Uma modesta festa de despedida foi organizada em Drukali para Airen Farreira, Illia Lindsay e Lulu antes de sua partida.
Ou talvez a palavra ‘modesta’ não fosse a mais adequada. Apesar de apenas seis pessoas estarem presentes, cada uma era notável por si só.
“Achei que Khubaru com certeza viria… mas não esperava que Tarakhan, Karakhum e Gurgar também participassem…” pensou Airen, um pouco surpreso pelos três anciãos, que não haviam comparecido à despedida de Judith e Brett, estarem presentes.
Claro, isso não o incomodava de forma alguma. Gurgar era um espírito gentil, enquanto Tarakhan e Karakhum se tornaram mais familiares para ele após os dois meses que passaram juntos. Illia, porém, talvez achasse a situação desconfortável, dado o quanto era tímida.
Plop!
— Uma festa de despedida não é festa sem bebidas.
— Vamos beber tudo? — perguntou Airen, antes de corrigir-se silenciosamente ao olhar para a pilha de garrafas decorando a mesa. Ele não precisava se preocupar com a possibilidade de sobrar bebida.
— Bem, é uma pena que Brett não esteja aqui, mas por que não pegamos cada um uma garrafa? Ah, suponho que vocês precisem de copos? Um segundo…
Os pais, filhos e Gurgar entregaram-se ao prazer de beber o licor diretamente da garrafa, comentando com refinamento sobre o sabor.
— Hmm, divino como sempre. Gosto do sabor picante e do leve toque de cereja preenchendo minha boca.
— Eu também gosto do aroma ligeiramente amargo. Gostaria de outra garrafa, pai?
— Claro. Além disso, vocês deviam servir essas mais vezes, se as têm.
— Posso ser um chefe tribal, mas não sou rico o suficiente para beber isso todos os dias.
— Khubaru, dê uma garrafa para este velho. Essa é a vantagem de estar morto. Não preciso me preocupar com minha saúde — comentou Gurgar.
— Acho difícil acompanhar essa piada… — murmurou Khubaru.
— O quê? Isso também me faz querer uma! — exclamou Lulu, enquanto os orcs elogiavam as bebidas. Ela pulou, transformou-se e convenceu Khubaru a dar-lhe um pouco. Lulu bebeu três copos seguidos, sem hesitar.
— Ugh, sinto isso. Sinto mesmo — murmurou Lulu.
Claro, Lulu não durou muito. Rapidamente retornando à forma de gata, adormeceu nos braços de Airen.
— Acho que… isso também é tudo para mim… — murmurou Airen.
— Haha, já? Achei que você aguentava bem, pela última vez. Acho que é mais fraco do que parece…
Illia soltou um palavrão.
A próxima a cair foi Illia Lindsay. Embora ela pudesse beber mais do que Judith, não se comparava aos quatro orcs, que bebiam como monstros.
— Boa noite — disse ela, como se não tivesse acabado de xingar. Após uma reverência respeitosa, retornou aos seus aposentos.
Felizmente, ainda conseguia andar em linha reta. Olhando carinhosamente para sua amiga agora indefesa, Airen tomou um gole de sua bebida antes de se voltar para Khubaru, os olhos ligeiramente vidrados.
“O que eu estaria fazendo se nunca tivesse conhecido Khubaru?” refletiu.
Ele realmente não queria pensar nisso. Para Airen, Khubaru era mais do que um mentor. Ele era o salvador do jovem. Foi Khubaru quem lhe disse para acender o fogo interior. Foi Khubaru quem deu os conselhos que ajudaram a alimentar esse fogo. Além disso, foi em Drukali que ele finalmente recuperou as ilusórias memórias de sua vida passada, que sempre o intrigaram. Não seria exagero dizer que ele devia 80% de seu sucesso atual a esse excêntrico oráculo.
Ao rememorar sua jornada, quase deixou escapar algumas lágrimas. Sentindo-se embriagado pelas emoções, procurou expressar sua gratidão. Mas perdeu sua chance quando Khubaru, que o observava em silêncio, disse calmamente. — Obrigado.
— Honestamente, eu não estava tentando fazer muito quando me aproximei de você pela primeira vez. Só estava sendo um velho. Talvez a solidão de vagar longe de casa por mais de vinte anos estivesse me afetando. Agi por impulso, vendo como você era um pouco diferente dos outros. Talvez eu estivesse orgulhoso, pensando que deveria guiar um jovem como seu ancião — disse Khubaru.
— Orgulhoso? De forma alguma. É como você disse. Se não fosse por você, eu ainda estaria perdido, sem saber o que fazer — protestou Airen.
— Não, isso não é verdade. Tudo que fiz foi dizer algumas palavras que qualquer um poderia ter dito. Não há nada de especial em dar conselhos. O que merece elogios é entender o conselho e agir sobre ele.
— Curiosamente, foi você… quem me ajudou e deu a lição difícil, não o contrário… — murmurou Khubaru, fechando os olhos e recordando sua jornada.
— Foi graças a você… que finalmente encontrei meu caminho após dezessete anos… — disse Khubaru.
