Quando fizemos nosso caminho para a porta da frente da Guilda dos Aventureiros na manhã seguinte, um homem-lagarto imediatamente se aproximou de mim.
— Ah, oi. Já cuidei da atualização de nosso rank.
Por um momento, não fiz ideia de quem o cara deveria ser, mas então notei a mulher de olhos insectóides ao lado dele e percebi que eram os mesmos sujeitos do dia anterior. Seus nomes eram… uh, Jalil? E Vizquel, não?
Em minha defesa, era difícil distinguir um rosto do outro por aqui. Havia uma tonelada de gente-lagarto nesta cidade, e não ajudava o fato de esses dois estarem usando armaduras de couro em vez das roupas civis que usaram no dia anterior. Eles pareciam pessoas totalmente diferentes quando se vestiam como aventureiros comuns em vez de cidadãos comuns.
— Bom dia, Jalil. Muito obrigado por cuidar disso.
— Q-que tom educado é esse? Você está me dando medo…
— Só estou falando com respeito. Isso é um problema?
— N-não, não…
Quando olhei para ele, Jalil rapidamente desviou os olhos.
— É bom ver você também, Vizquel. Estou ansioso para trabalhar com vocês.
— Uh… certo. — Ela estava olhando amedrontada para Ruijerd. Para ser justo, ele também estava lançando olhares afiados para os dois. Ah, bem.
— Bem, e então, podemos entrar?
— S-sim. Claro — disse Jalil com um aceno nervoso.
No momento em que pisamos dentro da guilda, um certo homem cavalo nos avistou e caminhou até nós.
— Vocês aí!
— Oi…
Esse cara de novo…? Sério, como ele conseguia dinheiro?
— Ahah, o que é isso? Você está com o Caçador M hoje, hein?
— E-ei, Nokopara. Quanto tempo.
Aparentemente, o Cara de Cavalo e nosso novo amigo homem-lagarto eram conhecidos.
— Sim, muito tempo sem nos vermos, Jalil. Ouvi falar que vocês foram para o rank C! Tem certeza de que é uma boa ideia? Você não será mais capaz de trabalhar nesses empregos de busca por mascotes, sabe?
Parando por um momento, Nokopara olhou de Jalil para mim e vice-versa, então acenou com a cabeça enquanto relinchava.
— Agooooora eu entendi. Não é de admirar que você tenha cuidado daquela coisa de animal perdido ontem, garoto! Convenceu o Caçador M a te ajudar, né?
“Caçador M” era provavelmente o nome do grupo de Jalil. Soava até bem.
— Sim, exatamente! — falei. — Os encontramos enquanto procurávamos aquele gato e eles se ofereceram para nos instruir!
— Ahah. Então o pequeno e tímido Jalil encontrou alguns aprendizes? E um deles é até um Superd falso! Guhuhuh…
O Cara de Cavalo ficou muito feliz em aceitar minha mentira de baixa qualidade. Ele mal interpretou a situação de uma forma bem conveniente para todos nós. Depois de rir consigo mesmo por um tempo, se inclinou para olhar para o lado de Jalil.
— Ei, o Roman não está com vocês hoje. Sabe onde ele está?
— S-sim… Roman, uh… morreu.
— Ah, entendi. É uma pena.
Roman era provavelmente o nome do homem que Ruijerd matou. Nokopara não pareceu especialmente abalado com a notícia. Talvez a morte de uma pessoa não fosse grande coisa nesse ramo de trabalho. Fui o único que levou aquilo tão a sério? Jalil e Vizquel também pareciam relativamente indiferentes em relação a tudo isso.
— Ainda assim, se vocês perderam o Roman, por que decidiram melhorar seu rank logo agora? Aquele cara era o melhor lutador do seu grupo, não era?
—B-bem, eu… — Jalil me lançou um olhar nervoso. Vendo isso, Nokopara soltou outro relincho de compreensão.
