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Damn Reincarnation – Capítulo 184

Yurasia (3)

Kristina não respondeu imediatamente. Ela rapidamente agarrou seus lábios, que estavam prestes a se abrir inconscientemente, e se esforçou para manter sua expressão. Ela não sabia que tipo de expressão faria se perdesse o controle, mas também não queria saber e também não queria mostrar esse tipo de expressão a ninguém.

— Ah, agora que você mencionou isso, parece ter adquirido um novo acessório. — Kristina respondeu como se não tivesse prestado atenção a ele e só agora tivesse notado sua existência.

Esconder seus verdadeiros sentimentos por trás de uma expressão bem treinada era algo com o qual Kristina estava familiarizada.

Ela finalmente deu uma boa olhada no dedo de Eugene e disse com um sorriso brilhante: 

— Está no dedo anelar da sua mão esquerda. Será que você ficou noivo de alguém? Não é incomum fazer isso entre os membros da nobreza, e você também não é muito jovem. No entanto, se Eugene Lionheart estivesse noivo de alguém, certamente os rumores teriam se espalhado…

Kristina disse tudo isso em um tom de voz gentil. Quando o trem partiu com um estrondo, Mer imediatamente colocou as duas mãos na janela e enfiou o rosto no vidro.

Enquanto o vagão balançava suavemente, Kristina continuou falando. 

— Ah, poderia ser, o noivado em si era para ser um segredo? De fato, ouvi dizer que entre os nobres os noivados costumam ser poluídos com intenções políticas e que é fácil que sejam desfeitos devido a mudanças nas posições e situações de ambas as famílias. No entanto, não importava qual fosse o caso, ser rotulado como alguém que rompeu o noivado não trará muitos benefícios para nenhuma das partes.

Kristina tinha um sorriso brilhante que escondia a direção de seu olhar. No entanto, Eugene foi capaz de dizer que aqueles olhos azuis por trás de seus cílios grossos estavam obviamente olhando para os dedos dele.

— É por isso que você deve ter guardado o segredo tão bem. — Continuou Kristina. — Claro, visto que eles são tão cuidadosos com sua reputação, certamente são uma família aristocrática de alto escalão, e para eles, garantir um noivado com alguém como você, Sir Eugene, cujas ações estão subindo a cada dia… Eles devem ser uma família cuja reputação iguala ou até excede a do clã Lionheart, certo? Será que você entrou em um contrato de noivado com a realeza?

Eugene apenas sorriu em vez de responder. Kristina realmente não gostou da aparência daquele sorriso. A expressão dele definitivamente pretendia irritá-la. Ela simplesmente não conseguia entender o porquê Eugene estava usando a questão de seu anel para provocá-la.

Não, ele não era alguém que ela pudesse tentar entender em primeiro lugar. Em Samar, Kristina ficou dolorosamente ciente do fato de que Eugene Lionheart não era o tipo de pessoa que poderia ser entendida racionalmente. Ele era alguém tão incrivelmente violento, sem vergonha, irritante e infantil que era impossível acreditar que ele era descendente do prestigioso clã Lionheart e um Herói escolhido pelo Deus da Luz.

— Não posso deixar de pensar que o momento desse noivado é perfeito demais. Logo depois que nos separamos, você venceu seu duelo em Aroth contra o Mestre da Torre Verde, Jenneric Osman. E recentemente, em Kiehl, você conseguiu sobreviver diante da Princesa Rakshasa, então realizou a esplêndida façanha de obter quatro vitórias consecutivas contra os Cavaleiros Dragão Branco. Uma vez que todos esses atos elevaram sua reputação, é natural que as famílias reais de muitos países diferentes desejem estabelecer laços com você, Sir Eugene. — Comentou Kristina.

— É mesmo? — Eugene respondeu à toa.

— Sim… Embora eu ache que esse anel pareça um pouco simples demais para comemorar um noivado com a realeza, suponho que um anel ornamentado que chama muito a atenção seria inapropriado para um noivado secreto. — Disse Kristina, tendo conseguido convencer a si mesma de que Eugene havia ficado noivo de um membro da realeza.

Mas quem poderia ser? Era uma princesa de Kiehl? A Princesa-Cavaleira de Shimuin também veio à mente. Dizia-se que ela era bonita e tinha a mesma idade de Eugene.

