Ricardo Pinto, o antigo campeão que se lembrava do passado sangrento das lutas de gladiadores, sorriu. Seus dentes brancos brilharam como presas de um predador.
“Como ele ousa tentar uma ‘quebra de armas’ comigo?”
Obviamente, o resultado de uma “quebra de armas” não dependia apenas da qualidade das espadas. Mesmo que a espada fosse uma obra-prima lendária, nas mãos de um camponês comum, ela seria apenas um pedaço de madeira. Por outro lado, uma espada de ferro barata poderia cortar uma rocha se usada por um mestre espadachim. Mas, se perguntassem a Ricardo se a qualidade da espada não fazia diferença no resultado, ele certamente negaria.
“Esta espada é a razão pela qual tenho chance contra Illia Lindsay.”
O valor de uma espada bem feita era extraordinário. Ela permitia a um espadachim lutar contra adversários mais habilidosos e dava vantagem contra inimigos de habilidades iguais. Mas qual era a situação agora? Airen Farreira era menos habilidoso em esgrima e tinha uma espada de qualidade inferior. Era ridículo ele tentar uma ‘quebra de armas’.
Ricardo não conseguia entender seu desafiante.
“Vou entrar no jogo então!”
Ricardo decidiu aceitar o desafio. Limpou o sorriso do rosto, ergueu sua espada e gritou enquanto a balançava.
— Haaa!
Duas espadas gigantes colidiram ferozmente no ar. O barulho ensurdecedor fez a multidão estremecer, mas aquilo não parou. Uma, duas, três vezes… As espadas dos dois gladiadores atacavam as armas um do outro, sem qualquer interesse nos corpos de seus adversários. Alguns gladiadores ficaram espantados ao perceberem o rumo da luta.
— Meu Deus, isso é loucura!
— O garoto Farreira enlouqueceu! Mesmo que ele use uma espada de feitiçaria, como pode fazer isso contra a Espada Numerada…
— Ele acha que não pode vencer de maneira normal? Se for isso…
A maioria pensava que Airen era um tolo, enquanto alguns pareciam simpatizar. Era óbvio por que as pessoas pensavam assim. Todos sabiam que a habilidade de Ricardo Pinto com a espada era comparável à de um mestre espadachim, então Airen poderia achar que não tinha chance em um confronto direto. Mas a fama da Espada Numerada era ainda maior que a de Ricardo.
“Às vezes, as pessoas tomam decisões erradas quando estão encurraladas”, pensavam muitos.
Sim, o resultado dessa luta parecia decidido desde o início. Algumas pessoas torciam por Airen apenas para se divertir, mas os espadachins veteranos sabiam o que poderia acontecer quando Ricardo Pinto empunhava a Espada Numerada, e como ela se harmonizava perfeitamente com suas habilidades. Talvez Ricardo pudesse realmente derrotar um mestre espadachim. Assim, os gladiadores já pensavam na próxima luta. Mas nem todos faziam isso.
Aqueles que conheciam Airen antes de ele se tornar famoso, que sabiam como ele treinava, o quanto era talentoso e com que determinação lutava, como Judith e Brett, tinham pensamentos completamente diferentes.
Eles assistiam à luta com expressões sérias. Isso não mudou mesmo quando as pessoas ao redor zombavam da decisão aparentemente tola de Airen ou demonstravam decepção. Alguns murmuravam de forma sarcástica, insinuando que existia um laço entre os que vinham de Krono.
Mas nem Judith nem Brett se abalaram, assim como o outro discípulo de Krono, Airen Farreira. O tempo passou… e agora já fazia dez minutos desde o início da luta. Cada espectador, incluindo os espadachins veteranos, sentia que algo inesperado estava acontecendo.
A espada golpeava, golpeava e golpeava novamente. O som do choque entre metais preenchia o coliseu repetidamente. Era o suficiente para fazer uma criança chorar com o barulho ensurdecedor, mas ninguém parecia reclamar. Alguém então murmurou consigo mesmo:
— Quando ela vai quebrar?
Era o que todos pensavam. Não podiam evitar, olhando para a grandiosa Espada Numerada de Vulcanus. Nas mãos de Ricardo Pinto, ninguém além de Zett Frost poderia derrotá-la. Mas, então, Airen ainda estava resistindo com uma espada de aparência rude e cega.
E mais… Um espadachim que notou uma névoa subindo da espada de Ricardo gritou em choque:
— Ricardo está tendo dificuldades!
Era verdade. Levantar a aura através da ‘materialização’ e usar a ‘concentração’ para evitar que ela se dissipasse resultava na névoa que surgia da espada de Ricardo, uma habilidade avançada que a maioria dos especialistas não ousaria tentar. Porém, essa não era uma maneira eficiente de utilizar aura em uma luta real, já que desperdiçava muita energia por um pequeno ganho de força.
