Mesmo assim, Judith estava controlando as chamas com maestria. Uma energia intensa e abrasadora emergia de seus passos e punhos, algo que Karakhum podia presenciar com os próprios olhos. Contudo, havia um problema evidente, a humana não estava lidando bem com o calor.
“Não, ela não está controlando. Está apenas suportando.”
Era um calor impressionante. Uma aura abrasadora, cuja origem e motivo para se transformar em chamas eram desconhecidos, espalhava-se por todo o corpo de Judith. Essa onda de calor não apenas atingia Garam, mas também a queimava. No entanto, Judith não cedia. Ela não se transformava em cinzas. Um homem comum teria caído inúmeras vezes, mas ela resistia com pura força bruta, como se já tivesse feito isso incontáveis vezes antes. Karakhum balançou a cabeça em choque. Esse era um tipo diferente de impacto comparado à aura de aço de Airen.
— Hmm…
Até mesmo o Grande Elementalista Gorha deixou escapar um leve murmúrio. Seus olhos geralmente severos estavam arregalados, deixando claro o quão impressionantes eram as chamas da humana. Karakhum voltou sua atenção ao palco. A humana, com cabelos que pareciam chamas, saltou para frente. Desta vez, o chute de Garam não a acertou.
Mas a curta distância não significava que Garam estava sem opções. Embora não pudesse desferir golpes devastadores à distância, ainda possuía diversas formas de atacar de perto. Seu cotovelo, duro como pedra, atingiu o rosto de Judith, seguido por outro golpe. Mas Judith também atacava. A aura flamejante em seu punho atingiu o estômago de Garam, provocando uma dor ardente. Não era um soco comum. Era como se seu punho estivesse envolto em chamas, causando uma dor insuportável a cada golpe.
— Nngh…
Garam gemeu de dor. A situação não parecia tão ruim para ele. Embora não conseguisse atacar sem receber um golpe em troca, ainda dominava a luta. Tinha mais aura, força e físico. Desde que suportasse a dor e resistisse à tentação de baixar a guarda, sua oponente ficaria limitada a alvos em seu torso, enquanto ele teria diversas oportunidades de ataque. Era irritante sentir essa dor inesperada, mas ele usava essa irritação para manter o foco. Então, Garam estendeu a mão para agarrar Judith. Ela desviou, mas ele já esperava por isso. Ele segurou sua cabeça e a atingiu com o joelho.
Como um cinzel atingindo uma pedra, o ataque foi forte e opressivo. O joelho de Garam movia-se ritmicamente com o som do impacto, mas isso foi um erro. Judith captou o ritmo e, assim que o pé de Garam tocou o chão, ela pisou sobre ele.
— Argh…!
O som de um osso se partindo ecoou. Garam perdeu a pegada sobre Judith, e seu rosto surgiu quando ela recuou. Estava um desastre. Mesmo protegendo o rosto com os braços, estava inchado, cortado e sangrando. A troca de golpes parecia menos favorável a ela, dado o estado em que estava. Mas Judith não parou. Todo tipo de emoção negativa a consumia, mas também a sustentava. A humana, agora completamente tomada pelas chamas, avançou contra o guerreiro orc.
“Isso é loucura!”
Garam hesitou. Ele sabia que, embora não pudesse manter uma luta à distância com o pé quebrado, não tinha nada a perder lutando de perto. Sabia que, se conseguisse resistir ao dano, derrotaria sua oponente.
Mas não conseguia se mover como planejava. Não sabia o porquê. Normalmente, teria a mente firme para revidar, mas seu corpo recusava-se a lutar contra aquela humana. Não, ela já não parecia mais humana. A atmosfera estranha das chamas envolvendo seu corpo abalava até mesmo o espírito de um guerreiro treinado. Era uma pressão que ela nunca havia demonstrado antes.
E essa energia se intensificou ainda mais. Não era uma aura comum. Era uma aura contendo o elemento fogo, algo que até mesmo Karakhum e Gorha achavam impressionante. Garam sentiu-se mais oprimido do que esperava. Como um animal temendo o fogo, começou a recuar. Mas Judith o perseguia obsessivamente. Então, ela cravou o joelho na coxa de Garam.
O som era como o de uma adaga penetrando a carne. Mas não era uma adaga comum; era uma adaga envolta em chamas. Com o som de músculos se rasgando, os movimentos de Garam foram interrompidos. Ele tentou contra-atacar imediatamente, mas seu equilíbrio estava comprometido. Continuou lançando socos e cotoveladas, mas eles não eram tão ameaçadores, pois não conseguia colocar peso nos golpes. Além disso, a aura flamejante de Judith continuava a incutir medo nele. Ela esquivava-se facilmente de todos os ataques e desferia outro chute com o joelho no mesmo lugar.
— Aaargh!
As chamas atingiram novamente o corpo de Garam, fazendo-o gritar pela primeira vez desde o início da luta. Mas os gritos do orc foram abafados pelos rugidos da multidão. Surpreendentemente, todos os orcs na arena estavam torcendo por Judith, em vez de Garam.
— Humana! Humana!
— Judith! Judith!
— Vá atrás dele! Acabe com ele!
— Judith! Judith!
Os orcs eram extremamente orgulhosos de sua raça, muito mais do que os humanos, e os guerreiros de Durcali tinham ainda mais orgulho de suas tribos. Por isso, sabiam reconhecer quem estava lutando com mais ferocidade e quem demonstrava o verdadeiro espírito de um guerreiro naquela arena. Não importava quem era orc ou humano. Não importava quem estava julgando quem. Naquele momento, a humana de cabelos vermelhos era o maior guerreiro presente naquele lugar.