— Ah, sim, já entendi tudo. Nem precisa responder. Claro que você gostaria de parecer um figurão na frente de seus novos aprendizes!
Era quase impressionante como ele havia decidido as coisas por si mesmo. Com alguns tapas amigáveis nas costas de Jalil, Nokopara finalmente se virou e voltou para as mesas. Pude até mesmo escutar o ligeiro suspiro de alívio que o homem-lagarto deixou escapar.
Sério, qual era o problema daquele cara? Ele continuava constantemente pegando no nosso pé. Será que tinha uma queda por mim ou algo do tipo? Nah… se fosse algo assim, parecia passar mais tempo olhando para Ruijerd. Será que gostava de homens rudes com cicatrizes na cara?
De alguma forma, duvidei disso.
— Tudo bem então. Pessoal, por que não damos uma olhada no quadro de tarefas?
À medida que avançamos na guilda, algumas pessoas nos lançaram olhares peculiares. Por enquanto, seria melhor fingirmos não notar. Como nós três éramos agora aparentemente “aprendizes”, fiz questão de fazer algumas perguntas a Jalil e Vizquel enquanto examinávamos os empregos na faixa de rank D a B.
— Gente, existe alguma diferença entre as tarefas de “colheita” e “coleta”?
— Hã? U-uh, claro. Eles chamam de colheita quando você está colhendo plantas. As coletas são principalmente para coisas de monstros, acho…
A resposta de nosso novo mentor foi um pouco vaga, mas pareceu mais ou menos precisa. A maioria dos trabalhos de colheita parecia envolver a procura por ervas medicinais e tal… enquanto a coleta era mais um recurso para outros tipos de “buscas”.
— Ah, claro. Ruijerd?
— O quê?
— Sinto muito, mas acho que precisamos nos concentrar em ganhar dinheiro e melhorar nosso rank por um tempo.
— Por que está me pedindo desculpas…?
— Porque estamos colocando aquele outro assunto em segundo plano.
Eu disse a Jalil e Vizquel para espalharem a palavra sobre o Fim da Linha. Mas não esperava muito deles. Por um tempo considerei microgerenciá-los para ter certeza de que estariam ajudando as pessoas com um sorriso, mas, para ser realista, parecia mais inteligente ficar meio distante. Enquanto mantivéssemos distância dos dois, poderíamos nos livrar da dupla caso fosse necessário. Mesmo se suas atividades criminosas fossem expostas, e mesmo se tentassem empurrar a culpa para o Fim da Linha, os outros apenas ririam – afinal, eles tinham um rank bem superior ao nosso, e todos já sabiam que Ruijerd era um “falsário”.
— Está tudo bem, Rudeus. Eu entendo.
Como Ruijerd não estava levantando nenhuma objeção, comecei a escolher alguns serviços enquanto consultava Jalil.
Depois de trocar algumas palavras de saudação com os guardas do portão, nós três saímos da cidade.
Nas proximidades de Rikarisu, parecia que Coiotes Pax, Lobos Ácidos, Grandes Tartarugas e Tartarugas de Pedra Gigante eram as melhores apostas quando se tratando de caçar monstros. Coiotes Pax eram caçados principalmente por causa de suas peles; Lobos Ácidos por suas presas e caudas; Grandes Tartarugas eram como pilhas de carne andantes; e seria possível encontrar pedras mágicas dentro das Tartarugas de Pedra Gigante. Decidimos ignorar as Grandes Tartarugas desta vez, principalmente porque sua carne era absurdamente pesada.
As Tartarugas de Pedra Gigante eram nosso alvo principal. As pedras mágicas encontradas nelas eram pequenas, mas valiosas, o que permitia algumas caças muito lucrativas. O único problema era que esses eram monstros muito raros nesta localidade, e não se conseguia encontrar nenhuma muito perto de lugares onde as pessoas viviam.