O fato de Ricardo recorrer a isso mostrava que estava em apuros. Mas o que aconteceu a seguir chocou a todos. Airen, que lançou um olhar para a espada de Ricardo, continuou a balançar sua espada como vinha fazendo, ao invés de recuar para fazê-lo desperdiçar energia. E então, um som mais alto que qualquer outro ecoou. Mas Airen não parou. O impacto ressoava pelo coliseu uma e outra vez. As pessoas apenas assistiam, paralisadas, sem sequer cobrir os ouvidos. Era um show de um homem só. Todos só conseguiam olhar para Airen Farreira. E logo…
Com um som completamente diferente, a luta terminou. Ricardo estava devastado e ficou parado, segurando o que restava de sua espada quebrada, sem a confiança que exibia no início. Airen prestou seus respeitos silenciosamente e se virou, olhando para outro lugar.
Não havia necessidade de um árbitro para anunciar o resultado, nem de uma entrevista para confirmar. A multidão, em êxtase, gritava o nome do vencedor em uníssono:
— Airen Farreira!
— Airen Farreira!
— Airen Farreira!
Foi intenso. Claro, isso era apenas o começo. O verdadeiro confronto seria realizado no próximo mês, em abril, para decidir o campeão. Illia Lindsay contra Airen Farreira. Era a luta dos sonhos que finalmente decidiria quem era o melhor, e as pessoas gritavam de empolgação e expectativa.
A campeã atual da Terra da Provação desviou o olhar de Airen e saiu do coliseu.
No dia seguinte à luta de Airen contra Ricardo, o cronograma da luta pelo título foi divulgado ao público. A luta ocorreria dali a duas semanas, em 13 de abril, o quarto mês desde que Airen chegou a Aisenmarkt.
Como sempre, as pessoas se dividiam ao especular sobre o resultado. Alguns acreditavam que Illia Lindsay, uma mestre espadachim, venceria, enquanto outros afirmavam que o mestre de uma espada de feitiçaria, que destruíra até mesmo a Espada Numerada de Vulcanus, tinha uma chance. Alguns discutiam. Mas havia uma coisa em que todos concordavam: a espada de Airen era forte o suficiente para enfrentar uma Aura da Espada.
— Talvez vejamos a história ser escrita naquele dia.
— Concordo. Ricardo não disse que a espada era incrível, mas que a esgrima de Farreira estava acima dele? Isso não dá a ele uma chance contra um mestre?
— O que é certo é que ele é o desafiante com mais chances. Vou quebrar minha poupança para comprar um ingresso.
— Eu também!
Parecia que toda Aisenmarkt se reuniria no coliseu. E, nesse momento de fervor, Illia permanecia em sua casa, aperfeiçoando suas habilidades com a espada sob o olhar de Emma Garcia, sua cavaleira guardiã.
Mas Emma não parecia feliz, pois sua preciosa senhora parecia estar sofrendo.
— Argh, hah, argh!
Seria por causa do treinamento intenso? Não. Sua mestra, Illia, não era tão fraca a ponto de se exaurir por algo assim. Quem ousaria pensar que a mais jovem mestre espadachim e atual campeã da Terra da Provação era tão fraca? Mas… de alguma forma, sua senhora parecia ainda mais frágil do que um camponês comum.
“Uma obsessão e uma incerteza.” Emma refletia sobre esses sentimentos que atormentavam Illia, sentindo seu coração se despedaçar.
“Ela não precisa se esforçar tanto assim…”
Illia sempre fora assim desde que retornara da Academia de Esgrima Krono. Esforçava-se mais do que qualquer um, mas nunca se sentia satisfeita ou aliviada. Forçava sua mente e seu corpo para calar aqueles que falavam mal de sua família, e isso só piorava sempre que tinha um evento importante pela frente.
Emma não conseguia impedi-la. Em uma ocasião, viu sua mestra sendo forçada a descansar e, desde então, nunca mais pediu para que ela parasse.
“Ela parecia sofrer ainda mais quando isso acontecia…”
— Argh, ugh, ah…
Illia balançava sua espada novamente. Ela arfava, e seu corpo tremia de tempos em tempos. Parecia um desastre, e era difícil acreditar que aquela era uma mestra espadachim.
Mas aquela faceta dela desaparecia conforme o tempo passava.
— Haa…
Illia se afiava novamente, como se fosse uma lâmina sendo polida. Ela fazia isso tanto que se tornara tão magra que parecia que quebraria com um toque, mas não se importava. Isso significava que estava incrivelmente afiada agora. Precisava desferir o golpe antes que se quebrasse. Ela assentiu para si mesma e continuou seu treinamento de espada. Sua cavaleira guardiã apenas observava enquanto ela seguia em frente, sem parar.
12 de abril.
Era o dia anterior à luta pelo título de campeã, a qual todos aguardavam ansiosamente. Airen, embora devesse estar nervoso, parecia calmo enquanto se concentrava em sua espada. Armazenamento, fortalecimento, endurecimento, aprimoramento, concentração e materialização. Ele revisava os fundamentos da utilização de aura novamente e fechava os olhos. Estava no meio de uma tentativa de criar a espada infundida com aura, uma tarefa que já o havia frustrado inúmeras vezes, quando alguém o chamou por trás.
— Meditando de novo?
Ele sentiu um déjà-vu. Parecia que algo assim havia acontecido quando ainda era um aprendiz preliminar. Abriu os olhos. Mas, ao contrário do passado, virou-se e falou com um leve sorriso.