— Hah… hah…
Judith não se importava. Ela não conseguia ouvir mais nada, pois todos os seus sentidos estavam focados em Garam. Era como uma maldição que só poderia ser quebrada quando o adversário caísse. E, para isso, ela precisava derrotá-lo. Então, ela sorriu, cuspiu sangue e avançou. O medo se estampou no rosto de Garam.
“Saia daqui!”
Ele gritou em sua mente, lançando a mão direita com força. Apesar de estar em péssimo estado, ainda tinha muita força em seus ataques, embora faltasse precisão. O punho passou raspando pela orelha de Judith, que imediatamente avançou e desferiu um soco flamejante contra a cabeça que agora desabava.
Com um baque surdo, a cabeça de Garam foi jogada para trás. O golpe foi tão poderoso que levantou o corpo do orc no ar antes de ele cair ao chão. Estava coberto de ferimentos, cortes e hematomas. Era o fim. Os orcs começaram a gritar o nome de Judith ao término do segundo desafio.
— Judith!
— Judith! Judith!
— Judith! Judith!
Os guerreiros batiam os pés no chão enquanto entoavam seu nome. Os estrondos faziam a arena inteira tremer como se fosse um terremoto. Judith, confusa, finalmente percebeu o que estava acontecendo. Então, sorriu e ergueu o punho mais uma vez. Era um gesto semelhante ao da primeira luta, mas a resposta foi diferente. Os orcs gritaram ainda mais alto.
— Pahun! Pahun!
— Pahun! Pahun!
— Pahun! Venha! Pahun!
Agora, os orcs se voltaram em outra direção, chamando pelo nome do segundo filho de Mestre Halifa, Pahun, para o terceiro desafio. Pahun engoliu seco enquanto olhava para a humana de cabelos vermelhos. Seu irmão mais velho, Garam, estava em péssimo estado, coberto de feridas e cortes, com ossos possivelmente quebrados.
Mesmo assim, Pahun não conseguia aliviar o medo que sentia. Apenas imaginar a possibilidade de derrota fazia seu corpo gelar como se estivesse preso em uma nevasca.
— Pahun! Pahun!
— Pahun! Pahun!
— Pahun! Pahun!
Mas os orcs não se importavam. Eles não se importavam com quem venceria. Eles queriam apenas uma grande luta, algo que mantivesse o fogo e o calor na arena vivos. E essa simples expectativa pressionava Pahun intensamente. Ainda assim, ele precisava dar o próximo passo. Então, engoliu em seco e estava prestes a subir ao palco com uma expressão determinada quando alguém segurou seu ombro. Pahun se virou com uma carranca, mas congelou no lugar ao ver quem estava ali. A pessoa que o deteve começou a caminhar em direção ao palco.
Todos os orcs ficaram em silêncio, interrompendo até os sons das pisadas no chão. Os gritos cessaram.
Mestre Halifa, o segundo guerreiro mais forte da grande Durcali, caminhava em direção à humana de cabelos vermelhos, coberta de sangue. Judith xingou ao ver a imensa sombra que se aproximava.
— Porra…
— Isso não é justo. Isso não é… — disse Airen, levantando-se na arquibancada.
— Pare.
Airen se ergueu, com o rosto franzido, parecendo pronto para invocar sua espada, mas Brett o impediu. Airen virou-se, confuso, para Brett, que o segurava e dizia.
— Pensamos da mesma forma quando você disse que lutaria contra Illia. Mas não o impedimos.
— Se você entende como nos sentimos naquela vez, não a detenha agora. Resolva isso depois que a luta acabar.
Brett explicou calmamente enquanto se sentava. Airen olhou para ele por um momento e, em seguida, voltou a sentar-se. Apesar de sua calma aparente, Brett mordia os lábios com tanta força que sangravam. Illia observava os dois com seriedade, enquanto Lulu olhava fixamente para o palco, como se estivesse prestes a se transformar.
Enquanto isso, Mestre Halifa continuava caminhando. Judith tremia diante da poderosa energia que o cercava, algo como um enorme rochedo ou uma antiga árvore gigante, pressionando-a. Ele era mais baixo do que Garam e até mesmo do que Gunt, mas ela sentia algo ainda mais avassalador se aproximando. O fogo que ardia dentro dela começou a diminuir, mas, após um breve momento, uma nova onda de ciúme e inferioridade se transformou em fúria, reacendendo suas chamas. Ela se preparou para lutar.
Então, disse — Cai pra dentro.
Ela estava em péssimo estado. Diferente de quando subiu ao palco pela primeira vez, agora estava ferida e sangrando, e parecia impossível que pudesse enfrentar Mestre Halifa. Mas Karakhum sabia. Tarakhan sabia. Até mesmo o elementalista Gorha sabia. A chama dentro da humana ainda ardia, e ela só se apagaria com sua morte. Mais do que qualquer um, Mestre Halifa sabia disso.
— Perdemos — ele disse a ela.
— O quê?
— Perdemos. Você passou pelos três desafios.
Com isso, ele deixou o palco. Pahun o seguiu com um olhar surpreso, enquanto os orcs começavam a entoar novamente.
— Judith! Judith!
— Judith! Judith!
— Judith! Judith!
Os orcs gritavam seu nome naquele lugar que, até então, era tão hostil. Era difícil acreditar no que acontecia, considerando os eventos entre Judith e Gunt. Mas…
— Nada mal.
Judith riu e então caiu ao chão. Brett imediatamente saltou ao palco para ajudá-la a se levantar.
Enquanto isso, Airen a observava com um olhar profundo. O fogo dela parecia ter se espalhado até ele, fazendo seus olhos arderem ainda mais intensamente.