Nick observou a cidade por um tempo.
De fato, as coisas haviam mudado.
A megaestrutura e a Cidade Externa pareciam praticamente as mesmas de algumas décadas atrás, exceto por alguns prédios que haviam sido substituídos.
As pessoas na Cidade Externa também não pareciam muito diferentes de antes.
Não estavam superfelizes, mas também não viviam em constante desespero.
Apenas viviam a vida.
“Pelo menos isso significa que as coisas não voltaram a ser tão ruins quanto antes de eu me tornar Intermediador”, pensou Nick.
“No entanto”, pensou Nick, ao focar nos novos prédios.
A antiga Cidade Carmesim tinha cerca de cinco quilômetros de diâmetro.
A Cidade Carmesim que Nick via tinha cerca de sete quilômetros de diâmetro, acrescentando um anel externo com cerca de um quilômetro de largura.
Surpreendentemente, os antigos muros ainda estavam ali, separando a antiga Cidade Carmesim da nova.
E foi exatamente aí que as coisas começaram a mudar.
O anel mais novo ao redor da cidade se parecia com os Dregs.
A única diferença era que as pessoas não pareciam tão famintas quanto as dos antigos Dregs.
No entanto, ainda pareciam estressadas e miseráveis.
Nick já tinha visto incontáveis humanos e aprendera muito sobre psicologia quando foi recruta da Égide.
“Sintomas de excesso crônico de trabalho”, pensou Nick.
Com base em seus corpos, essas novas pessoas não estavam desnutridas nem anêmicas. Surpreendentemente, seus corpos eram bastante resistentes e em forma.
Ainda assim, seus olhos estavam caídos, estavam constantemente nervosos, e seus corpos descansavam ou se moviam de maneira trêmula.
Nick também pôde ver que praticamente todas as pessoas que viviam nas periferias estavam trabalhando naquele momento.
Uma boa parte delas trabalhava em novos campos ao norte da cidade.
Esses campos se estendiam da Cidade Carmesim até cerca de um quilômetro da costa.
Os campos eram gigantescos!
Tinham basicamente dez quilômetros de comprimento e largura!
A comida cultivada ali parecia bastante interessante.
Os campos estavam repletos de árvores adultas, com enormes frutas penduradas no topo de seus troncos.
Nick já tinha visto aquelas frutas antes.
“Como se chamavam? Mamões?” pensou Nick.
Nick viu centenas de pessoas indo do anel externo até os mamões com água e fertilizante.
Chovia apenas uma vez por semana, mais ou menos, e isso não era suficiente para cultivar plantas como aquelas.
A quantidade de mamões sendo produzida ali era insana.
Era mais do que a cidade conseguia consumir.
No entanto, obviamente, esse não era o objetivo das árvores.
“São para se tornarem um produto local para caravanas.”
Nick percebeu que muitos dos trabalhadores pegavam mamões aleatoriamente enquanto trabalhavam e os comiam sem tentar esconder o ato.
“Provavelmente um benefício do trabalho”, pensou Nick. “Permitir que comam mamões durante o serviço dá aos empregadores a oportunidade de pagar salários mais baixos, ao mesmo tempo em que ganham um cliente para o excedente de produção.”
“Sem surpresa que eles não estejam desnutridos. O transporte constante e o vai-e-vem também os mantêm relativamente em forma.”
“E ainda assim, parecem mais escravos do que pessoas normais.”
Nick observou por um tempo.
Viu alguns trabalhadores cujo turno estava terminando, e os acompanhou no caminho de volta para casa.
No caminho, carregavam um monte de mamões e os trocavam com outras pessoas por comida diferente e água.
Depois, caminhavam para casa, cumprimentavam a família e…
Iam dormir.
Quase todos aqueles trabalhadores adormeciam quase imediatamente ao deitarem na cama.
“Seus corpos e mentes estão exaustos”, pensou Nick. “Existem pessoas que conseguem dormir em segundos, mas a chance de todos esses trabalhadores simplesmente terem esse atributo é baixa.”
“Isso significa que o corpo precisou adquirir esse atributo para sobreviver.”
Nick observou o número de empregados trabalhando e cruzou com quantas pessoas saíam e chegavam a cada hora, por cerca de três horas.
Os resultados foram absurdos.
“Eles estão trabalhando 16 horas por dia, sem contar o trajeto até o trabalho.”
“Como também precisam comprar coisas e comer, mal têm sete horas de sono por dia, e isso só se não tiverem nenhuma vida pessoal.”
“Pelo estado dos corpos, também não há dias de descanso.”
“Essas pessoas estão literalmente trabalhando 112 horas por semana.”
