Dentro da carruagem, Airen fechou os olhos. Apesar das vibrações constantes e da posição desconfortável, ele não se deixou abalar. Claro, seria melhor meditar em um local silencioso e em uma postura adequada, mas ele sabia que sua concentração não deveria ser afetada por um ambiente adverso. Logo, em sua mente, surgiu a gigantesca estaca de ferro.
“É impressionante.”
A estaca de ferro costumava ser um enorme pilar quando ele estava com os ferreiros. Mesmo em sua mente, onde tudo deveria acontecer de acordo com sua vontade, ele não conseguia mudar o aspecto bruto do metal. No entanto, algo havia mudado na base. Era como se um gigante flamejante tivesse segurado a estaca, deixando uma marca. A transformação ocorrida antes do duelo com Ignet ainda permanecia.
— Uff.
Airen soltou o ar e voltou a se concentrar. Então, algo mais surgiu em seu coração: uma chama. Era maior do que quando ouvira os conselhos de Khubaru, mas ainda minúscula em comparação com a de Ignet. Sentindo um misto de vergonha e aceitação, Airen pensou que, embora fosse pouco, o simples fato de haver algum progresso já era um motivo para ser grato.
Ele assentiu e dirigiu a chama para o corpo da estaca, concentrando-se ao máximo. Agora, era hora de persistir. Ele precisava manter o foco com toda a sua força para que a chama não enfraquecesse, sustentando-a pelo maior tempo possível. Airen continuou sem descanso até que toda a estaca de ferro assumisse um tom laranja, como o pôr do sol, aquecida pela chama.
Por sorte, ele conseguiu alcançar esse ponto graças ao crescimento do fogo. No passado, ele esgotava sua energia antes mesmo de conseguir aquecer a estaca. Mas isso não era tudo. A parte mais importante começava agora. Ele cerrou os dentes e visualizou outra coisa. Um bloco em sua mente começou a tomar forma, transformando-se em um martelo. Esse era o desejo do jovem espadachim de moldar a vontade gigante e densa do homem dos sonhos.
Airen segurou o martelo por um momento e, então, desferiu o golpe.
O som das marteladas rítmicas ecoou em seu coração. Não houve nenhuma mudança visível; a estaca parecia imutável. Mas ele sabia que era assim que deveria ser. Até mesmo os ferreiros martelavam milhares de vezes para moldar o metal na forma desejada.
Airen afastou as dúvidas e continuou martelando a estaca de ferro repetidamente. O suor escorria de sua testa até o queixo.
Depois de um período que parecia curto, mas também longo, a carruagem parou.
— Airen! Lulu! Está na hora do almoço… Hmm. Ainda estão meditando?
— Oh, já passou tanto tempo? — Airen despertou de sua meditação e perguntou. Seu corpo inteiro estava encharcado de suor. Khubaru o observou naquele estado.
— E aí? Algum resultado? — Khubaru perguntou.
— Ainda não, mas acho que logo virá.
— Certo, certo.
Khubaru assentiu com um sorriso. Embora estivesse preocupado, sentiu alívio. Encontrar Ignet havia acendido o fogo em Airen, mas ele já tinha visto muitos que se destruíram por não saberem como usar tal chama. Ainda assim, Khubaru achava que não precisava se preocupar com Airen nesse estado.
“É impressionante. Ele é jovem, mas muito centrado.”
Tão importante quanto ser apaixonado e competitivo era manter o controle. Tornar-se ganancioso por ansiedade poderia levar alguém a se queimar em sua própria chama, causando sofrimento e dúvidas. Mas Airen não parecia perdido, como um monge que meditava por décadas.
“Talvez seja por causa da estaca de ferro que ele tem desde o início.”
Khubaru observou Airen enquanto ele secava o suor. Ainda era difícil entender por que aquele jovem possuía uma energia mental tão significativa.
“Bom, ele me contará no tempo certo”, pensou Khubaru, antes de se virar.
— Lulu?
— Lulu, Lulu! — Khubaru chamou.
— Acho que não vai acordar — disse Airen.
— Hmph.
Lulu também estava com os olhos fechados, em uma posição peculiar. Sentada como um humano, com as patas dianteiras sobre o abdômen, parecia estar meditando.
— Todos os feiticeiros treinam assim? — perguntou Khubaru.
— Não. Cada um tem seu próprio jeito… Acho que Lulu descobriu que essa posição funciona melhor para ela — respondeu Airen.
— Entendi. Acho que devemos almoçar primeiro.
Deixaram Lulu na carruagem e começaram a preparar o almoço. A preparação foi breve. Airen colocou os ingredientes em uma panela, e Khubaru, com um movimento da mão, conjurou água, fogo e lenha para cozinhar rapidamente.
Logo, o ensopado ficou pronto. Estava delicioso, considerando a simplicidade, graças ao molho especial que Khubaru adicionou no final.
— Que molho é esse, afinal? — perguntou Airen.
— É um segredo comercial.
Airen encarou Khubaru, que o encarou de volta. Eles se encararam por um momento, então riram e focaram novamente em sua refeição.
Foi um almoço tranquilo, diferente das refeições com Lulu. Mas o silêncio não os incomodou. O tempo que passaram juntos e as conversas compartilhadas tornaram qualquer desconforto inexistente.
Entretanto, a paz não durou muito. Airen, ao terminar a refeição, invocou sua espada larga.
— Hah!
“Ele é… realmente incrível”, pensou Khubaru, espantado ao ver Airen treinando sua esgrima sempre que possível.
