Levaram três dias para escalar a Torre do Orgulho, mas cruzar o Rio da Inveja levou apenas um dia. Já conquistar a Caverna da Luxúria, o Mar da Ira e a Fortaleza da Ganância levou uma semana no total.
“Quando escapamos da Fortaleza da Ganância, não achei que isso levaria tanto tempo…” pensou Illia Lindsay, com a expressão endurecida.
Vinte dias. Esse foi o tempo que perderam no Pântano da Preguiça, a última das sete regiões. Não foi porque os oponentes eram fortes ou porque ouviram falar dos outros Arquiduques que derrotaram um após o outro. Pelo contrário, o governante do Pântano da Preguiça não fez qualquer tentativa de resistir. O problema foi que o próprio grupo se sentiu apático.
— Agora entendo por que chamam isso de pântano.
— É… Será que já estivemos tão desmotivados assim… ou talvez sim? É uma sensação horrível.
Brett e Judith comentaram suas impressões, e Airen fez um gesto de concordância. Illia o observou por um momento, notando a expressão complexa no rosto do marido. Airen foi quem passou mais tempo vagando por ali. Pensou que talvez a experiência o tivesse traumatizado, mas…
“Isso não pode ser.”
Apesar da letargia, eles não sucumbiram. Lutaram para escapar do Pântano da Preguiça, que os afundava dos tornozelos aos joelhos, da cintura aos ombros. Eventualmente, o esforço deu frutos. Se abrissem a enorme porta à frente, encontrariam o diabo da Preguiça.
“Já sentimos esse tipo de frustração antes, de certa forma.”
Illia sempre viveu se esforçando cada vez mais, mas se alguém lhe perguntasse se já foi preguiçosa, teria que admitir que sim. Antes de deixar a Academia de Esgrima Krono e ser derrotada por Airen na Terra da Provação, era apaixonada pela esgrima. Mas, quando se tratava de relacionamentos, era tímida e acomodada. E ela não era a única.
Houve também uma época em que Brett caiu em desespero e abandonou a espada, e Judith frequentemente parecia impotente, como se tivesse sido reduzida a cinzas após uma explosão de raiva. O caso de Airen nem precisava ser dito. Não foi à toa que as pessoas lhe deram o apelido pejorativo de Nobre Preguiçoso.
Mas todos superaram seus passados sombrios. Essas experiências se tornaram a força necessária para resistirem aos ataques mentais do Pântano da Preguiça. O grupo se fortaleceu com os fracassos. Talvez nem fossem fracassos de verdade. Illia sorriu ao se lembrar do velho ditado: ‘O fracasso é a mãe do sucesso.’
— Então… vamos entrar? — perguntou ela.
— Vamos.
— Certo.
— Estou pronta. Vamos acabar logo com isso. Assim que lidarmos com o último, poderemos alcançar a Árvore Diabo… — disse Judith. Ela tomou a dianteira e abriu a porta.
O diabo da Preguiça os aguardava. Desta vez, não houve crise. Se não tivessem conseguido chegar até ele, talvez a luta tivesse sido um pouco difícil. Porém, uma vez que romperam os ataques mentais e chegaram até aquele ponto do pântano, o Arquiduque não era páreo para eles.
— Finalmente, poderei dormir profundamente… — disse o diabo, desabando.
De repente, a sensação pesada e sonolenta que preenchia o pântano desapareceu.
Brett parou de prender a respiração e exalou. Virou-se para os outros três e disse:
— Não vamos seguir logo. Vamos descansar um pouco.
— Tudo bem — disse Judith.
— Está certo — acrescentou Illia.
Airen apenas assentiu.
Eles não queriam descansar por estarem exaustos. É verdade que haviam gasto muita energia por causa do fedor terrível do Reino Demoníaco, mas essa não era a razão do descanso. E quando Brett sacou a espada e a brandiu, parecia o oposto de descansar. Judith fez o mesmo.
“A jornada não foi fácil… mas ganhamos muito com ela”, pensou Illia, observando os dois puxarem as espadas e começarem a treinar em vez de repousar.
