Trot, trot.
Callius se sentou dentro de uma carruagem, que foi remodelada a partir de um trenó, e olhou para a garota na sua frente.
Tinha a mesma cor de cabelo e os mesmos olhos.
Emily von Jervain.
Os dois se observavam curiosamente.
As duas servas que acompanhavam Emily murmuraram e balbuciaram sobre Callius, enquanto Bruns ficou um pouco insatisfeito com a situação.
Depois de deixar a montanha e chegar a uma aldeia próxima, eles pegaram uma carroça, onde colocaram as bagagens, e foram para o norte.
E metade de um dia tinha se passado agora.
Callius e Emily continuaram se olhando sem dizer uma palavra.
Não havia ninguém no Reino de Carpe que não conhecia os Jervain do Norte, que possuíam cabelos pretos e olhos cinzentos.
Callius e Emily são da mesma família.
‘Não tem como esse mestre ser casado, então talvez seja um primo.’
As servas de Emily também achavam isso.
Khm.
Aqui, o servo de Callius e amigo do coração deve dar um passo à frente.
— Ah, vou apresentar meu mestre… Um peregrino imponente que adora o grande Deus Valtherus…
Foi então que…
A voz fofa da Emily cortou as palavras de Bruns, indo direto ao ponto.
— A ovelha negra dos Jervain.
Huk!
Bruns, assim como as servas, ficaram assustados e engoliram o fôlego.
— Um homem idiota que nunca teve um talento para a esgrima desde que era criança. Tem uma atitude arrogante e age como se fosse superior e soubesse mais que os outros, mesmo sendo um cabeça oca. Viciado em prazeres sensuais e baixarias, então muitas vezes desperdiça a riqueza. Um verdeiro lixo entre os lixos.
Bruns piscou.
Além da autenticidade das palavras proferidas a todo vapor, ele ficou confuso se era real ou não que uma criança tão fofa quanto uma boneca realmente pronunciasse essas palavras.
Ele esfregou as orelhas uma vez para verificar se tinha ouvido errado.
Mas foram tantas palavras nesse discurso, então era impossível ter escutado errado.
Bruns engoliu em seco.
O Callius que conhecia era um Peregrino sem misericórdia em suas ações.
Um homem entre homens que não hesitava em sacar a espada e que sempre arriscava a vida quando se tratava de lutar.
‘Mas falar que ele não tem talento em esgrima…’
Ele não conseguia entender.
Bruns olhou para seu mestre, Callius.
Apesar das observações degradantes da criança, seu rosto estava calmo.
— Emily… Como você sabia que eu sou a ovelha negra dos Jervain?
— Os descendentes diretos dos Jervain, bem como as pessoas dos ramos colaterais, estão todos ocupados subjugando a Floresta Branca no Norte neste exato momento.
**TL/N: Ramos colaterais que é parente, mas não em descendência direta, como os sobrinhos em relação aos tios.
Emily apontou um dedo para o pescoço do Callius e depois para o dorso da mão dele.
— Acrescentando o rosário no seu pescoço e os estigmas na mão. Ouvi dizer que você é o único com o sangue dos Jervain que é um Peregrino. Você, a ovelha negra.
— Você é inteligente.
— Diferente de você.
Pshk!
Callius sorriu.
Ela tinha pouco mais de doze anos, mas era muito mais brilhante e ágil do que o esperado para alguém dessa idade.
Afinal, era uma Jervain.
Se herdou o sangue deles, deveria ser assim.
Porque isso que é ser digno ter o nome Jervain, elogiado pelas massas.
‘Jervain… ‘
Eu vim para o Norte para encontrar Bernard, mas não esperava encontrar alguém da família antes disso.
— Então, por que você foi capturada pelos bandidos?
— Não interessa.
Bastante hostil.
Ela provavelmente tinha ouvido os rumores e histórias sobre ele de outros na família.
‘Sim.’
Callius, a ovelha negra dos Jervain, que em vez de trazer glória para a família, pintou o nome com esterco.
Até mesmo uma criança pequena não terá uma boa opinião sobre ele se já ouviu histórias dele desde que era jovem.
‘É por isso que eu não queria encontrar ninguém da família.’
