Há pessoas gritando no chão.
Foi isso que Yang In-hyun disse, mas Lukas não ouviu nenhum grito. No entanto, ele notou que havia uma atmosfera perturbadora em algumas áreas no solo.
A princípio, ele esperava ver pessoas sendo atacadas por demônios, monstros ou algum outro tipo de ser monstruoso.
Mas foi diferente.
A cena que Lukas viu não foi de ataque ou massacre.
Foi uma mina. Uma enorme mina que raramente era vista.
A hora atual era 16:37 da tarde. Era muito cedo para o sol ter se posto, mas a entrada da mina estava excepcionalmente escura e sombria. A razão para isso foi que toda a área de mineração estava coberta por uma névoa negra. Como se estivesse viva, a névoa negra que cercava a área parecia bloquear ativamente a luz do sol.
Isso provou que a atmosfera sombria que Lukas sentiu não era um truque dos olhos ou uma sensação.
O papel da névoa negra não era simplesmente bloquear a luz do sol. Também servia para esconder ao extremo os sinais da mina. O tamanho de toda a área de mineração era comparável ao de uma cidade pequena, mas teria sido impossível, mesmo para pessoas com sentidos extremamente aguçados, perceber os sinais de vida dentro da névoa negra.
Yang In-hyun foi provavelmente o único que poderia ter percebido essa incongruência a milhares de metros de altura.
— É um ser formidável.
Yang In-hyun encostou-se na parede da aeronave enquanto dizia isso.
— Eu sei.
Outros podem não perceber, mas o ser que espalhou a névoa negra não era fácil de ver. Isso ficou mais claro pelo fato de que até mesmo Lukas e Yang In-hyun ainda não haviam descoberto sua identidade.
— Isso provavelmente tem algo a ver com aquele grupo [VIP].
— …
Ele pensou que isso era um palpite. Afinal, definitivamente havia muitos seres fortes neste universo além dos VIPs.
Enquanto as palavras de Yang In-hyun fluíam por um ouvido e saíam pelo outro, Lukas realizou movimentos espaciais com Pale.
E num instante chegaram à entrada da mina. Não havia guardas na entrada. Ele sabia disso desde o início e foi por isso que usou corajosamente o movimento espacial.
Sss…
Ele podia sentir a névoa negra se contorcendo e tentando envolver seu corpo. Lukas ficou parado e não recusou o contato desagradável.
— Ugh.
Por outro lado, Pale cuspiu com uma expressão de desgosto.
— Algo neste lugar não está certo.
Embora ele concordasse.
— Aguente firme…
Depois de dizer isso, a primeira coisa que fez foi analisar a névoa que o tocava.
Naturalmente, não era um fenômeno natural. Não era magia. Se ele tivesse que classificá-la, diria que era algum tipo de técnica maligna, mas era de um nível tão alto que poderia ser chamado de Autoridade. (N/T: No mesmo nível das habilidades dos semideuses)
No entanto.
— …
Foi nesse momento que os olhos de Lukas ficaram pretos por um instante. O movimento contorcido da névoa negra ao redor de seu corpo parou por um momento.
Então, passou direto por Lukas e Pale e continuou como estava. Depois disso, a névoa negra não tentou mais envolver seus corpos.
Olhando para o corpo dela, Pale disse…
— O que você fez?
— Depois de analisá-la, a enganei para que não fosse mais capaz de nos perceber.
— Versátil!
— Por favor, abaixe sua voz de agora em diante…
— Siiiiim.
— …
O rosto de Lukas estava um pouco tenso.
Isso porque quando ele analisou a névoa negra, sentiu um fragmento de um poder familiar dentro dela.
[Hehehe…]
Talvez o Deus do Relâmpago também tenha percebido isso porque começou a soltar sua risada excepcionalmente desagradável.
Aquele que controlava esta mina podia acabar sendo mais problemático do que inicialmente esperado…
* * *
O interior da mina estava escuro. Não que não houvesse luz, mas era tão fraca que era difícil ver o caminho.
Além disso, o ar estava muito obscuro. Claro, considerando que era uma mina, o ar não poderia estar tão limpo, mas isso era um pouco diferente.
Lukas sentiu que mesmo uma pessoa saudável não conseguiria sobreviver um ano neste lugar.
O fato de seu corpo existir naquele momento o deixou desconfortável. Lukas bloqueou bruscamente as narinas com as vestes.
Então, ele decidiu ir um pouco mais fundo.
Clang… Clang…
À medida que o cheiro de terra se intensificava, um som metálico ressoou à distância.
“O som de picaretas?”
