— Você precisa agir.
— Você sabe como é diferente de cinco anos atrás?
Khubaru perguntou a Airen Farreira, que ficou estático diante de uma resposta inesperadamente curta. Ele não conseguiu responder, e o orc continuou como se já esperasse isso.
— É o fogo dentro de você. Você estava vazio quando o conheci. Mas agora, não mais. O fogo ainda não é grande o suficiente para controlar o metal… Mas é melhor do que nada.
Khubaru girou a mão, e as chamas se acenderam novamente. Mas, desta vez, eram muito pequenas, tão frágeis que um espirro as apagaria. No entanto, quando um boneco de terra surgiu do chão e começou a alimentar o fogo com galhos, toras cortadas e ventilando-o, as chamas mudaram. O fogo fraco desapareceu, crescendo até se tornar uma chama poderosa.
— Não sei como começar um fogo quando não há nenhum, mas existem muitas maneiras de aumentá-lo. Você pode pegar galhos do chão e alimentá-los ao fogo, criar toras de madeira ou até mesmo abaná-lo. E para fazer tudo isso… Você precisa agir.
— Não fique parado hesitando. Aja antes que seu fogo se apague para que você não se arrependa.
Khubaru olhou para Airen por um momento e depois foi embora. O silêncio caiu no local. Lulu e Airen refletiram sobre o que o orc Elementalista acabara de lhes dizer.
“Sou diferente de quem era cinco anos atrás…”
Pensando bem, Airen realmente não tinha nada dentro de si no passado, como Khubaru disse. Ele desejava encontrar sua esgrima, mas não fazia ideia de qual caminho seguir. Lulu já o repreendera por isso, dizendo que um esforço sem direção não era nada. Era um esforço inútil. E agora?
“Sou exatamente o oposto do meu passado.”
Airen percebeu, no momento em que Khubaru falou sobre o fogo em seu coração, que isso dizia respeito à sua decisão. Seu coração queimava com o desejo de seguir Illia Lindsay, Brett Lloyd e Judith e explorar o mundo.
Isso era muito melhor do que há cinco anos, quando ele não sabia para onde ir. Desta vez, só precisava agir. Então, ele decidiu.
“Vamos nos mover antes que este calor esfrie.”
— Já me decidi — disse Airen para Lulu, que estava em seu colo.
— É mesmo? O que vai ser?
— Vou partir em uma jornada.
— Ótimo. Vou torcer por você.
A gata feiticeira respondeu casualmente. Já esperava isso, pois Airen nunca foi do tipo que fica parado. Se tivesse a vontade de fazer algo, certamente colocaria isso em prática. Claro, muitas pessoas não conseguiam fazer algo tão óbvio, tornando a palavra ‘esforço’ mais valiosa.
“Você está se esforçando, Airen.”
Lulu olhou para Airen, que fazia o melhor para seguir em frente. Então, subiu em seu ombro e deu tapinhas em sua cabeça.
— Vou torcer por você. Sempre. Vou te acompanhar onde quer que vá — disse Lulu.
— Uma aventura pelo continente, ótima ideia — disse uma voz.
— Nada aquece mais o coração de um jovem do que uma aventura em um mundo maior. É uma escolha excelente para manter a chama acesa. Eu, Khubaru, também estarei torcendo por você.
— Você ainda não foi embora? — perguntou Lulu, surpresa.
Mas era assim que deveria ser. Um personagem misterioso aparecendo do nada, dando conselhos perfeitos e desaparecendo depois era algo muito estereotipado para um oráculo. Por que ele voltou?
— Hã? Só fui dar uma mijada…
— O que está acontecendo? O que deu em você? Hmph… De qualquer forma, o que quero dizer é… Você me deixaria acompanhá-lo na sua jornada? — Khubaru perguntou.
— O quê? — respondeu Airen.
— Dá para ver que será sua primeira vez em uma longa viagem. Acho que posso ser útil. Posso cuidar de várias tarefas pequenas durante a jornada se você me pagar um pouco… O que acha?
Desta vez, Airen ficou frustrado. Eles mal haviam se conhecido, e Khubaru já queria se juntar a eles. Airen jamais faria algo assim, pois era muito tímido.
Mas Lulu não parecia se importar com isso. Em vez disso, questionou o orc sobre outra questão.
— Está tentando ser nosso guia? Quão bom você é? — Lulu perguntou.
— Hmm?
— Somos uma equipe incrível! Temos a mim, Lulu, a melhor feiticeira gata do continente, e Airen Farreira, o espadachim genial com um potencial insondável! Você deve ser um guia incrível para se juntar à nossa equipe. Consegue fazer isso?
— Não acho que você vai achar facilmente um guia que também seja oráculo e…
— Não precisamos mais de adivinhações!
Tap, tap!
Lulu bateu na mesa novamente. Claro, não conseguiu fazer muito barulho, por mais que tentasse. Mas sua intenção foi bem recebida, e Khubaru ficou sério.
— Não quero me gabar, mas viajei pelo continente por mais de dez anos. Conheço os caminhos e posso ensinar as culturas de cada região, suas características únicas, culinárias específicas e muito mais.
— Hmm. — Lulu parecia cética.
— Sabia que cidades grandes têm lojas para animais?
