Depois do jantar, as bruxas se reuniram no quarto de Lucia Branco.
Tocada pelo encorajamento e conforto, Lucia podia sentir seus olhos cheios de lágrimas. Ela respirou profundamente com os olhos fechados, se esforçando para não chorar.
Você não pode chorar. Já foi embaraçoso o suficiente chorar em voz alta na frente de Rouxinol, e ainda fiz isso na frente da minha irmãzinha. Eu preciso dar um bom exemplo para ela! — Lucia se repreendeu.
Lucia só tinha ouvido falar de uma organização de bruxas situada aqui no momento antes de embarcar no barco em direção à vila. Ela jamais esperava viver uma vida boa neste lugar remoto, mas simplesmente encontrar uma cura para a praga demoníaca e um abrigo para a sua irmã.
Só que o que Lucia encontrou não foi apenas uma vida confortável, mas um grupo de pessoas com tanta coisa em comum que logo se tornaram sua família. Ela se sentiu em casa novamente pela primeira vez desde a morte de seus pais no ataque dos piratas.
— Minha irmã está realmente em perigo? — Ling perguntou enquanto descansava nos braços de Lucia — Vai doer muito?
— Sim, é uma dor insuportável, parece que têm milhares de facas perfurando você, mas dentro do seu corpo. — Rouxinol sorriu — Apenas algumas bruxas podem sobreviver a isso. Há provavelmente apenas uma ou duas entre dez bruxas que podem sobreviver ao seu Dia da Idade Adulta.
A garotinha estremeceu.
— Pare de assustar a menina. — Wendy olhou para Rouxinol — É verdade, mas isso era antigamente, durante nossas viagens na Associação Cooperativa das Bruxas.
— Tudo o que Lucia precisa fazer agora é continuar praticando sua habilidade todos os dias e liberar todo o seu poder mágico antes do Dia do Despertar, assim não terá problema algum. — Pergaminho disse, sorrindo — Ouvi dizer que até mesmo Anna passou pelo seu Dia da Idade Adulta dormindo serenamente.
— E o seu primeiro alto despertar também ocorreu ao mesmo tempo. — Agatha bocejou — Definitivamente causaria um grande tumulto se isso acontecesse quatrocentos anos atrás em Taquila, já que nunca houve nenhuma bruxa que pudesse alcançar a compreensão enquanto dormia.
— Mas e você, Agatha, está bem? — Sua Alteza Roland olhou para ela e perguntou — Mesmo que o trabalho seja importante, você não deve se esforçar demais.
— A Batalha da Vontade Divina está se aproximando. Se eu não estivesse tão ocupada com isso agora… — Agatha disse com as mãos cobrindo a boca — Não seria um problema dormir para sempre se falharmos desta vez.
— Não vamos falhar. Pode ter certeza. — O Príncipe Roland assegurou.
— Eu decidi fazer um pouco mais, já que estou otimista com sua nova invenção. — A Bruxa do Gelo revirou os olhos para ele e continuou — Se não fosse assim, você realmente acha que eu gostaria de ficar no laboratório todos os dias? — Com essas palavras, ela se virou e murmurou para si mesma suavemente — Eu não seria capaz de fazer nada para você, mesmo que você não cumpra sua promessa…
— Bem, vocês não deveriam discutir uma história tão pesada agora. — Wendy interrompeu os dois — Ah, sim, a senhorita Agatha não mencionou antes que cada uma das bruxas teria direito a um desejo no Dia do Despertar? Agora é a vez de Lucia. Então, jovenzinha, qual é o seu pedido?
— Hã… pedido? — Lucia ficou chocada ao descobrir que ela era o centro das atenções de todas as pessoas no quarto.
— Escolha o pão de sorvete, irmã! — Ling disse com os olhos brilhando — Acho que dez é o suficiente, aí você me dá metade!
Mas essa pentelha… tudo o que consegue pensar é em comida? — Lucia pensou e deu um peteleco na testa da irmã. Então ela olhou para Roland e perguntou:
— Eu posso fazer o pedido depois?
— Se você quiser, sim. — Roland sorriu — Mas é só um. Então faça-o bem.
— Sim, só um será o suficiente, obrigada. — Lucia respondeu com gratidão.
Ela não tinha mais nada para pedir por si mesma enquanto pudesse morar nesta vila. Tudo o que ela podia esperar era que Ling tivesse uma vida feliz. Sua irmã mais nova não era uma bruxa, então ela teria que deixá-la para construir sua própria família com alguém algum dia. Esse desejo poderia ajudá-la se houvesse alguma mudança até lá.
