Ele nunca pensou que perderia algo em uma briga.
Para Kasajin, lutar sempre era um presente cujo conteúdo ele não conhecia.
Quer fosse uma luta grande ou pequena.
Se o oponente era fraco ou forte.
Se ele ficaria ferido ou não.
Kasajin sempre ficava grato e contente cada vez que lutava.
Porque ele sempre aprendia alguma coisa. E tinha a confiança de que conseguiria lutar ainda melhor na próxima vez. Mesmo quando pensava que era uma luta trivial onde não obteria nada, em algum momento, ao olhar para trás, ele percebia que havia conseguido algo.
Braços ou pernas decepados, globos oculares arrancados, dentes quebrados, órgãos rompidos. Mesmo sendo coisas que as pessoas chamavam de danos, para Kasajin eram vistas como medalhas que ele conquistou em uma batalha feroz.
— …
Ele perdeu a consciência.
O demônio usou outra técnica do Punho do Rei Guerreiro.
Utilizando o chão, a sola dos pés e uma injeção de mana para aumentar a aceleração instantânea antes de acertar o oponente com a palma da mão. Ao mesmo tempo, era possível injetar mana aquecida em seus corpos para causar danos ainda mais sérios.
Era uma aplicação de três técnicas do Punho do Rei Guerreiro ao mesmo tempo.
Mas essa habilidade, qual era o nome dela?
Assim que recuperou a consciência, ele ouviu uma voz.
— Sete derrotas.
Shik.
Pale fez outro corte no chão.
Sete cortes estavam desenhados ali, mas não eram necessários.
Porque Kasajin estava bastante consciente sobre quantas derrotas sofreu.
— O que você perdeu desta vez?
Cada vez que ele era derrotado, perdia alguma coisa.
No entanto.
— Não sei.
A parte mais assustadora era que ele nunca sabia exatamente o que havia perdido. Ele tinha que lutar contra o demônio para saber. Porque usaria tudo o que roubou dele na batalha.
Não só isso, ele também alterava para se adequar ao seu próprio estilo de luta.
Isso o fez se sentir sujo… Como se alguém tivesse cuspido na cara dele.
“Seu Punho do Rei Guerreiro não é grande coisa, então vou refiná-lo para uma forma mais útil.”
Kasajin sentiu como se isso estivesse sendo dito.
— …
Todas as suas feridas foram curadas. Até pouco tempo atrás, ele estava à beira da morte, mas um pedaço de carne seca de Pale do tamanho da junta de um dedo foi suficiente para regenerar facilmente todos os seus ferimentos.
Para que ele pudesse lutar novamente.
No entanto…
“…”
Kasajin negou o pensamento que de repente surgiu em sua mente.
— Você perde algo toda vez que é derrotado, mas seu corpo fica mais forte.
A voz suave de Pale parecia zombar dele. Kasajin olhou para ela com um olhar profundo.
— Estou curiosa. Você está ficando mais forte? Ou está mais fraco?
Ele não sabia.
A pergunta de Pale era algo que Kasajin também queria muito saber.
Ele estava avançando? Ou estava regredindo?
Só havia uma maneira de descobrir…
Endireitando sua postura, Kasajin caminhou em direção ao demônio.
— Lembro que éramos cinco…
Sua voz estava seca como areia sem qualquer umidade.
Pale ouviu silenciosamente essa voz.
— Lukas, Schweiser, Kasajin e…
Ao dizer esses nomes, Kasajin parou. Mas sua boca permaneceu aberta. E ficou assim por um tempo, como se ele estivesse hesitante ou inseguro.
Boom!
De repente, ele bateu com o punho no chão, como um martelo.
Rachaduras parecidas com teia de aranha se espalharam pelo chão. Kasajin ofegou, incapaz de acalmar sua raiva. Seus olhos brilhantes se voltaram para Pale.
— Não são apenas técnicas… Esse cara também está levando minhas memórias?
— Huhu.
— Responda-me.
— Técnicas e memórias.
Pale sorriu assustadoramente.
— Mas isso é realmente tudo?
— Você está tentando testar minha paciência?
A vontade de lutar surgiu no corpo de Kasajin. Pale aceitou seu desafio levianamente. Ela tirou dois recipientes do bolso.
Eles eram recipientes de água.
