— Você acha que ele está bem?
— Hmm… O que poderia acontecer?
— Mas não é estranho? Como alguém pode não sair de casa nem uma vez? E quanto às refeições?
— Ele provavelmente sai de madrugada ou à noite.
— Isso não é ainda mais preocupante? Ouvi dizer que vêm sons estranhos de lá, e se acontecer alguma coisa…
— Sons estranhos?
— Parece o som de alguém balançando uma espada. Pelo menos é o que as crianças disseram.
— Meus filhos disseram a mesma coisa.
— Devíamos dizer a eles para não irem perto daquele lugar…
— Hmm… — O chefe franziu a testa ao ouvir as preocupações dos aldeões.
A pessoa em questão era um jovem de cabelos loiros, um forasteiro que chegara à vila cerca de um mês antes. Ele pediu educadamente, mas com um semblante sombrio, por um lugar para ficar, e o chefe lhe emprestou a casa de um velho que havia falecido um ano antes. Não pediu nada em troca.
“Afinal, todos nós estamos lutando para sobreviver neste mundo.”
Atualmente, as guerras entre reinos não davam trégua. Conflitos frequentes entre os poderosos surgiam, e as notícias de demônios aproveitando o caos eram comuns. Monstros e criaturas demoníacas também vagavam em números nojentos. Então, quando um viajante com roupas esfarrapadas e uma história aparentemente triste apareceu em busca de ajuda, ele não teve coragem de pedir algo em troca.
“Não sei a dor que ele carrega no coração, mas espero que consiga se libertar dela e reencontrar sua força.” Esse era o desejo do chefe, um gesto que só um velho que viveu o bastante poderia oferecer a um jovem.
No entanto, parecia ser um sentimento só dele. Os demais, no geral, pareciam pensar diferente. Uma das mulheres que expressava preocupação falou novamente:
— Realmente não há nada que possamos fazer?
— Você está sugerindo que o expulsemos? — perguntou um lenhador.
— Não se trata de expulsá-lo… Ele não vai morar aqui para sempre, certo? Não vai se estabelecer em nossa vila, então até quando vamos deixá-lo assim? Sinceramente, mesmo que ele não tenha outro lugar para ir, já o abrigamos por um mês. Já é o suficiente, não é?
— Mas a casa estava vazia mesmo… Era só um lugar abandonado e sujo, então fazer tanto alarde por causa disso é…
— Acha que estou fazendo alarde porque quero? Porque não ganhei algumas moedas? — disse a mulher, exaltando-se. O lenhador recuou e calou-se. Seus olhos afiados e puxados encararam o homem, que se encolheu instintivamente.
Apesar do lenhador ter recuado, a mulher não suavizou sua expressão. Em vez disso, continuou dizendo o que pensava, como se quisesse despejar tudo que sentia.
— Sinceramente, eu estou preocupada. Não estou fazendo isso por maldade, mas tudo bem, vamos dizer que sim. Vamos dizer que sou uma pessoa ruim. E daí? Vamos dizer que sou eu quem quer friamente expulsar um jovem que passou por algum tipo de dificuldade por aí, vamos dizer que é isso. Mas se nossa vila não ficar mais segura depois que ele se for, então podem me culpar.
Ninguém disse nada.
— E se esse homem for um ladrão perigoso? E se fingir ser dócil, mas abrir o portão do curral à noite? E se um bando de ladrões invadir a vila? Aí, o que fazemos, hein?
— Bem, isso é um pouco exagerado…
— Exagerado?! Por acaso vocês aprenderam feitiçaria? Acham que só porque alguém parece bondoso, ele é? Não, mesmo que ele seja realmente uma boa pessoa, ainda pode ser perigoso. E se algum nobre canalha ou grupo de mercenários o quiser? Vocês vão ouvir a história dele e ajudá-lo só porque é o certo?
Mais uma vez, todos permaneceram em silêncio.
— Acordem, todos vocês! — gritou a mulher. — Apenas concordem comigo: foi errado abrigá-lo desde o início!
Mais um longo momento de silêncio tomou o ar. O lenhador, o chefe e alguns outros que sentiam simpatia pelo jovem permaneceram calados. No fim, a mulher estava certa.
