Wendy, Pergaminho e Speer estavam sentadas no salão do castelo, apreciando o chá preto de primeira qualidade que era importado da Cidade do Resplendor.
Wendy tirou a chaleira assobiando do gancho na lareira e serviu a água fervida em uma xícara de chá. Observando a superfície da água sendo gradualmente tingida de laranja transparente e cheirando o aroma suave que vinha do vapor crescente, ela sentiu todo o seu corpo relaxar e ficar mais preguiçoso. Depois de soprar na xícara para esfriar o chá, ela tomou um pequeno gole. O sabor inicial era ligeiramente amargo, mas lentamente se transformou em um sabor fresco e doce que rejuvenesceu seus lábios e língua. Quando o líquido quente fluiu para o seu estômago, ela soltou incontrolavelmente um gemido satisfeito.
Do outro lado do salão, Papel ainda estava mexendo no Sigilo da Vontade Divina. Ela já havia dominado a habilidade de canalizar o poder mágico no sigilo, e também era capaz de controlar com precisão o fluxo de poder mágico. Mas não importava o quanto ela tentasse, ela só era capaz de iluminar a primeira pedra mágica.
— Sempre que a vejo, penso nos dias da Associação Cooperativa das Bruxas. — Pergaminho disse, emocionada — Naquela época, ninguém pensava que todas nós poderíamos viver uma vida como a que temos hoje.
— Se pudéssemos prever o futuro, Kara não teria persistido com tamanha teimosia. — Wendy colocou a xícara na mesa — É bom que, no futuro, nossas irmãs despertas não tenham que sofrer o mesmo que sofremos. — Enquanto falava, Wendy começou a rir — Nós somos provavelmente o último grupo de bruxas que precisarão sofrer.
— E também o grupo mais antigo, o que significa que vamos aproveitar menos dias bons do que elas. — Pergaminho acrescentou ao colocar a mão na testa — Parece que, de uma forma ou de outra, ficamos com o pior.
— É por isso que você voltou cedo hoje, só para aproveitar um pouco mais de lazer? — Wendy brincou.
— Eu só saí depois de terminar meus deveres. — Pergaminho deu de ombros — Sua Alteza Roland está fora e, portanto, a quantidade de trabalho é muito menor do que o normal. Eu não estou acostumada com isso.
— É mesmo? — Wendy levantou as sobrancelhas — Quando Sua Alteza voltar, direi o que você disse palavra por palavra.
— Oh… então, para o próximo exame, não posso prometer que você será capaz de entender cada pergunta.
— Vocês duas têm um ótimo relacionamento. — Speer riu enquanto ouvia a conversa — Embora eu não seja mais jovem, nunca desfrutei de um relacionamento tão profundo com ninguém. Vocês duas estão entre as mais afortunadas das bruxas que conheci.
— Realmente, mas digo o mesmo de você. Nem toda bruxa tem um pai poderoso… — Pergaminho disse, e bebeu um bocado de chá antes de continuar —, que passaria tudo o que possui para a filha. Até mesmo entre os nobres, essas pessoas são raras.
— A propósito, como está indo na Prefeitura? — Wendy perguntou para Speer — Ouvi dizer que você vai lá sempre que tem um tempo livre.
— Há muitos benefícios na Prefeitura. — Speer exalou profundamente — Esta é a primeira vez que eu compreendo um estilo de gestão de departamentos que é tão bem ordenado e demarcado, mas permite que os departamentos trabalhem juntos. Em vez de fazer com que os ministros de cada departamento conduzam o próprio recrutamento e remuneração dos funcionários, a Prefeitura cuida disso para eles. Dessa forma, há menos dificuldade em substituir funcionários, e também permite que cidadãos capazes entrem no serviço civil sem obstáculos. Eu não tenho ideia de como Sua Alteza concebeu essa ideia.
— Ela até teve uma boa conversa com Barov. — Pergaminho brincou.
— Uhum, ele estava simplesmente me consultando sobre algumas questões relacionadas às leis dos nobres, que por acaso eu tenho uma boa compreensão. — Speer disse, balançando a cabeça — Além disso, as novas leis estabelecidas por Sua Alteza são únicas, e podem até ser implementadas na Serra do Dragão Caído. Eu discuti isso com Barov por um pouco mais de tempo.
— Oh? Únicas em que sentido?