Um deles estava vazio e o outro cheio d’água.
— Ei, Kasajin, qual você acha que é a essência desses cantis?
— …
— Responda-me.
A voz de Pale parecia conter um encanto irresistível. Então, mesmo cerrando os dentes, ele não teve escolha senão responder rudemente.
— Eles retêm água.
— Esse é o papel deles. Não é a essência deles.
Pale riu antes de continuar.
— A essência de um cantil é a água. Você entende? Este é um cantil bem-feito, mas sem água não passa de um lixo inútil.
— Do que está falando?
— Este cantil é Kasajin. E este aqui vazio… É o [0º Demônio].
— …
— E este é o processo que você está vivenciando atualmente.
Pale sorriu quando começou a derramar água de um dos cantis para o outro.
Splash.
O som do líquido sendo derramado foi estranho para Kasajin.
— As memórias que você tem. A personalidade que formou sua natureza, suas relações humanas e suas experiências. Memórias que só você conhece e as emoções que você sentiu naqueles momentos, as emoções que você sente quando olha para seus entes queridos, os hábitos triviais e maneirismos que nem você percebe… O Demônio levará todos eles.
— Você…
— Agora. Veja isso.
Pale pegou o cantil vazio e sacudiu-o levemente.
— Não há água aqui. Está vazio. Então, como devemos chamar este cantil agora?
— …
— Um recipiente vazio, uma concha.
Tuk.
O cantil vazio caiu de sua mão e rolou pelo chão.
— Se você continuar perdendo, se tornará uma concha vazia. E…
O olhar de Pale se voltou para o demônio.
— No fundo, esse ser se tornará mais parecido com Kasajin.
— Me deixe ir…
Kasajin falou com a voz quebrada.
Sua voz soou mais fina que um fio de cabelo e mais fraca que a de um paciente doente deitado no leito de morte, mas seu corpo ainda estava em perfeitas condições.
Pale estava certa. Seu corpo estava se tornando mais poderoso quanto mais ele lutava.
No entanto, sua mente estava quebrando.
— Eh?
Pale inclinou a cabeça para o lado.
— Você gostava de lutar. Não?
— Não. Isso é diferente. Eu, eu…
Kasajin se espremeu.
— Não… Quero mais lutar.
Se alguém que conhecesse a verdadeira natureza de Kasajin ouvisse essas palavras, teria duvidado de seus ouvidos. Ou poderiam ter confundido isso com um truque ou que ele era uma farsa.
Mas não foi nada disso.
Foi realmente o Rei Guerreiro Mágico, que pensava na luta como sua vida, que falou com uma voz tão fraca.
— Não posso.
Pale suavemente, mas com firmeza, recusou.
— Você não pode?
— Sim. Não posso. Você está fadado a se tornar Lorde do Vazio, o [0º Demônio]. Não pode haver outro resultado. Então…
Ela apontou para o [0º Demônio] com o dedo indicador.
— Continue a lutar.
— …
— Seja cem vezes, mil vezes ou dez mil vezes, continue a lutar. Agora, Kasajin, você já descansou o suficiente, não foi? Então levante-se.
Com essas palavras.
Kasajin levantou-se do chão como uma marionete que recebeu uma ordem.
Então cambaleou até o demônio.
[Venha.]
O 0º Demônio cumprimentou Kasajin com um sorriso inocente.
Ele olhou para aquilo e pensou.
O demônio tirou até mesmo sua capacidade básica de raciocínio? Por que ele continuava lutando? Por que ainda estava travando essas batalhas perdidas? Por que não conseguia desobedecer Pale?
Ele não sabia.
Sua mente parecia estar envolta em névoa. Parecia que havia um pedaço pesado de chumbo em seu peito e ele não conseguia mais sentir os batimentos cardíacos.
Ele não conseguia pensar em uma solução.
Então Kasajin não tinha escolha senão continuar lutando.
Ele estava com medo da derrota.
Mais precisamente, ele estava com medo do que perderia se fosse derrotado.
Ele queria protegê-los. Não queria esquecer nada. Não queria perder mais nada.
Mas como?
— …
Kasajin lembrou-se da Estátua do Demônio.
Estátua… Isso. Estátuas de pedra.
