Um grupo de pessoas caminhava pelas ruas da cidade. Moradores, mercadores e até mesmo bêbados que normalmente arrumariam briga com qualquer um abaixavam a cabeça e evitavam encará-los. Isso se devia a Korah Murrey, que liderava o grupo.
Ninguém entre os habitantes da cidade ousava olhar em seus olhos, pois ele era o precioso filho da poderosa Companhia Mercantil Murrey, temido até pelo Senhor do Domínio, e caminhava com uma expressão desagradável.
Mas aqueles que o seguiam pareciam não se importar nem um pouco com isso. O jovem de cabelos azuis que andava ao lado de Korah tinha exatamente essa atitude, assim como o rapaz loiro e o orc que vinham atrás, parecendo igualmente alheios. Até mesmo a gata no ombro do orc não demonstrava preocupação, olhando ao redor das ruas com entusiasmo.
Judith também estava imersa em seus próprios pensamentos, seguindo um passo atrás de Airen. “Será que ele completou a tarefa do diretor?” No início, ela não sabia o motivo de sua saída da academia, mas após três anos insistindo com Ian, ela conseguiu arrancar a resposta. Mesmo assim, ela não entendia direito.
“Encontrar sua própria esgrima? O que isso significa?” Para ela, a espada era apenas uma ferramenta. O diretor havia dito: — Você já tem sua esgrima, ainda que instável. — Mas ela não compreendia isso. E nem queria entender, pois detestava perguntas enigmáticas. No entanto, tinha uma vaga ideia de que, para Airen, que era ainda mais nerd do que Brett, aquilo era uma tarefa importante.
“Pelo menos… ele parece melhor do que antes.” Judith observava Airen cuidadosamente.
Ele havia crescido cerca de um dedo a mais que Brett e tinha um corpo bem equilibrado e robusto. Suas mãos estavam cheias de calos. Mas o que mais havia mudado eram sua expressão e seu olhar. Ele parecia mais determinado. Isso era bom.
“Já faz cinco ou seis anos desde o nosso último duelo? Vai ser interessante.” Judith sorriu, pronta para falar com Airen, mas alguém falou com ela antes disso.
— Oi.
— Oi…? — Judith respondeu, meio sem jeito.
— Que bom te ver. Sou Lulu. Como você ouviu, sou a professora de feitiçaria do Airen!
— Ah… certo. Sou Judith. Amiga do Airen.
— Sim, eu sei! Ouvi falar de você. Mas queria conversar com você pessoalmente.
Lulu riu de um jeito muito humano, e Judith sorriu sem jeito. Não era a primeira vez que ela via um feiticeiro. A academia recebia convidados especiais de tempos em tempos, então ela já tinha visto feiticeiros ou magos algumas vezes. Mas o que chamou sua atenção foi o fato de aquela gata ter pelos ‘negros’.
“Mas gatos pretos… são símbolos de má sorte!”
Ela se lembrou de histórias que ouvira nos becos, de um passado que preferia esquecer. Histórias de pessoas seguindo gatos pretos e encontrando um diabo, ou vilarejos infestados pela peste depois da aparição de um gato preto. Eram apenas rumores, mas… ela era sensível a esse tipo de coisa.
— Vou te dar isso. É um presente! — disse Lulu.
Mas Lulu parecia pensar diferente. Parecia gostar de Judith e retirou três ratos dourados de um espaço mágico, entregando-os a ela. Khubaru engoliu em seco, e Korah e seus guardas, que observavam, ficaram paralisados. Judith, com os olhos cheios de choque, alegria, nervosismo e dúvida, perguntou a gata:
— Isso é ouro de verdade?
— Sim! Não se preocupe. Tenho muito!
— V-você tem muito?
— Quer mais?
— Não, não é isso. Q-Quer dizer, seria bom se você me desse mais, mas… Hã?
Airen riu ao ver Judith confusa enquanto Lulu a bombardeava com presentes. Ela parecia diferente, mas igual ao mesmo tempo. Ele achou bom que ela mantivesse a mesma inocência, embora parecesse mais madura.
Mas a mudança de Judith não era apenas interna. Ela tinha crescido e agora exibia um corpo equilibrado. Sua habilidade com a espada também devia ter evoluído bastante.
“Quero duelar com ela!”
Os olhos de Airen brilhavam com determinação. Antes, ele não teria se sentido assim, mas agora sentia. “Mais rápido.” Ele mal podia esperar para chegar à casa de veraneio de Korah Murrey.
Airen estava imerso em seus pensamentos quando Korah parou. A casa ficava em um terreno enorme. Era ainda mais impressionante à medida que avançavam. Judith ficou maravilhada ao ver o chão de pedra do campo de treinamento.
— Uau, você realmente investiu dinheiro aqui.
— Esperem aqui… — disse Korah.
— Hã? Por quê? Não podemos começar logo? Mal posso esperar — respondeu ela.
Airen, embora não dissesse nada, pensava o mesmo enquanto observava Korah. Os outros olhavam para ele com a mesma expectativa. Korah hesitou, intimidado pelos olhares, mas abriu a boca.
— Bem, vocês não vão acreditar em mim, certo? — disse ele.
— Hã?
— Mesmo que vocês sejam tão medíocres que eu descubra que não são mercenários de nível prata, achariam que estou mentindo porque não gosto de vocês — disse Korah.
— Então o que você vai fazer? — perguntou Judith.
— Vou chamar uma testemunha. Ele está aqui na casa, não vai demorar.
— Espere, mas isso seria a mesma coisa. Como vamos acreditar em alguém que trabalha para você? — disse Judith.
— Ele não trabalha para nós. Sir Brian Burnes, o cavaleiro errante, é confiável e habilidoso.