Ele percebeu pela primeira vez o dom de Airen nas Montanhas Alhaad. Embora já reconhecesse Airen como um bom homem, foi naquele momento que ele observou o jovem não apenas abrigar pensamentos virtuosos dentro de si, mas também se esforçar ativamente para compartilhar sua bondade com o mundo. Os olhos de Airen brilhavam enquanto ele buscava o melhor caminho, fazendo perguntas que outros poderiam zombar.
Mas isso não foi tudo. Airen tornou-se mais forte e mais apaixonado. Esse jovem humano não recuou nem mesmo diante de um monstro de pessoa como Ignet, nem se abalou diante da campeã da Terra da Provação.
Se ele conseguiria ou não não importava. Com seu coração de ouro e coragem para agir pelo bem… Airen buscava alcançar milagres. Ele não fugiu nem se afastou, não importava o quão difíceis as coisas se tornassem.
— É graças a você… que eu finalmente pude encontrar o meu caminho após dezessete anos… — disse Khubaru.
— Mesmo antes de descobrir sobre sua vida passada ou estabelecer sua crença… você era um herói para mim.
Khubaru suspirou. Airen achou que sentiu cheiro de álcool. No entanto, Khubaru não estava intoxicado de forma alguma. Com a mente ainda clara, Khubaru olhou para Airen com sinceridade e ajustou sua posição para fazer uma profunda reverência.
— O-o quê… — murmurou Airen, chocado, olhando para Khubaru em confusão.
Mas isso não foi tudo.
— Obrigado. Muito obrigado — disse Gurgar, o adivinho, enquanto também se curvava.
— Obrigado por trazer meu irmão de volta — disse Tarakhan, o chefe da tribo Drukali, ao fazer o mesmo.
Até mesmo Karakhum, o maior guerreiro dos orcs, que vinha bebendo em silêncio durante a festa, ajoelhou-se e fez uma reverência.
— Obrigado, jovem herói — disse ele, tão sério quanto sempre.
— Obrigado por tirar o peso da minha vida, por me ajudar a ver meu filho novamente… Obrigado do fundo do meu coração — disse Karakhum, abaixando a cabeça, seus olhos se enchendo de lágrimas.
Foi uma lágrima, não de um antigo chefe ou de um grande guerreiro, mas de um pai.
Dominado por suas emoções, Airen também derramou uma lágrima.
Fazendo uma reverência no estilo tradicional dos orcs, Airen prometeu. — Farei o meu melhor… para ser um herói, não apenas para Khubaru, mas para todos os outros.
No dia seguinte, Airen Farreira e sua comitiva deixaram o castelo de Drukali após um almoço antecipado. Embora Lulu e Illia estivessem um pouco de ressaca, o grupo se preparou para a viagem sem problemas, graças a um dos guerreiros orcs que ajudou com algumas tarefas.
— Este é o mais longe que posso ir. Cuidem-se — disse ele ao se despedir.
Claro, Airen não podia esperar que ele ajudasse o caminho todo. O guerreiro orc deixou o grupo em uma cidade adequada antes de retornar a Drukali com sua carruagem.
Mas os três ficaram sozinhos apenas por um momento.
— Ora, prazer em conhecê-los! É uma honra trabalhar com pessoas tão nobres! — cumprimentou o cocheiro que Airen e seus amigos haviam acabado de contratar.
Eles não tinham outra escolha. Até agora, Khubaru estava encarregado de tudo. Em outras palavras, Airen, Illia e Lulu não sobreviveriam sozinhos durante a jornada.
— Estou avisando só para garantir, mas contratem alguém em vez de tentar fazer tudo sozinhos. Vocês vão se sair muito melhor —havia advertido Khubaru.
Airen, Illia e Lulu assentiram obedientemente, sabendo que não seriam capazes de lidar com acampamentos sozinhos.
E assim, o grupo de três tornou-se um grupo de quatro. Airen Farreira e seus amigos partiram novamente em sua jornada, admirando as habilidades do cocheiro que haviam contratado.
No entanto, não tinham ideia de como pareciam ingênuos sendo jovens nobres que davam gorjetas generosas. Tampouco sabiam quantos vigaristas esperavam por presas tão inocentes.
“Cara, dei a sorte grande”, pensou Johnson, o cocheiro e líder de uma gangue de ladrões, enquanto conduzia a carruagem.
Até aquela manhã, nunca imaginara que encontraria jovens aparentemente ricos e claramente inexperientes em uma cidade remota no noroeste. Também nunca pensara que visaria alvos como aqueles.
Mas hoje era o dia de sorte dele. Tudo o que precisava fazer agora era acampar perto de sua base e esperar seus homens aparecerem no horário combinado. Sendo uma pessoa ‘generosa’, planejava ao menos deixar algum trocado para que eles pudessem voltar para casa.
“Seria mais seguro me livrar deles, mas são muito jovens…” pensou Johnson.
Por mais implacável que fosse, não era cruel o suficiente para tirar a vida de pessoas tão jovens. Planejava apenas ensinar-lhes quão assustador o mundo poderia ser.
Mal sabia ele que o ingênuo naquela situação era ele mesmo.
