— Oh, ele voltou.
— Brett.
Brett saiu da tenda. Todos se reuniram ao redor dele, incluindo Judith. Apesar de evitar adivinhações por causa das provocações de seus amigos, ela não conseguiu conter sua empolgação. Gurgar havia demonstrado poderes incríveis que superaram suas expectativas.
“Ele voltou dos mortos e ainda expulsou os mestres com suas palavras!”
Era um milagre impossível até mesmo para um grande feiticeiro. Judith estava tão animada para ouvir uma adivinhação de Gurgar que se sentiu decepcionada por ele não tê-la chamado primeiro. Mas, mesmo assim, ela não conseguia perguntar diretamente a Brett sobre como foi. Já se passavam mais de dez dias, mas Judith ainda estava chateada com ele.
— Como foi, Brett?
Felizmente, Illia fez a pergunta que Judith queria fazer. Todos se voltaram para Brett, que respondeu com seriedade.
— Foi incrível.
— Sério? Ele é bom em adivinhação? — perguntou Illia.
— Ele é diferente do Khubaru? — perguntou Airen.
— Ele é diferente. Muito diferente.
— Ugh, pessoal. Eu ainda estou aqui, sabiam? Não deveriam dizer isso na minha frente… — resmungou Khubaru.
— Mas você é ruim em adivinhação, Khubaru — disse Airen.
— Hmph…
Airen e Illia fizeram mais algumas perguntas a Brett sobre a adivinhação, mas desta vez ele balançou a cabeça.
— Não posso contar o que ele me disse. Isso diminui a eficácia.
“Que besteira é essa?!” Judith franziu o cenho. Nunca tinha ouvido algo assim e achou ainda mais absurdo vindo de Brett. Ele sempre desprezava adivinhações, e agora alegava que eram eficazes. Mas isso também tornava Judith ainda mais curiosa. Se a adivinhação de Gurgar tinha convencido até Brett, então devia ser realmente impressionante.
— Judith, entre.
— Sim! Ah, er, hã.
Ela foi chamada em seguida, gritou animada e, em seguida, tossiu de leve para disfarçar. Não olhou para os outros, envergonhada, e entrou diretamente na tenda. Assim que entrou, estava prestes a cumprimentar Gurgar.
— Está interessada em romance?
— O quê?
— Perguntei se está interessada em relacionamentos amorosos.
Judith ficou sem palavras. Ela havia ido ali para lutar contra guerreiros orcs valorosos e queria perguntar qual era seu caminho de crescimento. Com crescimento, ela se referia à maestria em espada e ao fortalecimento. Gurgar certamente deveria saber disso. Mesmo morto, ele ainda era o melhor vidente do continente.
“Talvez tenha ficado ainda mais forte depois de morrer.”
Judith pensou que aquele velho orc estava brincando com ela. Ela havia acabado de passar por uma situação irritante antes de ir ali, então levou a pergunta para o lado pessoal.
— Pare de brincar e vamos ao que interessa — disse ela.
— O que você quer dizer com ‘o que interessa’? Fiz uma pergunta séria.
— Do que você está… Ah, esqueça. Quero conselhos sobre minha esgrima. Quero saber como posso ficar mais forte, me tornar uma mestre espadachim e alguém ainda maior. Me diga isso.
— Não vou dizer.
Judith começou a franzir o cenho, seu rosto ficando tão vermelho quanto seu cabelo, e um som de dentes rangendo escapou de sua boca. Estava prestes a explodir de raiva, mais impaciente do que o normal, quando Gurgar disse calmamente.
— Você não ouviria o que eu diria de qualquer forma.
— O quê?
— Não tem a ver comigo. Tantos espadachins acima de você devem ter lhe dado conselhos até agora, mas você provavelmente nunca ouviu. E não pretende mudar isso. Como eu poderia aconselhar sobre esgrima a uma garota tão teimosa? Eu nem sou espadachim.
— Não acha?
Judith se virou silenciosamente com uma expressão desconfortável. Ela não queria admitir, mas ele estava certo. Recebera muitos conselhos, mas nunca realmente os seguiu. Não era sobre os detalhes da esgrima. Ela discutia e aprendia com Airen e Brett, mas nunca mudava sua maneira de treinar. Também discordou fortemente dos conselhos de Zett Frost, e a razão para começar essa jornada era provar que Ian estava errado, embora estivesse passando por grandes dificuldades para isso…
“Bosta. O que devo fazer, então?!”
