A maioria das pessoas compartilhava opiniões iguais sobre a religião Bellid: um mal para o mundo. Uma das razões pelas quais os karuwimans eram tão exaltados era porque fizeram deles seu principal inimigo e os exterminavam. Até o papa estava disposto a enganar os países vizinhos para isso, deixando claro que, mesmo que forçassem diplomacia, entenderiam se dissesse o motivo.
Entretanto, a religião sobreviveu ao ódio e perseguição e continuou a aumentar o seu número nas sombras. A palavra “praga” era bastante adequada para eles.
Por outro lado, eles, que sempre torturavam e destruíam nações e estados, eram agora os que estavam sendo empurrados para o canto.
— Qual é o tamanho do exército deles? — perguntou Colum Tríslei, encarando os karuwimans ameaçadoramente.
— Não tenho certeza, mas um pouco mais do que mil! — respondeu o sacerdote.
Mil. Era uma força considerável, e o cardeal também tinha mais ou menos este número de seguidores no templo. Todavia, eram soldados mais despreparados.
— São todos cavaleiros sagrados ou sumos sacerdotes?
— Sim, parece ser o caso!
Com a elite karuwiman, mil bellids comuns seriam exterminados em um instante.
— Porra! Como eles puderam encontrar este lugar! — Irritado, pisou com força no chão.
De acordo com a história, quando viram pela primeira vez essa visão milagrosa em um deserto, choraram e afirmaram que Bellu enviou um milagre para ajudá-los a se esconderem. Fiel às crenças, desde que se estabeleceram, o local continuou a ser um centro confiável para eles. Não sabia de que maneira a informação havia vazado, porém o inimigo número deles enviou um exército de elite.
“É tarde demais para chamar reforços!”
— Irmãos Treble — chamou os sumos sacerdotes atrás dele.
— Sim, senhor!
— Vocês comandam as tropas e os impedem de atravessar!
— Sim, senhor!
Sem qualquer refutação, seguiram de imediato a ordem de Tríslei, que se afastou do dever e voltou ao templo.
“Antes, tenho que pegar aquilo.”
Mesmo que todos morressem, precisava proteger “aquilo”. Ao contrário das expectativas de Zich, voltou na hora para dentro.
Zich vasculhou o edifício. Não importava o quão habilidoso fosse, era perigosíssimo se infiltrar em um momento turbulento que nem este. A fim de se preparar para o pior cenário, se certificou de que todos os lugares fossem iguais à sua memória para que pudesse escapar a qualquer hora.
“Hmmm… Tudo igual.”
Após quebrar o pescoço de outro sacerdote, voltou ao porão e sentiu um cheiro horrível ao descer. No meio de um corredor, celas foram espalhadas.
“Igual.”
Inúmeras pessoas lotavam a prisão. Não eram criminosos, mas deviam estar sendo usados como sacrifícios, experimentos ou brinquedos. De relance, aparentavam estar fracos e doentes. Contudo, ele não tinha intenção de libertá-los agora.
“Não são prioridade, mas podem ter um uso mais tarde.”
Em silêncio, verificou se a prisão também era idêntica à sua memória.
“Então, vamos para o lugar mais importante.”
Um templo era um edifício construído para adoração divina. Na lógica, o canto mais importante era a sala de oração.
“Se eu não tiver esquecido, era a grande sala um pouco atrás do centro.”
Na verdade, era difícil chamá-la de sala. Era um espaço enorme que cabia umas casas médias. Ele se escondeu lá dentro. Devido ao ataque surpresa, estava vazia.
Na última parede estava pendurada uma grande tapeçaria bordada com o símbolo bellid, e existia uma grande plataforma abaixo. No meio, um lago artificial ocupava mais da metade do cômodo, e dois caminhos passavam pelos lados e se interceptavam com o centro.
“Isso é…?”
Seus olhos brilharam. Na interseção, um objeto foi colocado sobre um altar-mor. O objeto em forma de pirâmide era tão pequeno quanto um punho e, de sua superfície lisa, liberava uma luz suave e prateada.
“Estava aqui?”
Por um momento, ficou surpreso ao ver um objeto que não esperava. Mas então logo sorriu. Se tivesse isso, Tríslei priorizaria a sua captura ainda mais do que a batalha em andamento.
Tríslei estava caminhando com firmeza. Depois que recuperasse o objeto na sala de oração, iria orar a Bellu para abençoá-los para sua próxima luta. No entanto, quando chegou lá…
— Honorário cardeal! — Um sacerdote o deteve, desesperado — N-na sala de oração…!
Slam!
Sem nem o ouvir, o jogou a uma parede, fazendo-o rolar no chão. Tríslei não piscou um olho sequer, pois havia algo muito mais importante para ele do que uma vida.
“Sem chance…”
Se um problema surgisse na sala de oração, deveria estar conectado aos karuwimans; era o pior cenário possível. A entrada estava aberta, permitindo que ele visse alguém sentado no topo da plataforma no outro lado com vários cavaleiros e sacerdotes o cercando e outros mortos. A julgar pela espada ensanguentada da figura, era seguro presumir que foi ele quem matou todos.
