Em vez de dar uma mão a um desses incontáveis fragmentos de Poder da Alma, Jake percebeu que esse momento era propício para uma introspecção profunda e abrangente. A progressão de sua Aura apresentou uma oportunidade de mergulhar em mais questionamentos existenciais, aqueles que ele ainda não teve a chance de contemplar.
Por que ele matava?
Por que ele lutava?
Por que ele estava arriscando sua vida nessas Provações?
Para sobreviver? Definitivamente, mas não era essa a história de todos?
Poucos sabiam o propósito de sua existência, mas todos entendiam pelo menos por que não desejavam morrer. Enquanto a esperança tremulasse, a vida valia a pena lutar.
Para ficar mais forte? Claro, isso soava verdadeiro, mas se aplicava a todo Evoluído. Caramba, todo ser senciente, não importa quão sem graça ou preguiçoso, tinha uma ambição profunda de ser o melhor ou pelo menos melhorar.
A Verdadeira Vontade de Crescimento, que Jake também havia despertado, era apenas uma de suas inúmeras manifestações. Essa ânsia de evoluir, de expandir, nem sempre foi nobre. Não inteiramente.
Frequentemente, o desejo de ser o mais forte, de estar no auge, estava intimamente ligado ao ego, à vaidade. Se não cumprisse nenhum outro propósito existencial além de acariciar nossa autoestima, um anseio por reconhecimento, status ou domínio, tal ambição parecia um tanto vazia…
E se Jake não estivesse lutando por sua própria vida, mas para proteger a vida dos outros? Ele viu a verdade nisso também, mas sabia melhor do que ninguém que não era um herói. O destino da humanidade ou do universo o deixava frio, ao contrário da segurança e bem-estar daqueles que lhe eram queridos.
Mesmo como líder de uma facção, no fundo, Jake era indiferente ao destino da maioria de seus membros. Era seu senso de dever, sua bússola moral, que o levava a agir como um modelo, mas, por baixo da superfície, ele era indiferente. Enquanto sua família, Lúcia, Will, Enya, Esya, Gerulf e alguns outros selecionados estivessem bem, tudo ficaria bem.
‘Tudo ficaria bem…?’ A expressão de Jake se afiou de repente. Ele havia tropeçado em algo. Talvez ele não fosse tão emocionalmente distante quanto pensava.
Ficar mais forte, matar, não era meramente sobre vaidade ou insegurança, mas também sobre proteger aqueles que importavam para ele. Se todas essas pessoas desaparecessem, Jake duvidava que sua determinação de superar todas as provações permanecesse tão forte.
Quando tentava imaginar uma vida sem Anya, seu tio ou Lúcia, sua expressão se tornava ameaçadora, com uma intenção assassina genuína e intransigente emanando de seu ser.
Jake havia descoberto outro aspecto de si mesmo. Perder tudo não extinguiria sua vontade de lutar ou matar. Bem pelo contrário…
Se esse cenário temido se desenrolasse, ele dedicaria sua existência à vingança. Se isso significasse matar, torturar, aniquilar para aliviar seu ressentimento, sua dor, ele se tornaria um demônio sem hesitação.
No entanto, para que essa introspecção levasse a uma resposta inegável e clara, Jake precisava sondar ainda mais profundamente. À medida que ele se aprofundava mais em sua psique, confrontando cenários cada vez mais trágicos, seu rosto antes calmo e relaxado gradualmente se transformou em algo mais sinistro.
Quando sua expressão dificilmente poderia se tornar mais ameaçadora, a voz triste de Xi ecoou em sua mente, pouco mais alta que um sussurro,
Se eu desaparecesse, o que você faria?
Os olhos de Jake se abriram de repente e ele respondeu friamente:
“Não brinque com isso. Não tem graça.”