Então acabamos aceitando um pedido por peles de Coiote Pax, que estava fixado ao quadro da guilda. Levando tudo em consideração, pareciam a nossa melhor aposta, já que apareciam em grupos de tamanhos decentes que permitiam conseguir um bom lucro em uma única batalha.
Claro, isso só tornava as coisas um pouco mais eficientes, já que tínhamos que rastreá-los e esfolá-los… então, se encontrássemos algum Lobo Ácido pelo caminho, eu planejava também cuidar dele. Não tínhamos assumido nenhum trabalho para coletar seus materiais, mas com as missões de coleta, seria possível cuidar da parte de coleta antes mesmo de aceitar um serviço. Assim que tivesse matéria-prima suficiente, poderia assumir a tarefa e levar tudo direto ao balcão de compras da guilda.
Em qualquer caso… os Coiotes Pax eram o nosso foco principal, pelo menos por enquanto. Normalmente eles seriam encontrados em grupo de, no máximo, dez. Dado o tempo que levaria para rastreá-los e esfolá-los depois, inicialmente assumi que não seríamos capazes de matar muitos em um único dia.
Depois de caçar e esfolar nosso primeiro grupo, porém, Ruijerd começou a reunir seus corpos em uma pilha. A princípio, não entendi o que ele estava fazendo.
— Você pode espalhar o cheiro usando magia do vento, Rudeus?
Ah. Agora isso faz sentido. Íamos usar o cheiro de seu sangue para atrair outros monstros para o mesmo local. Comecei a espalhar o ar em várias direções, anunciando para toda a área circundante que tínhamos uma pilha de carne fresca.
— Tartarugas Gigantes de Pedra não podem ser atraídas dessa maneira, mas devemos atrair pelo menos todos os Coiotes Pax das proximidades.
Aconteceu exatamente como Ruijerd disse que aconteceria. No final daquele dia, tínhamos matado mais de cem Coiotes Pax – o suficiente para que eu me perguntasse se não tínhamos os erradicado da área.
Foi um empreendimento muito agitado. Ruijerd e Eris massacraram onda após onda de monstros por horas e horas. E eu me agachei atrás deles, trabalhando febrilmente para tirar a pele das malditas coisas.
Foi um trabalho exaustivo e repetitivo. Mais ou menos após a trigésima pele, meus braços ficaram pesados, meus ombros começaram a doer e o cheiro de sangue tornou-se totalmente nauseante. Me entretendo com fantasias de monstros que instantaneamente se transformavam em ouro quando seus PV chegavam a zero, consegui lutar por algum tempo, mas tive que desistir depois de aproximadamente setenta peles.
E então troquei de lugar com Eris.
Ficar matando os Coiotes Pax ao usar magia se provou muito menos agonizante do que os esfolar. Por algum tempo, cuidei de um de cada vez, lentamente ajustando o poder dos meus feitiços para evitar que estourassem ou danificassem muito as suas peles. Esse com certeza era um trabalho que fazia mais o meu tipo. Para começar, isso envolvia o uso de algum raciocínio lógico.
Mas quando eu estava começando a me divertir, Eris jogou a toalha – tendo conseguido cuidar de, talvez, trinta peles. Evidentemente, ela era ainda menos adequada para o trabalho manual do que eu.
Presumi que Ruijerd assumiria a função de esfola, mas nesse ponto já tínhamos peles demais – a pilha estava ficando difícil de manejar. Começamos a cuidar das coisas para começar a carregar tudo de volta para a cidade, e esse trabalho exigiria várias viagens.
— Espere. — Interrompeu Ruijerd. — Antes disso, devemos queimar os cadáveres.
— Você quer queimá-los? Não é melhor assá-los ou algo assim?
— A carne de um Coiote Pax é realmente nojenta. Vamos apenas colocar fogo neles e enterrá-los.