Reunindo sua compostura, Kristina prometeu: 

— Sir Eugene, se você finalmente realizar uma cerimônia de casamento, com certeza comparecerei e darei minha bênção pessoalmente. No entanto, Sir Eugene, por favor, não se esqueça deste fato. Por mais que eu queira respeitar sua liberdade no casamento, você é o Herói anunciado pela revelação do Deus da Luz. Por favor, tenha isso em mente ante-

Eugene finalmente a interrompeu. 

— Obrigado pelos votos de felicidades, mas… Isso não é um anel de noivado, sabia?

— Hã? — Kristina gemeu em um tom acima.

— Quando foi que eu disse que era um anel de noivado? — Eugene sorriu enquanto levantava o anel em seu dedo e o mostrava a ela. — É apenas um anel mágico.

— Por que você está… Mantendo um anel assim… No dedo anelar esquerdo? — Kristina resmungou, tentando se conter.

— Não é como se eu quisesse usá-lo neste dedo, é que a pessoa que me deu o colocou neste dedo como parte de um contrato. — Explicou Eugene.

— E por que você só está me contando isso agora?

— Você preferiria que eu não tivesse dito isso?

A sobrancelha de Kristina franziu e começou a se contorcer. Ela agarrou a bainha de sua saia com força, então enxugou a expressão chocada em seu rosto. Engolindo a raiva que crescia dentro dela, Kristina juntou as mãos na frente do peito em oração.

— O que eu quis dizer foi, por que você não disse isso em primeiro lugar, em vez de esperar até agora? — Kristina elaborou.

Eugene hesitou. 

— Bem, quero dizer… Não cabe a mim revelar ou não no início ou mais tarde?

— Mas porque você demorou tanto para se explicar, cheguei a um mal-entendido e fiz confusão sobre isso. — Disse Kristina com os dentes cerrados.

— Demorei para explicar justamente porque achei interessante seu mal-entendido. — Eugene confessou honestamente.

— Sir Eugene… — Kristina fez uma pausa para se recompor. — Você tem uma personalidade bastante travessa. O que há de tão divertido em zombar de alguém bem na cara? Como Herói, você deve ter um caráter tão moral que os outros só possam chamá-lo de santo. Não importa o quão talentoso você seja, e mesmo que um dia consiga subjugar os Reis Demônios e salvar o mundo, se sua personalidade continuar tão feia, ninguém estará disposto a segui-lo!

Eugene reclamou: 

— Não é um pouco duro você me chamar de feio, só porque fiz uma piada com você…?

Mer, que estava agarrado à janela, interrompeu.

— Já que você realmente é um lixo, deveria apenas aceitar a crítica honestamente.

Com essas palavras, Kristina concordou com a cabeça. No final, em vez de dizer qualquer coisa em protesto, Eugene apenas estalou a língua e se virou para olhar pela janela.

Ao fazê-lo, Eugene não pôde deixar de concordar com a afirmação de Kristina de que o trem tinha um charme diferente em comparação com os portais de dobra. O cenário passava em uma velocidade muito maior do que se poderia ver de dentro de uma carruagem. Isso era acompanhado por um estrondo mecânico incrivelmente constante. Eugene relaxou, apreciando as grandes janelas.

Em algum momento, o trem saiu da cidade e começou a passar por um campo tranquilo. À distância, eles podiam ver a cidade branca sendo deixada para trás. Na verdade, a paisagem não tinha muito o que olhar, mas Mer estava hipnotizada pela paisagem, incapaz de tirar os olhos da janela.

Quando o carrinho de vendas passou por eles três ou quatro vezes, Kristina finalmente falou: 

— Você não vai perguntar qual é o motivo?

Mer, que agora estava sentada ao lado deles, já havia comido duas refeições e mastigava os salgadinhos na vasilha em seu colo.

— O motivo? — Eugene repetiu interrogativamente.

Kristina fechou seu livro de escrituras, que estava gasto de tanto ser lido várias vezes. Os olhos de Eugene também estavam familiarizados com aquele livro de escrituras; ele tinha visto o mesmo livro todos os dias em Samar. Kristina gostava especialmente de abrir o livro e lê-lo de manhã cedo, quando acabava de acordar, e antes de dormir à noite.