Xi, sem se deixar intimidar, continuou,
Não estou brincando. Estou falando sério, me responda. O que você faria se eu fosse embora para sempre? Não recorra a frases cafonas como “Eu vou te encontrar” ou “te trazer de volta à vida, mesmo que isso signifique te tirar do inferno”. Estou falando de um cenário irreversível e sem esperança. O que você faria se eu morresse? Isso se aplica a mim, mas também a Lúcia, Anya e a todos os outros queridos para você. Deixe de lado essa ilusão onipotente que permite que você descarte qualquer coisa que contradiga sua percepção da realidade e responda honestamente.
“…”
Jake abriu a boca para responder, mas nenhum som saiu. Ele fechou a boca, então sua expressão endureceu, ficando séria.
“Se… E eu enfatizo que se você desaparecesse sem esperança de retorno, eu não acabaria com a minha própria vida, se é isso que você está temendo”, Jake finalmente disse, cada palavra forçada a sair como se ele estivesse confrontando uma verdade dolorosa.
Não é isso que–
“Mesmo assim!” Jake interrompeu com um tom mais sombrio, revelando suas presas subconscientes. “Eu garantiria que tais tragédias, tal sofrimento nunca mais acontecessem. E se possível, eu daria um fim a elas.”
Oh? Você é mais altruísta do que eu pensava.
A resposta de Xi não demonstrou surpresa, como se ela tivesse antecipado sua resposta, mas continha um toque de zombaria, sugerindo que ela sabia que essas não eram suas verdadeiras intenções.
“Eu falei errado”, Jake disse, sua risada tingida de escuridão. “Eu não poderia me importar menos com tragédias que não me afetam diretamente. Eu posso ter empatia, mas apenas por escolha. Então, no final, é meu próprio sofrimento que eu procuro evitar.”
Então, você está lutando para proteger sua própria felicidade? Para evitar sofrimento?
Xi reformulou a conversa.
Embora compreensível, esse motivo é muito comum, embora válido. Toda criatura inteligente se esforça pela felicidade e está disposta a lutar para preservá-la. Tenho certeza de que você pode encontrar uma razão mais profunda. Além disso, sejamos realistas, tal Intenção não combina com sua Primeira Forma da Aura de Lumyst.
Jake sabia que ela estava certa e não discutiu. Era uma Intenção muito vaga.
Se houvesse uma Intenção de Felicidade adaptada ao combate, ela poderia aumentar a proeza dele e de seus entes queridos no campo de batalha se a luta estivesse diretamente ligada ao seu bem-estar presente ou futuro. Mas como determinar se alguém ou algo impacta um conceito tão abstrato?
Além disso, sua eficácia, sua relevância, dependia de sua capacidade de avaliar situações. O que ele considerava essencial para sua felicidade em um momento poderia se transformar em uma fonte de miséria no momento seguinte. Seu sistema de crenças e valores poderiam influenciar diretamente suas condições de ativação.
Enquanto Jake refletia, Xi ofereceu outra perspectiva.
Se a felicidade não explica completamente por que você luta, então é a liberdade que você busca? O poder de controlar seu destino, não importa o que aconteça? Ser o mestre do seu destino?
Desta vez, as palavras de Xi ressoaram em Jake. Liberdade significava fazer o que se deseja, um aspecto fundamental da felicidade. Lutar por essa liberdade era crucial, talvez até mais do que a própria felicidade, porque para manter sua liberdade, Jake estava preparado para suportar o sofrimento, um conceito que uma Intenção de Felicidade poderia ter dificuldade em abranger.
“Isso faz muito mais sentido”, Jake concedeu após um momento de reflexão. “Tal Intenção também se alinharia com meus poderes de adaptabilidade.”
Intenção de Adaptação certamente era outro caminho. Parecia que a adaptabilidade de combate poderia se sobrepor às suas habilidades inerentes. A sinergia potencial tinha um potencial vasto e inexplorado, mas em tempos desesperadores em que seus poderes de adaptabilidade eram insuficientes, ele duvidava que essa Intenção fizesse uma diferença significativa.
