Nick poderia forçar alguém a fazer mais quando essa pessoa estivesse seguindo todas as regras?
Não.
Afinal, estavam fazendo tudo o que era exigido delas.
Essa situação prejudicava a humanidade como um todo?
Sim.
A felicidade de cerca de 6.000 pessoas em troca de um pouco mais de ajuda para a Égide…
Eram 6.000 pessoas, e a perda da felicidade delas ajudaria a Égide apenas um pouco.
Isso não parecia certo.
Era um dilema.
Não importava o que Nick escolhesse, parecia errado.
Escolher qualquer um dos lados era ruim.
“Bem, é verdade que haveria consequências graves se toda cidade agisse assim, mas essa simplesmente não é a realidade”, pensou Nick.
“As cidades são como as pessoas. Têm forças e fraquezas diferentes.”
“De certa forma, também têm personalidades diferentes.”
Nick levou um tempo para chegar a uma solução, mas acreditava que funcionaria.
“Quando se tem um funcionário que não é bom no que faz, mantê-lo em sua posição atual não é uma boa ideia. No entanto, demiti-lo também é ruim. Só porque ele é ruim em uma coisa, não significa que seja ruim em tudo.”
“É preciso buscar uma posição onde ele se encaixe.”
“Uma posição em que seus pontos fortes importem e suas fraquezas não interfiram.”
Nick formulou seu plano e deixou a Cidade Jardim Celeste.
No entanto, em vez de colocá-lo em prática imediatamente, Nick decidiu passar dois meses aprendendo com o Adversário contido.
Tornar-se mais poderoso e aprender sobre tecnologia antiga era a maior prioridade no momento.
Trabalhar para a Égide e entregar resultados era apenas algo que ele precisava fazer.
Seu objetivo era toda a humanidade, não apenas algumas cidades.
Após dois meses de aprendizado, Nick voltou à sede da Égide e foi diretamente ao encontro da Braço Esquerdo.
— Relatório — ordenou a Braço Esquerdo assim que Nick entrou.
— Encontrei uma cidade que está sob o controle da Preguiça — disse Nick.
— Você lidou com ela? — perguntou a Braço Esquerdo.
— Quero conversar com você sobre isso — disse Nick.
A Braço Esquerdo apenas o encarou com uma expressão impassível. — As pessoas que vivem em cidades da Preguiça quase sempre estão bastante felizes com a situação, mas você não pode deixar que isso te cegue. A Preguiça é inimiga da humanidade, e enfraquecê-la é prioridade maior do que melhorar a vida de algumas milhares de pessoas.
Naturalmente, a Braço Esquerdo conhecia Nick e pôde perceber imediatamente qual era o dilema dele.
— Mas eles estão seguindo as regras e fazendo o que esperamos que façam — disse Nick.
— Eles não estão seguindo as regras — respondeu imediatamente a Braço Esquerdo. — Estão trabalhando para um Corruptor. Trabalhar com um Corruptor é proibido.
— Eu tenho uma ideia — disse Nick.
A Braço Esquerdo franziu a testa.
Se fosse qualquer outra pessoa, ela diria para obedecer às ordens e lidar com a influência da Preguiça.
No entanto, Nick era o futuro da humanidade.
Se a era atual chegasse ao fim, caberia a ele moldar a humanidade.
Então, mesmo estando certa de que tinha razão…
— Muito bem, diga sua ideia — disse ela.
— As cidades são como funcionários — disse Nick. — São funcionários que trabalham para a Égide. Nós os protegemos e, em troca, eles contribuem com nossos esforços, certo?
A Braço Esquerdo não respondeu, pois não era necessário.
— Acho que não devemos olhar para funcionários individuais com desempenho ruim, mas para as funções em que eles estão — disse Nick.
— Toda cidade precisa contribuir com Zephyx e também fornecer novos membros para a Égide. É isso que se espera delas.
— No entanto, nem toda cidade é boa nisso. Nós investigamos as cidades que não estão à altura do padrão da função, e as ajustamos para que cumpram nossos critérios.
— Mas e se criássemos uma nova função?
A Braço Esquerdo franziu mais as sobrancelhas, mas não interrompeu Nick.
— Se dizemos que cada cidade representa um funcionário, estamos essencialmente forçando todos a fazerem a mesma coisa, apesar de suas forças e fraquezas serem diferentes.
— E se aproveitássemos as forças delas em vez de forçá-las a atuar de forma que acentue suas fraquezas? — perguntou Nick.
— Sua argumentação faz sentido — disse a Braço Esquerdo — mas você está falando em analogias simplificadas. Fale em termos mais realistas e concretos.
— Bem — disse Nick — neste momento, a Cidade Jardim Celeste mal está produzindo Extratores, e está lidando com uma quantidade ridiculamente pequena de Espectros. Eles estão essencialmente produzindo zero soldados que a Égide possa usar.
— Mas e se, em vez de pedirmos que produzam soldados, pedirmos que criem armas para nossos soldados?
— Termos mais concretos, por favor — disse a Braço Esquerdo com impaciência. — Vá direto ao ponto.