Os passos de Lukas diminuíram gradualmente. Eventualmente, a passagem chegou ao fim e deu forma a um grande espaço de trabalho aberto.
— …
Foi nesse momento que Lukas percebeu quais eram os ‘gritos’ que Yang In-hyun tinha ouvido.
De relance, ele pôde ver centenas de pessoas fazendo o melhor que podiam para extrair minerais. Mas estava claro que eles não estavam trabalhando por vontade própria.
Suas aparências eram piores que as de feras.
Eles usavam pedaços de pano que não eram melhores que trapos e não podiam ser chamados de roupas em seus corpos muito magros. Seus cabelos e rostos estavam tão manchados de sujeira que ele podia perceber à distância o quanto cheiravam mal.
Eles não pareciam… letárgicos.
Em vez disso, suas expressões estavam cheias de desespero e ansiedade. A razão para isso foi fácil de encontrar.
Não havia apenas humanos no espaço de trabalho.
Parado no centro como uma estátua estava um monstro de doze braços. Era enorme. Sua cabeça era tão alta que alcançava o teto alto da área de trabalho.
Além disso, dezenas de olhos estavam embutidos em seu rosto, aparentemente de forma aleatória, e Lukas percebeu que suas pupilas estavam constantemente se movendo e mantendo um olhar atento sobre os trabalhadores.
“Trabalho forçado.”
Parecia que eles haviam capturado humanos e os estavam forçando a trabalhar.
Por que razão? E por quê?
Primeiro, ele decidiu continuar analisando a situação.
As pessoas balançavam picaretas vigorosamente, escavando o chão, ou empurravam os carrinhos da mina.
“O que eles estão minerando?”
Da perspectiva de Lukas, não parecia haver nenhum mineral útil nesta mina. Em outras palavras, o trabalho deles era completamente inútil.
Ou havia algo oculto que não podia ser determinado pela análise de Lukas?
De repente.
Smack!
O monstro bateu palmas com força. A pressão do vento proveniente das palmas se espalhou em todas as direções, fazendo com que a poeira se espalhasse.
Foi apenas um aplauso, mas foi bastante assustador.
O grau de força absoluta
[É ho-ra da dis-tribui-ção de a-li-mentos.]
O monstro falou bruscamente com uma voz quebrada.
Com isso, a emoção de ‘viver’ apareceu nos rostos das pessoas que trabalhavam freneticamente.
— Kilkilkil.
— Kkikki…
Pequenos monstros gordos surgiram vindos de outra passagem. Cada um deles segurava uma bolsa de couro suja nos dedos gordos.
As pessoas cambalearam até a frente dos monstrinhos. Então, eles juntaram as mãos como tigelas e as estenderam para frente.
— Kilkilkil.
Com risadas horríveis, os monstros abriram suas bolsas de couro. Então, eles pegaram algo de dentro delas e deram as pessoas.
Era feijão cozido.
“É hora da alimentação.”
Se esse fosse o caso, então o que eles estavam fazendo era distribuir comida?
Era absurdamente pouco. Era tão pouco que nem mesmo um bebê recém-nascido se sentiria saciado depois de comer.
Cada pessoa recebia no máximo um amontoado desse feijão desprezível.
— U-Um pouco mais…
Naquele momento, um garotinho falou com uma voz lamentável. Um dos monstros gordos olhou para o garoto com olhos pálidos antes de chutá-lo no estômago.
— Blergh.
Vomitando, o menino caiu no chão. O monstro não parou por aí e, em vez disso, pisou impiedosamente no garoto com seus pés largos.
O corpo frágil do menino logo ficou coberto de feridas. E então, os feijões que o menino tinha recebido, espalharam-se pelo chão.
— N-Não.
Mesmo mal conseguindo manter a consciência por causa da dor, o menino se esforçou para pegá-los. Em seguida, enfiou o feijão na boca, sem se importar com a areia e as pedras que o acompanhavam.
— …
Lukas estreitou os olhos.
Ele se perguntou se deveria deixar sua análise de lado para mais tarde e matar todos eles primeiro.
Esse pensamento impulsivo, mas, sem dúvida, humano, ressoou fortemente em sua mente.
“Um pouco mais…”
Ele se forçou a suportar e continuou observando a situação.
A hora da distribuição de alimentos foi muito curta. Provavelmente menos de dez minutos. Como só recebiam um punhado de feijão, era inevitável que o tempo concedido para comer também fosse curto. Eles nem tiveram tempo para fazer uma pausa.
Sem sequer se preocuparem em conversar umas com as outras, as pessoas ficaram espalhadas enquanto tentavam descansar um pouco.
