Mas havia um problema. Airen já tinha outros companheiros de viagem: Judith, Brett, um orc chamado Khubaru e a gata feiticeira Lulu. Os dois últimos eram fáceis de lidar, pois sempre faziam amizades rapidamente e provavelmente aceitariam Illia com algumas explicações.
“Mas Brett e Judith… não tenho tanta certeza”, Airen ficou um pouco preocupado. Embora fossem seus amigos há muito tempo, nunca foram próximos de Illia. Na verdade, atualmente eles não tinham um bom relacionamento.
Claro, Judith havia se reconciliado com Illia antes de esta última deixar a academia, mas já haviam se passado seis anos. E, pelo que Airen sabia, elas nunca se falaram, mesmo quando se cruzaram em Aisenmarkt. Isso porque Illia evitava falar com Judith. Era seguro dizer que o relacionamento havia piorado.
— Não sei se isso vai dar certo — disse Illia, parecendo preocupada.
Ela sempre mostrava poucas expressões, então era difícil perceber, mas Airen sabia que ela estava muito nervosa. Ele sorriu de leve para tentar tranquilizá-la.
— Não se preocupe. Eles são boas pessoas. Tenho certeza de que conseguiremos resolver os… mal-entendidos.
— Talvez, mas…
— Vai ficar tudo bem. Eu estarei com você. Podemos pedir desculpas e explicar que você quer se juntar a nós. Não acho que eles vão ficar tão irritados com isso.
— Hmm…
— Vou convencê-los. Não se preocupe — disse Airen, confiante, e Illia assentiu.
Após terminarem a longa conversa, seguiram para a mansão de John. Parecia que os outros haviam saído para dar tempo aos colegas da academia, pois apenas Judith e Brett estavam lá. Mas algo inesperado aconteceu.
— Não — Brett balançou a cabeça.
— Hã?
— Eu disse não. Ela nos ignorou esse tempo todo e agora, de repente, quer se juntar a nós? Como devo entender isso?
Brett, em vez de Judith, que Airen esperava que dissesse não, rejeitou o pedido. Airen ficou sem palavras, pois não esperava essa reação, e Illia também parecia nervosa. Mas foi Judith quem ficou ainda mais surpresa.
“O que diabos há de errado com ele?”
Na verdade, os dois já esperavam por isso desde que Airen saiu para falar com Illia. Brett havia dito que não se importava, enquanto Judith afirmou que não gostaria de aceitá-la sem um pedido de desculpas sincero. Por isso, ficou chocada ao ver Brett declarando sua rejeição de repente, e abriu a boca para falar.
— Ei, você…
— Illia Lindsay.
Mas Brett a interrompeu imediatamente. Judith teria dito algo se fosse o comportamento usual dele, mas ele parecia muito sério. Então, em vez de se irritar, cruzou os braços para ver o que ele tinha a dizer. Enquanto isso, Airen e Illia ficaram tensos, esperando Brett continuar.
— Qual é o motivo de você querer se juntar a nós? — Brett perguntou.
— E-Eu…
— Bom, deixe-me adivinhar. Você quer estar com alguém em quem confia, ajudar um ao outro a seguir em frente e crescer. Algo assim, certo?
— Sim…
— Então, deixe-me perguntar outra coisa. Em quem você confia?
— Eu…
— Apenas no Airen, não é? Tenho certeza de que você não confia em Judith nem em mim.
— Não é?
Brett interrompeu rudemente as palavras de Illia, mas ela não conseguiu se irritar ou argumentar. Ele estava dizendo a verdade.
— Não consegue negar? Certo, entendi. Você não teria chamado Airen e conversado com ele a sós se confiasse em nós. Teria falado com todos sobre o que contou a ele lá fora, sobre sua história, por que nos ignorou e outros segredos que escondeu de nós. Não é verdade?
— Se não consegue fazer isso, então é melhor partir apenas com Airen, em vez de se juntar a nós.
Essas palavras frias trouxeram silêncio. Airen, Illia e até Judith ficaram tensos. Brett foi tão implacável que Judith chegou a sentir empatia por Illia, mas o clima ficou pesado demais para que ela dissesse algo. O único que podia aliviar a tensão era Brett, que a havia iniciado. Então ele suspirou, como se soubesse disso, e voltou a falar.
— Hmph… E eu sei que isso não vai acontecer, considerando o caráter do Airen. Ele quer que fiquemos todos juntos, certo, Airen?
Airen hesitou ao encontrar o olhar de Brett, mas acabou assentindo.
“Claro.” Brett murmurou, depois virou-se para Illia como se a tivesse convidado a dizer algo. Illia apenas abaixou a cabeça, desanimada.
Voltaram à estaca zero. Judith, Airen e Illia se perguntaram como aquilo terminaria quando Brett olhou para os três e disse em um tom mais suave, como se tivesse decidido.
— Certo. Vamos chegar a um meio-termo. Se você não pode começar, então nós começaremos.
— Vou contar nossos segredos que só compartilhamos com quem é muito próximo de nós. Então você pode falar sobre os seus depois.
“Esse desgraçado, esse foi o plano dele desde o começo.” Judith finalmente percebeu a intenção de Brett e assentiu com entendimento.
Brett havia decidido aceitar Illia desde o início. Mas eles estavam tão distantes que ele não podia fingir que nada havia acontecido. Então, queria que se conhecessem melhor antes que isso se tornasse um problema no futuro.
