No dia da inauguração da nova cidade, Roland levantou-se muito cedo.
Ele fez a barba, amarrou seus longos cabelos grisalhos com uma faixa simples e usou uma pequena tesoura para aparar as sobrancelhas. Depois de um ano vivendo neste mundo, ele já estava muito experiente em cuidar de si mesmo e não precisava da ajuda de ninguém pra ficar bonito e bem-apessoado.
Olhando para o seu reflexo embaçado no espelho de prata, ele sentiu que, se colocasse uma túnica, de alguma forma ele expressaria a presença divina de um sacerdote taoísta em reclusão.
Roland assentiu para si mesmo, satisfeito com seu trabalho, e foi para o escritório.
Barov já estava esperando por ele.
— Vossa Alteza. — Barov disse com uma reverência — Um falcão mensageiro já foi enviado para Forte Cancioneiro e provavelmente chegará ao castelo do forte em meia hora.
— Ótimo. O local está pronto?
— Terminamos os últimos preparativos ontem à tarde, e agora parece grande suficiente para conter toda a população da vila. — O Primeiro-Ministro da Prefeitura respondeu.
— Bom trabalho. — Roland elogiou e caminhou lentamente até a janela.
A Cordilheira Intransponível e a Floresta das Brumas à distância ainda estavam cobertas de branco, e o sol nascente espalhava raios de luz dourada sobre a neve. Ele viu silhuetas em movimento nas ruas próximas da vila indo para a área da muralha de cascalho ao oeste.
Como uma linha de defesa contra as bestas demoníacas do ano passado, esta muralha de cascalho, que foi construída às pressas com concreto, desempenhou um papel primordial na batalha. No entanto, agora se tornou uma fronteira entre as áreas internas e externas da vila. Roland não gostava desse tipo de separação clara entre os ricos e os pobres, então ele decidiu que iria derrubá-la mais cedo ou mais tarde, exceto a área de abertura simbólica e a torre do portão. No entanto, antes disso, ele ainda poderia utilizá-la. Ele escolheu a seção intermediária da muralha de cascalho como o local para o grande dia de inauguração da cidade, uma vez que poderia comportar muito mais pessoas do que a praça.
De acordo com seu plano, a fim de fortalecer o impacto da inauguração sobre os cidadãos de ambas as cidades, Forte Cancioneiro realizaria um anúncio ao mesmo tempo, que seria sincronizado por falcões mensageiros. Quando o primeiro falcão mensageiro alcançasse Petrov, Roland subiria ao palco para fazer um discurso.
Agora, o falcão cinza que carrega a notícia deve estar voando entre as montanhas e sobre o Rio Vermelho, com um pedaço de pergaminho preso à sua garra como de costume — Roland pensou —, mas ele não sabe o significado das notícias. A partir do momento em que aterrissar, Vila Fronteiriça e o Forte Cancioneiro se tornarão história.
— Vamos lá. — Roland se concentrou e disse, ao virar-se para Barov.
— Sim, Alteza. — Barov disse com um sorriso.
Petrov Hull caminhou lentamente para o palco de madeira construído e olhou em volta. Não havia tantas pessoas na praça, pelo menos não tantas quanto durante a distribuição de mingau de aveia na semana passada.
Isso não o surpreendeu, uma vez que as pessoas se preocupavam mais com comida e roupas. Em comparação com mingau de aveia de graça, uma cerimônia de inauguração não importaria muito.
Até mesmo Petrov achava isso um tanto desnecessário.
Os Meses dos Demônios terminaram, mas a Prefeitura ainda não recebeu tantos pedidos de emprego quanto esperavam. O aviso pedindo trabalhadores manuais e trabalhadores para construção já estava posto há uma semana, mas o número de recrutas não chegou nem à metade do pretendido. Enquanto isso, os ratos pareciam estar se levantando das cinzas, pois o departamento de polícia recebia mais e mais relatórios todos os dias e apenas verificar esses relatórios era uma quantidade de trabalho significativa. Seu amigo Rene Medde queixou-se a ele que a equipe exigia o dobro de homens para lidar com sua carga de trabalho.
Petrov já esperava por isso.
As pessoas são assim, preguiçosas, gananciosas e pouco inteligentes… Sua Alteza gasta muito tempo e esforços nelas, mas o que ele poderia receber em troca? — Petrov pensou, mas o que mais o deixava confuso era que Roland Wimbledon era claramente um membro da Família Real, então, de onde vinha essa estranha confiança nas pessoas?