— Bem, como posso dizer, se olharmos para a definição de cidadania…
— Irmã Wendy, quando poderei iluminar a segunda pedra mágica? — Papel juntou-se inesperadamente e berrou enquanto segurava o Sigilo da Vontade Divina.
— Quando você for um pouco mais velha. — Wendy estendeu a mão para a jovem — Venha, deixe-me dar um abraço em você.
Papel segurou a mão estendida de Wendy e se jogou em seu abraço.
Wendy acariciou a cabeça da menininha enquanto observava as outras duas bruxas discutirem as novas leis, e sentiu uma sensação de paz.
Seria tão bom se esta vida pudesse durar para sempre. — Wendy pensou.
Neste momento, um guarda entrou no salão. Ele olhou pela primeira vez ao redor antes de caminhar até as quatro bruxas com uma ligeira hesitação.
— Algo aconteceu? — Wendy o reconheceu. Ele era um guarda pessoal de Sua Alteza.
— Lady Wendy, alguém chegou e está nos portões do castelo afirmando que sua filha acaba de despertar como uma bruxa… — O guarda disse enquanto fazia uma saudação — Sua Alteza especificou que quando não estivesse por perto, você estaria encarregada de tais questões.
— O quê? — As três bruxas ficaram chocadas simultaneamente — Uma nova bruxa desperta?
— É exatamente isso o que a pessoa disse.
— Rápido, leve-me até ela. — Wendy imediatamente respondeu.
No portão principal do castelo, Wendy viu duas mulheres esperando no vento frio. Uma delas parecia ter uns 40 anos, com o cabelo já meio branco e com rugas profundas e compridas na testa. Ela vestia um casaco esfarrapado e suas costas eram um pouco envergadas. A outra era muito mais jovem, com cerca de 17 ou 18 anos, e estava quieta ao lado da mulher mais velha.
— Esta é Lady Wendy da União das Bruxas. — O guarda apresentou.
— Nossas saudações, Lady Wendy. — As duas mulheres se curvaram respeitosamente.
— Elas alegam ser migrantes da Região Sul e que se mudaram para um distrito residencial da cidade há meio mês. Eu verifiquei seus cartões de identidade e não encontrei nenhum problema com as informações fornecidas.
— Você é a bruxa? — Wendy olhou para a jovem e falou com a voz mais terna que pôde — Qual o seu nome?
— Lady Wendy está fazendo uma pergunta. — A mulher mais velha puxou a manga da mais nova.
— Ve… Vera. — A moça murmurou.
— E você é … a mãe dela?
— Sim, sim, eu sou. O pai dela ainda está trabalhando lá nos fornos, então eu trouxe ela pra cá. — A mulher mais velha falou enquanto assentia — Lady Wendy, posso perguntar se o que Sua Alteza declarou no boletim é verdade… que as bruxas têm direito a um salário de uma peça de ouro todos os meses?
— É verdade, sim, mas ela tem que estar disposta a se juntar à União das Bruxas.
— Eu… — Vera abriu a boca.
— Ela está disposta, ela está definitivamente disposta a servir e dedicar tudo à Sua Alteza. — A mãe interrompeu a filha — Nós temos que assinar um contrato? Quando vamos receber o dinheiro?
Essas palavras fizeram Wendy franzir a testa incontrolavelmente. Não era difícil compreender em seu tom que a mãe não apenas tratava a filha como um objeto à venda, mas também achava que a União das Bruxas era um lugar de prazer para Sua Alteza.
Wendy reprimiu sua infelicidade e respondeu placidamente:
— Sua Alteza está lidando com alguns assuntos em Forte Cancioneiro, e eu não tenho certeza quando ele voltará. Além disso, haverá alguns exames e testes antes que ela possa se juntar à União. Você pode deixar sua filha aos nossos cuidados no castelo, e quando Sua Alteza retornar, nós providenciaremos para você assinar o contrato.
Não importa o quê, Vera era inocente, e assim, Wendy não queria impor sua raiva para com a mãe ignorante. Embora as bruxas já fossem aceitas pela maioria dos habitantes da vila, os refugiados que chegaram recentemente à Região Oeste ainda possuíam um grosseiro mal-entendido sobre elas.
— Então eu vou confiar ela a você, Lady Wendy. — A mãe fez uma profunda reverência e depois acariciou a cabeça da filha — Comporte-se bem e não desaponte Sua Alteza.
— Mãe, eu… — Vera queria dizer alguma coisa, mas a mulher mais velha já havia se virado e caminhado em direção à rampa de saída.