Enquanto sua memória ainda estivesse clara, ele deveria esculpir as pessoas que conhecia.
A partir daquele dia, Kasajin esculpiu estátuas sempre que tinha tempo. Os materiais eram abundantes. Havia um número incontável de rochas de formatos estranhos na área.
Ele também poderia esculpir os fragmentos de pedra quebrados.
Claro, os resultados foram desleixados. Não havia como evitar que eles fossem absolutamente terríveis. Afinal, Kasajin não tinha nenhuma destreza digna de artista.
“Posso esquecer sobre qualquer outra coisa. Mas…”
Mas ele não queria esquecer seus amigos mais próximos.
Kasajin cerrou os dentes. Um homem que usava uma espada, uma mulher que usava magia negra.
Ele não conseguia lembrar seus nomes. Mas mesmo que não conseguisse lembrar seus nomes, ele esculpiu seus rostos enquanto essas lembranças ainda estavam claras em sua mente.
Em algum momento, a escultura não trouxe mais felicidade a Kasajin.
Scratch, scratch-
Ele esculpia as estátuas com uma expressão vazia. Não tinha muito tempo.
Era um sentimento de obrigação? Um senso de dever?
Ou era outra coisa que o fez esculpir a estátua?
Ele não sabia.
Então, Kasajin continuou esculpindo.
Em algum momento, Pale desapareceu.
Os únicos que restavam naquele espaço escuro eram Kasajin e o demônio… Kasajin e o demônio?
Ele olhou para o ser à sua frente.
Tinha um corpo que lembrava pedra sólida, olhos de fera e, embora os chifres em sua cabeça e asas não tivessem mudado, suas feições pareciam pertencer a alguém com quem ele estava muito familiarizado.
“Na verdade, agora…”
Não era mais adequado chamar esse ser de Kasajin?
Então como ele estava agora?
Kasajin olhou para a palma da mão. Ele podia ver dedos finos que pareciam estar apenas cobertos de pele. Era estranho. Parecia que… Seu corpo estava mais forte. Na verdade, Pale também não disse que seu corpo estava ficando mais forte?
Verdade… Ele estava definitivamente ficando mais forte.
Embora seus músculos tivessem desaparecido, Kasajin sentiu que seu corpo continha mais poder.
Porém… Esse era realmente o caminho que ele queria?
Ele olhou para a estátua e disse.
— Ei, você consegue me ouvir?
Claro, a estátua não podia responder e Kasajin sabia disso.
— Minhas memórias estão desaparecendo gradualmente.
Ele arrancou o cabelo. Mordeu os lábios e roeu as unhas. Gritou como um louco e, em algum momento, bateu a cabeça no chão até sangrar.
— O Grande Mago. Meu querido amigo. O Grande Mestre…
E, no entanto, ainda não conseguia se lembrar.
Ele não conseguia se lembrar em primeiro lugar.
Afinal, as memórias de Kasajin não desapareceram ou foram esquecidas.
— Como era… Mesmo?
…
— Havia muitos. Ele tinha mais títulos do que isso, muito mais…
Eles haviam desaparecido.
Todos eles se foram.
Como lenha queimada ou neblina ao nascer do sol.
A cor das letras nas páginas do livro não havia desbotado, as páginas foram rasgadas. E o conteúdo das páginas arrancadas de um livro não podia ser visto.
Ele havia perdido suas memórias, perdido sua essência.
— Ele se parecia com você.
Kasajin olhou para a estátua enquanto falava.
Este homem.
Este homem com uma expressão franca no rosto, que estava coberto por um manto e segurava um cajado de maneira majestosa.
— As estátuas têm uma limitação clara. Porque só podem mostrar uma forma. É por isso que você…
Ele só conseguia se lembrar deles serem amigos próximos.
No entanto.
— Qual era a cor do seu cabelo? Seus olhos? Como era sua voz?
A mão que segurava a estátua ficou tensa. E rachaduras se espalharam pela estátua, que foi esculpida em pedra.
— Haha… Estou ficando louco.
…
— Ei, por favor me responda.
A estátua não podia responder.
Kasajin sabia disso.
No entanto, sentiu que não poderia sobreviver se não perguntasse.
— Então, diga-me… Grande Mago.
Kasajin disse com uma cara que parecia que iria chorar.
— Qual era seu nome?