Quando se deixa uma pilha de cadáveres jogada por aí, eles servem como fonte de alimento para outros monstros, encorajando-os a se multiplicar. Simplesmente atear fogo neles não seria o suficiente para convencer os monstros a não os comer; e se apenas os enterrássemos, aparentemente retornariam como “Coiotes Zumbis”. Consequentemente, seria necessário queimar as coisas e depois enterrá-las.
Um lindo e prático plano surgiu na minha cabeça na mesma hora:
- Matar Coiotes Pax. Pegar as peles.
- Enterrar os corpos, criando toneladas de Coiotes Zumbis.
- Aguardar até que um trabalho de caça a Coiotes Zumbis fosse postado na guilda.
- Lucro!
Infelizmente, Ruijerd rejeitou a sugestão. Parecia que permitir a multiplicação proposital de monstros era um grande tabu nessas regiões.
Gostaria que eles anotassem essas pequenas regras locais em algum lugar, sério…
— Mas não fizemos isso com os monstros que matamos em nossa viagem até aqui, não é?
— Não é necessário quando você mata apenas alguns.
Parecia uma regra terrivelmente vaga. Ainda assim, uma pilha tão maciça de corpos em decomposição parecia que também poderia ser problemática de uma perspectiva de saúde pública. Como não consegui encontrar nenhum fundamento real para apresentar uma objeção, comecei a queimar os corpos até ficarem torrados.
Quando terminamos de preparar nosso carregamento de peles que levaríamos de volta para a cidade, o sol já estava se pondo. Nossa primeira caçada finalmente acabou. E foi uma muito produtiva. Eu estava preparado para voltar direto para a pousada e tirar uma soneca.
Eu realmente estaria lá fora, esfolando dezenas dessas coisas, de novo, no dia seguinte? Meio que senti que merecíamos um dia de folga…
— Nós realmente lucramos muito hoje, hein? Amanhã vamos fazer ainda melhor!
Mas diante do entusiasmo de Eris, não consegui discordar.
Apenas três dias depois, o “Fim da Linha” chegou formalmente ao rank E.
— Bom trabalho. — Com algumas palavras de agradecimento, entreguei a Jalil um décimo do dinheiro que ganhamos na caçada daquele dia.
— O-obrigado, cara.
Dez por cento foi o que combinamos, mas… não parecia tanto dinheiro. Quando perguntei a Jalil se eles realmente estavam bem com isso, ele explicou que não era apenas um aventureiro – também administrava um negócio na cidade.
— Que tipo de negócio?
— Uh, uma loja de animais.
Ah, nossa. Então, primeiro você os vende e depois os rouba? Nossa cara, isso é meio sem noção.
— Não faça nada muito errado, entendeu?
— É, eu sei.
O negócio da loja de animais aparentemente era, de qualquer forma, legítimo. Eles pegavam animais errantes pela cidade, os davam algum tipo de treinamento e depois os venderiam como animais de estimação. Jalil era um membro da raça Rugoniana, um povo conhecido por sua experiência em domar feras. Com a ajuda de técnicas passadas de geração em geração, ele poderia supostamente “domesticar” qualquer coisa, desde um vira-lata perdido até uma orgulhosa mulher guerreira do povo-fera.
Pela graça da deusa, mas que tribo perversa.
Ainda bem que Eris e Ruijerd estavam comigo, ou eu poderia ter acabado rastejando a seus pés e pedido por dicas.
Deixando tudo isso de lado, esse pet shop parecia ser uma operação lucrativa – com uma vantagem para a cidade como um todo, já que estava tirando animais potencialmente perigosos das ruas.
— Então, uh. Por que você começou a sequestrar animais, se já tinha uma linha de trabalho legítima?
— No início, estávamos apenas pegando os que se perderam, mas… acho que perdemos as estribeiras.
Claro. Uma vez que enfiaram a ideia na cabeça, deve ter se tornado algo muito tentador. E uma vez que cederam à tentação, tudo foi de mal a pior.
