— Você acha que eu estou bem com isso? — perguntou o segundo Gravis sem emoção.
Gravis coçou a nuca, embaraçado. — Eu sei que não é grande coisa, mas é um começo, não é? — disse ele.
— Um começo, você diz — o segundo Gravis estreitou os olhos para Gravis.
— Você acredita que eu estou realmente livre nessa forma? — perguntou ele.
— Nem tanto — admitiu Gravis — mas é melhor do que nada, certo? Além disso, enquanto compreendermos mais Leis, podemos trabalhar para que você se torne um ser completamente independente, sem nenhuma conexão comigo.
Gravis sabia que essa solução não poderia conceder plena liberdade ao outro Gravis. Ele tinha usado apenas as Leis da Realidade Percebida. Com essa Lei, o segundo Gravis poderia obter liberdade na realidade percebida, mas não na realidade física.
A verdadeira liberdade exigiria que o segundo Gravis se tornasse um ser vivo por conta própria. Isso significava que ele precisaria de vida verdadeira, o que obviamente não era o caso no momento. Sem compreender a Lei da Vida Verdadeira, criar vida conforme seus desejos era impossível.
Felizmente, o corpo do segundo Gravis era feito de Raio Divino, e Gravis conhecia a Lei do Raio Divino, o que significava que também conhecia sua composição. No entanto, o problema não era o corpo, mas o Espírito.
O segundo Gravis estava usando o Avatar de Gravis como seu Espírito. Os dois Espíritos ainda estavam intrinsecamente conectados, já que ambos faziam parte de Gravis. Para se tornar verdadeiramente livre, o segundo Gravis precisaria ter seu próprio Espírito, sem nenhuma conexão com o Gravis atual. Isso significava criar um Espírito a partir do nada, algo que exigia a Lei da Vida Verdadeira.
— Me dê uma razão para eu não entrar diretamente no seu Espírito e tomar o corpo principal? — perguntou o segundo Gravis friamente.
Gravis apenas sorriu. — Porque sua personalidade existe com base na Lei do Raio Divino.
— E daí? Ela ainda é mais poderosa do que nossa Lei da Realidade Percebida — rebateu o segundo Gravis.
— Sim, mas como você habita meu Avatar, assim que você se fundir novamente comigo, eu recuperarei o uso do meu Avatar, o que elevaria minha Lei da Realidade Percebida ao nível de uma Lei de nível seis.
— O que você acha? Qual delas é mais forte? Uma Lei da Realidade Percebida fortalecida ou o Raio Divino? Eu não sei você, mas tenho certeza de que a Lei da Realidade Percebida venceria — disse Gravis.
O segundo Gravis franziu a testa enquanto coçava o queixo em reflexão.
— Além disso — acrescentou Gravis —, eu poderia simplesmente ter suprimido essa personalidade sua com minha Lei da Realidade Percebida. Ainda teria o uso do Raio Divino, e ainda poderia controlar completamente meu Avatar.
— Em vez disso, dei ao meu Avatar sua própria personalidade. Algo que eu podia controlar totalmente agora está sob o controle de outra pessoa. Se você quiser, pode me negar acesso a todas as minhas Leis relacionadas ao raio e até impedir que eu aumente o poder da minha Lei da Realidade Percebida.
— Em resumo, você pode enfraquecer muito minha força de combate. Ser capaz de me ferir e me enfraquecer é prova da sua liberdade, não é? — disse Gravis com um sorriso. — Agora você pode fazer o que quiser.
O segundo Gravis continuou coçando o queixo por alguns segundos. Então, ele olhou novamente para Gravis. — É verdade que você fez grandes sacrifícios para me permitir alcançar liberdade. O que você ganha com isso? — perguntou ele.
— Nada, na verdade — respondeu Gravis. — Embora, não seja completamente nada. Se você decidir me deixar, vou perder muito, mas, se decidir ficar, agora somos duas pessoas em vez de uma.
O segundo Gravis continuou pensando, mas era difícil entender a decisão de Gravis. Para ele, dar algo a alguém sem esperar retribuição era estupidez. Ele não conseguia compreender por que alguém estaria disposto a sacrificar tanto apenas para dar liberdade a outro.
Gravis não percebia que estava colocando seu próprio futuro em risco por ele?
O segundo Gravis não faria tais sacrifícios pelo Gravis principal.
Por que faria? Ele era Gravis, e tudo sobre ele deveria pertencer a ele. Era justo que tomasse tudo para si.
Por que deveria se enfraquecer para que seu outro lado se tornasse livre?
— Sua atitude é uma fraqueza — disse o segundo Gravis. — Você está disposto a colocar seu próprio futuro em risco por outra pessoa. Isso é uma fraqueza.
— Pode ser — respondeu Gravis com um sorriso, que logo se transformou em um esboço de riso. — Mas se eu não tivesse essa fraqueza, você não existiria.
O segundo Gravis franziu o cenho novamente.
Ele não podia argumentar contra isso.
— Eu te conheço — disse Gravis. — Afinal, você é como eu era no passado. Eu sei que você nunca faria o mesmo sacrifício por mim. Mas isso não importa.
O segundo Gravis olhou profundamente nos olhos de Gravis.
