Um homem encapuzado caminhava pelo interior até chegar a um vale com vista para a cidade de Lont.
O sol estava prestes a se pôr, e o céu estava tingido com um tom alaranjado. O homem fez uma pausa para admirar o pôr do sol por um minuto inteiro antes de continuar sua jornada.
Ao se aproximar de Lont, o Ourobro sentiu sua presença, mas ignorou o homem que se aproximava. Ele já o tinha visto inúmeras vezes antes e lembrava bem de seu cheiro. Esse homem encapuzado deixava Lont por longos períodos de tempo, mas sempre que retornava, carregava consigo um forte cheiro de sangue.
Ezio deu um breve aceno para o Macaco Dourado antes de se fundir às sombras. Ele seguiu em direção à Residência Ainsworth como um espectro silencioso, sem perturbar ninguém em seu caminho.
Quando chegou à sala de estar, ouviu a risada de um bebê. Ezio sorriu, apesar de si mesmo, porque seu Lorde sempre voltava a ser um avô coruja sempre que estava perto de sua neta.
O mesmo acontecia com Matthew e William, mas ele podia dizer que James mimaria Eve ao extremo conforme ela crescesse. Ele fez uma oração silenciosa pelos tolos que ousassem cortejar a jovem quando ela atingisse a idade adulta.
Ezio tinha certeza de que, se Modred não os matasse, James certamente o faria.
Ele encontrou seu Lorde escrevendo uma carta dentro do quarto. Como sempre, Ezio esperaria até que James terminasse sua tarefa. Ele não estava com pressa e decidiu meditar enquanto aguardava. Alguns minutos depois, James finalmente terminou sua carta e o chamou.
“Como foi?” James perguntou.
“A mão direita do ministro não nos incomodará mais”, Ezio relatou. “Se o ministro não for um tolo, ele saberá o que fazer.”
“Muito bem.” James assentiu em aprovação. “Descanse por dois dias antes de começar sua nova missão. Tenho certeza de que já sabe qual é, certo?”
Ezio assentiu. “Se essa for sua vontade, meu Lorde.”
“Não vai me perguntar o motivo?”
“Não. Eu confio no julgamento do Lorde.”
James tamborilou o dedo no braço da cadeira enquanto observava o homem encapuzado ajoelhado à sua frente.
“Mostre a ele a podridão da humanidade”, ordenou James. “Mas não diga a ele o que fazer. Deixe que tome suas próprias decisões. Se ele fará algo ou não, dependerá apenas dele.”
“Ouço e obedeço”, Ezio respondeu.
“Pode ir agora.”
“À sua vontade.”
Após deixar a Residência Ainsworth, Ezio seguiu para a única taverna de Lont, a Floresta Adormecida.
Ele retirou o capuz antes de entrar na taverna. Ezio agora estava de folga, então não havia necessidade de seguir o rígido credo que havia imposto a si mesmo.
Como sempre, ele caminhou até o banco mais distante do bar e esperou que o barman viesse anotar seu pedido.
“Vai querer o de sempre?” O barman da Floresta Adormecida, Ryan, perguntou enquanto limpava um copo de vidro em suas mãos.
“Sim”, Ezio respondeu sem nem olhar para ele.
Ryan assentiu e pegou algumas garrafas do armário. Alguns segundos depois, estava misturando habilmente um coquetel. Esta era uma mistura especial que não era servida aos outros clientes da taverna. O motivo? Nenhum deles era forte o suficiente para terminar a bebida.
Apenas um punhado de pessoas em Lont apreciava essa bebida, e Ezio era uma delas.
Ryan colocou o copo na frente de Ezio com uma piscadela antes de voltar para seu posto. Ezio murmurou um agradecimento antes de tomar um gole do copo.
O homem de cabelos castanhos fechou os olhos enquanto saboreava a sensação ardente que se espalhava por sua boca, descia por sua garganta e aquecia seu corpo.
Ele não conseguiu evitar que um leve suspiro de prazer escapasse de seus lábios enquanto aproveitava o calor residual da bebida.
Ezio ficou dentro da taverna por uma hora antes de sair para a noite. Como sempre, ele vagou pela cidade de Lont sem um destino em mente.
Por algum motivo, ele se viu caminhando em direção ao sul de Lont. Era um lugar que ele raramente visitava, pois não tinha razão para ir até lá. No entanto, por alguma razão, algo o estava puxando naquela direção.