— De qualquer forma, não é difícil administrar uma loja e ao mesmo tempo trabalhar como aventureiro?
— Nah, na verdade não. Temos estoque suficiente de animais para continuar por um bom tempo.
Aparentemente, eles só mantinham a loja aberta até o início da tarde, e então passavam a trabalhar nas tarefas da guilda pelo resto do dia.
— Bem, de qualquer forma, acho que isso não é da minha conta. Contanto que você continue concluindo os trabalhos.
— Não se preocupe, chefe – somos aventureiros de pleno direito. E também estamos nos certificando de espalhar a palavra sobre o Fim de Linha.
Hmm. Se é o que você diz…
A essa altura já tinhamos conseguido um pouco de dinheiro, então parecia que estava na hora de comprar roupas novas e armaduras de combate.
Em primeiro lugar, pegamos algumas roupas de um vendedor ambulante.
Eris não demorou muito para se decidir. Ela só queria algo resistente, mas leve e fácil de usar, critérios que a levaram a um par de calças nada estiloso.
Pareceu uma escolha sensata, especialmente dadas as nossas circunstâncias atuais, mas eu senti que não faria mal ter também ao menos uma opção “feminina”. Quando apontei para um vestido de uma peça, rosa e com babados, que tinha visto em um canto da loja, ela fez uma careta de nojo.
— Você realmente quer que eu use algo assim…?
— Não custa nada ter pelo menos um vestido feminino, certo?
— Ah, é? Então que tal comprar algo mais másculo para você, hein, Rudeus?
Ela empurrou um colete de pele para mim. Parecia algo que um bandido da montanha poderia usar.
Hmm. Então, se eu colocasse essa coisa, Eris usaria um vestido com babados?
Por um momento não pareceu um mau negócio, mas então imaginei nós dois parados um ao lado do outro em nossas novas roupas e imediatamente desisti da ideia.
Assim que terminamos de comprar as roupas, fomos para uma loja de armaduras local.
Eris ainda não tinha sofrido nenhum ferimento sério em combate, e eu poderia usar magia de Cura para tratar qualquer ferimento menor, então eu tinha a impressão de que ela realmente não precisava de uma armadura. Mas, quando Ruijerd me disse: “Seus feitiços não podem curar feridas fatais ou restaurar um membro perdido, e Eris ainda não está acostumada à batalha. Complacência e descuido podem custar a vida de jovens guerreiros.” Não pareceu que seria uma boa ideia deixar ela sem qualquer equipamento defensivo.
A loja de armaduras era um estabelecimento grande e impressionante, embora ainda um pouco mais rudimentar do que as lojas que eu tinha visto em Asura. As mercadorias expostas lá dentro eram universalmente mais caras do que as coisas que poderia comprar dos vendedores ambulantes da cidade. As barracas e carrinhos eram a melhor aposta para itens mais baratos e, às vezes, se descobriria uma joia escondida entre as pilhas de lixo, mas lojas como essa ofereciam qualidade confiável e uma variedade maior. Eles também tinham uma grande variedade de tamanhos… o que era muito bom, visto que éramos duas crianças.
— Proteger seu coração é muito importante, então acho que devemos comprar o melhor que pudermos…
No momento, estávamos escolhendo um peitoral para Eris. Havia uma grande variedade deles, principalmente para guerreiras, projetados para caber em pessoas com diferentes tamanhos de busto.
— Esse me parece bom — disse Eris, puxando um modelo de pele de fera que se encaixava perfeitamente nela. — O que você acha, Rudeus?
Bem, se ela estava pedindo, eu ia dar uma olhada. Hmm… Nada mal.
— Você provavelmente deveria escolher um que seja de um tamanho maior.
— Por quê?
Vamos lá, pense nisso.
— Ainda somos crianças em fase de crescimento. Qualquer coisa que se encaixe perfeitamente em você agora ficará muito pequena bem rápido. — Peguei um peitoral semelhante em um tamanho um pouco maior e entreguei a Eris.
— Esse fica todo frouxo…
— Nah, você está ótima. Não se preocupe com isso.
Murmurando reclamações, Eris começou a escolher outras partes de armadura para todos os cantos de seu corpo. Todas as lutas que estivemos travando ultimamente a deram uma noção de onde ela era mais vulnerável a lesões. Não foi difícil encontrar equipamentos para proteger suas articulações e órgãos vitais.
Entretanto, sua cabeça representava um dilema. Um elmo excessivamente pesado só iria atrapalhar. Mesmo assim, não queríamos deixar uma parte tão importante de seu corpo totalmente desprotegida.
— Que tal algo como isso? — perguntei, apresentando a ela um elmo que me lembrava um dos malvados irmãos Hokuto.
— Sem chance — respondeu, fazendo careta.
Essas crianças de hoje em dia. Não conseguem nem apreciar os clássicos.
Continuamos tentando todos os tipos de elmos diferentes, mas Eris rejeitou cada um deles por causa do peso, da feiura, do cheiro ou por dificultar sua visão. No final das contas, decidiu usar uma espécie de bandana; tinha placas de ferro costuradas para oferecer alguma proteção.
Claro, o capuz que havíamos comprado antes servia apenas para esconder seu atraente cabelo ruivo. De uma perspectiva defensiva, era inútil.
— Acho que isso é tudo. O que você acha, Rudeus? Pareço uma aventureira?!
Com a espada semelhante a um cutelo que Rowin nos deu presa em seu quadril, Eris girou para mostrar seu novo conjunto de armadura leve. Para ser totalmente honesto, meio que parecia com um cosplay… especialmente porque o peitoral não era do tamanho certo.
— Esplêndido, senhorita. Simplesmente esplêndido. Você é a própria imagem de uma guerreira experiente.
— Você acha? Hehehe…
Eris colocou as mãos nos quadris e olhou para si mesma com um sorriso satisfeito. Enquanto ela saboreava o momento, pechinchei o custo de seu equipamento para ficar por apenas uma moeda de ferro. De qualquer forma, não foi nenhuma comprinha, estávamos obtendo um conjunto de armadura completo.
— Certo, Rudeus! Você é o próximo!
— Eu realmente acho que não preciso de nada, sabe?
— Claro que precisa! Você é um mago, então devia ter um robe!
Tive a impressão de que Eris tinha uma certa predileção pelas histórias em que um jovem guerreiro heróico partia em uma aventura ao lado de seu amigo de infância, que era capaz de usar magia. Havia noites em que a garota mal conseguia dormir, mas ela certamente era corajosa durante o dia.
Ah, bom. Acho que não faz mal.
— Ei, senhor. Você tem algum robe que caberia em mim?
O velho proprietário da loja de armaduras se aproximou silenciosamente e abriu um de seus guarda-roupas.
— Aqui. Foram todos feitos para hobbits.
Dentro, havia uma grande variedade de mantos coloridos, todos com designs ligeiramente diferentes. Pareciam ter em cinco tons: vermelho, amarelo, azul, verde e cinza. Nenhum era lá muito vívido.
— A cor faz alguma diferença?
— Os coloridos foram tecidos com pêlo de monstros. Cada um oferece um pouco de proteção adicional contra cada tipo de elemento em específico.
— Certo, então vermelho seria fogo, e amarelo deve ser terra… Uh, o cinza protege do quê?
— É um tecido comum.
Ah. Não era à toa que custa basicamente metade do preço. O custo de cada uma das outras cores também variava um pouco. Isso provavelmente estava relacionado ao valor dos materiais usados para tecê-los.
— Então, acho que você precisa de um azul, Rudeus! — disse Eris.