O problema real era outro: aquilo que deveria estar no topo do altar sumiu e agora estava nas mãos do homem. Consumido pela fúria, com cautela se aproximou pelo caminho que abriram.
Enquanto Zich estava no topo, Tríslei, que gesticulou para que os presentes recuassem um pouco, estava abaixo. Ainda mantiveram a formação e pareciam prontos para cortar Zich em pedaços se fossem ordenados.
— Uau. Você veio mais rápido do que eu esperava. Não estava lá fora?
— Quem é você? É um cão dos karuwimans? — perguntou Tríslei, irado. Seu olhar ia e voltava entre Zich e o item que ele estava segurando.
— Sou alguém com um rancor pessoal contra você.
— Então você é um tolo que não entende e segue Bellu.
— Temos uma pequena diferença de opiniões. Acho vocês parecidos a vermes podres incapazes de raciocinar e que dizem que um salmão é um deus.
Ele podia sentir a irritação ao redor e a sede de sangue de Tríslei mais forte, mas tudo o que fez foi inclinar a cabeça um pouco.
— Para um arrombado como você…
— Ah, calma aí. Tenho algo para te perguntar. — O interrompeu.
— Ei, cardeal honorário Bellid, Colum Tríslei.
Não ficou surpreso que Zich soubesse sua identidade. Todos que desgostavam um pouco daquela religião sabiam quem ele era.
— Foi você quem torturou uma galera que vivia nos arredores de uma aldeia há uns dias? E conjurou um feitiço em um menino para que ele não morresse enquanto era torturado?
— Você invadiu aqui por uma razão tão insignificante como vingança? Sim, é verdade. Fui a uma aldeia pegar um pouco de comida e vi um garoto.
— Daí, o matou?
— Ele era só um mendigo; um inseto sobrevivendo dia após dia. Mesmo que desapareçam, nenhum problema surgirá. Acima de tudo, somos pessoas que governarão sob as grandes bênçãos de Bellu. Por isso, nos dar prazer e morrer por nossas mãos é a maior honra que podem ter.
— Ouvi dizer que você falou que tudo era culpa dele enquanto o torturava.
— Porque era verdade. — Gargalhou — Foi impulsivo. Assim que vi seus olhos, decidi matá-lo. Não foi muito diferente com a sua família e vizinhos. Então, eu estava certo. Tudo aconteceu por causa dele.
Tríslei achou que era um argumento muito convincente, e os outros seguidores concordaram. Era o seu jeito de pensar e o porquê pela qual eram vistos como monstros pelo mundo inteiro.
— Hmm, ok. Se acha isso…
A resposta não traiu as expectativas de Zich nem um pouco.
Booooom!
Ouviram um som explosivo de longe, e o impacto fez o prédio tremer um pouco. Estava claro que a batalha havia começado, e Tríslei sabia que não podia perder mais tempo. Tentou atacar e pegar o objeto, porém Zich abriu a boca de novo.
— A propósito, você me perguntou se eu era um cão deles. Deve pensar que eles me ordenaram a me infiltrar aqui por algum motivo.
— Não é o caso?
— De jeito nenhum. Você está completamente errado. — Balançou o indicador — Está misturando causa e efeito. Fui eu quem chamei eles.
— O quê…?
A resposta inesperada surpreendeu o bellid.
— Pode estar se perguntando como descobriram seu esconderijo secreto. Deve ter sido uma surpresa, já que nunca foram vistos desde a fundação. Sendo sincero, eles também não sabiam disso aqui. Eles procuraram em todo o mundo para capturá-lo, mas quem imaginaria que havia um lugar desses sob um deserto? Agora, me diz quem você acha que contou a eles. — Sorriu. Era o que fazia ao ferir o ego dos oponentes — Euzinho. Explanei para eles.
— Hã?
— Descobri por coincidência. E eu sabia que você, Colum Tríslei, estaria aqui, então entreguei as informações deste local.
— Desgramado! — Queria decapitá-lo, porém Zich ainda não havia terminado.
— Entendeu o motivo de eu ter feito isso? É porque odeio vocês? É verdade, mas não é a única coisa. Porque gosto dos karuwimans? Não quero estar contrário a eles, mas também não tenho intenção de sair do meu caminho por eles. Então, qual acha que é a principal razão?
Foi por algo tão trivial.
— Você matou um garoto importante para mim. Não só isso, mas também o torturou. Vou resumir: chegaram aqui porque contei a eles; o porquê de eu ter dito foi por raiva; o porquê da raiva? O moleque teve uma morte dolorosa.
Não planejava falar o seu slogan “o quão doce foi seu momento de esperança?” desta vez; tinha outra frase em mente.
— Se lembra do que disse para ele? Que era tudo sua culpa? Então, sabe o porquê de os karuwimans terem se reunido na base norte dos bellids? — Riu ao ver o rosto de Tríslei se contorcer de raiva — Por conta de Colum Tríslei. É tudo sua culpa.