“Foi uma luta de guerreiros.”
Era raro ver uma luta assim nos dias atuais, mas há algumas décadas isso era mais comum. Os demônios desapareceram após a grande guerra de 150 anos atrás, mas muitos outros ainda permaneceram no mundo. Os orcs arriscavam suas vidas para proteger suas tribos dessas ameaças, e os que sobreviveram tornaram-se guerreiros. Não precisavam passar por provas para se tornarem grandes guerreiros, pois cada combate já era um teste. Mas, à medida que os demônios desapareceram e seus remanescentes foram eliminados, os únicos perigos restantes no mundo eram bandidos e monstros nas planícies. Nos tempos recentes, os orcs deixaram de ver as ‘verdadeiras’ lutas de guerreiros.
“Não, isso é apenas uma desculpa.”
Eles não tinham ninguém para observar e aprender? Isso não era verdade. O continente estava em paz, mas ainda era vasto. Espadachins e guerreiros vagavam pelas terras treinando a si mesmos. Ian fez isso em sua juventude, e Ignet seguiu o mesmo caminho alguns anos atrás. Judith e seus três amigos também cresceram incrivelmente rápido ao passar por diversas experiências. Não era culpa de ninguém, exceto dos próprios orcs, que sabiam disso muito bem, mas permaneciam em suas tribos, regozijando-se com a glória de seus ancestrais e acreditando que ainda eram grandes guerreiros.
“Preciso educar meus filhos novamente.”
Halifa abriu os olhos e se levantou. Garam, Pahun, Gunt e ele próprio precisavam recomeçar do zero. Ele precisava parar de se preocupar com a política tribal e voltar a ser um guerreiro. Precisava começar a treinar imediatamente. Mas isso não seria hoje. Lembrando-se da humana de cabelos vermelhos, ele dirigiu-se à montanha espiritual além da fortaleza. Era muito mais íngreme do que as colinas onde Gurgar estava enterrado. Também tinha uma concentração espessa de elementos. Após refletir longamente, ele moveu-se rapidamente. Halifa, forte mesmo entre os mestres, não se importava com a inclinação da montanha. Chegou ao destino com facilidade, mas ficou surpreso. Havia muito mais orcs do que ele esperava.
— Ei, está atrasado.
— Já faz um tempo.
— Deve ter sido bom ver seus filhos sendo humilhados. Deve estar envergonhado.
Eram os guerreiros mais velhos de Durcali. Halifa riu ao ver os orcs, muito mais velhos do que ele.
“Bem, suponho que também estão curiosos.”
Uma semana após o Desafio do Guerreiro, Airen e seus amigos subiram a montanha espiritual de Durcali para aprender a Arte dos Cinco. O plano original era começar mais tarde, mas Judith insistiu que não podia esperar mais, então decidiram começar antes. Por isso, Judith ainda não estava completamente recuperada.
— Ufa, isso é cansativo! — exclamou Judith.
Mesmo assim, ela subiu o caminho íngreme da montanha sem ajuda. Alguns poderiam considerar isso tolice, mas essa teimosia era o que a definia. Todos que a conheciam bem a encorajaram quando chegaram ao destino.
— Bom trabalho — disse Brett.
— É, bom trabalho — disse Airen.
— Cala a boca. Mas, a propósito… — disse Judith enquanto olhava ao redor, observando os orcs reunidos, mais do que esperava.
Era óbvio que Tarakhan e Khubaru estavam presentes, já que sempre a apoiaram. Mas por que Mestre Halifa estava ali? E quem eram aqueles orcs muito velhos com rostos enrugados que ela nunca tinha visto antes? Quase uma dúzia deles, parecendo extremamente idosos até mesmo para outras raças, observavam-na. Eles não olhavam para os outros do grupo. Apenas para ela.
— Não se assuste. Eles só estão impressionados com sua luta — disse Khubaru.
— Minha luta?
— Sim. Disseram que queriam assistir ao ‘Ritual dos Cinco Elementos’ porque sua luta ardente os impressionou. Como pode ver, são os anciões das tribos. Também são os guardiões da Arte dos Cinco, então não tínhamos o direito de negar que viessem — explicou Khubaru.
— Por quê? Está desconfortável com eles? — perguntou Khubaru em voz baixa.
Judith não respondeu enquanto observava os orcs olhando para ela.
Eram velhos e fracos, alguns mal conseguiam ficar de pé. Mas apenas por seus olhos, ela podia sentir a grandiosidade de suas experiências. E eles não eram os únicos. Havia o Grande Guerreiro Karakhum, o herói de todos os orcs; Tarakhan, um mestre que alcançara tal título aos trinta anos; e o Grande Elementalista Gorha, que nunca pareceu interessado nela antes. Mestre Halifa também estava ali. Todas essas figuras importantes da tribo a observavam com expectativa. Naquele momento, uma chama intensa irrompeu dentro dela.
“Eles estão me observando.”
