Crunch, crunch.
Um som estranho o acordou de seus pensamentos.
Lukas se virou. Atrás dele, Pale começou a comer o cadáver meio cozido do enorme monstro. Era mais como predação do que como comer e, embora o exterior estivesse queimado, o interior ainda estava cru, o que fazia com que o sangue pingasse da carne quando ela era rasgada.
O sabor, o cheiro e a textura deviam ser os piores, mas Pale ainda comia com entusiasmo, como se tivesse encontrado a comida mais deliciosa do mundo.
Então, de repente ela se levantou e enxugou os lábios como se sentisse o olhar de Lukas.
— Eu comi bem! Obrigada.
Ele não se lembrava de ter respondido quando ela pediu permissão, mas no final, ainda assentiu sem jeito.
Pale sorriu. As manchas de sangue que cobriam seu rosto a deixavam com um sorriso assustador. Então, ela enterrou o rosto no cadáver meio comido do monstro mais uma vez.
Crunch, crunch.
Ele percebeu a origem do som misterioso. Eram as escamas do monstro. Pale mastigava as escamas, cuja dureza era inimaginável, como se fossem carne.
Ptfu.
Depois de cuspir uma escama particularmente dura, Pale falou novamente.
— Meu nome é Pale. Ah, mas você já sabia meu nome.
— Hm?
Ela estreitou os olhos ligeiramente.
— Mas como você sabe meu nome?
Não havia sinais de suspeita em sua voz ou em sua expressão. Mas não havia como dizer o que ela estava pensando por dentro.
Como ele deveria explicar isso?
Lukas hesitou por não ter certeza do que fazer, mas Pale balançou a cabeça.
— Bem. Não importa.
Não importa?
Não importava que alguém que você encontrou pela primeira vez soubesse seu nome?
Tal conclusão era completamente incompreensível para o princípio de pensamento de Lukas, mas não havia necessidade dele entender isso.
— Obrigado por cuidar de mim.
Ele decidiu mudar de assunto agradecendo-lhe.
Ficou claro que Pale o protegeu enquanto ele estava inconsciente. O Mundo Imaginário era um lugar muito perigoso. Sem ela, ele poderia ter se tornado a refeição de um monstro antes mesmo de voltar para si.
— Hehe. Bem…
Pale coçou a cabeça enquanto sorria timidamente.
Lukas não pôde deixar de observá-la por um momento.
“Quem é ela?”
Uma presença estranha, uma personalidade misteriosa e uma compreensão surpreendente deste mundo.
Sua pergunta não surgiu por causa desse conhecimento.
Era porque Pale estava, claramente, escondendo algo.
Na verdade, mesmo antes de morrer, ele teve essa sensação desde a primeira vez que conheceu Pale, mas depois de encontrar Yang In-hyun, ele teve certeza.
—Já te vi uma vez. Na ‘Guerra da Existência’ na Região Oeste…
A Guerra da Existência.
Yang In-hyun falou como se tivesse conhecido Pale lá. Claro, Lukas não sabia o que era a Guerra da Existência e não sabia onde ficava a Região Oeste. No entanto, ele não achava que Yang In-hyun estivesse enganado.
Mas Pale o negou imediatamente. Presumivelmente, isso ocorreu, porque ela não queria revelar o fato de conhecer Yang In-hyun.
—Como a jovem senhorita disse, devo ter me enganado… Por favor, perdoe minha grosseria.
—Há mais uma coisa que gostaria de perguntar. Eu vou matar aquele homem agora. A jovem senhorita vai me impedir?
—Se a jovem senhorita pretende me impedir, eu recuarei imediatamente…
Yang In-hyun manteve uma atitude extremamente cautelosa em relação a Pale.
Para ser preciso, ele parecia ter medo de enfrentá-la.
Foi por isso que Lukas não tinha escolha a não ser ter mais cuidado e até mesmo ter um pouco de medo de Pale.
Ele sabia o quão forte Yang In-hyun era. Já que lutou pessoalmente contra ele, Lukas sabia disso muito bem.
O caminho da espada que ele tinha visto se estendia até o limite do que um ser poderia alcançar. Cada golpe de sua espada continha a essência do próprio ser de Yang In-hyun, e eles representavam o pico.