“Mas por que ele está dizendo ‘nós’ em vez de ‘eu’?” Judith de repente teve uma dúvida. Não seria normal falar sobre os próprios segredos em uma situação dessas? Mas Brett logo resolveu sua dúvida.
— Eu nunca contei isso a ninguém… Mas Judith acreditava no Papai Noel até os quatorze anos.
— Hã?
— Foi depois de ela se tornar uma aprendiz formal. Ela evitava dizer palavrões e suavizava o tom para ganhar um presente do Papai Noel. Mas começou a falar besteiras imediatamente depois que descobriu que ele não existia…
— Ei! Seu idiota! Fale dos seus segredos, não dos meus! Seu cretino…!
Judith saltou tão rápido que a cadeira dela caiu no chão. Ela agarrou Brett pelo colarinho e o levantou no ar. Mesmo com os pés balançando no ar, Brett manteve um sorriso calmo. E Airen e Illia riram ao assistir.
Papai Noel, a famosa figura imaginária, dizia-se trazer presentes às crianças boas em 25 de dezembro. Era tão famoso que a maioria descobria a verdade ainda jovem, então era difícil não rir ao saber que Judith acreditava nisso até a adolescência.
Mas não era engraçado para Judith. Ela corou de vergonha, jogou Brett no chão e gritou com ele.
— É melhor você contar também os seus segredos! Vou te matar se não falar tudo!
— Certo. Não se preocupem — disse Brett calmamente.
— E você também, Airen! — gritou Judith.
— Eu…? — disse Airen.
— Sim! Você achou que só ia ouvir nossos segredos e que tudo estava resolvido?
— Não, eu não…
— Claro que não! Claro que você não deveria! E Illia!
— S-sim?
— Nem pense em abaixar a cabeça e ficar quieta enquanto falamos sobre nossos segredos!
— Se fizer isso, vou lutar com você até que uma de nós morra! Não dou a mínima para essa história de mestre espadachim!
— Certo, eu conto os meus… — assentiu Illia, quase sem perceber as palavras ferozes de Judith.
Illia já havia sentido isso uma vez, quando deixou a academia, e sentiu novamente hoje: Judith tinha uma ferocidade impressionante. Era uma energia predatória, algo que instintivamente trazia medo à mente de quem a enfrentava. Embora fosse engraçado que a razão para essa intensidade fosse ‘o Papai Noel’ no momento, não era nada engraçado. Airen também não conseguiu rir.
— Hmph. Então, deixe-me começar com os meus segredos.
Somente Brett permaneceu calmo enquanto seguia suavemente com sua história.
Os olhos de Judith o fitaram com intensidade, ansiosa para ouvir o que ele diria. Mas a história de Brett era muito mais longa do que qualquer um imaginava. Ele contou sobre sua juventude antes de entrar na Academia de Esgrima Krono, suas memórias da academia, o que aconteceu depois e suas experiências ao deixar a academia. Brett revelou tudo, sem esconder nada. Foi uma exposição crua e honesta de si mesmo.
— Agora é minha vez…
Judith fez o mesmo em seguida. Inicialmente furiosa com Brett, sua atitude mudou à medida que ele contava sua história. Ela reuniu coragem para falar sobre seu passado, incluindo os dias que passou nos becos da cidade. Ao terminar, ela olhou para Airen. Ele sorriu e compartilhou sua história, que seus três amigos já haviam ouvido antes. E quando os três terminaram suas narrativas…
Os olhos de Illia estavam cheios de lágrimas. Nos seis anos após deixar a Academia de Esgrima Krono, ela caminhara sozinha por um caminho escuro e estreito. O medo provocado pelos olhares das pessoas, as palavras cruéis e sua imaginação sombria a atormentaram diariamente.
Mas não mais. Após percorrer a escuridão, ela encontrou a vastidão e a calorosa acolhida do mundo, o que inicialmente a frustrara. Mas esses três amigos a receberam sem um traço de falsidade, o que a aliviou profundamente.
— Eu…
Então Illia começou sua história. Parava de vez em quando, sobrecarregada pelas emoções, mas os três amigos a ouviram atentamente.
Assim, seis anos depois dos dias de pré-aprendizes na Academia de Esgrima Krono, os quatro finalmente se tornaram verdadeiros amigos.
— Haha, já podemos entrar?
— Oi! Prazer em conhecê-los! Sou a melhor gata feiticeira do continente, Lulu! Fui eu que fiz o ursinho de pelúcia que você recebeu! Hahaha!
Quando os quatro amigos, incluindo Illia, terminaram suas histórias, Khubaru e Lulu entraram na sala com expressões radiantes. Embora vissem Illia pela primeira vez, trataram-na com grande calor. Para eles, não havia problema algum em ela se juntar ao grupo.
— Eles sempre são assim? — perguntou Illia.
— Sim, eles sempre são assim — respondeu Airen com um aceno de cabeça.
Mais sério do que a entrada de Illia no grupo foi a discussão sobre o próximo destino. Khubaru e Lulu não tinham objetivos específicos, mas os outros quatro espadachins tinham. Eles estavam nessa jornada para crescer como espadachins, e esse era o propósito do grupo. Portanto, o próximo destino deveria ajudar nesse objetivo. Foi então que Khubaru fez uma sugestão.
— Que tal visitarmos meu professor? — perguntou o orc.
— Seu professor? — perguntou Airen.
— Sim, meu professor. Talvez… — Khubaru fez uma pausa breve, então continuou com seriedade. — Ele saiba algo sobre o seu sonho, Airen… Sobre o homem misterioso.