Era verdade. Todos estavam focados nela. Em comparação com os humanos, essas figuras eram como cavaleiros das Cinco Famílias Renomadas de Espadachins. Eles não olhavam para Brett, Illia ou Airen, mas para ela. Isso a empolgava. Era um tipo de chama diferente da que sentiu ao lutar contra Gunt e Garam. Ela soltou uma respiração quente, aproximou-se da urna diante de Gorha e, com um olhar ousado, colocou a mão dentro dela.
Este era o Ritual dos Cinco Elementos da Tribo Durcali. Um processo para descobrir qual espírito se alinhava melhor com a pessoa. A tarefa era retirar a energia dentro da urna moldada pelos elementalistas e colocá-la para fora. Ela ouvira a explicação inúmeras vezes na última semana. Não havia com o que se preocupar. Um homem comum sentiria o peso da expectativa de figuras tão grandiosas, mas Judith não.
Sentia-se empolgada e, com isso, agarrou a energia dentro da urna, puxou-a e a lançou no chão. E então…
— Oh…
— Hmm…
As chamas irromperam com força, deixando os anciões impressionados. Todos permaneceram ali de boca aberta. Era óbvio. As chamas de Judith explodiram tão alto que quase alcançaram o segundo andar de um edifício. E não parou por aí, tentando expandir-se ainda mais. Gorha estalou os dedos, criando uma barreira de água para conter as chamas. Mas até ele parecia tão surpreso quanto os anciões. Judith, observando-os, perguntou a Khubaru, já que era o mais acessível entre os orcs.
— O que acharam?
— Não sei o que dizer… Pelo tamanho, pelo menos… Eu diria que superou as expectativas. É grande demais, na verdade — respondeu Khubaru.
— Então, eu tenho o necessário para a Arte dos Cinco?
— Com certeza. A energia desapareceria se você não tivesse o talento. Mas… eu não imaginava que as chamas seriam tão grandes. Não faço ideia de como você vai treinar para controlá-las…
— Hmmm. É mesmo?
Judith respondeu fingindo estar calma, mas não estava. Esforçava-se para conter os lábios, que teimavam em se curvar num sorriso mal disfarçado e um tanto desajeitado.
“Ela é tão fofa.”
Apenas Brett pensava diferente dos outros, mas não demonstrava. Ninguém sabia o que se passava em sua mente. Enquanto isso, a maioria dos orcs continuava a olhar fixamente para a humana de cabelos vermelhos, murmurando entre si.
— dlrj gotjrgoqhkdi qufrj djqtsmsep gkdtkd gktlejkfrhdy?
— rmfoeh akrtkd dkaneh dksgownaus tjdnsgkrlsgkqslek.
— dlqjsdpeh wkf qnxkremflqslek……!
Até mesmo Mestre Halifa tinha uma expressão semelhante. Ele não tagarelava como os anciões, mas estava igualmente impressionado com as chamas de Judith. Tinha os mesmos pensamentos de Khubaru. Não sabia como alguém poderia controlar um fogo daquele nível.
“Precisaremos não apenas de um guerreiro, mas de um elementalista habilidoso para ajudá-la com a Arte dos Cinco nesse nível…”
— Hmm?
Foi enquanto Halifa pensava em como treinar Judith que percebeu algo estranho em Gorha. Ao contrário dos outros orcs, Gorha não estava olhando para Judith. Karakhum também não. Curioso, Halifa seguiu o olhar deles.
Gorha não era o único. Alguns outros orcs também olhavam na mesma direção. Halifa logo entendeu o que eles tinham em comum e murmurou para si mesmo.
“Elementalistas.”
Esses eram os orcs que usavam os cinco elementos como sua principal arte, ao contrário dos guerreiros, que apenas os utilizavam como suporte para suas habilidades. Halifa acompanhou o olhar deles, imaginando que talvez pudessem ver algo que ele não conseguia. Então virou-se na mesma direção.
Airen Farreira. O prodígio que se tornara mestre aos vinte anos. Mas Halifa nunca havia pensado nele como alguém com talento para o elementalismo e não deu muita importância.
— Airen Farreira — disse Gorha.
— Sim.
— Você é o próximo. Está preparado?
— Estou preparado.
Halifa percebeu o tom de excitação na voz de Gorha, mesmo que este tentasse escondê-lo. Gorha tinha um olhar semelhante ao que Halifa lançara para Judith. Não, talvez até mais intenso…
Enquanto Halifa refletia, Airen caminhou até a urna. Diferente de Judith, ele avançou de forma mais lenta, mas carregando um peso perceptível. Parou por um momento, como se algo o tivesse impedido. Então, fechou os olhos, parecendo contemplar algo. Não ficou assim por muito tempo. Após um breve aceno de cabeça, abriu os olhos. Foi um instante breve, mas Halifa sentiu algo quente e sólido irradiar dele. No entanto, logo se distraiu com algo ainda mais impressionante acontecendo diante de seus olhos.
Diferente de Judith, a energia espalhou-se pelo chão em forma de fogo. Em seguida, uma gigantesca estaca de ferro começou a surgir lentamente. Então, com o calor crescente, ela se transformou em chamas, brilhando com uma luz vermelha radiante.
Não, não era vermelha. Era dourada. Uma gigantesca espada radiante que fazia todos os orcs presentes, incluindo Halifa, engolirem seco diante da visão.