Mesmo que Lukas tivesse não apenas o poder de nove estrelas, mas também a Língua Final e a força externa de um Absoluto, ele não pôde garantir a vitória naquela luta. Não, com toda a honestidade, ele sentiu que perderia mesmo com isso.
E, no entanto, Pale era alguém que Yang In-hyun temia…
— O que foi? Tem algo no meu rosto?
Com as palavras de Pale, Lukas desviou os olhos.
— Sangue e carne.
— Ah.
Pale limpou o rosto com a manga. Então, se virou para olhar para ele como se dissesse ‘que tal agora?’.
Sua aparência tola não parecia nada perigosa, mas isso apenas o deixava mais cauteloso…
Olhando para o rosto que não estava completamente limpo, Lukas assentiu.
— Mas você não vai comer, tio?
Pale sugeriu que ele comesse comida. Eles tiveram uma conversa semelhante da última vez.
Naquela época, ele havia negado sua fome, mas no dia seguinte, seu corpo começou a desaparecer pelos dedos dos pés.
O fenômeno do desaparecimento.
Ele comeu o rato que Pale deu a ele e conseguiu escapar do fenômeno.
Ele não queria estar em dívida com ela… Além disso, a única maneira de reabastecer sua mana era ingerir nutrientes de alguma forma.
Com um suspiro, Lukas se aproximou de sua presa. Então, depois de cortar um pedaço de carne, arrancando grosseiramente as escamas e cozinhando o mais uniformemente possível com uma chama do tamanho da palma da mão, ele comeu.
Na verdade, ele mordeu um pedacinho e provou. Era um pouco comestível. A primeira refeição que ele comeu da última vez foi um rato sujo. Então, embora estivesse um pouco seco, o sabor era muito melhor. Era um pequeno conforto.
* * *
Ele olhou para o céu. As cores se misturavam como se várias tintas fossem despejadas no mesmo lugar. Da última vez, ele usou esse tempo para organizar seus pensamentos enquanto estava no meio do deserto.
Lukas olhou para Pale. Ela estava deitada na areia plana, olhando para o céu.
Não parecia que ela não estava pensando em deixá-lo como antes.
Várias questões surgiram em sua mente.
O que exatamente ela planejava fazer com ele? O que aconteceria se ele tentasse afastá-la? O que ela estava pensando?
De repente, Pale se virou para olhar para ele. Talvez ele estivesse encarando ela muito abertamente.
Decidindo tomar a iniciativa antes que ela abrisse a boca, Lukas falou…
— Você conhece os Doze Lordes Imaginários?
— Conheço.
Ele recebeu uma resposta simples.
— Como eles são?
— Eles são incríveis!
— …
Embora ele esperasse uma resposta semelhante, a resposta dela não o ajudou em nada.
Deus disse a Lukas para se tornar um dos Doze Lordes Imaginários e subir ao trono. Mas ele nem sabia quem eram os Doze Lordes Imaginários.
Apenas pelo nome, ele assumiu que eram os doze seres que governavam o Mundo Imaginário…
Lukas queria perguntar mais alguns detalhes, mas logo mudou de ideia. Em vez disso, alguém que se comunicaria mais do que ela apareceu em sua mente.
Ele se dizia um intelectual e, após conversar com ele, Lukas percebeu que ele não estava blefando.
“Michael”.
Ele tinha a sensação de que Michael definitivamente saberia sobre os Doze Lordes Imaginários.
Já que Lukas não esquecia a localização dos lugares que já havia visitado, ele sabia a localização da cidade subterrânea.
Poderia ir para lá agora, mas isso não seria diferente de invadir o território de forma imprudente em vez de ser convidado. Na pior das hipóteses, ele poderia até ter que lutar contra Michael.
“Se eu esperar um pouco, os [Miglings] virão.”
Afinal, foram eles que o procuraram da última vez.
A previsão de Lukas não estava errada. Quando a cor do céu mudou pela quinta vez, figuras pareciam se aproximar deles à distância.
Miglings.
Pale exclamou, seus olhos brilhando.
— Uau! Estes são nativos! Acho que estão aqui para convidá-lo!
Ignorando a empolgação de Pale, Lukas olhou para os miglings. Na cidade subterrânea, parecia que eles podiam falar, mas agora mantinham a boca fechada como se não tivessem cordas vocais.