— Espectros — disse Nick. — Eles estão matando quase todos os Espectros que encontram porque não querem trabalhar com eles. Mas só porque eles não querem, não significa que mais ninguém queira.
— E se tratarmos a Cidade Jardim Celeste como uma fornecedora de Espectros? Já que não querem trabalhar com eles, podemos oferecer um incentivo para que os capturem, e então nós simplesmente os levamos para outro lugar.
— Claro, não vamos usar os Espectros nós mesmos. Em vez disso, só os transportamos da cidade para outra cidade. Os Fabricantes em outras cidades vão trabalhar com esses Espectros com prazer, o que significa mais produção de Zephyx, o que significa Extratores mais poderosos.
A Braço Esquerdo olhou para Nick com as sobrancelhas franzidas. — Comércio interurbano de Espectros é ilegal devido ao risco. Só permitimos isso em exceções.
— Você é quem faz as regras — disse Nick. — Pode mudá-las. Não aproveitar cidades como essa equivale a desperdiçar recursos.
— Além disso, e talvez mais importante, a Preguiça está usando nossas regras para enfraquecer a humanidade. É assim que ela nos prejudica. Está basicamente explorando uma brecha.
— Mas se corrigirmos essa brecha, a Preguiça perderá sua arma, e ainda estará ajudando a humanidade.
— Claro, a influência da Preguiça não pode se tornar forte demais. Precisamos de uma proporção adequada entre os dois tipos de cidades para isso funcionar. Contanto que não deixemos que ela domine, a Preguiça na verdade nos ajuda.
— A exportação de Espectros pela Preguiça aumentará nosso poder, que usaremos para lidar com outros Corruptores.
— Ela se beneficia, mas nós também.
— Pelo menos… com a situação atual — disse Nick, chegando à parte mais importante do plano.
— A Preguiça é inimiga da humanidade. Isso é um fato imutável.
— Embora a Preguiça provavelmente fique contente com essa nova dinâmica, a Morte e a Peste não ficarão. Elas perceberão que a Preguiça está ajudando a humanidade em vez de prejudicá-la, e a forçarão a agir de maneira diferente.
— Nesse momento, a Preguiça será forçada a adotar uma abordagem mais direta, perdendo a tática que usou por mais tempo. Estaremos essencialmente obrigando a Preguiça a abandonar seus pontos fortes e trabalhar com suas fraquezas.
— Seu efeito prejudicial perderá todo o poder. Nesse caso, não precisaremos mais dedicar mão de obra ao território dela, liberando mais recursos para outros territórios. Ou ela continua sendo inútil, ou se torna mais agressiva e perde sua arma mais poderosa.
— Isso pode tornar a Preguiça vulnerável, e ela pode cometer erros.
A Braço Esquerdo permaneceu em silêncio por um tempo.
— A ideia não é ruim, mas falta-nos mão de obra para supervisionar essas trocas — disse a Braço Esquerdo. — Não podemos enviar tantos Heróis para transportar Espectros entre cidades. Cada vez que um Herói viaja de uma cidade a outra, é perigoso por causa dos Demônios selvagens e dos Caídos.
— E as caravanas? — perguntou Nick.
— Já fizemos isso no passado — disse a Braço Esquerdo. — As caravanas enfrentam o mesmo nível de perigo, e muitos Espectros perigosos escaparam. Foi exatamente por isso que o comércio interurbano de Espectros foi tornado ilegal.
Nick não desistiu. — Parece uma perda prevista se estivermos falando em termos empresariais. Você não pode lucrar sem correr riscos. Usa-se dinheiro para ganhar mais dinheiro, e contanto que as perdas não sejam maiores que os ganhos, ainda vale a pena.
— O que é pior: dezenas de cidades matando 90% de todos os Espectros que veem ou alguns Espectros escapando no meio do nada?
— Eu concordaria com você se a Preguiça não existisse, mas ela existe, e esse é o problema central.
— Se a Preguiça mudar seu modo de operação, podemos simplesmente tornar o comércio interurbano de Espectros ilegal novamente.
— Toda essa mudança de política serve apenas para lidar com a arma da Preguiça.
— Assim que a Preguiça mudar seu modo de operação, ela precisará alterar retroativamente a forma como todas as suas cidades funcionam. As mudanças serão perceptíveis, e descobriremos rapidamente quais cidades ela controla.
— Estamos encurralando a Preguiça com essa mudança.
A Braço Esquerdo permaneceu em silêncio por um bom tempo.
— Terei que conversar com o Campeão e os outros Escudos sobre isso. Sua ideia parece viável, mas precisamos fazer os cálculos e elaborar um plano concreto se quisermos transformar isso em realidade.
Nick se sentiu aliviado ao ouvir isso.
— Eu cuidarei disso — disse a Braço Esquerdo. — Por ora, ignore o território da Preguiça. Foque em outro território por enquanto. O Técnico vai te avisar se isso avançar.
— Obrigado, Braço Esquerdo — disse Nick.
A Braço Esquerdo apenas assentiu, e um momento depois, Nick deixou o escritório dela.