A noroeste de Alcantra, a maior cidade dos espadachins no continente central, estendia-se um grande lago. Rico em peixes e livre de monstros, ele atraía muitos pescadores, especialmente nos últimos tempos. Nobres e mercadores ricos sentavam-se com suas varas de pesca, aproveitando o clima primaveril de abril, sem serem incomodados por nada além de…
Splash! Splash!
— Whoa! Isso é tão divertido! Kiril, olha pra mim! Eu acabei de pescar um peixe!
— Sério? Ah, você conseguiu.
Era Lulu, a gata feiticeira. A felina costumava viver nas costas orientais do continente, mas isso já fazia muito tempo. Ela não gostava de se molhar na água salgada do mar. No entanto, aquele lago cristalino era do seu agrado.
Usando o tubo que Kiril fez para ela, Lulu deslizava pelo lago, espirrando água e, às vezes, mergulhando para pegar peixes. Para os pescadores, era um desastre. No entanto, ninguém se sentiu ofendido. Em vez disso, seus olhos se arregalaram, como se estivessem diante de um milagre, e logo tentaram interagir com a gata.
— O-Olha só isso! Olha essa gata! — exclamavam.
— Uau! Uma gata que fala…?
— Agora entendo. Deve ser a gata feiticeira que dizem estar viajando pelo continente.
— Que estranho! Uma gata que gosta de água?
— Haha! Eu sou uma gata da água! — gritou Lulu de dentro do tubo.
Achando a gata tanto misteriosa quanto adorável, os pescadores esqueceram dos peixes e passaram a observá-la.
Kiril assistiu à cena com carinho antes de voltar para suas próprias tarefas. Decidiu que era hora de invocar algo que pudesse usar na água.
“Não quero um Kraken… Talvez uma tartaruga? Ou um golfinho?”, pensou enquanto caminhava ao redor do lago.
Com seus cabelos loiros brilhando sob o sol do meio-dia e refletindo sobre o lago azul, parecia uma pintura. Mesmo entre os membros da família Farreira, que eram todos belos, ela se destacava. Assim, os jovens ao redor do lago passaram a focar nela em vez da gata. Alguns idosos riram enquanto observavam a cena.
Um pouco mais afastado, um jovem estava em uma área deserta, longe dos pescadores e dos piqueniques. Ele desferia golpes ferozes contra o lago.
Zap!
Boom!
— Ah!
— O quê…
As pessoas que observavam Lulu e Kiril olharam ao redor, chocadas, ao ver a água se erguer com um estrondo. Engoliram em seco ao ver Airen Farreira segurando sua espada larga dourada diante do lago agitado. Alguns guardas começaram a murmurar.
— Isso é insano…
— Esse é ele, certo? O famoso…
— Sim. É Airen Farreira. Ouvi dizer que ele se tornou um mestre da espada no ano passado… Não sabia que era verdade.
— Eu sei. Ele tem pouco mais de vinte anos. Não está avançando mais rápido que o Diretor Ian?
— Ele está. Claro, não há garantia de que ele se tornará um espadachim melhor só porque se tornou um mestre cedo…
Ainda surpreso, um dos homens murmurou — Acho que é possível…
— O que quer dizer? — perguntou seu colega.
— Ele pode se tornar o mais poderoso do continente.
— Hmph, acho que você está se precipitando…
Mas o colega parou. Pensando bem, ele não tinha um bom motivo para discordar. Afinal, quem se tornou mestre da espada mais rápido que Airen Farreira? Ele só conseguia pensar em dois nomes: Ignet Crecensia e Illia Lindsay. Airen já havia derrotado uma delas. Claro, Illia era três anos mais nova que ele. Mas era evidente que Airen tinha talento para estar entre os melhores da nova geração. Isso fez com que reconsiderassem o que estavam presenciando.
“Talvez eu esteja vendo o melhor espadachim do futuro em treinamento!”, pensaram, entusiasmados.
Cheios de expectativa, desviaram os olhos de Kiril e passaram a observar Airen, esperando ver algo espetacular. Mas não receberam nada.
Dez, vinte, trinta minutos se passaram. O espadachim dourado permaneceu imóvel, de olhos fechados, em meditação.
— Isso também faz parte do treinamento…? — perguntou um dos guardas.
— Imagino que sim. Como poderíamos compreender os pensamentos de um mestre? — respondeu seu colega.
— Acho que é verdade.
Perdendo o interesse, os guardas voltaram a observar Kiril, ocasionalmente desviando os olhos para Lulu quando ela fazia algum truque.
Enquanto Airen permanecia ali, livre da atenção das pessoas, o Diretor Ian se aproximou.
— Não está indo bem? — perguntou Ian.
— Diretor, hum… — murmurou Airen.
— Não é surpresa. Isso não é uma tarefa fácil, você sabe.
Murmurando que seria impossível realizar aquilo em apenas alguns dias, o diretor caminhou até o lago.
As cabeças das pessoas se viraram novamente. Embora fossem de Alcantra, raramente viam o diretor de Krono, pois Ian quase nunca saía. Claro, mesmo que tivessem a oportunidade de vê-lo com frequência, ainda ficariam intrigados. Afinal, estavam diante de um dos três maiores espadachins da atualidade.
Infelizmente, o homem do século não atendeu às suas expectativas.
Splat!
Nem lento nem rápido. Aqueles que entendiam muito sobre espadas poderiam admirar o movimento impecável de Ian, mas os visitantes do lago eram apenas gente comum. Tudo o que viram foi a espada de Ian batendo na superfície da água de maneira frouxa.
