Eles caminharam por muito tempo.
Lukas reconheceu isso pelo fato de que a cor do céu mudou cinco vezes.
Em algum momento, a paisagem ao redor mudou completamente. Não percebeu imediatamente. Não apenas porque estava focado na mudança de cores do céu. Em vez disso, era porque algo que Lukas não conseguia perceber interferiu em sua concentração quando entraram na área desconhecida.
Foi semelhante à primeira vez que entrou na Montanha das Flores…
Um sentimento de incongruência escondido no meio de uma naturalidade perfeita.
Era quase como se tivessem entrado em uma dimensão completamente diferente…
Splash—
O toque do líquido frio.
Lukas se viu parado no meio do mar. Ou, pelo menos, era o que a cena ao redor afirmava.
Da superfície, o mar parecia inimaginavelmente profundo, mas, na verdade, chegava apenas aos tornozelos. Na realidade, não era um mar, mas uma vasta poça de água rasa e estagnada.
— Onde estamos?
— Na Região Norte, O Mar da Possessão Perdida.
Pale respondeu com um largo sorriso. Para ela, foi uma boa resposta.
Como de costume, ela falou em um tom direto e sem nenhuma explicação que só ela conseguia entender, mas apenas saber o nome era diferente de saber onde você estava. Isso era especialmente verdade para Lukas, que era novo neste mundo.
— Aguente mais um pouco! Estamos quase lá!
Parecia que esse não era o destino final.
Pale avançou com passos rápidos.
Splash, splash.
O som da água espirrando era quase ensurdecedor.
Enquanto seguia atrás, Lukas sentiu que suas vestes eram um pouco pesadas, então simplesmente as descartou.
Não caminharam tanto tempo desta vez.
Depois que o céu mudou de cor apenas mais algumas vezes, Pale parou de andar novamente.
— Provavelmente é aqui…
Assim que ela murmurou baixinho.
Boom…
Lukas sentiu a superfície da água começar a tremer levemente. Sua expressão ficou rígida.
— Pale.
Algo estava vindo. Antes que ele pudesse dizer isso…
Fwoosh!
A superfície da água irrompeu com um som alto. De baixo, a sombra de algo enorme foi revelada.
“Grande!”
Lukas não pôde deixar de admirar o tamanho do monstro.
A princípio, tudo o que ele podia ver era um olho dourado. Então, um corpo gigantesco coberto por suaves escamas turquesas apareceu.
O monstro tinha a aparência de uma enorme serpente marinha. Apenas levantando ligeiramente a cabeça, obscureceu todo o céu.
Era diferente dos monstros que encontrou no deserto. Não era apenas o seu tamanho. Havia algo, mas Lukas não tinha certeza do que era.
Isso era normal nesta área? Suprimindo suas dúvidas, Lukas gritou novamente.
— Pale!
No entanto, ela estava olhando para o monstro com sua expressão indiferente característica.
— Que sorte! Não acredito que apareceu tão rápido!
— O quê?
— Eu irei primeiro~
Pale tomou impulso ligeiramente do chão e saltou em direção à serpente marinha. A serpente calmamente olhou para ela com olhos maiores que seu corpo e abriu a boca.
Glup.
— !
Em um piscar de olhos, ela foi engolida.
Isso era literal, a serpente marinha havia engolido todo o corpo de Pale.
Lukas ficou lá como uma estátua.
Shuk—
O olhar da serpente marinha então se voltou em sua direção. Seus olhos estavam cheios de indiferença.
Não havia hostilidade ou fome.
Em vez disso, parecia estar perguntando calmamente o que Lukas pretendia fazer.
“Tenho que ser comido também?”
— …
Lukas mordeu o lábio.
Ele não sabia o que estava acontecendo, mas uma coisa estava clara. Se não avançasse agora, a serpente marinha iria embora.
“Um método para se tornar forte…”
Quanto ao que era esse método, Lukas não fazia ideia.
Pale era sua única dica.
Sss—
Lentamente, seu corpo flutuou no ar. A gigantesca serpente marinha abriu a boca na direção de seu corpo flutuante como se esperasse por ele.
Lukas se jogou em sua garganta.
A textura escorregadia do esôfago era desagradável. A saliva pegajosa que entrava em suas roupas, o fedor terrível… Se ele soubesse que isso aconteceria, não teria tirado suas vestes.
Ele escorregou por um tempo, como se estivesse deslizando em um escorregador.
Era a mesma sensação, mas, naturalmente, não era tão agradável.
Tum.
— Ugh.
