aperto, mas não adiantava. Se fosse uma mão humana, talvez ela conseguisse escapar. No entanto, as mãos de Gravis eram maiores, mais poderosas e tinham garras mais longas que estendiam seu alcance e firmavam seu aperto.
Gravis puxou a cabeça da víbora para frente, de forma que ela ficasse olhando diretamente em seus olhos. — Convencida? — ele perguntou.
— Sim — respondeu a víbora, com medo e derrotada.
— Bom — disse Gravis com um sorriso de canto.