— Não anotei todos os detalhes na carta que lhe enviei, Sir Eugene. Embora tenha sido porque senti que coisas como a Confirmação de minha Santidade não eram dignas de serem incluídas em minha carta para você, parece que a carta, junto com minhas ações atuais, lhe causou grande descontentamento. — Disse Kristina em desculpas.

— Hm. — Eugene inclinou a cabeça para o lado com um zumbido pensativo e olhou para o rosto de Kristina. — Em todo caso, sua Confirmação de Santidade é para acontecer na Santa Sé, certo? Então por que precisamos ir para Tressia? Teria sido mais conveniente apenas ficar em Yurasia.

— Isso porque há várias coisas que precisam ser preparadas. — Explicou Kristina. Embora sentisse que já era tarde demais para Eugene reclamar ou perguntar o motivo, ela ainda respondeu imediatamente: — Na Paróquia de Tressia, há uma Fonte de Luz que dizem ter sido deixada lá por Deus há muito tempo. A partir de amanhã, estarei em jejum por três dias antes de me banhar na primavera.

A Fonte de Luz…

Eugene procurou em suas memórias o nome. Ele definitivamente tinha ouvido esse nome uma vez em seu passado. Naquela época, todos estavam um pouco bêbados e conversavam sobre os lugares misteriosos de suas respectivas cidades natais.

—O que há de misterioso nisso? Estou lhe dizendo que o território élfico em que vivi tinha a Árvore do Mundo. Ei Hamel! Você ao menos sabe o que é a Árvore do Mundo?

—Não é apenas uma árvore muito, muito grande? Havia uma macieira muito grande atrás da casa onde morei quando criança.

—Você está mesmo comparando uma macieira com a Árvore do Mundo? Nunca ouvi uma afirmação tão ignorante! Não tem… Não tem jeito mesmo, hmm, mais tarde, quando tudo isso acabar e finalmente pudermos deixar este maldito lugar, vou levar você para o território élfico e expandir seus horizontes.

—Não… Eu não quero ir… Se eu for lá, vou acabar encontrando aquele desgraçado do Signard, e deve ter um monte de elfos com a mesma cara e personalidade de merda que aquele desgraçado.

—Qual é o seu problema com o Grande Irmão Signard? Além disso… Também, seu filho da puta, estou tentando levá-lo lá para o seu bem, então você não deveria ficar quieto e me agradecer, seu — ah! Então é isso. Agora entendi! Se você ficar ao lado de um grupo de elfos, sua cara parecerá a parte de baixo de uma tampa amassada de lata de lixo. É com isso que você está preocupado?

—Você quer morrer?

—Não se preocupe, porque os únicos que podem ficar entre os elfos e não se envergonhar de sua aparência são o Vermouth, a Anise e… Eu mesma.

—Um rio quente corre pelos campos de neve perto da tribo Bayar.

—Ei Moron, eu entendo o que você está tentando dizer, mas não pode simplesmente inventar coisas que não fazem o menor sentido. Sua tribo mora lá no extremo norte, certo? Então, como poderia haver algo como um rio quente em um lugar onde a neve se acumula como montanhas e há nevascas todos os dias?

—Deixa para lá, Hamel. Moron é ainda mais caipira do que você, então, quando esse tipo de conversa surge, ele fica sem nada a dizer. Como há neve aqui, neve ali e neve para onde quer que você olhe, Moron deve estar apenas querendo inventar alguma coisa.

—Como guerreiro da tribo Bayar e filho dos campos de neve, não minto. Realmente existe um rio quente que corre perto de nossa tribo.

—Não, por que um rio quente fluiria por um campo de neve? Que tipo de fogo poderia derreter a neve o suficiente para fazer um rio fluir? Isso parece possível, seu maldito?

—Embora não seja um incêndio, há um lugar onde a fumaça e as chamas fluem ao longo do rio. Se você não acredita em mim, pergunte ao Vermouth. Eu e ele frequentemente tomávamos banho naquele rio juntos.

—O rio vem de uma nascente que está sendo aquecida por uma fonte geotérmica. A água quente se acumula em uma piscina e depois flui para um rio. Moron já me levou lá algumas vezes, e é um lugar bem legal. Só de mergulhar ali, pude sentir que minha fadiga foi consideravelmente aliviada.