Ele esbarrou em alguém. Sentiu um latejar na cabeça, como se algo o tivesse atingido.
— Ai ai ai ai…
Ele ouviu um gemido. Parecia a voz de Pale.
Lukas piscou, mas não conseguia ver nada ao seu redor.
Pat—
Ele usou o feitiço Clarão para iluminar os arredores.
Então, viu Pale, que havia caído de bunda e segurava a testa.
— Você está bem?
Pale olhou para a mão estendida de Lukas, que não estava gemendo. Um olhar estranho apareceu em seus olhos.
— Pale?
— Sim…
Com um tom desinteressado, ela segurou a mão dele e ficou de pé.
Lukas se deu ao trabalho de olhar em volta… Era o estômago da serpente marinha? Parecia estranhamente quente e abafado.
— Ser digerido e se tornar parte da carne e do sangue de uma serpente marinha não é realmente um método para se tornar mais forte.
— …
Pale não respondeu imediatamente. Em vez disso, estava olhando para as palmas das mãos. Ao contrário do normal, havia uma expressão séria em seu rosto.
— Pale?
— Hã? Oh. Pensando bem, esse era o método?
— …
Em vez de se sentir chocado com a resposta inesperada de Pale, Lukas decidiu primeiro se sentir aliviado por suas palavras não estarem erradas.
Com um leve sorriso, Pale cerrou levemente o punho e falou.
— Este lugar é um depósito de lixo.
— Depósito de lixo?
— Devemos ir mais fundo primeiro.
Saltando, Pale caminhou para frente. Ele não teve escolha a não ser segui-la enquanto olhava ao redor.
A primeira coisa que notou foi a parede… Era a parede de um estômago? Parecia isso, mas parecia estranhamente diferente. Assim que estava pensando em tocá-la, ouviu a voz de Pale.
— Obrigado por seu trabalho duro.
Eles estavam em um beco sem saída.
Mas isso não significava que não havia nada lá.
Alguém estava parado na frente de Pale. Lukas não pôde deixar de se sentir surpreso ao ver a aparência dele. Um crânio liso e limpo, ossos brancos e órbitas vazias.
Um esqueleto.
Um esqueleto estava parado no beco sem saída.
Pale finalmente enlouqueceu? Não. Não pode ser isso.
[Veio, para, que negócio?]
Uma voz saiu do esqueleto.
A razão para a expressão ‘saiu do’ foi porque a mandíbula do esqueleto não se mexeu ao fazer a voz.
Era como telepatia que eles ouviram. Mas Pale não pareceu surpresa com isso enquanto falava calmamente.
— Estou aqui para pegar uma ‘possibilidade’.
[Entendo. Um pouco, espere.]
Os olhos do esqueleto brilharam quando olhou para Pale. Parecia que a estava analisando.
Então voltou a falar.
[Não, é possível. Sua, origem, sem perda.]
Pale balançou a cabeça como se isso fosse esperado.
— Não, eu não, seu esqueleto idiota. Por que comete o mesmo erro toda vez que venho aqui?
[…]
— Analise a origem deste tio, não a minha.
O esqueleto então virou o crânio para olhar para Lukas. Quando olhou de perto, podia ver chamas fracas queimando dentro daquelas órbitas profundas e escuras.
Estava analisando-o?
Após um momento de silêncio, o esqueleto falou novamente.
[Um, ser, do universo, número 2731361.]
— Hmm.
[Estranho. As possibilidades, deste homem, único, neste mundo. Não. Em vez disso, um externo…]
O esqueleto inclinou a cabeça para o lado enquanto murmurava com uma voz rouca.
Pale riu.
— Não é seu trabalho se preocupar com isso, é?
[Isso está, correto…]
Ao dizer essas palavras, o esqueleto recuou.
Havia uma enorme bússola, ou talvez algo parecido com um relógio, pendurada na parede.
No entanto, havia muito mais ponteiros do que os ponteiros das horas, minutos e segundos. À primeira vista, havia dezenas deles. As marcações também pareciam bastante precisas.
O esqueleto esticou os dedos ossudos em um movimento familiar e começou a ajustar as mãos em forma de agulha. Ao contrário de sua voz lenta, não houve hesitação no movimento de seus dedos.
Pale cantarolava baixinho enquanto esperava.
E quando o ajuste acabou.
Boom—
A parede sem saída começou a tremer antes de finalmente se dividir ao meio. Pouco tempo depois, o espaço negro escondido atrás dele foi revelado.
[Número 2731361, lixão.]
— Uau. Bom trabalho!