Judith lançou um olhar de raiva. Ela sabia que era teimosa, então tentava ser mais flexível e ouvir os outros, mas não era fácil. Não sabia se nascera assim ou se sua criação difícil a moldou dessa forma, mas não conseguia aceitar conselhos. Ouvir isso de Gurgar, o grande vidente, parecia confirmar que aquele era seu limite. Isso a deixava desconfortável. Mas…
— E essa teimosia é boa.
Mas o que Gurgar disse a seguir foi muito mais positivo do que ela esperava. Surpresa, ela perguntou. — O quê?
— É boa. Você é única. Todo mundo gosta de vencer, mas a maioria desiste em certo ponto quando encontra inúmeras limitações. Ninguém consegue suportar tanto sofrimento por muito tempo. Se você desafiar uma parede inquebrável, seu corpo e mente inevitavelmente serão destruídos. E as pessoas ao seu redor dirão para parar. Procurar outro caminho, tentar outra coisa…
— Mas você não pode fazer isso, pode?
— Não…
Judith assentiu. Gurgar sorriu mais profundamente para ela.
— Você é quem mais se entende e quem mais pensa sobre si mesma. Se você se conhece melhor do que ninguém e ainda mantém sua teimosia diante de tantos bons conselhos… então tenho certeza de que sua teimosia tem seus méritos.
— Siga seu próprio caminho. Faça isso do seu jeito e chegue ao estágio onde só você pode chegar… O que acha? Não me parece tão ruim.
“Ah, mas não seja tão rígida enquanto faz isso”, acrescentou Gurgar. Então, pegou uma xícara de chá que surgiu sobre a mesa, tomou um gole e gritou.
— Ai! — Ele deixou cair a xícara.
“Um espírito pode sentir calor?” Judith pensou por um instante e depois se concentrou no que ele disse. Após algum tempo, fez uma reverência respeitosa para Gurgar, sentindo sua raiva diminuir.
— Obrigada.
— Haha. Fui útil?
— Sim. Ainda não sei ao certo… mas obrigada. Eu estava perdida nos últimos meses. Acho que agora entendi.
O cabelo ruivo se inclinou novamente, e Gurgar a observou com satisfação. Judith também o olhou com um leve sorriso enquanto se preparava para deixar a tenda, mas não conseguiu. A voz a deteve.
— Então você não quer saber sobre seu relacionamento amoroso? Tem certeza?
— Pense nisso. Sou o melhor vidente do continente. Já tive convidados vindos dos reinos do sul em busca das minhas adivinhações. Ah, até elfos do leste vieram me procurar. Todos trouxeram fortunas para me pagar, mas só vi aqueles de quem gostei.
— E agora estou aqui, tentando contar sobre seu relacionamento amoroso… O que me diz? Realmente não quer saber o que tenho a dizer?
Gurgar falou de forma persuasiva, mas confiante, como se aquela fosse sua última oferta. Judith permaneceu em silêncio com a mão na porta. Um breve momento se passou.
Logo, ela voltou silenciosamente para Gurgar. O vidente sorriu.
— Bom. Esse é o meu ponto forte, na verdade.
Já fazia algum tempo desde que Airen e seus amigos chegaram ao túmulo de Gurgar. Brett e Judith já haviam se encontrado com o vidente, e agora era a vez de Illia. Airen, o último da fila, aguardava ansiosamente sua vez. Talvez finalmente descobrisse o segredo de seu sonho. Mesmo que não conseguisse toda a verdade, ao menos poderia obter uma pista. Esses pensamentos normalmente o deixariam fixado na tenda, mas não era o caso. Os dois amigos que saíram da tenda pareciam bastante estranhos.
“O que está acontecendo?”
Ele já havia sentido isso algumas vezes em Aisenmarkt. Embora seus amigos apenas sentassem em silêncio, algo no clima o deixava inquieto. Por que estava sentindo essa estranha vibração ao observá-los? Incerto, Airen foi até Khubaru e explicou o que sentia, mas não obteve uma resposta satisfatória.
— Se você realmente não consegue entender isso, deveria simplesmente viver com isso.
— Hã?
— Ah, agora é sua vez. Vá em frente.
— Hã? Er…
Khubaru o empurrou, claramente sem querer continuar o assunto. Airen quis retrucar, mas teve que seguir em direção à tenda, pois Illia havia acabado de sair dela.