Ele já sabia que o jovem era diligente, mas ficou admirado ao vê-lo treinar sua mente pela manhã, suando intensamente, e depois partir para o treinamento físico logo após o almoço.
“Sua mente é de aço, assim como seu vigor.”
— Hmph.
Khubaru, após observar por um tempo, fechou os olhos. Ele se concentrou nos cinco elementos que permeiam o mundo. Apesar de não possuir a mesma paixão ardente e a força de vontade de aço de Airen, Khubaru também havia sido influenciado por Charlot, Victor e Ignet. Mesmo sendo preguiçoso por natureza, não poderia evitar treinar naquele ambiente. Ele assentiu, pronto para usar o poder misterioso dos elementalistas.
— Me dá comida.
— O que está fazendo? Me dá comida. Você disse que faria peixe assado especial para mim hoje.
Lulu despertou de sua meditação e interrompeu sua concentração. Khubaru abriu os olhos e viu a gata negra deitada à sua frente. Ela coçava a barriga de um jeito irritante, mas Khubaru decidiu cozinhar para ela, como havia prometido.
Assim, Khubaru, o oráculo medíocre, elementarista razoável e guia de viagem competente, voltou ao trabalho.
Um mês se passou. Já era outono, e as pessoas começaram a usar mais roupas durante o dia e à noite. Nesse tempo, o grupo de Airen estava quase chegando à cidade Lathion, uma das cidades do Reino de Myoss. O reino possuía a segunda história mais longa depois do Reino de Adan. Airen estava ansioso para chegar à cidade, lar de inúmeras academias de esgrima.
“Deve haver tantos espadachins lá.”
Antes de embarcar em sua jornada, Airen usava a espada apenas por sua família. Mas isso mudou. Sua família ainda era importante, e ele nunca os trocaria por nada, mas não pensava mais que sua vida se limitava a eles. As experiências e as pessoas que conheceu durante sua jornada o transformaram.
Por isso, ele estava tão ansioso. A cidade abrigava inúmeras academias de esgrima com histórias tão longas quanto a de Krono, onde muitos espadachins treinavam.
Quais seriam suas crenças e pensamentos? Como seria a espada que carregavam em seus corações? Ele descobriria em poucos dias. Airen se acalmou e voltou ao treinamento mental.
A estaca de ferro, o fogo e o martelo surgiram lentamente em sua mente. Infelizmente, ele ainda não tinha feito progresso no refinamento. Por mais que martelasse na estaca aquecida, ela se recusava a mudar de forma.
Mesmo assim, Airen conseguia se concentrar no treinamento mental, mesmo sem resultados imediatos. Isso não era apenas por causa de sua paciência, mas porque os frutos vinham de outro lugar: sua habilidade com a espada estava melhorando.
“Por que isso está acontecendo? Será que estou moldando a espada daquele homem ao meu próprio jeito?”
Essa era uma teoria plausível. A esgrima de Airen era uma mistura das técnicas de Judith, Brett, Illia e do homem dos sonhos, poderosa o suficiente para surpreender qualquer espadachim especialista. Porém, o estilo daquele homem, que formava o núcleo de Airen, era um tanto simples e direto, semelhante à estaca de ferro dentro dele. Então, ao tentar moldar a estaca para caber melhor em suas mãos, Airen sentia que sua esgrima também estava se adaptando mais ao seu próprio estilo. Mas, ainda assim…
“Só isso não resolverá tudo.”
O treinamento mental apenas lhe dava uma possibilidade. Ele não conferia poder real, apenas abria o caminho ao empurrar a barreira que bloqueava seu avanço. Para seguir adiante, ele precisava se esforçar ainda mais. Mas isso não o incomodava. Ele recebia a situação de braços abertos.
Airen sorriu com confiança.
— Vamos descansar aqui — disse Khubaru.
— Certo — respondeu Lulu.
— Ok — disse Airen.
Eles chegaram à cidade cerca de três dias antes de Lathion, no Reino de Myoss. Enquanto o crepúsculo descia, rapidamente encontraram uma estalagem para passar a noite. Khubaru, como sempre, encontrou instantaneamente um bom lugar por um preço razoável. Ele até encomendou o jantar antes de falar com Airen.
— Vou ao banheiro.
— Eu também — disse Lulu.
— Sabe, eu queria perguntar isso há um tempo. Gatos usam banheiros humanos?
Pow!
Lulu saltou e acertou um soco na cabeça de Khubaru antes de desaparecer.
— Argh… — O oráculo orc franziu a testa e foi atrás dela.
Airen ficou sozinho. Não achou estranho. Aqueles dois frequentemente vagavam por aí, então ele já estava acostumado a ficar sozinho à mesa. Em sua solitude, pensou sobre as academias de esgrima de Lathion e sobre sua própria técnica enquanto esperava a comida.
Então, ouviu uma cadeira caindo no chão. Airen virou-se na direção do barulho, com uma expressão irritada. No início de suas viagens, ficava facilmente assustado com esse tipo de coisa, mas agora sabia que tais confusões eram comuns em estalagens e bares. Ainda assim, ficou curioso sobre quem estava por trás da cena. Ao se virar, viu uma mulher em pé, apontando o dedo para homens frustrados do outro lado.
E então Airen congelou. A mulher de cabelos vermelhos que discutia com eles parecia muito familiar.
— Judith…? — Airen murmurou. Foi então que ouviu uma voz chamando-o por trás.
— Airen Farreira?
Airen virou-se, sobressaltado, e ficou ainda mais surpreso. À sua frente estava um jovem sofisticado com cabelos azuis chamativos. Brett Lloyd, que havia crescido muito, olhava para Airen com uma expressão séria.