O sol se punha no horizonte, pintando o céu com tons de roxo profundo e vermelho intenso. Os últimos raios de luz se moviam sobre as ameias e os rostos cansados dos presentes. Alguns soldados e civis começaram a murmurar em tons suaves e ansiosos. Suas vozes se misturavam ao vento farfalhante enquanto um deles sussurrava.
“Talvez o Alto-Cavaleiro Comandante estivesse errado. Talvez aquelas criaturas não estejam vindo.”
“O Alto-Comandante já esteve errado antes?”
“Não, mas… e se isso for só um exercício? Algum tipo de teste?”
Eles se mexeram, inquietos. Estavam ali parados há horas. A ameaça de uma quebra de masmorra pairava há algum tempo, mas ninguém jamais poderia prever exatamente quando isso aconteceria. No entanto, seu líder os reunira ali como se soubessem quase o momento exato em que ela começaria.
À medida que o último raio de sol se esvaía, um silêncio pesado se instalou sobre os defensores. Então, de repente, sons estranhos e distantes romperam o ar parado. Uma vibração baixa e estrondosa tremeu sob o solo e ondulou ao longo das muralhas fortificadas. A hesitação se transformou em alerta enquanto os vigias se esforçavam para identificar a fonte.
Crk… crk… shhhk.
Um som semelhante ao de ossos se estilhaçando ecoou pelo campo aberto, seguido por um lamento agudo que paralisou todos os soldados. A névoa além das muralhas se agitava como se algo enorme se movesse dentro dela.
“A-alguma coisa está vindo. Olhem!”
Batedores nas torres apontavam para o longe. A névoa mágica, antes invisível, brilhou para todos verem. Uma explosão de luz azul irrompeu da névoa enquanto o chão rachava e se agitava. Rugidos enchiam o ar. Alguns eram profundos e ameaçadores, outros altos e penetrantes. Algumas figuras tinham forma vagamente humana. Outras pareciam feras. A quebra da masmorra havia começado.
E naquele momento, ninguém mais duvidou do Alto-Comandante. Por um instante, o silêncio retornou. Então, ouviram-se os passos. Não de uma única criatura, mas de centenas. O som ecoava cada vez mais a cada momento. Conforme os monstros emergiam, seus rosnados aumentavam, ficando mais altos a cada segundo. Soldados ao longo da muralha instintivamente ergueram suas armas. Torres automatizadas ganharam vida, seus canhões girando em direção à distância de onde as criaturas avançavam.
A névoa se dissipou lentamente, revelando a primeira onda. Grandes feras feitas de pedra retorcida e quitina avançaram com passos pesados, os membros dobrados em ângulos anormais. Seus olhos brilhavam fracamente, com nada além de malícia. Atrás deles, formas velozes rastejavam como insetos gigantes, formando um tapete grotesco de corpos blindados que se estendia em todas as direções.
Robert foi o primeiro a se aproximar. Sua mão repousava sobre o punho de sua lâmina rúnica, que ansiava por usar.
“Eles começaram a emergir. Basta dar a ordem e minhas tropas acabarão com eles rapidinho.”
Sua voz estava cheia de confiança, mas Roland interveio rapidamente, interrompendo-o antes que ele fizesse algo imprudente.
“Não precisa. Vamos deixar as torres automatizadas cuidarem disso por enquanto. Esses monstros não devem ser um problema…”
A maioria das pessoas não seria capaz de avaliar a força dessas criaturas, mas para Roland, era simples. Os maiores eram uma espécie de golem, grosseiramente formados por uma mistura de partes de insetos e pedra. Pareciam algo remendado por um cientista perturbado, uma colcha de retalhos de quitina e rocha.
Atrás deles, vinha um enxame de criaturas menores – escaravelhos, centopeias e besouros. Monstros insectoides não comumente encontrados na masmorra de Albrook. Ainda assim, eles compartilhavam uma característica notável: nenhum deles estava acima do nível cem. Roland ergueu a mão. O momento havia chegado.
“Ative os sistemas de torre rúnica.”
Embora pudesse ter feito essa tarefa sozinho, ele desejava dar às pessoas ali presentes a oportunidade de aprender como as defesas funcionavam. Algumas pessoas operavam um console escondido em uma das torres próximas, assim que ele deu o comando, elas ativaram as torres por meio de uma série de comandos. Engrenagens mudavam, runas brilhavam e os canos começaram a girar e mirar em seus alvos.
