O cocheiro era tão experiente que Lucien não se incomodou nem um pouco com a estrada esburacada.
Com um monte de problemas incomodando sua mente, quando Lucien parou de pensar nas múltiplas coisas, a carruagem já estava na frente da mansão do Lorde Venn.
— Sr. Evans, chegamos. Você precisa que eu informe os guardas? — O cocheiro se virou e perguntou a Lucien educadamente. Um cavalheiro nobre geralmente não falaria com guardas comuns.
— Não, obrigado. — Lucien sorriu, — Meu amigo é um escudeiro aqui. Nós somos iguais.
Com sua Bênção desperta, Lucien estava a apenas um passo de se tornar um cavaleiro. No entanto, em sua mente, ele e John eram simplesmente bons amigos, e não havia nenhuma diferença de nível ou de classe entre eles.
Novamente, Ian e Durago estavam na guarda do portão. Eles imediatamente estufaram o peito quando viram a bela carruagem com o brasão do Touro Flamejante, prontos para receber o visitante.
Eles ficaram muito surpresos quando viram Lucien novamente. Eles ainda se lembravam dele: em sua memória, Lucien era apenas um pobre que não mostrou o devido respeito a eles, e agora em sua camisa branca e terno preto, o jovem parecia um nobre decente.
Eles não caíram na real até Lucien estar em pé na frente deles.
— Ah… desculpe, você está procurando John?
— Sim, por favor. — Lucien não reconheceu eles de cara.
Quando Ian ia entrar na mansão para chamar John, Durago perguntou com um pouco de hesitação:
— Me desculpe, senhor. Você… você que é o Sr. Evans?
Após o grande sucesso do concerto, mesmo John, como um jovem tranquilo, não podia deixar de contar tudo o que sabia sobre Lucien e os elogios que seu amigo recebeu do grão-duque, do Santo Cardeal e da princesa.
— Sim, eu sou o amigo de John, — respondeu Lucien.
— Sua obra, Sinfonia do Destino, foi tocada no banquete do Lorde Venn dias atrás. Foi fantástico! — Durago disse a Lucien com grande entusiasmo: — Eu sinto muito por ter sido rude com você da outra vez.
Aquele cara durão e grandalhão estava muito animado e era bem sincero. Lucien se lembrou do conflito que teve com eles anteriormente e ficou bastante surpreso por Durago ter tanto entusiasmo com a música.
Logo, Lucien percebeu que Aalto era de fato a Cidade dos Salmos.
— Está tudo bem. Estou feliz que você tenha gostado da minha obra, — respondeu Lucien educadamente.
De pé ao lado de Durago, Ian colocou um sorriso meio envergonhado no rosto.
Após o concerto, Lucien experimentou uma grande mudança na forma como muitas pessoas o tratavam. O pedido de desculpas sincero de Durago e todos aqueles elogios levaram Lucien a refletir sobre aquilo. A mudança repentina em seu status social transformou o que aconteceu há alguns meses em um sonho distante.
— Sr. Evans, posso convidá-lo para ir na minha casa bater papo uma hora dessas? — perguntou Durago, esfregando as mãos nervosamente com entusiasmo.
Lucien recusou educadamente encontrando uma desculpa aleatória, mas ele ainda se sentiu muito estranho.
Logo, John chegou acompanhando Ian, com um olhar um pouco confuso.
— Lucien! Eu vou voltar para casa esta tarde. Aconteceu alguma coisa?
— Sim, mas já está tudo resolvido. Não se preocupe. — Lucien puxou John pelo braço, — Vamos entrar na carruagem primeiro.
O velho cocheiro era esperto o suficiente para saber que não deveria ouvir a conversa deles. Então, ele amarrou os cavalos com firmeza a um posto de amarração e se afastou da carruagem. Depois, se encostou em uma árvore grande, aguardando na sombra.
Enquanto John estava ouvindo Lucien, seu rosto ficou tenso e as sobrancelhas arquearam. Seus dedos ficaram brancos enquanto ele apertava as mãos com tanta força que todo o seu corpo tremia. Quando ele soube que os dedos de seus pais foram cortados, seus dentes rangeram de ódio. No entanto, John não disse sequer uma única palavra. Ele permaneceu em silêncio e ouviu atentamente.
— Sinto muito, John, — disse Lucien, cujo coração estava cheio de culpa.
Baixando a cabeça, John não respondeu de imediato. Lucien sabia que seu amigo precisaria de algum tempo para se recuperar da dor e raiva que sentiu. Assim, ele permaneceu em silêncio com John.
Depois de um tempo, John finalmente começou a falar:
— Lucien, não é culpa sua. Eu não culpo você.
Essa foi a primeira coisa que John disse a Lucien. Em vez de dar voz à sua frustração, John escolheu confortar seu melhor amigo para libertá-lo de sua horrível culpa.
Lucien ficou surpreso e tocado.
— Muito obrigado, John. O que você acabou de dizer significa muito para mim.
Quando John estava prestes a voltar para pedir uma licença maior para ficar com seus pais, Lucien o deteve.
— Espere, John. Aqui tem vinte gramas de pó de Rosa Luz Lunar. — Lucien pegou o saquinho preto e o entregou ao seu amigo.