—Não é só fadiga. Os minerais da água que corre pelo rio são ótimos para doenças e feridas, e algumas delas podem até ser curadas apenas pela imersão nele. É especialmente bom para a pele, então nossas mulheres gostam muito.

—Anise, você ouviu isso? Se for esse o caso, então vamos, certo? Eu definitivamente vou, então você precisa vir comigo, certo?

—Podemos ir todos juntos depois que a guerra acabar. Nesse momento, já terei me tornado o chefe dos Bayar. Se eu pedir a eles que mantenham o rio vazio para meus amigos, os membros da tribo cederão de bom grado para nós. Então nós cinco podemos tomar banho juntos no rio largo…

—Seu maluco. Como assim, tomar banho juntos?! Anise e eu vamos lá sozinhas, então vocês podem fazer o mesmo sozinhos. Hamel, se você espiar, eu mato você.

Era apenas esse tipo de conversa sem importância. Depois que uma batalha terminava, eles conversavam sobre o que todos fariam depois de deixar Helmuth. Talvez porque ela estivesse especialmente de bom humor naquele dia, Anise, que raramente contribuía quando se tratava de tais tópicos, na verdade falou enquanto tomava uma bebida.

—Se estamos falando de lugares misteriosos… Então Yuras também tem alguns assim.

—O quê?

—Todo mundo, calem a boca! Moron, seu idiota, cale a boca! Anise está tentando dizer alguma coisa! Sienna! Encha o copo da Anise!

—….

—Desculpe, Anise. Serei o primeiro a calar a boca, então continue falando.

—O lugar que me vem à cabeça agora… É a Fonte da Luz.

—A Fonte de Luz? E o que é isso exatamente?

—Assim como o nome sugere, é uma nascente que emite luz. À primeira vista, parece que está derramando luz em vez de água. A água é… Hum. Não é tão quente quanto o rio quente de que Moron falou, mas é bem quente.

—É mesmo? Que misterioso. Vamos ver juntos quando terminarmos, tudo bem? Se mergulharmos nela, nossa pele ficará melhor como o rio na cidade natal de Moron?

—Se você entrar normalmente, então quem sabe, pode ter tal efeito.

Anise não tinha falado mais sobre isso.

“Embora não tenhamos conseguido ir lá juntos, acabei vendo a Árvore do Mundo”, Eugene pensou melancolicamente.

Embora não tivesse visto pessoalmente o rio quente do qual Moron havia falado, aquele rio havia se tornado uma famosa atração turística em Ruhr. Eugene sorriu amargamente ao relembrar o passado. Se não tivesse morrido no castelo do Rei Demônio do Encarceramento, poderiam viajar juntos para os vários lugares sobre os quais conversaram naquela época? Naquela época, eles já viajavam juntos há mais de dez anos, então sempre conversavam sobre que tipo de férias gostariam de ter depois.

Eugene perguntou a Kristina: 

— Você precisa mesmo fazer algum jejum? Não é como se esvaziar o estômago deixasse seu corpo mais limpo depois de tomar banho.

— Não é simplesmente limpar o corpo. — Explicou Kristina. — Como Santa… Não, como Candidata a Santa, imergir meu corpo na Fonte de Luz é um ritual sagrado por si só. Já entrei várias vezes naquela fonte desde criança.

— Você só toma banho naquela fonte normalmente? — Eugene perguntou.

Swisssh!

A escuridão de repente engolfou o interior do trem. Mer, que ainda estava olhando pela janela com olhos fascinados, puxou as mãos da janela em surpresa. O trem tinha acabado de entrar em um túnel.

Feitiços no teto reagiram à escuridão e iluminaram a sala com uma luz suave. Não era apenas um simples conjunto de luzes. Finas linhas de luz corriam por todo o teto, representando um ícone religioso.

Talvez por causa do nome do trem ser o que era, o ícone no teto era uma imagem de Anise rezando com os olhos fechados. Esta era a composição mais comum entre os muitos ícones que representavam Anise, mas a forma como a figura dela foi desenhada com linhas de luz na tela escura criada pelo túnel fez com que parecesse uma constelação.