Foi então que ele o viu. Um jovem garoto estava deitado sobre um monte de feno enquanto olhava para as estrelas no céu. Ao seu lado, havia uma cabra Angoriana cuja cabeça repousava sobre seu peito.
Ezio o reconheceu imediatamente, pois poucas crianças em Lont tratavam uma cabra dessa maneira. Em seus olhos, o garoto era como a chama de uma vela ardendo na escuridão. Uma luz frágil que poderia se apagar a qualquer momento se o vento soprasse em sua direção.
Embora não questionasse a ordem de seu Lorde, Ezio se perguntou o que aconteceria se a luz do garoto desaparecesse de repente e fosse substituída pela escuridão. Ele ainda seria o mesmo garoto despreocupado que ria feliz? O mesmo garoto que cantava canções enquanto conduzia suas cabras para pastar no vale?
Ele ainda olharia para o mundo com aqueles olhos verdes e límpidos que brilhavam como esmeraldas? Ou seu brilho desvaneceria e seria obscurecido por uma névoa conforme perdesse sua fé na humanidade?
Ezio queria saber. Ele ansiava por saber.
‘Um mês’, Ezio pensou. ‘Eu saberei a resposta depois de um mês.’
O homem de cabelos castanhos refez seus passos e vagou pela noite. Seu Lorde ordenou que ele descansasse, e era exatamente isso que ele faria.
Dois dias depois…
William estava dentro da sala de conferências com uma expressão séria no rosto. No dia anterior, James havia lhe dito que seu instrutor já havia chegado a Lont, e ele deveria comparecer à conferência à meia-noite do dia seguinte para conhecê-lo.
O “novo” instrutor de William estava atualmente parado em um canto da sala, vestido de preto e usando um capuz. Ele exalava uma “vibe assassino1)”, o que fazia o jovem garoto se sentir muito desconfortável.
“Will, quero lhe apresentar seu novo instrutor, Ezio”, disse James, fazendo um gesto em direção ao homem parado no canto da sala. “Ezio, você já sabe quem é William. Espero que vocês dois se deem bem a partir de agora.”
“Prazer em conhecê-lo, Senhor Ezio”, William disse com um sorriso.
“O prazer é meu”, Ezio respondeu.
James deu um tapinha no ombro de William com uma expressão séria. “Você acompanhará Ezio enquanto ele completa suas missões fora de Lont. Você tem liberdade para agir como quiser, mas não tem permissão para interferir no trabalho dele. Fui claro?”
“Sim.” William assentiu.
“Ezio, cuide do meu neto”, ordenou James. “Você já sabe como ele é. Tenho certeza de que terá algumas dores de cabeça, mas seja paciente com ele.”
“Como ordenar, meu Lorde.” Ezio fez uma reverência respeitosa a James antes de se virar para William. “Vamos, William. Hora de começar seu treinamento.”
“Sim, Senhor Ezio”, William respondeu.
Os dois deixaram a residência sob a cobertura da escuridão. William já havia se despedido de sua Mestra, de sua Mamãe Ella, de seu Tio Mordred, de sua Tia Anna, de sua Tia Helen e de sua adorável prima, Eve.
Os dois mal haviam saído da cidade de Lont quando Ezio iniciou uma conversa.
“Você já treinou sob a tutela de vários mestres, e posso dizer que sua habilidade geral de combate atingiu os estágios iniciais do Rank Ouro”, Ezio disse enquanto continuava a caminhar. “Bestas de Classe D não representam ameaça para você e—até certo ponto—você será capaz de lidar com bestas normais de Classe C sozinho.”
Ezio fez uma pausa por um momento antes de continuar sua explicação. “No entanto, a maior ameaça para você agora não são os monstros, mas sim os humanos. Embora eu tenha sido designado como seu instrutor, não lhe ensinarei nada até que você tenha se comprometido completamente a dar o próximo passo.
“Até lá, você apenas observará à margem. Você tem liberdade para fazer o que quiser, desde que não atrapalhe minha missão. Está claro?”
“Sim”, William respondeu. O garoto já tinha uma leve ideia do que seu novo instrutor estava insinuando, e isso já fazia seu estômago revirar. Ele torcia, do fundo do coração, para estar apenas exagerando as coisas.
Infelizmente para William, essa pequena esperança em seu coração desapareceu completamente conforme seu mundo se tingia de vermelho.
Nota:
[1] Vibração de assassino.