Gravis contou à Imperatriz e ao Grande Ancião tudo o que estava autorizado a compartilhar. Conceitos como a Sorte Cármica ou o fato de as bestas existirem apenas como recurso para os cultivadores, ele manteve para si mesmo.
Durante seu relato, a Imperatriz e o Grande Ancião o interromperam algumas vezes com perguntas. Muitos dos conceitos que Gravis mencionava eram estranhos para eles. Eles também duvidaram da existência do Céu por um bom tempo.
Vale lembrar que o Céu nunca havia se mostrado nesse mundo até recentemente. Dizer a alguém que havia um ser superpoderoso, oculto de tudo no mundo, não era exatamente convincente. Um ser estava observando o mundo todo? Por favor!
Alegações extraordinárias exigiam provas extraordinárias, e, felizmente para Gravis, sua breve interação com o Céu na Área de Compreensão das Leis para o Raio de Punição serviu como prova. O Grande Ancião foi a única besta presente que prestou atenção às palavras de Gravis antes do Céu se manifestar.
Naquela época, o Grande Ancião não sabia com quem Gravis estava falando, mas, com a revelação da existência do Céu, finalmente compreendeu. Esse evento, que intrigou o mundo por anos, agora fazia sentido.
Sem esse acontecimento, os dois não teriam acreditado na história absurda de Gravis. No entanto, o Grande Ancião viu a prova, e o mundo todo sentiu a prova quando tudo tremeu e tempestades surgiram. A Imperatriz confiava no Grande Ancião, e quando ele contou o que havia acontecido, ela também acreditou em Gravis.
A história de Gravis terminou após sua luta com o Dragão Dourado. A Imperatriz e o Grande Ancião já conheciam tudo o que aconteceu depois disso.
Quando Gravis terminou de falar, mais de meio dia havia se passado. Normalmente, ele levaria apenas algumas horas para contar sua história de vida, mas as discussões sobre os conceitos estranhos ocuparam bastante tempo. No entanto, Gravis não se importou, já que não estava sob pressão de tempo.
— Sua resistência à procriação obrigatória faz muito mais sentido agora — disse a Imperatriz. — Além disso, você também tinha uma chance real de escapar dessa exigência, mas parece que agora você terá que cumpri-la de qualquer forma.
Gravis suspirou.
— Infelizmente, sim. Nada contra você, Imperatriz, mas simplesmente não sinto atração por nenhum tipo de besta. Não é uma questão de corpo, mas de mentalidade diferente. Além disso, a família é comumente extremamente importante para os humanos.
— Ainda não entendo bem isso — comentou a Imperatriz. — Afinal, nós bestas também somos todas diferentes umas das outras, mas acho que posso simpatizar com seus sentimentos.
— Imperatriz, agora que você conhece os humanos, tenho uma pergunta — disse Gravis.
— Pergunte — respondeu a Imperatriz, de forma direta.
— Seu corpo superior é muito semelhante ao dos humanos — disse Gravis. — Você poderia ter escolhido qualquer outro corpo superior com maior potencial de combate, mas escolheu parecer um humano. Por quê?
Uma pergunta assim era um pouco pessoal, mas, como Gravis havia compartilhado seus segredos, ela não se importou em retribuir.
— Curiosamente, antes de você me contar sua história, eu não tinha certeza do motivo pelo qual escolhi este corpo.
Gravis levantou uma sobrancelha. Não esperava essa resposta.
— Quando me tornei uma Imperadora — disse a Imperatriz, olhando para o horizonte em reflexão — deixei as Leis guiarem minha evolução. Eu não pensei sobre o tipo de corpo que queria, apenas confiei em meus instintos e sentimentos nisso. Naquela época, eu não sabia por que escolhi esse tipo de corpo, até agora.
— Desde que me tornei uma Imperadora, senti-me mais próxima das Leis do que nunca. Originalmente, acreditava que esse era apenas o sentimento inerente que todo Imperador compartilhava, mas agora, não penso mais assim.
— Acredito que as Leis escolheram esse corpo para mim porque ele cria uma conexão mais forte com elas. Vocês, humanos, têm corpos muitas vezes mais fracos que os nossos, pelo menos foi o que você disse. Então, deve haver outros poderes que lhes permitem fechar essa lacuna.
— Acho que um desses poderes é uma conexão mais forte com as Leis. Não tenho certeza, mas talvez os humanos tenham uma ligação mais próxima com as Leis, o que pode ser uma das razões pelas quais conseguem lutar contra as bestas. Você é um bom exemplo disso — disse a Imperatriz.
— Eu? — Gravis perguntou, levantando uma sobrancelha.
A Imperatriz assentiu.
— Você já compreendeu três Leis enquanto ainda é um Lorde. Claro, podemos contar apenas duas delas, já que você basicamente absorveu sua Lei do Raio de Punição. Para nós, bestas, entender duas Leis enquanto ainda somos Lordes é extremamente notável. No entanto, isso talvez não seja verdade para os humanos.
Gravis coçou o queixo em pensamento.
— Acho que é uma possibilidade — disse ele após alguns segundos. A Imperatriz não sabia disso, mas essa explicação também encaixava com a ideia de que os humanos deveriam se tornar os mais poderosos possíveis, não as bestas.
