Mas…
“Eu nunca negociei dinheiro com um gato antes…”
Na verdade, a questão não era o dinheiro, mas como negociar com um animal. John fechou os olhos e os abriu novamente, beliscando a coxa para ter certeza de que não estava sonhando. Então, a gata preta, Lulu, falou casualmente:
— Você não está sonhando.
— Você… leu minha mente?
— É o que as pessoas geralmente pensam quando me veem falando. Mas não esperava isso de você. Pensei que, vivendo em um palácio, já tivesse visto alguns feiticeiros.
“Você não é um feiticeiro qualquer!”, John pensou.
Uma gata feiticeira? Ele nunca havia visto algo assim antes, mas entendeu rapidamente. Quando algo tão irreal acontecia, a palavra ‘feiticeiro’ geralmente explicava o suficiente, e era esse o caso agora.
John assentiu e encarou a gata. Lulu retribuiu o olhar. Após um silêncio desconfortável, John sentiu o suor escorrer pela testa e pelas costas.
“Não consigo ler sua expressão!”
A diferença de espécie tornava impossível para John interpretar as emoções da gata. Ele, que dominava a arte de decifrar rostos humanos para ter vantagem em negociações, agora estava perdido. Normalmente, o desespero de quem vinha até ele facilitava as coisas, mas essa gata…
“Como vou negociar com isso?”
John engoliu seco e olhou novamente para a gata, que continuava a fitá-lo. O silêncio caiu outra vez até que Lulu coçou o queixo com a pata traseira e falou:
— Não precisa se esforçar tanto.
— Hã? O quê…?
— Não precisa pensar. Eu sei que você quer dinheiro. E muito. Não é?
— Eu já disse que estou bem agora, que não preciso de mais…
— Então pare de falar isso. Você só está dizendo isso porque quer mais.
“É por ser uma feiticeira? Ela sabe exatamente o que estou pensando!”
Embora nunca tivesse encontrado um feiticeiro, John sabia que alguns tinham fama de ler mentes. Ele rapidamente inclinou-se para frente, prestes a argumentar, mas Lulu interrompeu, enfiando a pata em um vazio e retirando um objeto brilhante.
Era um rato dourado. Depois, outro, e mais outro. Quatro, cinco, seis… Um total de dez ratos de ouro brilhavam sobre a mesa. John ficou atordoado olhando para a gata, mas isso não era tudo.
— Hiya.
Lulu então tirou uma tartaruga dourada com um rubi vermelho nas costas, uma figura de monge dourada segurando safiras azuis e uma estátua de gato dourada com pedras preciosas nos olhos. Com um olhar orgulhoso, declarou:
— Acho que isso deve ser o suficiente.
— O quê? Quer mais?
— Não… Não, de jeito nenhum.
John balançou a cabeça rapidamente e se tornou muito mais cortês. Normalmente, ele tentaria arrancar ainda mais dinheiro de alguém tão disposto, mas…
“Não. Esta mulher… quer dizer, esta gata…”
Havia o risco de perder tudo caso fosse ganancioso. John temia que a gata mudasse de ideia se ele pressionasse demais. Então, levantou-se e cumprimentou Lulu e Airen com reverência.
— Farei o meu melhor para oferecer o melhor serviço.
John inclinou-se profundamente, enquanto Lulu virou-se para Airen.
— É assim que se gasta dinheiro.
— Hã? Não?
— Você está certa, Lulu.
Airen assentiu, com uma expressão complicada. Talvez o ser mais rico não fosse o rei ou os nobres, mas sim a gata preta à sua frente. Ele sentiu curiosidade sobre o passado de Lulu, mas decidiu deixar isso para outro momento.
“Lulu não me contou, então não vou perguntar. E isso nem é o mais importante agora.”
Airen virou-se para John, que permanecia firme como um servo obediente.
— Desculpe, mas estou com pressa. Podemos começar as lições imediatamente?
— Claro! Por favor, me acompanhe até a sala de treinamento!