Eles não sabiam que tipo de pessoa ele era. Podia ser alguém mal-intencionado, com segundas intenções, ou podia ser uma boa pessoa, mas perigosa. Mesmo que ele estivesse sendo injustamente acusado e estivesse fugindo, estariam preparados para ajudá-lo a resolver seus problemas e estender sua boa vontade?
Os aldeões se questionaram e balançaram a cabeça em silêncio. Começaram a pensar que o problema era o próprio jovem. Se ele tivesse sido mais amigável, se mostrasse qualquer intenção de interagir com eles, ou até mesmo um pouco de sinceridade, o clima não teria ficado tão amargo.
— Vamos discutir isso mais um pouco — disse com cautela um homem de meia-idade, quebrando o silêncio. Não era sua intenção refutar as palavras da mulher, na verdade, era o contrário. Quando o jovem apareceu, ele foi contra deixá-lo ficar. Simplesmente não gostava daquilo.
No entanto, queria esconder seus verdadeiros sentimentos o máximo possível. Não queria ser tão negativamente direto. Queria fingirque estava refletindo mais a respeito. Os outros pareciam compartilhar pensamentos parecidos. E assim, os aldeões reunidos começaram, lenta mas seguramente, a conduzir a conversa na direção de expulsar o jovem loiro.
Mas outro homem apareceu de repente, interrompendo a reunião.
— Vamos esperar mais um pouco.
Com seu olhar intenso, barba desgrenhada, corpo enorme e músculos saltados, a presença do homem encheu o ambiente. Muitas pessoas desviaram o olhar, claramente querendo evitar se envolver com ele. Era compreensível, o caçador era uma pessoa difícil de lidar de várias maneiras. Apenas encará-lo já era intimidador.
Claro, nem todos se sentiam assim. A mulher o encarou, com os olhos cheios de intensidade.
— Esperar por quê? — perguntou.
— Esperar para expulsá-lo.
— Por que deveríamos esperar? Já está decidido.
— Vamos ao menos conversar com ele antes de tomar uma decisão.
“Conversar…”
O caçador a interrompeu.
— Aqui.
O clima ficou ainda mais pesado. A mulher, pronta para retrucar, engoliu as palavras. O homem não a provocou mais. Em vez disso, olhou ao redor da sala, encarando cada pessoa. Então, com um tom de leve irritação, disse:
— Existe alguém aqui que nunca dependeu da boa vontade de outra pessoa? Nem uma vez?
Todos ficaram em silêncio de novo.
— Não pode haver. Não nesta vila — disse o caçador, em voz profunda.
Todos abaixaram o olhar. Ele não estava falando do fato óbvio de que os humanos são seres sociais. Cada morador daquela vila devia algo a alguém. Alcançaram alguma estabilidade por meio de boas vontades incondicionais. Num mundo cruel e implacável, conseguiram manter viva uma fagulha de esperança, pouco a pouco.
— Então vou agora — anunciou. — O Barão também concordaria.
Tendo dito o que queria, o caçador se virou sem olhar para trás. Enquanto caminhava rumo à casa do jovem loiro, memórias da pessoa que mais respeitava inundaram sua mente.
“Se não fosse pelo lorde, o que eu estaria fazendo agora?”
Talvez fizesse parte de um grupo mercenário envolvido em coisas ruins. Talvez fosse parte de um bando de ladrões, vivendo de forma irresponsável. Talvez estivesse morto. Seja como fosse, o caçador não seria tão feliz quanto era agora. Por isso, queria ver o jovem.
A boa vontade de outra pessoa o havia erguido. A salvação o alcançara no momento em que o choque de perder seu filho ameaçava consumi-lo. Ele odiava o mundo inteiro, e a nova felicidade que surgira por causa disso. O jovem loiro podia estar sentindo o mesmo. Então, assim como o Barão havia feito por ele, ele também espalharia sua boa vontade aos outros.
Pensar nisso fez o caçador se sentir bem, e ele queria ir até a casa do jovem o quanto antes. Queria ouvir tudo sobre seus problemas e dividir esse fardo pesado. No entanto, ao chegar, o caçador não conseguiu entrar.