Ao considerar isso, Jake percebeu um problema significativo com essas Intenções de Felicidade, Liberdade e Adaptação: elas focavam principalmente nele. No campo de batalha, a pressão espiritual desempenhava um papel crucial em intimidar e dominar os inimigos.
Ao derrotar um inimigo, a Verdadeira Vontade de Matar permaneceu de longe a mais versátil: ela não apenas aumentava a letalidade dos ataques, mas também permitia que a própria aura intimidasse, paralisasse de medo e até mesmo infligisse a morte independentemente da pressão espiritual do lutador.
No Universo Espelhado, entre iguais, um soldado que já havia matado tinha uma chance melhor contra um novato. Isso era ainda mais verdadeiro entre Evoluídos com uma contagem alta de Provações.
Evoluídos de poder medíocre que derramaram oceanos de sangue para atingir seu status eram muito mais perigosos do que aqueles escolhidos com linhagens de alto grau que tiveram tudo entregue a eles em uma bandeja de prata.
Havia um ditado entre os jogadores que haviam completado sua quinta Provação: “Se você matou alguém, você terminou o tutorial. Se você matou 100 inimigos, você provou seu valor. Se matou 10.000 inimigos, você é respeitável. Se você matou 1 milhão de inimigos, você é perigoso. Se você matou 100 milhões de inimigos, você é forte. Se você matou tantos inimigos que ninguém mais consegue contá-los, você é invencível.”
Pode soar um pouco constrangedor e clichê, mas a ideia era clara. Matar pode trazer reputação apenas nos estágios iniciais, mas quando o número de vítimas atingiu quantidades impressionantes, tornou-se uma medida objetiva da força de um Evoluído.
Se Jake pretendia ser o mais forte, Verdadeira Vontade de Matar continuava sendo uma excelente escolha.
“Então, no final, eu mato para ser feliz, eu mato para ser livre, eu mato para vingar aqueles que me privaram dessas coisas”, Jake resumiu em sua mente, sentindo que estava à beira de uma epifania.
Desta vez, ele não esperou a insistência de Xi para continuar a extrapolação, por mais desagradável que fosse. Depois da vingança… O que vem depois?
Jake se sentiu perdido naquele momento, mas logo riu, percebendo que já havia dado a resposta a Xi.
“Eu ainda lutaria e mataria para pôr fim a esse sofrimento. Se a tragédia que causou esse sofrimento já ocorreu e é irreversível, então o sofrimento é, por definição, indelével. Tal raciocínio é caprichoso e infantil. Eu posso mudar meu futuro, não meu passado.
“Xi, você disse que eu quero ser o mestre do meu destino, certo? Você está insinuando que atualmente, eu não estou no controle, e é verdade. Ainda há muitas pessoas mais fortes do que eu que podem arruinar minha vida e a dos meus entes queridos com um estalar de dedos. Isso também significa que não importa o quanto eu me prepare, se o destino decidir o contrário, estou condenado a sofrer se eu os encontrar muito cedo, antes de ter crescido o suficiente.”
Xi não respondeu com o mesmo entusiasmo dessa vez. Ela não tinha certeza para onde ele estava indo, mesmo com a conexão de consciência deles permitindo que ela sentisse seus pensamentos e emoções.
Jake percebeu a confusão dela, mas não abordou o assunto, continuando sua linha de pensamento,
“Para concluir, Xi, você está certa. Eu quero ser o mestre do meu destino, mas a menos que eu seja onipotente e onisciente, isso é obviamente impossível. Eu sei que existem Classes Espirituais e todos os tipos de linhagens e habilidades misteriosas que podem influenciar o destino, mas elas estão além do meu alcance atual. O que eu posso fazer, no entanto…”
Xi finalmente entendeu qual Intenção ele queria escolher para sua Aura de Lumyst, e se ela tivesse um corpo, ela definitivamente teria estremecido.
“É isso mesmo. É para desrespeitar meu destino e dizer para ele se foder quando eu não gostar.” Jake declarou com um sorriso irônico. “Então, minha Primeira Forma de Aura será…”