— Como foi? — ele perguntou.
— Ainda não sei ao certo… Talvez eu precise de mais tempo — respondeu Illia.
— Hmm.
— Mas eu recebi algo.
— Oh, isso…
— Ele me disse para abrir quando eu realmente me sentir frustrada.
Airen assentiu ao observar o pequeno saquinho nas mãos de Illia. Ele já havia recebido algo semelhante de Khubaru antes. Certamente continha uma nota com algum conselho.
“Ela não parece completamente satisfeita…”
Airen olhou para a expressão de Illia. E era verdade. Apesar do comportamento estranho, Brett e Judith pareciam satisfeitos, como se tivessem obtido o que precisavam. Illia, porém, ainda parecia sombria, como alguém vagando por uma caverna escura. Ele a observou com um olhar complicado.
“Hmm?”
Havia algo mais, no entanto. Ela não parecia radiante, mas havia algo diferente em seus olhos. Era estranho, uma sensação de formigamento. No momento em que Airen percebeu que sentia o mesmo em relação a Brett e Judith, percebeu que estava olhando para Illia há tempo demais.
— Oh, desculpe — disse Airen, envergonhado.
— Pelo quê?
— Por ficar te olhando por tanto tempo.
— Está tudo bem.
— Certo. Eu vou entrar agora.
Airen acenou de maneira desajeitada e entrou na tenda, enquanto Illia o observava partir. O jovem loiro não percebeu que ela também havia ficado olhando para ele por muito tempo.
Airen entrou com uma expressão estranha no rosto, enquanto Gurgar o observava seriamente. Os olhos do vidente eram profundos e claros. Airen teve a sensação de estar diante do diretor Ian quando o vidente de Durcali começou a falar.
— Vou direto ao ponto. Posso interpretar o seu sonho.
— É sua vida passada, para ser mais preciso. O homem em seu sonho, sobre quem você está tão curioso, é você mesmo de muito tempo atrás.
O coração de Airen começou a acelerar. Isso era diferente de quando Lulu havia sugerido que o sonho poderia estar relacionado a uma vida passada. Gurgar falava com absoluta certeza. E ele disse que poderia interpretar. Airen abriu a boca para perguntar algo, mas o vidente levantou a mão para interrompê-lo e continuou em tom calmo.
— Não podemos olhar para sua vida passada imediatamente. Preciso de preparação e de alguns reagentes que Khubaru deverá buscar…
— Ah, entendo…
— Mas não desanime. Preparei um presente para mantê-lo entretido enquanto espera. Ah, é um presente para vocês quatro.
— Um presente?
Os olhos de Airen se arregalaram. Apenas saber sobre sua vida passada já parecia um presente enorme. Ele achava que não merecia tanto. Gurgar continuou imediatamente, como se tivesse lido seus pensamentos.
— Deixe-me repetir, obrigado por trazer meu aprendiz, a quem talvez eu nem tivesse encontrado, mesmo após minha morte. Falo sério.
— O presente é para retribuir essa dívida. Ah, mas preciso conversar com Tarakhan sobre isso… Então, peço que espere do lado de fora por um momento.
Gurgar fechou os olhos, encerrando a conversa. Só então Airen percebeu que o corpo de Gurgar havia se tornado ainda mais translúcido. O tempo dele no mundo mortal parecia estar chegando ao fim. Airen saiu rapidamente da tenda e encontrou Karakhum e Tarakhan esperando ali. Eles assentiram e entraram na tenda como se já soubessem o que estava acontecendo. Judith, Brett e Illia se aproximaram de Airen.
— Um presente? O que é?
— Ainda não sei…
Os quatro espadachins tentaram imaginar qual seria o presente, mas não chegaram a nenhuma conclusão. Com o misterioso orc, tudo parecia possível. Contudo, a resposta veio logo.
— Nos vemos mais tarde. Meu garoto, da próxima vez traga mais licor em vez de comida.
Após essas palavras, Gurgar se dissipou no ar, enquanto Khubaru permanecia em silêncio. Então, Tarakhan, o chefe tribal de Durcali, deu um passo à frente e falou em tom grave.
— O presente… que ele queria dar a vocês é a técnica de utilização de aura que tem sido passada de guerreiros de alto nível para guerreiros de alto nível entre os orcs.
Os quatro aprendizes ficaram chocados enquanto Tarakhan assentia.
— Isso mesmo. A Arte dos Cinco.