Gravis tinha quase certeza de que, quanto mais se progredia no caminho do cultivo, mais importantes as Leis se tornavam. Dar aos humanos uma conexão mais forte com as Leis também criaria humanos muito mais poderosos, que era o que o Céu mais elevado queria.
No entanto, também poderia ser visto de outra forma. Enfraquecer a conexão com as Leis para as bestas poderia dar aos humanos a vantagem necessária para triunfar sobre elas nos Reinos mais altos.
Quando só havia dois lados, era praticamente impossível encontrar o estado ‘normal’. Poderia ser que a conexão com as Leis das bestas fosse enfraquecida ou que a dos humanos fosse fortalecida. Gravis não sabia.
Após perceber que Gravis ficou em silêncio por um tempo, a Imperatriz sorriu de lado. Seus horizontes haviam se expandido, e, com essa expansão, ela agora era capaz de encontrar mais respostas para perguntas que nem mesmo tinha antes.
— Sua explicação me deu uma pista sólida para outro mistério do mundo — disse a Imperatriz, com um sorriso.
— Oh? — Gravis perguntou.
O Grande Ancião permaneceu em silêncio na maior parte do tempo, deixando a Imperatriz e Gravis conversarem, enquanto ele refletia sobre o mundo e o Céu. Nesse momento, ele estava questionando muitas coisas que nunca havia questionado antes.
A Imperatriz apontou para suas costas.
— Olhe além do meu trono, à distância. O que você vê? — ela perguntou.
Gravis não sabia ao que ela se referia, mas obedeceu mesmo assim.
— Vejo o seu Império — disse Gravis. — Vejo algumas bestas descansando, alguns recursos e algumas plantas, mas ainda não entendo o que você quer que eu veja.
A Imperatriz riu um pouco e balançou a cabeça.
— Eu disse para você olhar, não usar esse seu chamado Espírito.
Gravis obviamente tinha usado apenas seu Espírito para olhar atrás dela. Seus olhos não conseguiriam enxergar além do alcance de seu Sentido Espiritual, a menos que algo realmente gigantesco estivesse muito ao longe.
Gravis andou para trás do trono e olhou além dele. Nada havia realmente mudado. Ele viu as mesmas coisas.
— Não entendo — disse ele, após um tempo.
— Você vê aquelas bestas que parecem herbívoros? — perguntou a Imperatriz.
Gravis de fato as viu. Elas pareciam um tipo de vaca verde e marrom, sem chifres. — Sim, estou vendo. E daí? — perguntou Gravis.
— Tente inspecioná-los com seu Espírito — disse a Imperatriz, com um sorriso de lado.
Enquanto isso, os olhos do Grande Ancião se arregalaram ao perceber o que a Imperatriz acabara de descobrir. Quanto mais pensava sobre isso, mais fazia sentido. Ninguém jamais havia questionado a existência dessas bestas. Afinal, elas simplesmente existiam como qualquer outra besta. O que as diferenciava das demais?
Gravis direcionou seu Sentido Espiritual para os herbívoros, mas seus olhos se arregalaram ao perceber algo assustador.
Seu Sentido Espiritual não conseguia alcançar os herbívoros. Como isso era possível!? Seu alcance era de mais de 150 quilômetros!
A Imperatriz viu a expressão de Gravis e deu uma risadinha. Nas últimas horas, ela e o Grande Ancião haviam mostrado esse mesmo olhar, mas agora, era a vez de Gravis.
— Esses são os Errantes, Gravis — disse a Imperatriz. — Eles são visíveis de praticamente qualquer ponto com um Império. Eles residem no centro absoluto de todo o mundo, o lugar onde apenas os Imperadores mais poderosos podem viver.
A mente de Gravis estava a mil.
— Mas você é apenas a líder de um Império de nível três — disse Gravis, chocado.
Normalmente, tal comentário seria visto como desrespeitoso, mas a Imperatriz entendeu que Gravis não quis dizer dessa forma.
— Exatamente — respondeu ela, com um sorriso. — Esses Errantes estão a mais de 100 mil quilômetros de distância daqui. Se você olhar bem de perto para os pés deles, perceberá que eles estão sobre algo branco e fofo. Essa é a camada de nuvens. Eles não estão realmente sobre ela, mas parece que estão, apenas por serem tão grandes.
Gravis ainda não conseguia compreender completamente o que acabara de testemunhar. Ele já havia visto esses herbívoros algumas vezes, mas nunca prestou atenção neles. Para ele, pareciam apenas algumas vacas distantes. No entanto, ele não sabia o quão distantes realmente estavam!
Gravis olhou para a camada de nuvens e percebeu que ela estava cerca de 20 quilômetros acima do chão. Se isso fosse verdade na localização deles, essas bestas deviam ser incrivelmente massivas! Gravis fez alguns cálculos rápidos e percebeu que cada Errante tinha mais de 20 mil quilômetros de altura! Isso parecia incompreensível para Gravis. E, além disso, havia dez deles!
— Cada Errante tem um poder acima da média em comparação com um Imperador de nível cinco — explicou a Imperatriz.
Quando Gravis ouviu isso, finalmente entendeu por que esses Errantes existiam.