Kristina esperava que a escuridão pudesse esconder as mudanças em sua expressão. Não, a verdade é que a expressão dela não mudou tanto. No entanto, realmente estava um pouco abalada. Mesmo agora, os cantos de sua boca pareciam um pouco rígidos.

Kristina piscou cuidadosamente uma vez. Ela acalmou seu coração trêmulo e assustado.

Eugene sabia de alguma coisa? Não havia como isso acontecer. Nesse período de tempo, não havia outra Candidata a Santa senão Kristina. Como tal, nesta geração, o batismo que todas as Candidatas a Santa precisavam receber periodicamente indo à Fonte de Luz havia sido monopolizado por Kristina.

Isso significava que não havia como a informação vazar em qualquer outro lugar. Kristina sabia melhor do que ninguém o quão secreta a verdade por trás desse batismo era mantida.

— Não tenho certeza se entendi muito bem o que você está perguntando, Sir Eugene. — Disse Kristina assim que se recompôs. — Existe algum outro método especial além de apenas entrar na fonte, como qualquer outra?

— Bem, para começar, seu nome é Fonte de Luz, não é? E você é a Candidata a Santa. Então, se tem tomado banho lá regularmente como se fosse parte de algum ritual, eu estava perguntando se há algo especial que você faça para tornar isso mais… Ritualístico. — Eugene elaborou.

Então era isso que ele queria dizer. A agitação de Kristina diminuiu rapidamente.

Vrum, vrum.

O trem continuou a correr em silêncio por alguns momentos.

Whoosh!

Ao sair do túnel, a escuridão foi dissipada.

— Eu uso uma túnica branca. — Respondeu Kristina por fim.

— Uma túnica branca? — Eugene repetiu.

— Sim. — Confirmou Kristina. — Diferente das minhas vestes normais de sacerdotisa. Tenho que usar um manto totalmente branco de cima a baixo antes de entrar na fonte. Uma vez lá, não poderei trocar de roupa ou sair da fonte nos próximos três dias.

— E se você ficar com fome ou com sede durante esse período? — Eugene perguntou.

Kristina balançou a cabeça. 

— O processo de suportar essas coisas faz parte do ritual.

— Mas e se você precisar ir ao banheiro? — Mer, que estava olhando pela janela, virou-se para fazer uma pergunta direta. — Você não vai soltando aos poucos, não é?

A expressão de Eugene se contraiu com essas palavras, e ele se virou para olhar para Mer. Kristina nem tentou esconder as mudanças em sua expressão desta vez. Seus olhos se arregalaram quando olhou para Mer, que apenas deu de ombros e sorriu inocentemente.

— Sinto muito. — Mer desculpou-se.

— Em todo caso, preciso retornar a Tressia por causa deste ritual. — Kristina mudou de assunto.

— Tudo bem. — Eugene assentiu. — Você tem um bom motivo para fazer isso e não pode ser evitado. Mas… Por que você me pediu para ir junto hoje? Você poderia ter me pedido para vir três dias depois, quando você deveria entrar no Vaticano.

Kristina respirou fundo para impedir que sua voz tremesse e disse: — O cardeal Rogeris pediu para se encontrar com você, Sir Eugene.

— Por quê? — Eugene perguntou.

— Não sei o motivo exato de seu pedido, mas é realmente tão incomum que um Cardeal deseje se encontrar com o Herói? — Kristina perguntou retoricamente.

Eugene franziu a testa. 

— Também pode ter algo a ver com você.

— Talvez. — Admitiu Kristina.

Eugene sondou: 

— Você tem alguma ideia?

— Sinceramente não. Embora… Todas as minhas cartas para Rohanna foram monitoradas e seu conteúdo verificado. — Kristina o advertiu.

— O feitiço cifrado que coloquei em nossas cartas nunca foi quebrado. — Afirmou Eugene com confiança.

Mesmo na Torre Mágica Vermelha, era um feitiço altamente protegido de alto nível que apenas alguns outros além de Eugene, Lovellian e Hera conheciam. Este feitiço garantia deixar rastros caso alguém tentasse desbloquear a cifra e, em seguida, criptografava novamente o texto.