— Ah, Sir Brian Burnes — disse Brett, assentindo.
— Você o conhece? — perguntou Judith.
— Ele foi juramentado no Reino Belson. Como Korah disse, é um homem que não mentiria sobre algo assim. Korah, aceito a testemunha — disse Brett.
— Certo.
— Vou me alongar enquanto isso — disse Judith, começando a alongar o corpo. Ela também balançava a espada de maneira descontraída, mas com movimentos habilidosos aqui e ali que impressionariam um espadachim experiente, embora Korah e seus guardas não fossem capazes de entender isso.
Foi Airen quem realmente chamou atenção.
— Hã?
— Uma espada acabou de aparecer…
— Uau, o que é isso? Isso é…
— Sim. É feitiçaria.
Airen sorriu, meio sem jeito, enquanto balançava a espada. Até Brett, geralmente calmo e controlado, parecia surpreso. Judith, no entanto, aceitou aquilo com mais naturalidade.
— Então você não ficou de bobeira nesses últimos cinco anos — disse Judith.
— É uma longa história. Conto tudo depois do duelo.
— Ótimo. Eu e Brett também temos coisas para contar. Mas não vai ser tão divertido.
Os dois trocaram sorrisos quando um cavaleiro se aproximou deles de forma disciplinada, fez uma reverência a Korah e falou:
— Ouvi dizer que precisam de uma testemunha.
— Sim, é isso mesmo. A mulher de cabelos vermelhos e o rapaz loiro vão duelar. Você só precisa nos dizer, após assistir, se acha que a mulher de cabelos vermelhos é habilidosa o suficiente para ser uma mercenária de nível prata ou superior — explicou Brett.
— Uma tarefa simples. Assim será.
— Tudo bem para você? — Brett perguntou a Korah.
— Por mim, tudo bem — disse Korah.
— Eu também! — disse Judith.
— Concorda que o perdedor concede um desejo ao vencedor?
— Claro — disse Korah.
— Sim! Mal posso esperar! Podemos começar?! — gritou Judith.
— Vamos começar. Eu observarei — disse Brian Burnes com uma voz firme.
Judith deu um sorriso agressivo e se preparou para atacar. Airen também assumiu sua posição contra ela. Logo, os dois prodígios avançaram um contra o outro.
“Droga! Por que tenho que fazer isso de novo…?”
Brian Burnes, um renomado cavaleiro errante do Reino Belson, resmungava mentalmente, como se fosse forçado a realizar algo que não queria. Mas ele não tinha escolha, precisava seguir as ordens dos Murrey para pagar as dívidas que seu irmão havia feito com um agiota. Isso significava também obedecer ao filho mais novo dos Murrey.
“Droga, droga! Como cheguei a esse ponto…?”
Ele xingou inúmeras vezes, mas não tinha saída no momento. Precisava ser o cão da família Murrey por pelo menos seis meses. Assim, ele tentou se acalmar e refletiu sobre a tarefa que tinha à sua frente.
“Não importa o quão incrível o duelo seja… só preciso dizer que ela não está nem perto do nível prata, certo?”
Ótimo. Era um trabalho simples. Ele não precisaria arriscar a vida ou usar força, e também não levaria muito tempo. Era uma tarefa fácil. Mas não… Mesmo sendo um cavaleiro errante, isso não era tão fácil, pois ele valorizava sua honra.
“Ainda assim… ‘está bem’.” Felizmente, os dois espadachins pareciam muito jovens. A placa prata não era algo que se conquistava apenas com habilidade. Era necessário combinar conquistas excepcionais com habilidades extraordinárias. Claro, outra forma seria ter talento suficiente para alcançar a ‘placa de ouro’, o que automaticamente conferiria a de prata.
“Isso é impossível para alguém tão jovem.”
Estar em uma idade tão jovem tornava impossível ter as habilidades ou conquistas necessárias. Brian pensava nisso e suspirava, aliviado por não precisar mentir. Ele apenas esperava que o idiota da família Murrey não fosse muito cruel com aqueles pobres coitados. Ele estreitou os olhos, e o duelo começou. Mas seus pensamentos desapareceram assim que os dois jovens iniciaram o confronto.
Os cabelos vermelho e loiro se chocaram três vezes no centro do campo de treinamento. Ambos passaram um pelo outro e, então, se viraram de forma suave.
Os dois se atacaram mais três vezes. Eles golpearam a parte superior do oponente, mas a precisão e a força dos ataques eram tão intensas que quase ficaram gravados na visão de Brian.
O loiro balançou sua espada em um ângulo amplo, empurrando a mulher de cabelos vermelhos enquanto ela bloqueava. Mas isso foi feito de propósito, pois ela saltou do chão de maneira rápida e ameaçadora. O loiro recuperou o equilíbrio.
Swish!
Então, algo impressionante aconteceu: a mulher de cabelos vermelhos realizou um movimento impossível bem antes de entrar no alcance de seu oponente. Ela parou, como se ignorasse as leis da física, virou-se para as costas do homem loiro e o atacou.
Baaam!
O som mais alto ecoou pelo campo. O homem loiro bloqueou o golpe que quase o esmagou de cima para baixo.
O chão de pedra se estilhaçou com o impacto. Brian sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Mas os dois continuaram a balançar suas espadas. Eles atacaram, atacaram novamente, bloquearam e bloquearam de novo. Após cerca de cinquenta golpes trocados, os dois se afastaram um do outro. Havia empolgação e antecipação nos olhos de ambos.
Korah Murrey, seus guardas, o homem que havia chamado Brian Burnes e até o próprio Brian estavam sem palavras. Apenas Brett, que estivera em silêncio, finalmente falou:
— Parem de brincar e lutem de verdade.