Airen suspirou mentalmente ao observar o professor temporário, que agora era excessivamente solícito.
“Espero que ele seja tão habilidoso quanto dizem.”
John Drew não era bonito. Para ser direto, era feio. Na infância, era alvo de piadas das outras crianças, que o chamavam de monstro, porco ou outros insultos. Pelo menos, sua força física lhe permitia revidar, mas não impedia os cochichos pelas costas. Com as mulheres, as coisas também não eram fáceis.
Era esse o motivo? Ele era obcecado com sua aparência e com sua reputação. Aprendeu esgrima para competir em uma arena de gladiadores e ser popular entre as mulheres, além de gastar seu dinheiro em itens extravagantes para se exibir aos amigos homens. Seu estilo chamativo era o resultado de tentar aparentar ser elegante. Mas, mesmo assim, ele não parecia nada bem. Esse era o motivo pelo qual John não gostava de Airen.
Por isso, John não gostava de Airen.
“Ele é bonito demais. Não gosto disso.”
A pele clara de Airen não tinha imperfeições, como se o sol não pudesse afetá-lo. Seus olhos azuis e traços faciais eram nobres e elegantes. E seu porte físico também era excelente.
“E se um cara como ele ficar muito bom, vai atrair ainda mais mulheres. Vai começar a namorar uma, duas, três ao mesmo tempo… Enquanto eu nem consigo uma!”
John sentiu o ódio surgir em sua mente, mas não o demonstrou externamente. Contudo, isso não era por causa de Lulu, a gata feiticeira que conseguia enxergar os pensamentos de uma pessoa, que estava presente.
Ser pago para ensinar esgrima. John levava o ofício muito a sério, pois era profissional. Não importava o que acontecesse durante a negociação, e se seus sentimentos eram feridos ou não, isso não tinha relevância. Ele precisava ensinar seu cliente e provar que era digno do dinheiro que recebia.
“Não se esqueça, John Drew. Ensinar esgrima é o seu maior orgulho”, pensou John. Ele se endireitou.
Lulu, que estava observando John, ficou fascinada. Airen apenas olhou ao redor da sala de treino, imaginando que haveria decorações ali, mas não havia muita coisa. Em vez disso, havia câmeras mágicas instaladas em todos os cantos. John percebeu que Airen estava observando-as e explicou:
— Esse é o gravador mágico que vai captar cada uma das suas habilidades de esgrima, senhor. Ele registra seus movimentos, não apenas a imagem parada como uma câmera comum.
— Oh, você não precisa ser formal comigo. Você é meu professor — disse Airen.
— É, por mim tudo bem também — disse Lulu.
— Então… vou falar casualmente. De qualquer forma, por que você não me mostra todos os seus movimentos de esgrima primeiro?
— Agora?
— Sim. Faça o melhor que puder. Talvez seja melhor imaginar que está lutando contra um oponente imaginário.
— Huh? Por que você mesmo não é o parceiro de duelo dele, então? — Lulu interferiu, mas John balançou a cabeça seriamente.
— Eu posso ser apenas um especialista mediano, mas me orgulho do meu conhecimento, experiência e olhar técnico. Obviamente, ele é mais forte que eu, então não posso lutar com ele.
— Na verdade, isso me leva a uma pergunta. Você é um filho escondido de uma das cinco famílias da esgrima? Ou mudou seu cabelo ou aparência com magia? Ou talvez… seja um pupilo de um mestre espadachim em segredo? — John perguntou, confuso.
— Eu sou… um aprendiz formal de Krono — respondeu Airen.
Ele ficou surpreso. Um espadachim mais forte reconheceu o potencial de um mais fraco, mas John admitia abertamente ser o menos habilidoso. Isso significava que John realmente tinha um olhar apurado, e também significava que ele estava confiante em ensinar, independentemente do seu próprio nível de habilidade.