Então veio o rugido da destruição com poderes arcanos. A primeira rajada atingiu como um trovão. Raios de luz fulgurante voaram em linha reta para atingir um golem bem no peito. A criatura explodiu em uma chuva de pedras, seus olhos brilhantes desaparecendo no esquecimento. Outro raio se seguiu, depois outro, cada um atingindo um monstro e devastando-o até o esquecimento. O céu acima da cidade flamejou com energia enquanto torre após torre descarregava saraivadas de mana condensado na horda que se aproximava.
As criaturas não tiveram chance. Explosões de luz e fogo cobriram o campo de batalha. Abominações de pedra e corpos de insetos se estilhaçaram como porcelana, com as pernas se dobrando ao caírem sob o fogo implacável. Os insectoides menores não se saíram melhor, sendo incinerados por pulsos rúnicos que cortavam suas fileiras em arcos flamejantes. O campo de batalha se transformou em uma fornalha incandescente de magia rúnica.
“Pelos deuses…”
Lucille sussurrou enquanto levantava a mão para proteger os olhos.
“Isso… isso é extraordinário.”
Ela não foi a única a ficar sem palavras. Ao seu redor, as pessoas estavam boquiabertas, cativadas pelo espetáculo que se desenrolava diante delas. As torres que ladeavam as muralhas estiveram lá, silenciosas e imóveis, seu poder apenas teórico na mente da maioria. Mas agora, enquanto cada uma delas atirava em perfeita harmonia, sua verdadeira força era revelada.
Roland permaneceu em silêncio enquanto o campo de batalha se iluminava com fogo e fumaça. O zumbido mecânico das torres enchia o ar enquanto elas continuavam dilacerando os monstros, espalhando sangue pelo chão. Seus canhões, forjados em ligas variadas, impediam que superaquecessem rápido demais. Ainda assim, havia um limite para o tempo que podiam disparar sem pausa. Logo, um terço das torres entrava em fase de recarga. Assim que se recuperavam, outro terço se desligava para iniciar o mesmo processo, auxiliado por runas de gelo que haviam sido colocadas por perto, embora não fizessem parte das torres propriamente ditas.
Com um terço das defesas automatizadas desativadas, os monstros conseguiram avançar ainda mais na luta. No entanto, Roland não se moveu. Permaneceu parado, imóvel como sempre. Os arqueiros nas muralhas mantiveram suas posições, aguardando o sinal que ainda não havia chegado.
‘Um pouco mais…’
Um estrondo distante ecoou pela planície, como o estalar de gelo ancestral. Da névoa de mana surgiu um movimento, lento a princípio, depois mais rápido do que qualquer um dos monstros anteriores. A terra tremeu sob o peso de algo imenso. E então eles viram.
Uma criatura do tamanho de um prédio de dois andares emergiu da névoa. Seu corpo estava coberto por placas irregulares verde-escuras, unidas a membros contorcidos de carne pulsante. Dezenas de olhos piscavam em um ritmo nauseante enquanto avançava, indo direto para a próxima armadilha de Roland: um campo repleto de minas.
BOOM!
Várias minas explodiram sob a pata dianteira esquerda do titã, rasgando sua estranha armadura biológica. Ele rugiu de dor, mas continuou se movendo. Outra explosão o atingiu, depois outra, cada explosão perfurando suas defesas e forçando-o a cambalear. As minas haviam sido enterradas a um quarto de quilômetro das muralhas, posicionadas precisamente para interceptar os monstros que se aproximavam.
Mais criaturas o seguiram. Dezenas, talvez centenas. Bestas retorcidas, horrores deformados com membros e bocas demais. Eles se amontoaram no campo minado, e o que se seguiu foi uma sinfonia de destruição.
As minas detonavam em intervalos controlados, uma após a outra, acionadas por encantamentos sensíveis a mana. Rajadas de terra e estilhaços enchiam o ar. Membros voavam. Gritos ecoavam pelo campo de batalha. Fumaça subia em colunas espessas enquanto cratera após cratera rasgava a horda em investida. Os monstros diminuíram a velocidade, depois vacilaram, seu ímpeto quebrado pela barragem implacável.
O atraso funcionou. A pressão sobre as torres diminuiu, permitindo que seus sistemas rúnicos esfriassem e se recuperassem. Roland já sentia os níveis de energia se equilibrando, retornando para mais perto de onde haviam começado.
‘Isso nos economizou muito tempo e dinheiro sabendo de que lado eles viriam.’
À medida que a carnificina se desenrolava, Roland não pôde deixar de sentir uma ponta de orgulho. Essa defesa vinha sendo construída há muitos meses. Além do conjunto de torres que haviam sido realocadas do lado oposto das muralhas para reforçar aquela seção, havia plantado inúmeros dispositivos explosivos no subsolo. Alguns eram simples pergaminhos de runas que havia preparado há muito tempo, enquanto outros haviam sido criados por alquimistas como Rastix. Juntos, eles criaram o espetáculo explosivo que agora se desenrolava, com centenas de feras sendo dilaceradas.