Eles não podiam falar no deserto?
Escondendo suas dúvidas, ele obedientemente permitiu que o puxassem pelas mãos e roupas.
Depois de caminhar um pouco no deserto, eles chegaram em frente a um pequeno formigueiro. Os miglings se lançaram um após o outro.
E desta vez, Lukas saltou antes de Pale. Ele ouviu o ‘uh’ de surpresa dela quando entrou.
Ele caiu no rápido fluxo de areia para a cidade subterrânea e foi arremessado pelos miglings que caíram primeiro.
Lukas prosseguiu com o rosto inexpressivo, esperando que o pequeno passeio terminasse.
Depois de um tempo, os miglings se aproximaram dele e falaram.
— Siga, venha.
— Nós.
— Siga, venha.
Desta vez, os seguiu sem fazer perguntas como da última vez.
Enquanto caminhavam, ele olhou lentamente ao redor da cidade. Da última vez, não conseguiu fazer isso, porque não estava com um humor tão relaxado.
“É muito maior do que eu pensava.”
Havia muitas ruas laterais, além da estrada que seguia para o norte pela qual eles estavam caminhando, que levava à catedral em que Michael se hospedava. Além disso, havia também uma grande estrada que cortava de leste a oeste e passagens que passavam abaixo da cidade subterrânea. Tochas tremeluzentes eram as únicas fontes de luz nas passagens escuras.
Isso mostrava que não eram naturais, mas caminhos feitos pelas pessoas para que pudessem passar.
— Isso, não olhe.
Um migling o avisou silenciosamente.
— Por quê?
— Pode entrar em luta.
— Com quem?
O migling franziu a testa.
— Desgraçados.
— …
O migling não parecia querer falar mais sobre o assunto, então Lukas não fez mais perguntas.
Em pouco tempo, chegaram à catedral em que Michael estava hospedado.
— A partir daqui, só você.
Com um aceno de cabeça para as palavras do migling, ele entrou na catedral. E fingiu não ouvir Pale reclamar com inveja.
Talvez devesse perguntar a Michael sobre Pale também… Ele poderia ser capaz de obter uma resposta inesperada. Decidiu fazer isso se tivesse a chance.
Creak–
As enormes portas de ferro se abriram.
A cena na catedral era magnífica, e um altar ficava no final do longo corredor.
De pé neste altar, lendo um livro, estava ninguém menos que Michael.
— …
— …
Mesmo olhando novamente, parecia o Lorde. Ele não estava tão surpreso quanto antes, mas ainda sentia uma cautela instintiva.
[Um convidado interessante.]
Michael parecia estar ciente da presença de Lukas desde o início. O som das portas de ferro era um pouco alto.
[Como você chegou aqui? Ser desconhecido, mas familiar.]
Michael provavelmente sentiu desde o início que Lukas era do mesmo universo fundamental que ele.
“Ele ainda não tem certeza.”
Michael só se convenceu depois dele mencionar o nome Trawman.
De qualquer forma, desta vez, ele não pretendia ser conduzido impotente como da última vez.
— Intelectual da Cidade Subterrânea. Eu vim aqui, porque tenho algo para lhe perguntar.
Ele decidiu pular as perguntas desnecessárias e ir direto ao ponto principal.
[Hoh…]
Com um som interessado, Michael fechou seu livro.
[Você sabe sobre mim.]
— Sim.
[Como você disse, eu sou um intelectual. Tenho conhecimento suficiente para responder a qualquer uma de suas perguntas. No entanto–]
— Você não pretende simplesmente me dar as respostas que procuro. Porque vai contra as regras deste mundo, certo?
[…]
Michael ficou em silêncio. Ele pareceu surpreso, ou até um pouco chocado. Essa reação era natural, visto que as palavras que ele estava prestes a dizer foram roubadas dele, mas Lukas simplesmente o interrompeu, porque queria ir direto ao ponto o mais rápido possível.
— Troca equivalente. Tudo bem. Então vamos trocar respostas de perguntas uma após a outra.
[Embora fosse isso que eu ia sugerir…]
— Há algum problema? Tenho certeza de que você está um pouco interessado em mim agora.
[Nem tanto…]
Michael respondeu com uma voz ligeiramente desconfortável.