Não tem razão para nos encontrarmos, e não vai trazer nada bom se deparar com um da família.
A relação entre Jervain e Callius está emaranhada como um nó.
Um que é melhor cortar do que desamarrar.
Por esta razão, Callius nunca pôs os pés nas propriedades dos Jervain nos três anos desde que se tornou um Peregrino.
‘Mas Emily é filha de quem?’
Não me lembro de ter configurado isso.
‘Se fosse da linhagem direta, eu saberia’
Agora tinha a teoria de que essa personagem talvez foi projetada por outra equipe.
‘Isso não importa.’
É muito interessante, mas o objetivo atual do Callius é o dono da Espada Espiritual, Bernard de Jervain.
Ainda assim, ela é como uma sobrinha, então vamos levá-la para casa.
Além disso, desde que foi capturada por bandidos, ele se sentiu um pouco ansioso.
‘Ela parece inteligente, então como é que foi capturada por um grupo de bandidos dentre todas as coisas?’
Ele ficou curioso.
— Emily…
— Não fale comigo como se fosse meu amigo. Seu idiota.
— Como você está com a esgrima?
— Melhor que você!
— Então, por que você foi capturada?
— Não quero falar deste assunto.
— É por que você não tem talento?
— Não é isso. Não calunie o nome da família dizendo coisas que não entende!
Ela então manteve a boca fechada, dizendo que não fazia sentido explicar.
— Acho que não deve ser lá uma grande coisa.
— É um grande segredo que você não consegue entender.
— Você foi apenas capturada por bandidos, que tipo de grande história pode estar por trás disso? A história ficou desinteressante a partir do momento em que esses bandidos de segunda categoria se envolveram.
Alguém com o sangue dos Jervain foi caputado por bandidos na estrada.
Callius notou Emily o olhar cruel dela.
— Seu sangue divino está bloqueado?
**TL/N: 성혈 (聖穴) está sendo traduzido como sangue divino (orifício sagrado). Pelo contexto, parece semelhante aos meridianos para canalizar o qi na medicina chinesa, no entanto, apenas para canalizar o poder divino.
Ouvindo isso, as mãos da Emily se curvaram em punhos.
— Então é isso.
Algumas linhagens nobres antigas, incluindo Jervain, têm suas próprias características.
É o resultado do batismo divino da época da fundação do Reino.
É por isso que a família real e algumas famílias fundadoras têm olhos ou cabelos excepcionalmente coloridos, ou têm estigmas em algum lugar do corpo.
Portanto, os membros dessas famílias podem ter poder divino mesmo sem serem batizados.
Claro, o mesmo vale para os Jervain.
Seus olhos cinzentos contêm os traços de Deus.
Portanto, um Jervain nasce com poder divino e maneja a espada com relativa facilidade.
‘Mas o poder divino de Emily é muito fraco.’
Não é que não haja nenhum poder divino, mas parece estranhamente frágil.
Assim como quando Callius estava usando a “Pulseira de Vivi”, a presença da Emily parecia bem fraca.
Mas não tem como uma criança como essa ter um artefato desses.
É razoável supor que o sangue divino não esteja fluindo normalmente, ou seja, bloqueado.
— Você teve um acidente? Ou foi intencional?
— …
Emily calou a boca.
Grandes gotículas de lágrimas pendiam tristemente dos cantos dos olhos.
Ela estava desesperadamente tentando conter suas lágrimas.
Vendo Emily olhar para o chão assim, Callius se virou para olhar para a paisagem do lado de fora da carruagem.
‘Você deve ter uma história que não pode me contar.’
Ele ficou um pouco curioso, mas não perguntou mais, até porque não queria falar muito, nem queria ouvir a situação dos Jervain.
Afinal, era apenas uma amizade de curta duração.
Uma que logo chegaria ao fim.
Então, não havia motivo para se preocupar.
Sua jornada continuou por três dias.
A carroça finalmente chegou ao território da família Jervain. Em frente, eles podiam ver a cidade construída em um enorme pedaço de terra, e o castelo majestoso no final.
Castelo Jevariano, a casa ancestral da família Jervain.
**TL/N: Adaptando Castelo Jevarsch para Castelo Jevariano para facilitar a leitura.
— Então, vamos nos separar aqui.