Ao entardecer, Johnson começou a questionar seus próprios olhos.
Clang!
Slash!
— Airen, você acha que isso é suficiente? — perguntou uma jovem nobre enquanto trazia lenha.
Mas a forma como ela coletava lenha não era normal. Em vez de pegar galhos caídos no chão, cortava uma árvore robusta, que até um machado teria dificuldade em derrubar, com poucos golpes de sua espada.
E isso não era tudo.
— Está muito grosso. Madeira verde não queima tão fácil, sabia? Jogue um pedaço para mim — convidou o jovem nobre.
— Certo.
Swish!
Slice!
— Acho que agora está fino o suficiente!
— Ah, entendi.
Johnson piscou estupidamente enquanto observava o jovem cortar a madeira em trinta e duas partes no ar.
Então, Lulu, a gata feiticeira, que dormia na bolsa de Airen, jogou uma bola de fogo.
Cshhh!
— Viu isso? Eu também consigo usar os elementos! — gabou-se Lulu.
— Isso foi só feitiçaria — repreendeu Airen.
— Ahhh… Eu também queria aprender a usar os elementos.
— Não disse que não se importava com os elementos antes?
— Sim, mas ficou mais divertido quanto mais aprendi sobre eles. Estou triste por não poder estudar mais…
“O que é isso? Estou sonhando?” pensou Johnson, o cocheiro e líder dos ladrões, atordoado.
Embora tanto a jovem que cortou a enorme árvore quanto o jovem que dividiu a madeira em pequenos pedaços o surpreendessem, o que mais o chocava era a gata que invocava fogo com as patas e falava como um humano.
“O que é isso? Que mundo é este?”
A cabeça de Johnson parecia girar enquanto tentava discernir se estava sonhando ou não.
As coisas logo pioraram.
— O que temos aqui? Uma carruagem chique no meio de uma estrada deserta…? — zombou um ladrão.
— Oh, céus! Jovens nobres? Parecem tão elegantes… e ricos — comentou outro.
— Que tal compartilharem um pouco conosco? Somos tão pobres.
“Não…! Não, seus idiotas!” pensou Johnson, despertando de seu transe.
Isso não podia acontecer. Se tentassem roubar aquele monstruoso trio, certamente encontrariam seu fim. No mínimo, perderiam suas vidas. No pior cenário, talvez aquela gata preta estranha os amaldiçoasse para que não pudessem nem viver nem morrer.
Jogando fora o que estava cozinhando, Johnson bloqueou desesperadamente seus homens. Pegando um punhal do cinto, gritou — Saiam daqui agora, seus desgraçados!
Os ladrões o encararam confusos.
Afinal, foi Johnson quem os trouxe até a presa. Agora, ele lhes dizia para ir embora. Sem entender a situação, um dos ladrões deu um passo à frente, rindo como se Johnson estivesse apenas brincando.
— Oi, chefe. Está se achando durão, hein… — zombou.
Smash!
— Durão o caramba! Sumam daqui! — gritou Johnson.
— C-c-c-chefe?
Smash!
— Chefe? Nunca vi vocês antes! Chega dessa besteira!
— E-espere. John…
Crack!
Smash!
Smash!
— Ugh…
— Sumam agora ou eu acabo com vocês! — avisou Johnson após deixar um dos ladrões inconsciente com chutes e golpes com o lado cego do punhal.
Finalmente, os ladrões notaram a seriedade nos olhos injetados de sangue de Johnson. Pegaram o colega e fugiram correndo.
— Já disse para sumirem daqui! — gritou novamente.
Os ladrões desapareceram rapidamente.
Ofegante, Johnson respirava com dificuldade. Embora não tivesse feito muito, sentia-se exausto. Seu coração acelerava com o pensamento de que poderia ter morrido ali mesmo.
Claro, a situação estava longe de terminar. Talvez seus contratantes, percebendo que algo estava errado, tentassem interrogá-lo.
Não, eles já pareciam ter decidido.
“Droga!” pensou Johnson, enquanto o loiro e a jovem de cabelos prateados se entreolhavam antes de caminhar em sua direção.
Ambos estavam inexpressivos. Ao observar os dois espadachins se aproximando, Johnson sentiu como se uma enorme muralha estivesse se fechando sobre ele. Ofegava mais forte. Talvez realmente fosse o fim.
Mas logo percebeu que estava enganado.
— Obrigado, Sr. Johnson — disse Airen.
— Sinceramente, imaginar que não só nos ofereceu uma carona como também enfrentou um grupo de ladrões… Nunca vi alguém tão virtuoso — disse Illia.
Ambos pareciam tocados, especialmente Illia. Para a jovem, que passou a vida sendo alvo de falatórios e zombarias, ver alguém demonstrar tanta bondade era revigorante, ou assim pensava ela.
— Obrigado, Johnson! Continue cuidando de nós! — disse Lulu.
Johnson, ainda confuso, viu a gata preta derramar tesouros em sua cabeça.
Logo recobrou os sentidos. Olhando para os três ratos dourados em sua mão, anunciou.
— Eu, Johnson, servirei lealmente a vocês a partir de agora!