Pale deu um tapinha no ombro do esqueleto e o elogiou. Ignorando isso, o esqueleto falou novamente.
[Mes-, tre, quer, encontrar você.]
Naturalmente, ele não estava falando com Lukas. A cabeça do esqueleto estava voltada para Pale.
Ela acenou com a mão para ele com desdém.
— Não posso. Não vê que estou ocupada agora?
[En, tendo… Entendido.]
O esqueleto não fez o pedido novamente.
[Espero, que a possibilidade, que você deseja, esteja lá.]
Depois de dizer isso, abaixou a cabeça. Como uma máquina que terminou sua tarefa.
— Agora, então. Vamos lá!
Pale desviou sua atenção do esqueleto. De repente, se aproximou de Lukas e agarrou sua mão. Então, o conduziu com um sorriso satisfeito no rosto.
Assim que entraram na escuridão, o som da parede se fechando novamente pôde ser ouvido atrás deles.
— Não podemos voltar por ali?
Lukas perguntou enquanto olhava para Pale, que estava segurando sua mão.
— Não há mais necessidade de ir lá. Se formos um pouco mais longe… Olha. Não chegamos rápido?
Pale esticou um dedo.
— Chegamos.
Lukas cobriu o nariz por um momento. Havia um fedor neste lugar que era completamente incomparável a antes.
Cheirava a cadáveres em decomposição.
Mas a cena à sua frente era ainda mais nojenta do que o cheiro.
— …
Ele ficou sem palavras ao contemplar a montanha de cadáveres. Não, havia tantos cadáveres empilhados uns sobre os outros que poderia ser descrito como um mundo de cadáveres.
Não importava para onde olhasse, não havia nada além de cadáveres. Mesmo Lukas nunca havia testemunhado tal visão.
— Tudo aqui são possibilidades que foram descartadas.
Pale caminhou pelo lugar.
A visão o deixou sem fala por um momento. Enquanto avançava um passo de cada vez, ela parecia um anjo passeando pelo inferno.
Então, começou a vasculhar os cadáveres com uma expressão inocente.
— Eles são todos cascas ocas e ainda assim não desapareceram. Não apodreceram. Por quê? Porque este lugar não tem nada parecido com um submundo.
— Esses cadáveres morreram no Mundo do Vazio?
— Daria para se dizer isso.
Pale riu.
— Este mundo obedece às leis da selva. E a presa se torna a carne e o sangue do predador no sentido mais verdadeiro. Em outras palavras, absorção. Essa é a regra aqui, e é a maneira mais comum de se tornar forte.
— …
— A propósito, a eficiência da absorção varia muito dependendo do alimento.
— Eficiência?
— Mesmo que o adversário seja muito mais forte que você, se não tiverem nada em comum, a eficiência será muito baixa. Se são seres completamente diferentes, pode até ser tão baixo quanto 0,1%.
O tom de Pale estava um pouco diferente do normal. Parecia que ela era uma pessoa completamente diferente. Não era só porque esta era sua primeira explicação detalhada.
Para Lukas, uma sensação estranha nunca era uma coisa boa.
Ele quase instintivamente olhou para trás, para o caminho que haviam feito.
Mas tinha certeza de que não existia mais uma rota de fuga.
Talvez Pale não tivesse notado seu comportamento, porque continuou com uma voz suave.
— Por outro lado, quanto mais você tem em comum, maior a eficiência de absorção. Qualquer coisa está bem. Seja a aparência, como a cor do cabelo, a cor dos olhos, o mesmo gênero, as características semelhantes, ou mesmo o modo de falar… O que estou tentando dizer é que o mais eficiente é… Ah.
Suas mãos que estavam procurando pararam por um momento.
— Encontrei. Como esperado, tenho muito mais sorte quando você está por perto.
Pale sorriu enquanto puxava um cadáver dos outros cadáveres.
— !
No momento em que viu este cadáver, Lukas não pôde deixar de respirar fundo.
Parecia que tinha sido negligenciado por um longo tempo. Estava em péssimas condições.
Faltavam pedaços como se tivesse sido comido por cães selvagens. Em particular, a parte inferior do corpo era inexistente, como se tivesse sido arrancada.
No entanto, o rosto ainda era facilmente reconhecível.
Cabelo loiro escuro, olhos azuis mortos.
Pale…
Exibiu o cadáver meio comido de ‘Lukas Trawman’ com um largo sorriso.
— Esta é a melhor presa para o tio. Ah. Já está morto, então você deve poder comer isso, certo?