— Sério? — perguntou Lulu, com olhos brilhando. Parecia igual ao momento em que viu o pó da fruta Taihoi pela primeira vez, e Khubaru contou sua história com uma expressão honesta.
— Claro, é real. Embora sejam para animais de estimação… Acho que você encontrará algo que possa aproveitar lá. Pode achar comida preparada não para humanos, mas para gatos. Ou conseguir a escova mágica que tira os pelos mortos com facilidade…
— Oh… Ooooh…!
A gata então rapidamente virou a cabeça para Airen. Seus olhos brilharam, e ela já não era mais uma entrevistadora severa.
— O que acha, Airen? — Lulu perguntou.
— Você pode decidir depois — disse Khubaru, mas parecia querer se juntar a eles.
“Ele é só intrometido ou achou que eu sou interessante?” Airen pensou.
Ele não tinha ideia. Mas o importante era que os conselhos de Khubaru foram de grande ajuda para ele. Ele precisava agir para criar um fogo maior, mas não precisava fazer isso sozinho. Aprendera isso há muito tempo. Só chegou até ali por causa das pessoas ao seu redor.
E, nesse sentido, talvez não fosse uma má escolha levar o orc elementalista na jornada.
— Certo. Você pode se juntar a nós — disse Airen.
— Haha! Legal! Uma renda estável, aqui vou eu!
— Oh… Mas não pedi para me juntar a vocês por dinheiro. É só bom assistir a um jovem crescer de perto. E é melhor ainda se eu puder ajudar…
— Não vamos te pagar se você não fizer um bom trabalho! E tem que nos levar à loja que mencionou! — a gata avisou o orc.
Khubaru riu e tentou dar um tapinha na cabeça de Lulu.
— Não se preocupe… Ai!
— Não toque na minha cabeça! — gritou Lulu.
O orc falhou em sua tentativa. E foi assim que Airen Farreira deu boas-vindas a um novo integrante em sua jornada.
Poucos dias depois, Airen chegou em casa e imediatamente contou aos pais o que havia decidido. Ele fez isso porque prolongar a conversa poderia fazê-lo hesitar.
Harun Farreira assentiu calmamente, como se já esperasse.
— Sabia que você iria partir. Achei que se tornaria um aprendiz formal na Academia de Esgrima Krono… Mas acho que é uma ótima escolha aventurar-se pelo mundo para vivenciar mais coisas.
O barão falou tentando se manter calmo. Uma parte dele queria impedir Airen de partir, pois desejava passar mais tempo com o filho, que finalmente superara o trauma e se tornara um jovem extraordinário. Mas o que mais desejava era que Airen se tornasse um homem ainda melhor.
“Ele já se tornou incrível o suficiente para o Capitão Tenente dos Cavaleiros do Crepúsculo reconhecê-lo, mas lhe falta perspectiva por ter ficado confinado em casa.”
E, nesse sentido, ele precisava apoiar a decisão do filho.
Amelia Farreira também abraçou o filho para incentivá-lo. E Kiril Farreira deu a ele um conselho peculiar.
— Airen, não ande por aí com essa cara de bobo, tá?
— Kiril. Eu já não sou tão ruim assim. Você não precisa se preocupar comigo. Mas obrigado.
— Eu não estou preocupada com você.
— Hã?
— Estou preocupada com as outras pessoas.
Kiril começou a explicar enquanto meditava no topo da torre de bolinhas de gude. Uma pessoa poderosa seria notada, mas seu irmão não parecia assim de jeito nenhum. Isso só faria os outros implicarem com ele, o que inevitavelmente criaria inúmeras vítimas em possíveis conflitos.
— O que acha, Lulu? Não faz sentido? — Kiril perguntou.
— Faz sim. Você sempre está certa, Kiril.
— Ótimo. Você deveria sempre concordar comigo desse jeito.
— Claro. Nada do que você diz está errado.
Airen observou as duas conversando, atônito, e então assentiu. Ela estava certa. Ele quase se meteu em uma briga em Alcantra também. Achou que deveria, pelo menos, tentar parecer mais forte, mas não sabia como. Decidiu deixar isso para depois.
“Vou pensar nisso quando partir. Por enquanto, vou me concentrar na minha família.”
Airen ficaria longe de casa por alguns meses, um ano ou talvez mais. Precisava deixar esses pensamentos de lado e focar na família. E assim, passou as duas semanas mais felizes em casa, o que lhe permitiu partir com menos peso no coração.
— Adeus a todos — Airen despediu-se de sua família.
— Fique em segurança, meu filho — disse o barão.
— Mantenha-se saudável! — disse Amelia.
— Não se esqueça de me trazer um presente quando voltar! — disse Kiril.
Airen partiu enquanto sua família se despedia. Ele não olhou para trás, pois sabia que isso o faria chorar. Forçou os pés, que pareciam grudados no chão, a se moverem. E enquanto caminhava pela rua vazia naquela manhã, sentiu uma mistura de empolgação e incerteza.
Logo, chegou ao local onde havia combinado de se encontrar com Khubaru. O orc não parecia muito diferente. Não tinha muito o que preparar, já que já vivia como nômade.
Mas a gata feiticeira apareceu, com uma aparência muito além do que Airen esperava.
— Lulu? — disse Airen.
— O que… aconteceu com você? — disse Khubaru.
Ambos olharam, perplexos, para Lulu, que agora havia se transformado em um gigante de dois metros e quarenta.