Mas isso não importava mais, pois Petrov estava firmemente ligado à Roland, então tudo que ele podia fazer era segui-lo fielmente.
Um falcão crocitou à distância e uma silhueta cinzenta apareceu no céu.
Petrov abriu seu rascunho de discurso preparado.
— Vossa Alteza, está quase na hora. — Barov lembrou.
O sol já estava quase no meio do céu e a sombra do relógio solar apontava para as nove horas. Roland respirou fundo e foi até o corrimão da torre. Assim que as pessoas viram o Príncipe, suas conversas se transformaram em aplausos calorosos, e todos levantaram as mãos para criar ondas em meio à multidão.
A área em ambos os lados da muralha estava cercada por uma multidão de mais de 20.000 pessoas, o que significa que a maioria dos moradores de Vila Fronteiriça estavam reunidas ali. Roland ficou feliz por não estar realizando essa cerimônia de inauguração na praça central, já que obviamente não poderia oferecer espaço suficiente para uma multidão tão grande e animada.
Ele acenou com as mãos para silenciar os aplausos.
— Saudações, meus súditos.
A habilidade de ampliação de som de Eco permitiu que sua voz ecoasse por toda a vila.
— Eu acredito que vocês já saibam o que está prestes a acontecer hoje. Esta pequena vila, construída no sopé de uma montanha, na mina da encosta norte, está prestes a se tornar uma cidade real. No passado, os Meses dos Demônios eram um pesadelo para Vila Fronteiriça, e todos tinham que fugir para Forte Cancioneiro. Agora, construímos uma base aqui, firme e forte. Osmond Ryan, que queria arruinar a Região Oeste, caiu. A Igreja, que queria prejudicar as bruxas e escravizar o povo, foi banida desta terra e mesmo Timothy Wimbledon, que ousou tentar me destruir, fracassou. Mesmo que ele incendiasse toda a Região Leste e Sul, esta vila ainda estaria sã e salva! Tenho certeza de que os refugiados que fugiram para cá sabem disso melhor do que ninguém!
As palavras de Roland foram rapidamente recebidas com as respostas da multidão.
— É verdade! Ele incendiou a Cidade da Águia e saqueou o Porto de Água Clara!
— O novo rei saqueou toda Valência. Seus cavaleiros não agiram de forma diferente dos assaltantes, e às vezes eram até pior!
— Ele levou o meu filho, dizendo que precisava se juntar aos guardas da Cidade Real de Castelo Cinza. Céus… ele tem apenas quinze anos!
O Príncipe estendeu a mão para acalmá-los.
— E essas tragédias nunca mais acontecerão. É por isso que construímos a nossa nova cidade! Somente unindo mais pessoas é que poderemos enfrentar nossos inimigos malignos e mostrar a eles as consequências de sua imprudência. — Roland fez uma pausa e continuou — E esta é minha cidade também. Prometo que eu, Roland Wimbledon, nunca deixarei vocês, nunca deixarei nenhum de meus súditos para trás, e mesmo que o Reino de Castelo Cinza esteja unido, eu nunca sairei deste lugar!
Uma onda de gritos irrompeu aos pés da muralha da vila.
— Vossa Alteza, o senhor… — Barov exclamou atrás dele.
Roland acenou com a mão para silenciá-lo.
— Isso mesmo. Esta se tornará a nova capital do Reino de Castelo Cinza, e o reino renascerá! Acredito que mesmo que um inverno sem-fim chegue a este mundo, esta cidade ainda será tão quente quanto a primavera! — Ele parou por um momento e levantou o braço e a mão direita em direção aos céus — A partir deste dia, Vila Fronteiriça e Forte Cancioneiro se tornarão uma só cidade, e seu nome será…
— Primavera Eterna!
— Viva a Cidade de Primavera Eterna!
— Viva a Cidade de Primavera Eterna!
A multidão não parava de aplaudir e gritar, enquanto os cantos de júbilo ensurdecedores soavam pelo céu. Uma névoa de neve irrompeu na encosta da montanha, e os ecos rolaram interminavelmente pelos picos.
Roland olhou para os seus súditos animados e sentiu uma grande expectativa crescendo dentro dele. As faíscas da revolução haviam sido acesas e, um dia, ele veria essas faíscas se transformando em uma chama gigantesca que engolfaria toda a terra.