Lukas então falou imediatamente…
— Então eu vou perguntar primeiro. Conte-me tudo o que sabe sobre os Doze Lordes Imaginários.
[…]
Michael ficou em silêncio novamente. Foi por causa de sua surpresa com a pergunta de Lukas, ou foi porque ele estava chocado por ter perdido completamente o controle?
Lukas não sabia dizer por que ele não tinha nenhuma expressão em seu rosto.
[Em detalhe… O que você quer especificamente?]
— Que tipo de seres eles são. Quem são os membros e quais são seus objetivos. Seria bom se você também pudesse me dizer onde eles estão.
[Isso não vai funcionar. Isso excede em muito a capacidade de uma pergunta.]
Embora ele tenha dito isso de forma tão complexa, foi apenas um truque para assumir o controle da primeira rodada. Naturalmente, Lukas também não esperava que fosse tão fácil.
— Então, diga-me que tipo de seres são os Doze Lordes Imaginários.
[Bom… Posso dizer-lhe isso.]
Michael assentiu e disse…
[Existem muitas maneiras de descrever os Doze Lordes Imaginários, mas a expressão mais próxima da essência seria ‘os candidatos mais fortes e qualificados’.]
— Candidatos? Para quê?
[Para entrar no Castelo do Rei.]
Castelo do Rei.
Naquele momento, Lukas de repente se lembrou de uma conversa com Kasajin.
—Chegamos. Você vê aquele castelo?
—Eu acho que você não pode vê-lo.
O espaço que parecia vazio em seus olhos.
E Kasajin que estava apontando para lá.
—Parece que ainda não é o suficiente.
—Eu já te disse. Tenho acompanhado tudo daqui. De qualquer forma, acho que você ainda não tem as qualificações.
Ainda não tenho as qualificações?
Kasajin também queria que ele se tornasse um dos Doze Lordes Imaginários?
A expressão de Lukas enrijeceu ligeiramente.
Se isso fosse verdade, então significava que Deus e Kasajin queriam a mesma coisa para Lukas.
[É a minha vez. Seu nome. Não, eu quero saber seu sobrenome.]
— Trawman…
[Hoh. Então você é um Trawman… De fato.]
Michael falou como se estivesse convencido.
Lukas fez sua próxima pergunta.
— O que eu preciso fazer para me tornar um dos Doze Lordes Imaginários?
[Existem duas maneiras de fazer isso. Ou você aparece neste mundo desse jeito em primeiro lugar, ou você derrota um dos Doze Lordes Imaginários e ocupa seu lugar. O primeiro é simples, o último é um pouco mais complicado.]
Lukas achou o contrário.
Comparado com o último, que significava simplesmente derrotar um dos Doze Lordes Imaginários, o primeiro era muito mais difícil de entender.
O que significava aparecer neste mundo ‘desse jeito’? Isso significava que eles se tornaram Lordes Imaginários desde o momento em que nasceram? Como os governantes?
Suas sobrancelhas franziram ligeiramente, mas ele não perguntou mais nada.
Porque a vez de Lukas havia terminado.
[Você é um Absoluto?]
— Sim.
[Hmm.]
Michael parecia satisfeito, mas Lukas não pôde deixar de sentir que o estava enganando. Claro, não foi o suficiente para ele ficar com a consciência pesada. Provavelmente porque Michael se parecia com Lorde.
Em vez disso, ele se perguntou como poderia extrair mais conhecimento.
“Porque a informação que posso dar a Michael é limitada.”
Por outro lado, havia uma montanha de coisas que Lukas queria perguntar a Michael.
Isso significava que teria que ser cuidadoso com suas perguntas de agora em diante.
Depois de pensar por um tempo, Lukas percebeu o que mais deveria perguntar.
— Quão fortes são os Doze Lordes Imaginários?
[…]
Michael não respondeu imediatamente.
Era porque foi uma pergunta difícil de responder? Ou havia outro motivo?
Lukas olhou nervosamente para o rosto branco e inexpressivo.
Então, depois de um tempo, ele falou…
[Isso mesmo. Para dar uma resposta que você possa entender…]
Quando ele ouviu as palavras que Michael disse em seguida, os olhos de Lukas se arregalaram.
[A Governante que entrou neste mundo, a Deusa Dragão das Sete Presas, foi derrotada por um dos Doze Lordes Imaginários.]