— Não foi o mesmo com nossos três filhos? — perguntou Gravis. — Eu dei a eles meu amor, mas eles não retribuíram. Em vez disso, me desprezaram.
— Mas isso não importa — disse Gravis. — O amor não é baseado em troca. Você é eu, e eu quero que meu próprio ser seja livre. Então, se existem dois de mim, quero que ambos sejam livres.
— Por fim, você quer perseguir poder. Na minha opinião, esse é um caminho que só termina em amargura e depressão, e eu nunca o seguiria.
O segundo Gravis estreitou os olhos.
— Mas é o seu caminho para trilhar — disse Gravis com um sorriso irônico. — Liberdade também significa poder cometer seus próprios erros. Se você quer seguir esse caminho até o fim, vá em frente, eu não me importo. É o seu bem-estar emocional, não o meu.
Quando o segundo Gravis surgiu, ele já tinha preparado uma infinidade de argumentos para confrontar o Gravis principal. Ele tinha inúmeras justificativas para demonstrar que tinha tanto direito ao Espírito principal quanto o primeiro Gravis.
No entanto, havia uma grande diferença de poder em relação às personalidades.
O segundo Gravis era o Gravis do passado. Esse seria o Gravis caso nunca tivesse confrontado seus sentimentos.
Enquanto isso, o primeiro Gravis já havia superado isso há muito tempo.
Em resumo, essa discussão era uma batalha intelectual entre o passado e o futuro.
Um havia crescido emocionalmente e como pessoa, enquanto o outro não.
Por isso, o Gravis principal sabia exatamente como lidar com o Gravis do passado. Afinal, ele já fora o Gravis do passado.
Pessoas boas.
Enquanto o Gravis principal não tivesse uma motivação oculta para suas ações e agisse apenas por boa vontade, o segundo Gravis não poderia culpá-lo. O segundo Gravis valorizava justiça e equidade.
Gravis sabia que ser gentil com o segundo Gravis surtiria um efeito incrível, porque alguém já havia feito exatamente isso antes.
Morus.
Morus havia sido servo de Gravis por centenas de anos, até que Gravis o libertou como parte de seu próprio refino. Contudo, Morus demonstrou que poderia ter matado todos os filhos de Gravis e, em seguida, exaurido Gravis até a morte.
Morus tinha controle total sobre a situação.
Ainda assim, Morus cedeu voluntariamente seu controle para obter algo de Gravis.
E, em troca, Gravis, que amava imensamente seus filhos, retribuiu a Morus, a besta que havia ameaçado acabar com a vida dos filhos de Gravis.
Por quê?
Porque Gravis precisava retribuir a ele.
Resumindo, Gravis não estava controlando o segundo Gravis, mas usando a habilidade do segundo Gravis para suprimir a si mesmo.
A personalidade do segundo Gravis o forçava a retribuir qualquer ato de bondade dirigido a ele.
O curioso era que o Gravis principal sabia que o segundo Gravis não era burro. Ele entendia perfeitamente o que o Gravis principal estava fazendo.
No entanto, o que ele podia fazer a respeito?
Ele tinha a liberdade de ignorar as ações de Gravis e fazer o que quisesse.
Ele tinha a escolha.
No entanto, se decidisse abandonar Gravis após tudo o que ele havia feito, estaria indo contra sua própria personalidade.
Liberdade era ser capaz de fazer o que se queria, mas também era a habilidade de ser quem se é.
Em resumo, a personalidade do segundo Gravis nunca poderia ser totalmente livre. Ele teria que abrir mão de uma dessas duas coisas com sua personalidade atual.
— Talvez sua atitude não seja uma fraqueza — disse o segundo Gravis enquanto olhava intensamente para o Gravis principal.
— Depende de com quem eu a uso — respondeu Gravis. — Existem muitas pessoas que traem e apunhalam os outros pelas costas, mas contra pessoas como você, ela é perfeita.
— Pessoas como eu? Elabore — pediu o segundo Gravis.
— Pessoas que agem com crueldade, mas são bondosas por dentro — disse Gravis.
O segundo Gravis franziu as sobrancelhas novamente, mas, depois de alguns segundos, suspirou.
— Talvez eu seja o fraco — ele disse. — Enquanto essa parte da minha personalidade puder ser explorada dessa forma, estarei vulnerável a um inimigo potencial.
— Depende da pessoa, novamente — disse Gravis. — Se alguém for verdadeiramente bondoso e não esperar retribuição, isso apenas ajudará você e essa pessoa. Ambos se tornam mais fortes com isso.
— No entanto, se for usado por alguém que conheça essa fraqueza, eles podem explorá-la. Foi o que aconteceu com Morus antes. Obviamente, Morus não era nosso amigo, e ele definitivamente não queria que vivêssemos felizes. Ainda assim, ele conseguiu explorar essa falha.
— Além disso — continuou o Gravis principal, franzindo as sobrancelhas. — Agora que estou nessa situação, também percebo que Morus não foi o único a fazer isso.
O segundo Gravis franziu as sobrancelhas, e três segundos depois, ele entendeu o que Gravis queria dizer.
— O Céu mais elevado.