Fazia tempo que não enfrentavam uma batalha de verdade. Agora eram fortes demais. Ninguém no reino humano podia enfrentá-los… os heróis que derrotaram o Rei Demônio. Claro, ainda duelavam entre si, mas fazia tempo que não lutavam contra um inimigo com risco real de vida.
“Se há algo que me incomoda um pouco…” O olhar de Illia voltou a recair sobre Airen.
Ela não estava preocupada com ele. Ele não era mais o Airen Farreira confuso que enfrentara o Rei Demônio. Ela própria há muito deixara de ser a pessoa que sempre se rebaixava diante dos outros. Mesmo assim, sentia uma sensação de déjà-vu ao vê-lo, como se estivesse perdido em pensamentos profundos.
“Sinto que já vi isso antes…”
— Illia?
— Hã? Ah?
— Você estava me encarando tão séria. Tem algo a dizer?
— Não, não. Também vou começar a treinar agora, querido.
Ao ver o comportamento carinhoso da esposa, Airen riu baixinho e voltou aos seus pensamentos. Illia o observou por mais um momento antes de começar a treinar. Precisavam treinar, afinal, ainda não havia acabado. Enfrentar a Árvore Diabo talvez fosse mais perigoso e árduo do que todas as jornadas anteriores juntas.
Uma semana depois, todos estavam ainda mais fortes. Foi então que a Árvore Diabo finalmente apareceu. Eles não conseguiam se mover com facilidade. Sentiam medo até de cogitar enfrentá-la.
— Isso… não vai ser fácil — murmurou Illia com a voz tensa.
Era impossível chamar aquilo apenas de árvore. De perto, a Árvore Diabo parecia uma muralha divina que proibia qualquer um, ou qualquer coisa, de avançar. Não era certo se ‘divina’ era a palavra adequada no Reino Demoníaco, mas a árvore transmitia uma sensação de desespero impossível de explicar sem recorrer a esse termo.
Eles precisavam atravessar aquilo? Com força humana? Como? Até Judith, que viveu sua vida alimentada por ressentimentos, achou que aquilo era uma tarefa quase impossível. Brett mordeu a língua até sangrar para acalmar as mãos trêmulas, e Illia sentia o mesmo. Enquanto observavam os milhares de galhos grossos e tentaculares se aproximarem, todos perderam a vontade de lutar.
Airen Farreira, aquele que permanecera em silêncio e quase sem presença durante toda a jornada, emergiu de seus pensamentos e ergueu a espada.
Suas ações deixaram Illia espantada.
— Isso é…
— Ha, droga — disse Judith, com aspereza.
Brett permaneceu em silêncio, mas embora cada um reagisse de forma diferente, pensavam a mesma coisa. Finalmente entendiam aquela sensação estranhamente familiar… a origem do déjà-vu.
Airen havia economizado forças.
Durante todo o tempo naquele lugar, Airen organizou, compreendeu e encontrou a melhor maneira de lidar com a Árvore Diabo. Procurou um meio de superar uma situação que parecia impossível de ser superada. Era como na sua avaliação final durante os dias de aprendiz preliminar, quando surgiu e deixou uma impressão aguda em todos.
— Illia, Judith, Brett — disse Airen.
Os três espadachins estremeceram. Seus pensamentos estavam confusos. Sentiam medo da Árvore Diabo, e os complexos de inferioridade que acreditavam ter superado começaram a ressurgir.
Mas estava tudo bem. Eles não eram mais crianças, eram heróis armados com o poder da superação. Usaram suas diversas provações e frustrações como degraus para subir mais alto. Tinham o potencial para não mais permitir que Airen os deixasse para trás.
A vida voltou aos seus olhos, e os corpos pararam de tremer. Coragem, e não inveja, cresceu dentro deles. A ideia de não querer mais mostrar aparências lamentáveis se fortaleceu. Acreditavam que também podiam lidar com tudo aquilo. A competitividade positiva, de que um dia superariam Airen, mesmo que não agora, aqueceu o coração de todos.