Eugene nem havia informado Kristina sobre o método de descriptografia. Então, para que outra pessoa tenha dissipado o feitiço na carta, eles deveriam ter sido capazes de descobrir o código de descriptografia examinando as partes do feitiço que foram reveladas na superfície.

Embora descobrir o processo não fosse realmente impossível, Eugene definitivamente teria notado se tivessem tentado criptografá-lo novamente usando o mesmo código. No entanto, até agora, nenhuma das cartas que Kristina havia enviado a ele havia mostrado qualquer sinal de alguém adulterando o feitiço de cifra.

— No entanto, não posso ter certeza se o Cardeal sabe que as cartas que enviei a Rohanna foram passadas para você, Sir Eugene. — Kristina murmurou com a mão trêmula.

— Você não disse que ela era uma amiga confiável? — Eugene perguntou preocupado.

— É verdade que ela é a única amiga com quem mantenho contato desde que deixei o monastério, mas o cardeal Rogeris pode ter chegado ao ponto de manter até mesmo Rohanna sob vigilância. — Especulou Kristina.

Eugene comentou sarcasticamente: 

— Seu pai adotivo é bastante paranoico.

— Devido à minha aparência, recebi um tratamento muito especial desde jovem. — Disse Kristina, desanimada.

Sua semelhança com Anise por si só era suficiente para atrair a atenção, mas, além disso, Kristina acabou se revelando uma candidata a Santa. Não… Talvez o Cardeal já tivesse previsto tal futuro para ela quando tomou Kristina como sua filha adotiva. Com o fato de haver apenas uma candidata a santa nesta geração, somado ao quanto a aparência de Kristina se assemelhava a Anise, não havia como Eugene não ter suas próprias suspeitas.

“Embora ela não tenha entrado em detalhes específicos, Kristina disse que sabia que eu era o Herói devido a uma revelação”, lembrou Eugene.

O Papa ou os outros Cardeais, que também receberam estigmas, poderiam ter recebido uma revelação sobre o nascimento de uma Santa. Eugene não tinha certeza sobre outros países, mas tal coisa era definitivamente possível neste Império Sagrado.

— Você está ofendido? — Kristina perguntou cautelosamente.

— Pelo quê? — Eugene respondeu.

— Pelo fato de não ter te contado antes.

— Se eu tivesse ficado realmente ofendido com isso, não teria entrado no trem para começo de conversa. Não sou idiota, então imaginei que fosse algo assim desde o momento em que você me pediu para irmos juntos à paróquia de Tressia.

Kristina hesitou. 

— No entanto—

— No entanto, o quê? — Eugene a interrompeu. — Agora que as coisas já chegaram tão longe, devo pular do trem? Ou talvez eu deva descer na próxima estação? Isso seria mais confortável para você?

Kristina não respondeu imediatamente quando Eugene fez essas perguntas com um sorriso.

— Não tenho certeza. — Kristina acabou admitindo.

Ela mesma não tinha certeza de qual seria a melhor resposta para a pergunta de Eugene. Kristina relembrou tudo o que tinha visto no cardeal Rogeris desde a infância.

— Se disser que quer descer na próxima estação, não tentarei contê-lo, Sir Eugene. Porque tudo o que aconteceu é um insulto para você, e pareceria que eu estava tentando arrastá-lo à força comigo. — Kristina confessou.

— Sabe, fico cansado só de olhar para você. — Suspirou Eugene.

Kristina ficou boquiaberta. 

— Hã?

— Você finalmente falou depois de ficar tanto tempo calada, porque pensou que eu precisaria dessa desculpa para evitar o encontro com o Cardeal? — Eugene acusou. — Porque você pensou que se eu entrasse nesse trem depois de ter ouvido as circunstâncias de antemão, você não poderia me dar mais desculpas para simplesmente recusar o convite do Cardeal.

Incapaz de pensar em uma resposta, Kristina apenas olhou para Eugene com olhos vazios.

Eugene assegurou a ela: 

— Além disso, mesmo que você tivesse me contado seus motivos para me convidar no início, e eu me recusasse a ir com você, realmente não teria sido grande coisa. O que eles poderiam fazer se eu dissesse que não queria? É só que os Cardeais podem pensar em mim como um maldito rude. Quanto a todos os outros, tudo o que eles pensariam é que os nobres cardeais queriam conhecer alguém pessoalmente, apenas para aquele jovem rude desperdiçar a oportunidade recusando.