— Hmm, imagino… — Em combate de curta distância, eu era propenso a usar rajadas explosivas para me enviar voando pelo ar. Será que vermelho ou verde não seria melhor? Hmm… pare ou siga?
— Que tipo de feitiço você usa, garoto?
— Posso usar todos os tipos de magias de ataque.
— Hmm. Bem, isso já é alguma coisa. E eu aqui pensando que você era só uma criança… Certo. Este pode até ser um pouco mais caro, mas…
Depois de procurar pelos robes por um momento, o velho puxou um que era de um tom de cinza notavelmente mais escuro.
— Este aqui é feito de couro legítimo de Rato Mackey.
— C-Camundongo… Mackey?
— Eu disse rato, garoto. Não camundongo.
A imagem de um sujeito amigável em shorts vermelho brilhante flutuou brevemente em minha mente; balancei minha cabeça com vigor até que ela desapareceu. O manto parecia mais um pano do que a pele de um animal, mas provavelmente era apenas a natureza do material.
— Então, que vantagens isso oferece?
— Não oferece nenhuma proteção especial contra magia, mas é duro como o inferno.
Eu coloquei, só para ver como cairia.
— Ficou um pouco folgado em mim. Não tem nenhum menor?
— Esse é o menor que eu tenho.
— Deve ter algum para crianças, não tem?
— Por que teria?
Agora eu sabia como aquele judoca deve ter se sentido quando tentou colocar um Traje Normal pela primeira vez. Ah, bom. Eu ainda era um menino em crescimento, então talvez isso servisse. A coisa ao menos parecia ser feita com material de qualidade… A julgar pela sensação, provavelmente forneceria alguma proteção contra armas perfurantes.
E também gostei do fato de ser feito da pele de um roedor de pele cinza. Combina bem com meu sobrenome1.
— Hmm, certo. Talvez eu fique com este.
— Você gostou disso, hein? São oito moedas de sucata.
— Bem, vejamos…
Depois de pechinchar com o velho para chegar ao melhor preço possível, acabei comprando o robe por seis moedas de sucata.
Enquanto estávamos nisso, também peguei outras duas bandanas iguais à de Eris, mas em cores diferentes. Eram para mim e para Ruijerd. Ele poderia a usar caso sentíssemos necessidade de esconder aquele olho em sua testa.
Mas por que eu precisava de uma?
Bem… não é divertido ser o diferentão, sabe?
Aliás, pedi para Ruijerd espionar Vizquel enquanto Eris e eu saíamos em nossa viagem de compras. Não esperava muito dela e de Jalil, mas dependendo de como se comportassem, havia a possibilidade de que nossa reputação pudesse ser seriamente prejudicada. Parecia ser prudente dar ao menos uma olhada.
Quando expliquei isso a Ruijerd, entretanto, o homem respondeu que eu nunca deveria ter juntado forças com eles, para começar, já que estava tão preocupado com o caráter dos dois. Era um ponto definitivamente justo. Mas, por outro lado, nosso acordo com eles rendeu alguns benefícios financeiros importantes. No momento, um pouco de paranóia parecia ser um preço bem pequeno a se pagar.
Para encurtar a história – nossos amigos raptores de mascotes estavam desempenhando seus deveres de maneira admirável. Eles abordaram até mesmo serviços de rank F com uma atitude positiva e diligência surpreendente.
Nesse dia, Vizquel tinha feito um trabalho de extermínio de insetos. Seu objetivo era erradicar uma infestação de criaturas repugnantes que ocupavam a cozinha de alguém. Ela era da raça Zumeba, cuja saliva era venenosa, mas também muito atrativa para todos os tipos de insetos. Qualquer inseto que a ingerisse morreria ou ficaria totalmente imóvel, dando à Zumeba um saboroso lanche.
Ou seja, a mulher nasceu para fazer esse tipo de trabalho.