Claro, aquele espírito combativo precisava ser direcionado para outro alvo.
— Vai levar um tempo até que minha espada esteja completa — disse Airen. — Então… por favor.
Centenas, milhares, até dezenas de milhares de tentáculos se aproximavam. Mesmo assim, Airen fechou os olhos. Confiava plenamente que seus amigos o protegeriam. E os outros três também podiam sentir isso.
— Tudo bem — disse Brett, firme. A aura da água que ele havia usado contra o Lorde do Castelo da Gula se espalhou em todas as direções. Era uma habilidade incrível, que desacelerava os tentáculos e tornava os movimentos dos aliados mais suaves e flexíveis.
“Tsk. Também não posso ficar para trás.”
Chamas irromperam do corpo de Judith. A explosão de aura intensificava a aceleração das chamas. Era uma técnica que exigia muito do corpo, mas aquilo era fácil. Era fácil suportar com força física e mental suficiente. Judith queimava com um espírito de luta intenso e se inclinava para frente como se a aura fosse disparar a qualquer momento.
A mais deslumbrante era Illia Lindsay. Vinte espadas saíram de sua bolsa dimensional. Elas voaram atrás de suas costas e formaram asas. Ela parecia uma borboleta feita de aço. Ao dar um passo suave pelo ar, uma aura prateada brilhante emanou de cada uma de suas espadas.
— Então…
— Vamos?
— Huff… huff… huff… Vamos!
Como uma onda, como uma chama, como uma brisa, os três heróis avançaram com ímpeto. Avançaram em direção ao ser absoluto que havia transformado o mundo em um inferno.
Airen não os viu partir, mas acreditava que iriam. Olhou para o próprio coração, aquele que ignorou por tanto tempo, e criou uma nova árvore: o fogo vindo da árvore, a terra vinda do fogo, o metal vindo da terra, a água vinda do metal, e da água, veio uma nova árvore. As energias que surgiram começaram a girar ferozmente, mas de forma suave, segundo os princípios dos Cinco Elementos.
Mas desta vez era um pouco diferente. Não se tratava apenas de fortalecer a energia mútua. As cinco energias giravam agora com tamanha velocidade que era difícil distingui-las. Tornaram-se duas massas grandes, tentando morder o rabo uma da outra. Yin, Yang e Tai Chi. Além disso… o universo.
Era impossível alcançar aquilo por completo. Esse poder ia além dos limites do elementalismo do povo orc e continha os princípios de todas as coisas do mundo. Mesmo vislumbrar esse estado exigia enorme percepção, talento e esforço. Até mesmo Airen não ousaria dar um passo tão grande em circunstâncias normais.
Mas ele não sentia medo. Não tinha medo do fracasso, nem recuava. Se era possível ou não, não importava, algo precisava ser feito. Isso era o que um herói fazia. E Airen Farreira era um herói.
Um imenso círculo voou em direção à Árvore Diabo, e um som insuportável para ouvidos humanos ecoou. Sangue escorreu das orelhas dos três que mal conseguiram evitar o ataque do companheiro. Mas não se sentiram mal, pelo contrário, todos sorriram.
“Extinção.”
Airen apagou a Árvore Diabo com um único golpe de espada. Respirou fundo.
— Então… vamos. Rumo ao fim — disse Brett. — Nosso objetivo não era derrotar a Árvore Diabo.
Todos assentiram. Não haviam vindo para destruir o Reino Demoníaco. O propósito original era encontrar a maçã dourada. Para isso, precisavam encontrar a árvore mágica.
Felizmente, não era necessário procurar. Uma porta dourada apareceu no ar assim que derrotaram a Árvore Diabo, como se fosse uma recompensa pela missão. Os sorrisos de todos se ampliaram ao verem o caminho revelado.
Com uma vibração mais intensa que qualquer uma anterior, as memórias e a história do Reino Demoníaco, guardadas profundamente no núcleo da Árvore Diabo, começaram a ser injetadas à força nas mentes dos quatro.