O jovem abriu a porta, ficando cara a cara com o caçador. Seu rosto era estranho para o caçador, afinal, ele acabara de voltar de seu acampamento temporário nas áreas de caça. Só tinha ouvido falar da chegada do homem à vila, mas essa era a primeira vez que o via.
No entanto, o olhar dele era estranho. O caçador teve a sensação de já conhecê-lo há muito tempo. Não, além disso, sentia como se o jovem nutrisse algum tipo de hostilidade por ele. Era uma certeza.
Um medo avassalador caiu sobre o caçador. Sua mente ficou turva, como se algo quisesse esmagá-lo e despedaçar seus ossos.
— Por favor, vá embora.
Após um momento, o jovem desviou o olhar, e a pressão que o acompanhava se dissipou. Seus olhos fechados davam a ele um semblante melancólico e solitário, mas o caçador não teve tempo de notar isso. Encharcado de suor frio, afastou-se da casa com todas as forças, ofegando por ar.
Fez o máximo para acalmar seu coração acelerado.
“O que foi aquilo? Por que aquilo aconteceu?”
Não entendia. Não tinha feito nada para que o jovem o detestasse. A simples ideia de que um ser tão monstruoso se importaria com ele era incompreensível.
Não conseguia evitar aquele sentimento. Mas a verdade é que ele aindanão tinha feito nada que levasse o jovem a desgostá-lo. O caçador vivia preso ao passado distante.
No entanto, Airen não tinha escolha a não ser odiá-lo. Mesmo que certas coisas ainda não tivessem acontecido, ele não podia perdoar o caçador, não enquanto tudo ainda estava vívido em sua mente.
Airen ainda podia ver o momento em que o caçador apontava o machado para ele, o interrogava, o modo como virou as costas covardemente no momento final de seu benfeitor, após descobrir toda a verdade.
“O Feudo de Gasco…”
Finalmente, Airen percebeu onde estava. Engoliu seus sentimentos ao se lembrar de sua vida passada.
Quando partiu em sua jornada para salvar Ignet, Airen era movido apenas por ódio aos diabos. Com o tempo, esse sentimento foi mudando, e o alvo de sua raiva passou a ser os humanos.
Airen passou a se concentrar nos humanos com corações piores que os dos próprios diabos. Humanos que não retribuíam boa vontade com boa vontade. E não se tratava apenas das pessoas que feriram o jovem batedor de carteiras.
Ao continuar sua jornada, Airen presenciou coisas realmente horríveis: pessoas que vendiam seus próprios filhos por uma ninharia e ainda ficavam felizes com isso; pessoas que davam menos valor à vida humana do que a um pedaço de pão; pessoas que matavam por diversão. O mundo era muito mais sombrio do que ele jamais imaginara. Retornar boa vontade com boa vontade não era algo garantido. Era o mesmo em sua vida passada.
Karin Winker sacrificou sua família pelo bem de seu feudo. Apesar disso, seu povo o traiu. Ninguém que o respeitava permaneceu ao seu lado. Só se importavam em perder os cinquenta anos de segurança que tinham garantidos.
Esse fato atormentava Airen. Alimentava ainda mais sua raiva e tornava sua tristeza ainda mais profunda. Todo o esforço que ele havia colocado em seu mundo mental nos últimos anos começava a se dissolver.
Enquanto se perdia em seus pensamentos, ouviu passos se aproximando. Airen virou-se para a porta.
“Quem será? O caçador? Não. Não são os passos dele. Mas tanto faz.”
Realmente não importava quem fosse. Ele não deixaria ninguém entrar. Ninguém do Feudo de Gasco poderia entrar em sua casa, nem em seu coração, naquele momento.
Era isso o que ele pensava, pelo menos. No entanto, no instante em que viu o rosto da outra pessoa, Airen não teve escolha a não ser mudar de ideia.
— Karin Winker.
A versão jovem de Karin olhou para Airen com um sorriso suave.
— Você sabe meu nome? Deve ter ouvido pelos aldeões…