Foi então que Lucia sentiu seu corpo, que havia esgotado seu poder mágico, tremer de repente e o poder mágico começou a acumular, como se estivesse vindo do nada e vertendo em seu corpo continuamente.
— Começou. — Rouxinol advertiu.
Mesmo que as irmãs lhe dissessem para não se preocupar, ela agarrou o cobertor com força, enquanto um calafrio tomava conta das palmas das mãos e das solas dos pés. Lucia, então, sentiu uma forte tensão em todo o seu corpo.
— Relaxe. — Wendy disse, segurando nas mãos de Lucia — O poder mágico faz parte do nosso corpo também.
— Devemos conversar sobre outra coisa para distraí-la? — Lucia ouviu alguém, talvez Lily, perguntar.
— Sobre o que deveríamos falar? — Lunna perguntou.
— Que tal o resultado do segundo teste? — A voz de Lily parecia muito distante — Geralmente, assim que nós falamos do teste, Lunna imediatamente muda de assunto e desvia a atenção. Os resultados de Lunna…
— Não fale mais nada!
— Não disse, funcionou!
Lucia queria rir, mas ela percebeu que a expressão em seu rosto estava rígida e seu corpo estava quente. Ao mesmo tempo, havia uma sensação indescritível de contração, pois o poder mágico continuava a ser acumulado, como se o seu corpo estivesse sugando tudo ao seu redor.
Toda bruxa experimentará essa sensação em seu Dia da Idade Adulta? — Ela pensou.
— E qual foi o resultado de Lucia? — Ela mal conseguia ouvir a voz de Lunna.
— Ela ficou acima da média. — O Príncipe Roland respondeu.
— O… o quê?
— Mas isso é muito!
— Viu só? E ela nem estudou com a gente!
— Aha, você não conseguiu, então é hora do castigo!
— Me deixe em paz!
— Vocês duas, parem de brigar! Parece que alguma coisa com Lucia não está bem.
Lucia podia ouvir a conversa entre Lunna, Lily e finalmente a voz de Rouxinol, mas ela percebeu que as vozes das bruxas tinham se tornado distantes para ela. Lucia estava cerrando os dentes e levantou a cabeça para olhar as irmãs ao seu redor. Ela ficou chocada ao ver a cena completamente alterada. A aparência de todas elas tornou-se nebulosa e confusa, uma composição de inumeráveis blocos. Alguns blocos eram grandes, outros pequenos e cada um deles tinha uma cor diferente.
Ela queria gritar, pois estava horrorizada, mas tudo o que ela podia ouvir era o som sibilante de sua respiração.
A contração em seu corpo estava ficando mais forte e começou a causar uma vaga mas crescente sensação de dor. Lucia só podia segurar a respiração e ver as pessoas ao seu redor começarem a ficar preocupadas e correrem para lá e para cá.
Foi exatamente como Rouxinol havia dito, a dor no Dia da Idade Adulta era muito pior do que a do Dia do Despertar. Quanto mais Lucia resistia, mais forte a dor se tornava. Parecia que seu corpo estava sendo cortado em pedaços.
De repente, um estranho poder mágico sondou seu corpo. Lucia podia sentir claramente que o poder mágico não pertencia a ela mesma. Era como um tubo montado no ciclone mágico.
Ela não aguentava mais, subconscientemente cedendo ao poder esmagador e permitindo que o fluxo a carregasse. Como se tivesse finalmente encontrado seu salvador, Lucia continuou injetando seu poder mágico neste tubo para suprimir a dor em seu corpo.
A estranha contração diminuiu após um período de tempo. O poder mágico não mais acumulava loucamente, e parecia ter se tornado substancial e sólido. Foi uma experiência completamente diferente.
Ela piscou e ficou aliviada ao descobrir que sua visão normal havia retornado completamente, não mais aparecendo aqueles blocos.
Olhando para Ling, que estava com uma expressão de horror no rosto, Lucia acariciou a cabeça de sua irmãzinha e assegurou-lhe com uma voz rouca:
— Está tudo bem agora.
Foi quando percebeu que estava encharcada de suor. Lucia podia sentir o frio nas costas quando o vento gélido soprava.
Espere um pouco, como pode haver vento frio em um quarto com o aquecedor ligado? — Lucia pensou.
Quando ela virou a cabeça, ficou chocada ao ver o jardim através de um enorme buraco que havia na parede e que estava deixando o vento frio entrar. Ela também podia ver a noite escura e as pequenas luzes da vila através do enorme buraco. Em pé na frente da parede estava Anna, olhando para ela com preocupação. O Sigilo da Vontade Divina em sua mão brilhava.
— Sua habilidade se solidificou. — Rouxinol disse.