Callius imediatamente se despediu da Emily, que também bufou, virou as costas e começou a caminhar em direção ao castelo.
— Você não quer vir?
Emily e suas servas estavam indo para o castelo atravessando a neve áspera.
O castelo ficava no topo de um penhasco íngreme, com paredes resistentes e muralhas altas. O Castelo Jevariano era nada menos que uma fortaleza natural, e era onde Emily von Jervain deveria estar.
— É a propriedade da família Jervain. Eles vão me reconhecer, e isso não vai acabar bem.
— Estamos ficando sem comida… e temos algumas coisas para vender.
— Você só vai chamar atenção.
O povo do Norte trata a linhagem Jervain com o maior respeito, afinal são o escudo do Norte, por isso é impossível que os habitantes locais não reconheçam um membro quando o veem.
Portanto, era difícil para Callius entrar nas propriedades dos Jervain.
Porque a notícia rapidamente chegaria à família assim que os moradores o reconhecessem e o saudassem.
‘Eu sou a ovelha negra, então vai dar merda se eu vagar por aqui.’
Seria muita sorte se ninguém me recebesse com uma faca e me repreendesse para sair de lá.
— Vamos lá.
O que é urgente agora não é a existência de Emily, mas o dono da Espada Espiritual, Bernard.
— Mas que tipo de pessoa é esse Bernard que precisamos encontrar?
Os cantos dos lábios di Callius se contraíram com a pergunta de Bruns.
Seus olhos ficaram afiados e suas mãos roçaram o punho da espada pendurada em sua cintura.
— Aquele maldito velho.
Fortaleza Jevariana.
Cheleleuk.
Correntes grossas sacudiram quando os enormes portões se abriram lentamente.
Kugugung.
Uma criança e duas servas podiam ser vistas entrando.
A garota tinha cabelo preto e olhos cinzentos, e seu cabelo curto estava amarrado por um toucado bem bonito.
Era Emily von Jervain.
Assim que os portões se abriram, ela entrou e correu para a capela.
Abrindo a porta, havia um velho de cabelos grisalhos, bebendo álcool em frente à estátua de Valtherus.
— Oh, isso aqui é água benta…
Seu rosto estava corado como se estivesse completamente bêbado, e o álcool escorria por sua barba branca.
Se estava fingindo ser um sacerdote, ele não deu uma impressão muito boa.
— Vovô? O senhor sabe de onde acabei de voltar?
— Hã? Quem é você?
— É Emily, Emily! O senhor nem se lembra mais de mim?!
— Ah, Emily, minha netinha querida!
— Não, não sou neta do vovô, sou mais como sua sobrinha-neta.
— E onde você estava? Os servos estavam procurando por você desde que desapareceu.
Emily se sentou de um lado da capela com um rosto irritadiço.
— Eu fui brandir minha espada contra os bandidos, mas acabei capturada.
— Ahh… Por que você fez uma coisa dessas? Eu disse que era muito cedo para você.
— Eu nunca matei ninguém. Albert falou que é preciso matar para se tornar um verdadeiro Cavaleiro. Então, meu sangue divino vai poder ser desbloqueado.
O sacerdote olhou para Emily com pena e deu um tapinha no seu ombro.
— Mas como você escapou?
— Alguém… me ajudou.
— Oh, que ser abençoado! Quem é, preciso agradecer pessoalmente.
— É alguém que o vovô conhece.
— Hm…? Alguém que eu conheça? Gilbert? Não, ele está na linha de frente agora… Então, Charlie? Não, ele está caçando bestas mágicas na Floresta Branca…
— Quem poderia ser?
— A ovelha negra dos Jervain.
O sacerdote bêbado semicerrou os olhos.
— Ei…
— Aquele bastardo… me salvou.
— Como ele estava?
— Ele é bonito. E me chamou de inteligente.
— Mas ele não foi vulgar, né?
— Não… assim como o vovô disse.
— Hahaha!
O sacerdote rindo alegremente tocou o punho da espada pendurada na cintura.
— Callius. Então ele voltou.
O nome dele era Bernard.
Um Paladino, que encontrou sua própria espada depois de uma longa peregrinação.