— Isso é… — Kristina tentou chegar a um argumento.

— É por isso que estou dizendo que você é tão cansativa. — Disse Eugene. — Vir com uma desculpa foi só para o seu bem, não meu. Se você disser a eles que cometeu um erro, me insultou e me obrigou a sair no meio de nossa jornada… Você acredita que será capaz de proteger minha posição de Herói enquanto apenas suas falhas são expostas.

De vez em quando, Kristina achava difícil acreditar que o jovem sentado à sua frente era na verdade três anos mais novo que ela.

— Há realmente necessidade de preparar tal desculpa por minha causa? Por que você está tão preocupada comigo conhecendo seu pai adotivo? Você acha que o Cardeal Rogeris está planejando me torturar e me forçar a entregar a Espada Sagrada? — Eugene perguntou a ela.

— Não é isso. — Gaguejou Kristina. — Não tem como ser assim, certo? É que eu… Pessoalmente, não consigo deixar de me sentir um pouco…

— Um pouco o quê? — Eugene perguntou.

Kristina estava visivelmente angustiada, sua expressão distorcida. Suas mãos trêmulas agarraram seus joelhos com força.

— Estou com medo. — Admitiu Kristina.

— Do quê? — Eugene perguntou.

— Estou preocupada que o cardeal Rogeris… Possa lhe contar… Algumas informações desnecessárias sobre mim. — Revelou Kristina lentamente.

O que ela quis dizer com isso? Eugene piscou em choque, tão surpreso com a resposta de Kristina que se esqueceu de fazer uma pergunta complementar.

— O quê…? Você está falando de coisas como… O fato de molhar os lençóis quando era pequena? — Eugene perguntou cautelosamente.

— Claro que não. Em vez disso, o que me preocupa e temo é que… O cardeal Rogeris possa estar tentando criar e torcer à força o vínculo que estou tentando forjar com você, Sir Eugene. — Kristina finalmente confessou.

— O vínculo que você quer construir comigo é o vínculo entre o Herói e a Santa, certo?

— Além disso, o que mais há?

— No fim das contas, o vínculo que o cardeal Rogeris quer nos arranjar não é o mesmo?

— Eu sou a Santa. Também sou eu quem deveria estabelecer um vínculo com o Herói, Sir Eugene. Eu me encontrei com você pela primeira vez devido a uma revelação de Deus, e também foi assim que me tornei a Santa. — Insistiu Kristina.

A própria Kristina não entendia totalmente o que estava tentando dizer. O medo e o desgosto escondidos em seu subconsciente estavam causando essas emoções confusas. Ela simplesmente não queria que o cardeal Rogeris e Eugene se conhecessem. Ela não queria que o vínculo entre eles se quebrasse por causa disso.

Mas isso era tudo? No final, era realmente apenas que Kristina não queria decepcionar Eugene? Kristina ouvia histórias sobre o Herói desde que era uma garotinha. Na Igreja da Luz, o Herói era chamado de Encarnação da Luz, então onde quer que o Herói fosse, sempre haveria luz.

A Paróquia de Tressia foi o lugar onde Kristina viveu depois de ter sido adotada e deixado o monastério e até se tornar Bispo Auxiliar de Alcarte há dez anos. Parecia ser um lugar tranquilo e sossegado, próprio de uma paróquia governada por um cardeal.

No entanto, para Kristina, era diferente. Através da revelação, ela sentiu a presença de seu Deus. Tinha visto Eugene sacar a Espada Sagrada bem na frente dela. Com isso, se convenceu da existência do Herói.

Aquele Herói… Ficaria na Paróquia de Tressia… Enquanto ela estava imersa na Fonte de Luz.

— Eu… — Kristina parou, incapaz de descobrir o que dizer.

Devido às suspeitas levantadas por Eugene, Kristina monitorou cuidadosamente as atividades do cardeal e investigou cuidadosamente ao redor da paróquia sempre que ele tinha que ir e vir do Vaticano.

Tudo isso fez Kristina sentir uma sensação distorcida de realização, mesmo que fosse apenas uma demonstração mesquinha de resistência. Ela realmente não havia realizado muito, mas ainda se sentia satisfeita por fazer o pouco que tinha feito.