Por um momento, esperaram que algo impressionante acontecesse. Logo, desistiram. Curiosos, inclinaram a cabeça e voltaram seus olhares para outro lado.
Airen estava tão confuso quanto eles. O movimento de Ian era, de fato, impressionante. Como espadachim experiente, ele conseguia perceber que o movimento do diretor era poderoso, ainda que não feroz. Era possível ver as décadas de experiência embutidas nele.
No entanto, aquela não era a mesma lâmina que cortou o lago uma semana atrás…
— Como eu disse, nada mudou. Cortei exatamente a mesma coisa — disse Ian.
— Não precisa se angustiar se não entender. Treine com calma… Estarei ausente por alguns dias.
— Entendido, senhor… — respondeu Airen.
Ian não parecia concordar.
Observando o diretor partir após lhe mostrar o mesmo movimento e repetir as mesmas palavras, Airen fechou os olhos. Ele ainda conseguia se lembrar claramente da postura de Ian, de sua respiração, aura e de todo o movimento. No entanto, não conseguia reproduzi-lo.
Sentindo-se frustrado, Airen suspirou.
“Ele podia pelo menos me dar mais pistas”, pensou com um toque de amargura.
Por mais que desejasse desesperadamente perguntar a Ian, não o fez, sentindo que o diretor tinha um motivo para permanecer em silêncio. Não queria estragar seu ensino por pura impaciência.
“Ele deve ter uma razão para me mostrar esse movimento todos os dias”, refletiu Airen, recordando-se não do que havia visto na semana passada, mas do que presenciara há instantes.
Por ora, ele não conseguia compreender. Pelo que sabia, Ian apenas mergulhara a espada na água. A mente de Airen lutava contra esse mistério.
Ainda assim, ele não tinha escolha se quisesse se juntar ao grupo de expedição dentro de um ano. Se queria derrotar os demônios, incluindo o bufão, precisava se tornar mais forte.
Woosh…
Boom!
Sua espada ressoou conforme sua determinação crescia. Sua aura golpeou a água novamente. Mas a água não se partiu. Airen suspirou, sentindo o calor da frustração.
Deixando o lago para trás, Ian seguiu seu caminho. Ele não estava correndo. A um olhar passageiro, caminhava como qualquer outro idoso. Mas sua velocidade era extraordinária.
O sol nasceu e se pôs. Quatro dias se passaram.
Finalmente retomando a consciência, Ian parou diante de um riacho e ergueu sua espada.
Splat!
Chua!
A água se partiu novamente, como se o tempo em si tivesse parado. Mas, é claro, logo voltou a se unir e fluir.
Ian se preparou para golpear mais uma vez, mas então embainhou sua espada.
— Eu sou quem está sendo impaciente — murmurou.
Airen era um bom aluno. Gentil, talentoso e paciente. Era muito mais talentoso do que Ian fora aos vinte e três anos. No entanto, ainda não conseguia aprender a espada da água. Normalmente, só a dominaria após mais uma década ou mais de treino.
Mas…
“Não sei se ainda estarei vivo até lá”, pensou Ian, sentando-se de pernas cruzadas sobre uma rocha e fechando os olhos.
A ansiedade atormentava sua mente, e ele sabia o motivo. O Reino Sagrado havia lhe enviado um aviso sobre o ressurgimento dos demônios.
“O que será do continente depois que eu morrer?”
Alguns poderiam considerá-lo arrogante, mas Ian tinha certeza de que, enquanto vivesse, poderia proteger o continente de qualquer demônio. E sabia que Julius Hule pensava da mesma forma. Julius fazia Ian sentir-se seguro.
No entanto, Ian sabia que tanto ele quanto Julius estavam velhos. Quincy Myers, a arma secreta do Reino Sagrado, poderia morrer a qualquer momento. Karakhum, o maior guerreiro orc, provavelmente também não tinha muito tempo de vida, pois os orcs tinham uma expectativa de vida um pouco menor. Os três chefes do Reino Runetell já haviam passado dos oitenta anos.
“No fim, o continente perderá metade de suas forças em quinze anos ou menos…”
Era por isso que Ian estava tão determinado a cultivar novos discípulos. Felizmente, havia muitos jovens talentosos no continente atualmente, como Ignet, Illia e Airen. Ian acreditava que até mesmo Brett não ficava atrás deles. Khun também parecia ter visto o mesmo potencial em Judith.
Mas eles não tinham tempo suficiente. E se a geração mais velha morresse antes que os jovens se tornassem poderosos o bastante? E se os demônios despertassem antes disso? O continente conseguiria manter a paz que perdurava há 150 anos?
“Mas isso está acontecendo rápido demais…”
Ian balançou a cabeça. O que era impossível, era impossível. Ele próprio precisara de mais de trinta anos de treinamento para aprender a espada da água. Mesmo agora, ainda precisava se esforçar. Um momento de hesitação ou impaciência poderia entorpecer sua lâmina e destruir seu corpo e mente.
Inspirando profundamente, Ian tentou acalmar sua mente turbulenta.
Mas sua paz foi interrompida.
Slash!
Ian abriu os olhos diante de um ataque feroz. Ele sacou sua espada. Um demônio? Não, isso não era um simples demônio. Um diabo? Também não. Por mais terríveis que fossem, Ian conhecia apenas uma pessoa capaz de encurralá-lo assim.
Bam!
O espadachim finalmente emergiu, pisando no chão com força.
Ao ver Khun avançando contra ele com fúria, Ian riu.
Que ótimo momento para isso!
Sentindo a ferocidade de Khun, Ian ergueu sua espada.