— Entendo… Então você é da lendária 27ª Turma… Mas, mesmo considerando isso, você parece forte demais… — John murmurou para si mesmo com um franzir de testa. — Mas acho que isso não importa. Você está aqui para preencher as lacunas nas suas habilidades, e eu fui pago para preenchê-las para você. Isso é um fato importante, não é?
— Isso mesmo.
— Então, se for para descobrir sua capacidade física, estilo de esgrima, estratégia, hábitos e todo tipo de coisa… Eu preciso saber cada pequeno detalhe para dar a lição certa. Entendido?
— Sim, eu entendo.
— Certo! Vamos começar, então. Por favor, continue até eu dizer que terminou. Ah, a propósito, o suporte de armas está…
— Eu tenho a minha, obrigado — disse Airen, invocando sua espada larga e pegando-a.
— Você é… você também é um feiticeiro?
— Isso é tudo o que posso fazer, no entanto.
Airen sorriu timidamente, e John assentiu.
— Você lutou na arena dos gladiadores com essa espada? Se ela tem algo que excede as capacidades de uma espada, pode causar um problema…
— Eu a fiz ser avaliada por alguns inspetores lá, e parecia estar tudo bem.
— Entendo. Tenho o hábito de ser curioso… De qualquer forma.
John soltou uma tosse seca, ativou o gravador mágico e, em seguida, caminhou até onde Lulu estava flutuando. Ele parecia muito mais sério do que antes.
— Agora, vamos começar. Faça o seu melhor — disse John.
— Sim.
Então, Airen começou a balançar sua espada. Era uma esgrima pesada e sólida que utilizava o peso da espada larga. Mas não era apenas isso, já que Airen ativamente marcava seu território. John tentou ao máximo não parecer chocado. Airen era muito melhor do que ele imaginava.
“Sua constituição física é inimaginável. Ele não tem pouco mais de vinte anos?”
Era difícil compreender movimentos corporais tão poderosos. Difícil de acreditar, mesmo que Airen estivesse treinando desde que nasceu. Mas isso não era tudo.
“E seu estilo de esgrima não é o que eu esperava. Achei que ele seguiria os padrões de Krono…”
O jovem usava uma esgrima completamente diferente de qualquer espadachim de Krono que John já tinha visto. Airen permanecia firme no lugar, mas avançava de forma explosiva ao atacar. Em defesa, movia-se com a fluidez de um oceano. Era fascinante.
John esqueceu seu papel de professor e ficou mesmerizado pela esgrima de Airen. Mas ele não era o único.
Lulu, que brincava com uma bolinha enquanto flutuava, aproximou-se silenciosamente de John para observar Airen. A gata ficou concentrado nele por um longo tempo.
— Srta… Srta. Lulu? Uh… senhorita? — perguntou John, hesitante.
Algo estava errado? John ficou curioso e perguntou. Era estranho. Ele tinha um bom instinto, mesmo não sendo tão preciso quanto um feiticeiro, e sabia que algo especial estava acontecendo. Lulu finalmente quebrou o silêncio e respondeu:
— Ele despertou.
— Despertou? — repetiu John, confuso.
— Ufa… Pelo menos ele não está se transformando em uma esfera ou algo assim. Que alívio…
— Hã? O que você quer dizer? Se transformando em uma esfera…? — John perguntou, sem entender nada.
Lulu então flutuou mais alto e deu um tapinha no ombro de John com sua pequena pata.
— Não pare Airen até que ele pare primeiro — disse Lulu.
— O quê? S-Sim, senhora!
— Nunca. Não importa quanto tempo ele precise, dias… Não o interrompa.
— Sim, senhora… — John assentiu automaticamente, levado pelo tom estranhamente sério.
Lulu também assentiu e continuou:
— Obrigado, professor. É tudo graças a você.
— Uh, sim… Obrigado?
— Isso é um bônus. Estou ansiosa para ver!
Lulu colocou a pata no ar e retirou um elefante dourado com uma esmeralda incrustada na testa, entregando-o a John. O feio instrutor de meia-idade pegou o objeto e pensou consigo mesmo:
“O que eu fiz?”