Smack!
[É ho-ra do traba-lho.]
O aplauso do monstro fez com que eles ficassem de pé mais uma vez.
O desespero floresceu em seus rostos mais uma vez, mas seus corpos procuravam suas ferramentas como se estivessem acostumados.
Foi então…
— Urgh, hugh…
Um menino no canto não conseguia ficar de pé. Era o garoto que foi espancado quase até a morte por um dos monstros gordos.
Ele tentou ficar de pé várias vezes, apenas para cair no chão todas as vezes.
Lukas percebeu que o menino tinha um ferimento que não lhe permitia levantar apenas com coragem ou rancor. Uma fratura.
— Mexa-se, mexa-se!
Ele gritou enquanto chorava muito, mas mesmo com suas coxas tremendo fortemente, ele não conseguia nem fingir que estava de pé.
Esta cena foi captada pelo monstro gigante.
[Não conse-gue se mo-ver.]
A voz quebrada do monstro soou mais uma vez.
— Hi–hiik! N-Não! Isso não é verdade! Eu ainda consigo me mover!
O menino se esforçou ainda mais. Foi muito lamentável ver apenas a parte superior do corpo fazendo força.
— E-Espere. Alguém, por favor, me ajude a ficar de pé um pouco. Por favor!
Ele olhou em volta apressadamente enquanto gritava, mas as pessoas ao seu redor apenas fingiam que não conseguiam ouvir com rostos aterrorizados.
[Não conse-gue se mo-ver.]
Ao mesmo tempo, um dos braços do monstro começou a se esticar na direção do menino. Então, pegou o menino como se ele estivesse pegando um inseto.
— Urgh.
Nas enormes palmas do monstro, o menino era segurado como um pequeno rato.
— A–Ah. Mãe…
[En-tão come-rei.]
O peito do monstro se abriu e dentro dele uma língua roxa se contorceu. Todas as pessoas viraram a cabeça diante da visão bizarra e aterrorizante.
Quando isso aconteceu, Lukas não conseguiu mais continuar assistindo.
Ele usaria magia para matar o monstro. Furtivamente, mas não de forma destrutiva. Naquele momento, em um lugar como este…
O tempo que Lukas levou para passar por aquela série de pensamentos foi menos de um instante…
Mesmo se ele lançasse uma magia depois de considerar isso, não teria nenhum problema em salvar o garoto.
Foi por isso que o que aconteceu a seguir o pegou de surpresa.
Sem som.
O monstro que estava prestes a devorar o menino se partiu em dois.
— !
Foi cortado.
Ele nem tinha notado.
Mesmo surpreso, Lukas conseguiu envolver o menino, que havia caído solto, no vento para que ele pousasse suavemente.
Tum!
Ao mesmo tempo, as duas metades do monstro desabaram, criando uma grande tempestade de poeira. As luzes penduradas no teto balançaram fortemente, fazendo com que a iluminação de todo o espaço de trabalho piscasse. À medida que terra e pequenos pedaços de pedra caíam, as pessoas se agachavam e cobriam a cabeça.
Lukas garantiu que o menino pousasse suavemente.
Então, olhou para a pessoa que havia se revelado sem se preocupar em se esconder e matou o monstro.
— …
Pale estava ali parada, inexpressiva.
A cena dela parada ali enquanto pequenos pedaços de pedra caíam sobre ela fazia parecer que ela estava parada na chuva.
— Ah, uuhh?
— O-O que aconteceu?
— Bullseye está morto?
As pessoas que estavam agachadas endireitaram as costas mais uma vez.
Lukas não teve escolha a não ser sair da passagem.
— Pale.
— …
Ele não recebeu resposta.
Agora que pensou sobre isso, ela esteve muito quieta por um tempo. Há quanto tempo? Desde quando a atitude de Pale ficou estranha?
— Pale.
Foi só depois que ele chamou o nome dela novamente que Pale virou a cabeça. Seu rosto estava surpreendentemente inexpressivo. Isso não combinava com ela.
Quando ela sorria, ela era Pale, quando demonstrava pouca emoção, ela era a Cavaleira Azul.
Mas parecia que ele havia encontrado outro lado além desses dois.
Pale olhou para Lukas por um momento antes de desviar o olhar. Embora seu olhar estivesse no menino, ela não estava olhando para ele. As pupilas de Pale estavam focadas no garoto, mas havia uma cena completamente diferente em sua mente.
— Com fome…
A luz nos olhos de Pale começou a diminuir lentamente.
Ela pensou…
Este lugar era realmente desagradável.
E aqui uma ilustração da Pale:
