Airen Farreira e Karakhum deixaram o túmulo de Gurgar e desceram a montanha. Um duelo entre mestres não era como entre pessoas comuns. Ninguém sabia o que poderia acontecer. Mas eles não precisaram ir muito longe. O terreno aberto ao pé da montanha era perfeito para um combate, sem espectadores ou encrenqueiros.
Durante o breve momento, Karakhum percebeu que aquele jovem humano havia definitivamente mudado de alguma forma.
“Ele floresceu em um instante”, pensou enquanto observava Airen marchar à frente, lembrando-se dos dias em que ele próprio vagara pelo mundo humano.
O mundo era muito maior do que a terra dos orcs. No continente, ele conheceu inúmeras pessoas extraordinárias que jamais esqueceria.
Não eram apenas espadachins, mas aqueles que carregavam grandes responsabilidades. Indivíduos notáveis que adquiriram carisma e força física com o tempo ou suportaram as durezas da vida, mantendo seus valores e crenças.
O jovem à sua frente exalava uma energia e uma aura semelhantes.
“Eu não teria ficado tão surpreso se fosse apenas a esgrima dele que tivesse melhorado…” refletiu Karakhum.
Claro, ele não sabia com certeza o nível atual de Airen, e foi por isso que concordou em duelar com ele.
Ele se comunicaria com o jovem do jeito dos guerreiros e descobriria o que estava acontecendo. Se isso não funcionasse, poderiam conversar com palavras.
Karakhum refletia enquanto olhava para Gorha, que caminhava meio passo atrás dele.
— Por que está nos seguindo? — perguntou.
— Há alguma razão para eu não fazê-lo? — respondeu Gorha.
— Suponho que não.
— Também quero ver como a flor floresce tão lindamente.
— Isso é um tanto… estranho para descrever três sujeitos.
— Haha. Então, apenas observarei em silêncio.
Eles conversaram por um tempo antes de chegarem ao destino. Airen Farreira olhou para o céu azul antes de se virar para Karakhum, que assentiu e tocou o chão.
Crack!
Grrrrr…
Creeeek!
Um som agudo de moagem ressoou quando o solo rachou e uma superfície se ergueu. De um monte de terra, surgiu uma arma que Karakhum agarrou. Era um machado de lâmina dupla em vez de um simples ou um martelo.
Percebendo que o outro estava sério, Airen convocou gravemente uma espada larga.
Pop!
Clutch!
Embora fosse a mesma espada que ele havia empunhado todos os dias, aquilo parecia diferente.
A espada havia evoluído novamente? Não. Fora o próprio Airen quem havia mudado. Seus sentidos, ainda sentindo os ecos de ter visto sua vida passada, diziam-lhe que, embora a espada que segurava fosse sua, ainda continha a vontade de seu antigo dono.
“Talvez esta não seja a última vez que verei aquele homem”, pensou Airen.
— Hmph… — respirou Airen enquanto amplificava sua aura após olhar fixamente para a espada.
Woooosh!
A bela espada brilhou em dourado, levando até Gorha, de uma raça diferente, a soltar um murmúrio de admiração.
Karakhum, no entanto, não se deixou levar pelos sentimentos.
Woosh!
Como Airen, ele convocou sua aura. A lâmina negra do machado parecia ainda mais perigosa e severa com a energia sombria.
— Venha até mim — convidou Karakhum.
— Com prazer — respondeu Airen, assentindo antes de avançar rapidamente contra Karakhum.
Foi um avanço direto e honesto, sem fintas ou variações.
Porém, não se podia negar a força subjacente do ataque, capaz de desequilibrar qualquer lutador menos talentoso.
Karakhum, é claro, não era um novato. Apenas poucos poderiam enfrentar um guerreiro de seu nível. Dando um passo à frente, ele balançou o pesado machado.
Crash!
Gorha franziu levemente a testa com o estrondoso impacto de metal reverberando pelo ar. Isso era apenas o começo. Os dois balançaram suas armas como se estivessem sedentos por combate. Airen estava especialmente agressivo.
Crash!
Crack!
Craaaack!
Crash!
Com o coração inabalável, o jovem atacou implacavelmente, como se estivesse decidido a derrubar o ídolo que era Karakhum.
Porém, o grande guerreiro de Durcali não se abalou. Afinal, ele ainda era muito mais habilidoso que o jovem. Ele apenas se defendia dos ataques, sem se preocupar em contra-atacar. A menos que Airen tivesse crescido exponencialmente, ele não conseguiria surpreender Karakhum.
Drrrrr!
Karakhum convocou o elemento da terra, o mais equilibrado dos cinco elementos. A aura da terra permitia absorver qualquer ataque, não importa quão afiado ou pesado fosse. Enquanto um guerreiro inferior teria os ossos esmagados como o chão rachado, Karakhum sabia que podia enfrentar alguém que, na melhor das hipóteses, era igual a ele.
Além disso, ele adicionou algo mais.
Pssss…
O elemento da árvore se espalhou pelo solo através de seus pés, sua aura fornecendo estabilidade como as raízes de uma árvore. Assim, ele seria capaz de resistir ao ataque incessante, embora se tornasse menos móvel. Como esperado, Airen começou a se frustrar à medida que continuava os ataques.
— Vejo que você tem pouco a oferecer… tão confiante que estava quando pediu para duelar! — provocou Karakhum.
Crash!
Ele balançou o machado horizontalmente, aproveitando a combinação entre a terra e a árvore, usando o centro de gravidade baixo para desferir um ataque poderoso.
Airen foi forçado a recuar dez passos. — Perdão, mas gostaria de continuar — respondeu, tossindo sangue.
— Tudo bem! — assentiu Karakhum, mais uma vez erguendo sua arma.
Desta vez, ele assumiu a ofensiva. Contudo, não encurralou o jovem. Por mais rude que fosse, Karakhum gostava de Airen. A forma como o jovem permanecia orgulhoso à sua frente, aperfeiçoava suas habilidades e trabalhava diligentemente todos os dias mostrava que ele seria um guerreiro exemplar.
Utilizando a Arte dos Cinco, Karakhum liberou os elementos um por um, permitindo que Airen experimentasse a combinação entre aura e elementos simultaneamente. Afinal, este era o objetivo do duelo.
Swoosh!
A aura da água, mais fluida do que o estilo de Brett Lloyd, deslizou pela espada de Airen.
Crack!
Mais dura, porém sofisticada, a aura do metal investiu contra o corpo de Airen.
Finalmente, a aura do fogo, tão quente e furiosa quanto o estilo de espada de Judith, prendeu Airen enquanto Karakhum avançava bruscamente. De fato, embora Karakhum fosse mais habilidoso no elemento do metal, ele também dominava o poder do fogo.
Porém, mais uma vez, Airen surpreendeu suas expectativas.
Crash!
O machado e a espada colidiram, lançando faíscas de aura vermelha e dourada, como brasas.
Craaaack!
Karakhum atacou novamente, mas Airen não recuou, não bloqueando, mas recebendo o ataque com firmeza. Os olhos de Karakhum se arregalaram. Suas auras arderam ainda mais furiosamente do que antes.
Crash!
Crack!
Craaaack!
Crash!
Airen não recuou, nem então, nem depois. O machado e a espada continuaram colidindo enquanto suas auras queimavam com mais intensidade.
Após cerca de um minuto, Karakhum abaixou o machado e observou o jovem humano em silêncio. Ele parecia pálido de exaustão aguda, mas o que chamou a atenção de Karakhum foi a formidável chama dourada que envolvia sua espada.
Kssshhhh…!
Entendendo que Airen Farreira finalmente havia aprendido a usar a aura do fogo em adição ao metal, Karakhum concluiu — Vamos parar por aqui. Estou curioso demais para continuar.
— Hah, haa… Do que está falando? — perguntou o jovem loiro, ofegante e ainda segurando sua espada.
Karakhum precisou se conter para manter a compostura ao ver Airen observando orgulhosamente a chama que havia criado.
— Entendo que você obteve algo através da memória de sua vida passada. Esse algo unificou sua mente dispersa — disse ele.
— Huh, haa… O senhor está certo. Finalmente consigo focar a chama, exatamente como disse — respondeu Airen.
— Entendo. Parabéns. Ter paixão o suficiente para manifestar o elemento do fogo quando você tem apenas vinte anos… Você superou os tolos da tribo.
— O senhor está sendo gentil demais.
— Chega disso… Vamos direto ao ponto. Não conheço sua vida passada. Achei que não queria conhecer… mas agora estou curioso.
— Contudo, também sei que estaria ultrapassando limites se exigisse uma resposta. Além disso, há outra coisa sobre a qual estou mais curioso.
— Isso é…
— Diga-me. Qual é o seu credo?
Kshh…!
Os olhos de Karakhum arderam enquanto ele fazia a pergunta.
Ele não tinha mais a paixão da juventude. Tinha envelhecido demais… não no corpo, mas no espírito. No entanto, ao ver o jovem prodígio manifestando o fogo, o coração de Karakhum voltou a queimar. Ele encarou Airen com curiosidade e empolgação.
O jovem retribuiu o olhar e fincou sua espada larga no chão em silêncio, enquanto se lembrava do que o homem no sonho, não, seu eu do passado, havia vivido.
Ele fora um homem que perdeu a família e a reputação. Ódio e raiva o guiaram em meio à tristeza e solidão. Mas, apesar das inúmeras ilusões, o homem encontrou determinação e superou seus próprios limites por meio de uma bondade mais forte e bela do que qualquer outra coisa.
Ver aquilo foi o suficiente para incendiar a mente de Airen.
— Eu…
Ele queria ir além do círculo de sua família e amigos. Queria ajudar a trazer felicidade para muitas mais pessoas no mundo.
Enquanto Airen recitava sua resposta, seus olhos ardiam mais brilhantes que os de Karakhum. O grande guerreiro franziu as sobrancelhas.
— Isso é grandioso… Sua ambição é… muito maior do que apenas querer se tornar o melhor espadachim — admitiu ele.
— Estou dizendo que o que você está tentando fazer é trilhar o caminho do herói. Poucos podem dizer algo assim. Você estava ciente do que dizia? — perguntou Karakhum.
A atmosfera pesou.
Nem Karakhum, nem Airen, nem Gorha, o observador, disseram nada. Era como se a própria gravidade tivesse se tornado mais opressiva. Airen se moveu nervosamente sob o olhar atento do grande guerreiro. Contudo, ele não tinha desejo de dobrar-se ou esconder sua vontade.
Erguendo sua espada larga mais uma vez, ele convocou sua aura, como se em desafio.
— Por mais embaraçoso que seja — disse o jovem.
— Se o caminho do herói for o que devo trilhar para fazer o que desejo, eu o trilharei com prazer — declarou ele.
Kssshhhh…!
A chama dourada crepitou como se confirmasse a declaração de Airen Farreira.