John tinha acabado de ouvir de onde veio aquele pó. Após mais de dez segundos, ele pegou com firmeza o saquinho das mãos de Lucien.
— Obrigado, Lucien. Vou despertar minha Bênção. Só assim posso proteger minha família e amigos, — disse John, sério.
— Sem pressa. Siga as instruções do Lorde Venn e leve o tempo que precisar. — Lucien concordou, — Além disso, você pode manter isso em segredo? Afinal de contas, eu menti para a princesa sobre como eu obtive esse pó de rosa.
— Você me conhece, Lucien. Eu sou mais confiável do que um homem morto. — John deu um tapinha no ombro do seu amigo e prometeu a sério.
A chegada da carruagem na Família Hayne causou um rebuliço em Aderon, o distrito mais pobre da cidade. Embora a maioria dos moradores dali não soubesse distinguir o brasão de cada uma das grandes famílias de Aalto, eles ainda mantinham em mente aqueles das poucas famílias nobres mais poderosas.
Joel, Alisa e Iven tinha sido enviados de volta para casa pela Igreja. Os pastores não encontraram muitas informações valiosas com eles. Vendo John e Lucien descer da carruagem, Iven de repente desatou a chorar, como se o menino estivesse tentando enxaguar com as lágrimas todas as memórias horríveis.
John gentilmente mexeu com o cabelo de Iven e deu um abraço firme nele.
— Está tudo bem, agora, Iven. Você já é um homem adulto e fez um ótimo trabalho. Deus nos abençoe.
Lucien abraçou Joel e Alisa. Uma mistura de desculpas, preocupação e alegria estavam todas naquele grande abraço.
— Não é culpa sua, Lucien. — Joel e Alisa confortaram ele também. — E você está vendo… nós estamos bem agora.
Como os reféns dos hereges malignos, eles não esperavam que fossem realmente sair vivos no final daquilo. Quando eles foram salvos, eles ficaram tão gratos ao Deus da Verdade que agora se tornaram ainda mais compreensivos e tolerantes. Afinal, nada mais importava quando se estava diante da morte.
Então, Alisa e Joel contaram a Lucien que a Igreja e o departamento de inteligência do ducado interrogou eles. A única coisa que deixou os pastores e a inteligência preocupados foi como Alisa e Joel desmaiaram fora da cela, mas foram encontrados mais tarde pelo cavaleiro dentro da cela.
Como o grande estrondo causado pelo poder da senhora Camil fez eles desmaiarem, nenhum dos reféns presentes pôde fornecer qualquer informação valiosa. No final, a Igreja e o departamento de inteligência presumiram que foi provavelmente porque os hereges primeiro trancaram novamente os reféns na cela, caso eles tentassem escapar, e, mais tarde, não tiveram tempo suficiente para voltar e matar todos eles.
— Demos muita sorte lá. Graças a Deus! — Secando as lágrimas dos olhos, Alisa contou a história inteira para Lucien.
Neste momento, houve uma batida na porta. Era Corella e um outro guarda da igreja que Lucien não conhecia. Lucien ficou um pouco mais aliviado de ver que a Igreja enviou apenas um escudeiro lá, o que significava que ele não era realmente um suspeito aos olhos da Igreja.
Após uma investigação curta e sem surpresas, Corella se levantou e agradeceu a Lucien em nome da Igreja:
— O bispo aprecia muito o que você fez. Sem a sua informação, nós teríamos sofrido uma perda ainda maior.
A identidade de Lucien como um músico tornava quase impossível para a Igreja fazer uma ligação entre o Professor e o consultor pessoal da princesa. No entanto, ainda havia algumas coincidências que envolviam Lucien que eles foram incapazes de explicar naquele momento.
Lucien finalmente voltou a sua vida normal, ocupado com seus estudos de música e de magia. Ele também pediu a Joel que se mudasse para sua nova casa temporariamente, já que o distrito de Gesu era muito mais seguro do que Aderon.
Naqueles dias, Lucien não deu sequer um único olhar para a parede trincada onde ele geralmente deixava as mensagens secretas para se comunicar com os aprendizes. Em nome da prudência, ele também deixou de lado seu plano de destruir seu laboratório de magia naquele momento.
Victor começou a ensinar a eles cânone, uma técnica de composição contrapontística que empregava imitações sequenciais de uma melodia, que começava depois de um determinado período.
Com apenas alguns procedimentos, mesmo os iniciantes conseguiam chegar longe com o cânone.
— Na verdade, você inconscientemente empregou o cânone em sua Sinfonia do Destino, Lucien, — comentou Victor. — Parece que você aprendeu muito na biblioteca da associação.
— Hum… É, deve ser. Obrigado, Sr. Victor, — respondeu Lucien, um pouco distraído.
Sua mente estava ocupada pelo pensamento de que ele precisava criar obras em número e qualidade suficiente para conseguir seu próprio concerto, para cumprir a exigência de Rhine.
Oitenta anos antes, alguém produziu uma obra musical que era muito semelhante ao Cânone de Pachelbel, famoso em seu mundo original. No entanto, ele ainda poderia recompor a obra como uma peça de concerto de piano.
Embora ele ainda fosse precisar de mais algumas obras “originais” de música para organizar seu próprio concerto, recompor algumas seria definitivamente a melhor maneira de economizar o seu tempo e montar seu repertório o mais rápido possível.