Mesmo agora, ainda era o mesmo. Enquanto preparava a desculpa para Eugene, ela realmente esperava que ele descesse na próxima estação. Se Eugene realmente a deixasse, o cardeal Rogeris com certeza ficaria desapontado com Kristina, e isso a deixaria com um leve sentimento de satisfação. Na verdade, era só isso. Kristina ignorou os sentimentos que continuavam a borbulhar em seu subconsciente.

— Me desculpe. Parece que minha razão ficou nublada por um momento devido à tensão dos deveres que tenho pela frente. Por favor, não se preocupe mais com isso. — Pediu Kristina.

Mer olhou para o rosto de Kristina através do reflexo na janela. Era óbvio que a condição dela era um pouco estranha. Embora Eugene continuasse olhando para a Santa com os olhos apertados, ela se recusou a dizer mais alguma coisa. Como para mostrar que não queria mais participar de nenhuma conversa, Kristina abriu o livro de escrituras que havia deixado de lado e voltou a lê-lo.

— Um vínculo, você diz. — Eugene bufou e apoiou o queixo nas mãos. — Ao invés de um vínculo entre o Herói e a Santa, eu preferiria um vínculo entre uma pessoa e outra.

— … 

Kristina permaneceu em silêncio.

Eugene continuou: 

— Porque esse vínculo é muito mais profundo e sincero.

Vermouth era o Herói para todos os outros, mas para Hamel, ele era apenas o Vermouth irritante.

Sienna era uma arquimaga, mas para Hamel, ela era apenas a violenta e desbocada Sienna.

Moron era o Guerreiro Chefe da Tribo Bayar, mas para Hamel, ele era apenas o idiota do Moron.

Anise era a Santa, mas para Hamel, ela era apenas a alcoólatra e traiçoeira-como-uma-cobra Anise.

Todos eles também sentiam o mesmo em relação a Hamel. Burro, filho da puta, idiota, e vários outros adjetivos ainda por cima, mas no final, ele era apenas Hamel.

O vínculo que conectara aquelas cinco pessoas trezentos anos atrás era exatamente esse vínculo.

Eugene — não, Hamel tinha certeza disso.

* * *

O trem chegou à paróquia de Tressia quando a noite estava caindo.

Embora fosse noite e o céu estivesse escuro, a rua estava iluminada. Eugene já havia começado a perceber isso antes mesmo deles chegarem, pois avistou a cidade pela janela enquanto ainda estavam longe, mas… Essa cidade realmente tinha luzes demais. Como a maioria dos prédios era branca, a luz dos postes de rua em todas as ruas parecia ainda mais forte.

— Eles com certeza exageraram na recepção. — Eugene bufou enquanto olhava pela janela.

Kristina não conseguiu nem sorrir. Com o rosto rígido, ela também olhou pela janela. Vestindo uma barretina preta e túnica vermelha, junto com um colete vermelho, os Inquisidores do Maleficarum – os únicos que tinham permissão para se vestir dessa maneira em Yuras – esperavam na plataforma.

Esses inquisidores não foram os únicos que apareceram. Em contraste com o Maleficarum, havia também Paladinos vestidos com uniformes brancos puros, com uma cruz vermelha dividindo seu uniforme em dois lados simétricos. Estes eram os Cavaleiros da Cruz de Sangue, que serviam diretamente sob a Santa Sé.

Elites das duas organizações mais poderosas de Yuras estavam esperando na estação para cumprimentá-los.

O trem finalmente parou completamente. Logo a porta se abriu. Um a um, os inquisidores e cavaleiros encarregados dessa tarefa embarcaram no trem.

Eugene começou a falar. 

— Só estou avisando com antecedência…

O som dos passos se aproximava. Eugene virou a cabeça para olhar o corredor e cruzou as pernas.

— Mas se você fizer aquele rangido chato com os dentes, saiba que vou te bater. — Eugene terminou de avisar um dos Inquisidores.

Sob a barretina preta, o cabelo da Inquisidora estava aparado em um corte curto que emoldurava perfeitamente a máscara de metal.

Os olhos vermelhos de Hemoria se estreitaram quando ela olhou para Eugene.


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