A cliente era uma mulher idosa – aparentemente teimosa e irritadiça, que parecia nunca parar de franzir a testa. A impressão de Ruijerd era de que ela não hesitaria em afugentar qualquer um que a desagradasse o mínimo que fosse.
Mas, claro, não chegou a isso. Vizquel começou a trabalhar rapidamente e aniquilou os insetos com eficiência; após isso, Ruijerd confirmou que não restou nem mesmo um único inseto vivo na casa da velha. A insectóide até tapou algumas rachaduras com algum tipo de substância filamentosa, como medida preventiva contra invasões externas.
— Obrigada, Vizquel. Aquelas coisas estavam me deixando louca.
— Sem problemas. Se você precisar de alguma coisa, lembre-se do nome Ruijerd Fim da Linha, certo?
— Ruijerd Fim da Linha? Esse é o nome do seu novo grupo?
— É, mais ou menos isso.
Após anunciar nossa marca com muito zelo, Vizquel entregou à velha senhora alguns pedaços extras de isca feita de sua saliva e, em seguida, educadamente despediu-se dela. Com seu trabalho concluído, prontamente se encontrou conosco na guilda para cuidar da troca de recompensas.
— Parece que ela está fazendo um bom trabalho, hein?
— Sim…
Eu com certeza não esperava aquele nível de perfeição. Vizquel não só já conhecia a cliente, como também fora muito além do necessário no seu atendimento. Provavelmente deixou uma impressão muito melhor do que minha atitude improvisada de vendedor de porta em porta deixaria.
— Hmm. Acho que não são tão podres quanto pensamos, Ruijerd.
— Talvez não.
Para ser justo, eu também desconfiava um pouco deles, mas acho que não estávamos pedindo tanto assim. Eles estavam basicamente fazendo trabalhos comuns e mencionando o “Fim da Linha” quando terminavam. Se fizéssemos pensarem que cooperar conosco significava dinheiro fácil para eles, era melhor assim. Isso também os tornaria menos propensos a nos trair.
— No entanto, o fato é que cometeram muitas más ações.
— É, tem razão. Mas agora eles estão lá fora, trabalhando honestamente… assim como você, Ruijerd.
— Mm…
Ser um “criminoso” não significa que alguém fosse irredimível; isso se aplicava tanto a eles quanto a mim e Ruijerd. Eles terem parado de sequestrar animais de estimação também parecia ser um bom sinal, embora não tivéssemos exigido isso abertamente.
Dito isso, estávamos há apenas três dias nessa parceria. A memória de seu encontro com a morte ainda estava fresca em suas mentes.
— Claro, eles podem estar apenas fingindo. Então devemos continuar a checá-los assim sempre que alguma coisa mudar.
Ruijerd franziu a testa diante disso.
— Você juntou forças com essas pessoas. Mas não… confia nelas?
— Claro que não. Nesta cidade toda, só confio em você e Eris, Ruijerd.
— Entendi…
Ele começou a estender a mão para a minha cabeça, mas de repente parou.
Eu confiava em Ruijerd, mas parecia que estava começando a perder a sua confiança.
Mas eu poderia viver com isso. Meu objetivo era voltar para o Reino Asura com Eris. Faria o meu melhor para alavancar a reputação da raça Superd enquanto estivesse nisso, mas ganhar o respeito de Ruijerd não estava na minha lista de objetivos principais.
— Bem, então por que não voltamos?
Voltamos para nossa pousada por ruas iluminadas apenas por pedras iluminadoras.
Considerando todas as coisas, nossa carreira de aventureiros teve um começo tranquilo.
[1] Grey, de Greyrat é, em inglês, cinza.
HAHA
Acho q o Ruijerd tá fazendo muito cu doce.
Impressionante o prota tá preocupado com algo tão nada haver igau lamentar a reputação dessa raça
Talvez seja frívolo pra você seu cabaço, mas pro Rudeus é algo significativo.
Gael eu te odeio, insuportável.