‘Seus números estão diminuindo rapidamente.’
Em pouco tempo, alguns monstros de nível três começaram a emergir. Eram muito mais resistentes a disparos de torres e explosões, mas o ataque constante os desgastava. Nem mesmo suas peles endurecidas e habilidades regenerativas conseguiam suportar o dano acumulado. Um por um, eles foram caindo.
“Está indo bem o suficiente…”
Roland deu um passo à frente. Os que o cercavam ficaram atônitos com o espetáculo da horda de monstros sendo repelida com tanta facilidade. Com tanta preparação, o resultado não foi surpreendente. A verdadeira questão agora recaía sobre as tropas que aguardavam e os aventureiros que se reuniram na esperança de saquear. Eles permaneceram perto dos portões, prontos para avançar caso algum monstro rompesse a primeira linha de defesa.
Mesmo assim, os monstros continuaram a avançar. Embora as torres e as explosões tivessem eliminado grande parte deles, alguns começaram a passar despercebidos. A crescente pilha de cadáveres acabou interferindo no alcance dos explosivos. Alguns dos monstros eram pequenos e ágeis, disparando pelas brechas e se aproximando da muralha principal onde os defensores estavam.
Os arqueiros ergueram seus arcos, prontos para eliminar as criaturas parecidas com insetos que serpenteavam pela grama alta. Mas eram difíceis de avistar. Era hora de mobilizar uma de suas unidades mais novas.
“Divisão Exoesquelética, é a vez de vocês. Quero que vocês incendeiem eles.”
Um pequeno grupo avançou, movendo-se a passos largos. Usavam trajes semelhantes ao que Robert usara durante seu julgamento, embora estes não tivessem a armadura externa completa. Apenas vinte deles estavam de prontidão, e cada um se distinguia por não possuir uma classe de batalha. Liderando-os estava alguém que Roland conhecia bem, seu assistente, Bernir.
“Tudo bem, pessoal, vamos lá!”
Bernir gritou, demonstrando entusiasmo. O grupo em armadura exoesquelética respondeu com um chiado sincronizado de pistões pressurizados e o zumbido baixo de circuitos rúnicos sendo ativados. Sua armadura, diferentemente das tradicionais armaduras de cavaleiro, era elegante e angular, coberta de runas gravadas que pulsavam com uma luz laranja opaca. Cabos ao longo de suas espinhas conectavam-se a tanques contendo fluido de mana em algumas unidades e a baterias de runas em outras.
As dez unidades avançaram até a borda da muralha, e suas formas imponentes faziam os pilotos ali dentro parecerem pequenos em comparação. Em vez de mãos, cada unidade apresentava uma extensão cilíndrica coberta por runas brilhantes que começavam a se ativar. Por meio da tecnologia de fantasmas de mana, os pilotos controlavam esses membros com precisão, guiando seus movimentos como se fossem seus.
À medida que os mecanismos ganhavam vida, os braços cilíndricos começaram a irradiar calor intenso. Em instantes, explosões de chamas irromperam deles, varrendo o campo de batalha abaixo. O fogo choveu, engolfando os monstros que haviam escapado pelas defesas externas.
As criaturas semelhantes a insetos gritavam em agonia enquanto as chamas as consumiam. Eles se contorciam e se debatiam, o fogo grudando em seus membros e queimando suas conchas e articulações em segundos. Não era um fogo comum. Cada explosão se prendia a seus corpos, imune à água e insensível à falta de ar. Continuaria a queimar indefinidamente, a menos que fosse extinto por meios mágicos.
Nenhuma das criaturas tentou fugir. Seus instintos não eram seus, mas sim guiados pela vontade da masmorra. Comportavam-se mais como golens irracionais do que como seres vivos. Isso facilitava as coisas. Eles simplesmente se lançaram no inferno até que nada restasse além de cinzas.
“Queimem, seus bastardos rastejantes!”
Bernir gritou de dentro de sua unidade, que se destacava das demais por seu design superior. Seu moral estava alto. Ele usava um traje Graça Prateada personalizado, completo com um capacete para protegê-lo do calor crescente. Atrás da muralha, os soldados podiam sentir a temperatura subindo do outro lado, mas nada a atravessava. Nenhum monstro havia conseguido escalar as muralhas. Começava a parecer que eles haviam se preparado demais para o ataque.
“Chega.”
“Sim, Chefe… Quer dizer, Alto-Comandante!”
Alguns soldados próximos olharam para Bernir com os olhos arregalados. Muitos desconfiavam dele e não ousavam falar tão casualmente. Mas, devido à sua familiaridade com Roland, o viam sob uma luz diferente. Bernir não era apenas mais um oficial, era o assistente pessoal do Alto-Comandante, alguém que o acompanhava há anos. Essa conexão por si só lhe rendeu um nível de respeito e reverência que poucos desfrutavam.
Roland assentiu com a cabeça para Bernir e, com um rápido acionamento de um interruptor dentro do exoesqueleto, as chamas mágicas cessaram. Dentro dos grandes braços do exoesqueleto havia vários interruptores, cada um correspondendo a um feitiço diferente. O fogo não era o único elemento que eles podiam liberar, pois os trajes também eram capazes de produzir gelo e disparar raios.
‘Isso é suficiente…?’
Ele se perguntou enquanto observava o campo coberto de monstros queimados e destroçados. Nenhum deles conseguira romper sequer a primeira linha de defesa. Suas forças, juntamente com os aventureiros contratados, permaneciam de prontidão, mas, dado o desenrolar dos acontecimentos, talvez não fossem necessários. O tempo estava passando e Roland tinha outras missões em mente, mas a segurança da cidade e das pessoas próximas a ele era prioridade. Mesmo assim, não conseguia deixar de sentir que suas habilidades poderiam ser mais bem aproveitadas em outro lugar.
“É o Lorde!”
Enquanto ele permanecia imerso em pensamentos, Arthur chegou, trajando uma armadura completa de mythril reluzente. Seus longos cabelos brancos caíam sobre suas orelhas meio-élficas e, combinados com seus olhos verdes vívidos, conferiam-lhe uma presença etérea. A multidão instintivamente abaixou a cabeça, e até Roland teve que agir como se Arthur fosse seu superior.
“Como está?”
Arthur perguntou, com o olhar fixo no espetáculo contínuo de luz e fogo. As defesas rúnicas ainda disparavam incansavelmente, e os gritos dos monstros ecoavam sem parar.
“Seus números estão diminuindo, assim como a concentração de mana.”
“Como esperado?”
Roland assentiu. Tudo estava indo conforme o planejado. Meses drenando mana dos túneis da masmorra haviam enfraquecido significativamente a barreira da masmorra. O número de monstros de nível 3 era mínimo e, mesmo que alguns conseguissem chegar às muralhas da cidade, seriam rapidamente derrotados pelos defensores.
“Entendo. Então vá. Deixe o resto comigo. Quando isso acabar, me junto a vocês, como combinamos.”
“…”
“Algum problema?”
“Não, deve ficar tudo bem. É só que…”
Arthur riu baixinho.
“Não se preocupe. Confie no seu plano. E mesmo que algo dê errado, olhe.”
Ele virou a cabeça, gesticulando em direção à grande multidão reunida atrás deles. Soldados estavam de prontidão, incluindo Mary, os dois cavaleiros que Roland ajudara a alcançar o nível 3, e uma horda de aventureiros experientes se preparava para defender a cidade. Roland sabia que havia pouco a temer. Os preparativos eram minuciosos, as defesas, fortes. Mesmo assim, não conseguia deixar de se preocupar.
“Como desejar, Lorde Arthur.”
Depois de confirmar que nada incomum estava acontecendo no campo de batalha, Roland voltou sua atenção para Robert e Lucille.
“Sir Durendal, Lady Curtana, por favor, sigam-me.”
“Sim, Alto-Comandante!”
Eles responderam em uníssono, já informados sobre o plano à frente. Esta missão não era algo que ele poderia realizar sozinho. Além desses dois, reuniria mais três indivíduos. Alguns soldados observaram com leve confusão enquanto seu Alto-Comandante começava a se afastar, mas nenhum deles disse uma palavra. Simplesmente o observaram se dirigir ao acampamento dos aventureiros.
“Venham comigo, vocês dois.”
“Hum?”
Armand piscou, claramente confuso com a ordem repentina, mas Lobélia rapidamente lhe deu um tapa na nuca.
“Não questione o Alto-Comandante. Só ande logo, idiota.”
“Não me chame de idiota!”
“Então pare de agir como um!”
Roland revirou os olhos por trás do capacete e continuou em direção à última pessoa que tinha em mente. Suas opções para a missão eram limitadas, mas este último recruta era de longe o mais forte. A grande cabeça calva do homem brilhava sob o brilho dos ataques mágicos, e ele já parecia irritado antes mesmo de Roland alcançá-lo. Ainda assim, ele não recusaria – não depois de tudo o que havia conquistado com o apoio de Roland.
“Mestre da Guilda.”
“Alto-Comandante Wayland…”