“Isso é insano!”
“Por que estão trabalhando tanto? Deveria ser óbvio que trabalhar tanto assim mataria qualquer um rapidamente.”
“Ninguém faria isso por toda a vida sem ser forçado.”
“Comida não parece ser o problema. Na verdade, todos voltam para casa com muito mais comida do que realmente precisam.”
“Água também não é um problema.”
“Os créditos que recebem também são bem razoáveis.”
“Também não vejo guardas tirando-os da cama à força ou espancando-os para que trabalhem mais rápido. É como se todos estivessem fazendo isso voluntariamente.”
Nick levou alguns minutos para encontrar a razão.
“Não há pessoas sem-teto.”
“Nem uma sequer.”
“Cada pessoa tem uma casa, sem exceção.”
“Até os idosos e doentes têm casas.”
As sobrancelhas de Nick se franziram.
“No entanto, há pouquíssimos idosos e doentes.”
Nick se aproximou lentamente de uma das casas, mantendo-se escondido.
Foi então que sentiu algo muito interessante.
“Há uma Barreira sofisticada ao redor desta casa.”
“Espectros não conseguiriam ver a Barreira, mas podem sentir o perigo.”
“Aproximar-se desta casa parece perigoso.”
No momento seguinte, a Barreira de Nick foi ativada, e ele usou suas capacidades de análise para inspecionar essa Barreira misteriosa.
Quando sua Barreira lhe deu os resultados, ele ficou irritado.
“É uma ameaça vazia!” pensou Nick. “Essa máquina inteira é inútil contra Espectros! Ela apenas emite ondas que os Espectros percebem como perigosas!”
Nick não havia feito a conexão antes, mas após perceber o que estava acontecendo, notou que aquela sensação de perigo era semelhante a uma outra que já havia sentido.
“O espaço acima da máquina verde”, pensou Nick. “A sensação ameaçadora e perigosa desta casa é muito parecida com o espaço acima da máquina verde!”
“Mas ela não tem o mesmo poder!”
“A força misteriosa sobre a máquina verde causava o mesmo efeito que afogamento causa em um humano normal, enquanto essa aqui apenas me lembra como o afogamento se sente.”
Nick rapidamente encontrou o gerador dentro da casa, transformou-se em névoa e o inspecionou.
Ele examinou a máquina e rapidamente descobriu como aquela sensação era gerada.
“Vibrações”, pensou Nick, ao observar vibrações extremamente sutis percorrendo as paredes.
Nick colocou parte de sua névoa em uma peça crucial da máquina e a impediu de se mover.
A casa parou de vibrar, e a sensação de perigo que Nick estava sentindo o tempo todo desapareceu.
Um momento depois, ele soltou a peça, e a casa voltou a vibrar.
Um humano normal não notaria as vibrações, pois eram extremamente sutis.
Depois de analisar a máquina por mais um tempo, Nick finalmente descobriu por que todos pareciam trabalhar tanto.
“Essa coisa consome dois gramas de Zephyx por mês!” Nick percebeu.
Então, olhou para as casas.
Cada uma delas possuía um gerador como aquele.
No momento seguinte, ele olhou para a parede gigantesca que separava o anel externo da Cidade Externa.
Naturalmente, as pessoas atrás dos muros não precisavam dessas máquinas.
“É por isso que não há pessoas sem-teto.”
“Qualquer um que não tenha uma casa é comida livre para qualquer Espectro, e como não há muros, quase qualquer Espectro pode vir até aqui.”
Assim que Nick percebeu o que estava acontecendo, ficou furioso.
“Construir um novo muro é caro, mas a construção se pagaria em apenas 16 meses!”
“É uma solução óbvia para uma quantidade horrenda de sofrimento.”
“Qualquer Governador minimamente decente pensaria nisso. Também não é difícil de implementar.”
Nick olhou para a cidade com a testa franzida.
“Aria provavelmente não é mais a Governadora da Cidade Carmesim. Ela nunca teria deixado algo assim acontecer.”
“No entanto, nem mesmo um idiota seria burro o suficiente para não pensar em construir um muro.”
“Isso só pode significar que o Governador é corrupto e está, de propósito, não resolvendo o problema.”
“E o motivo disso não poderia ser mais claro.”
A Cidade Carmesim tinha cerca de 2.000 novas pessoas, todas vivendo no novo anel externo.
Com uma média de quatro pessoas por casa, havia 500 casas, e cada uma precisava de pelo menos dois gramas de Zephyx por mês para funcionar.
Isso era mais de um quilo de Zephyx por mês.
No entanto, a parte importante não era essa, mas sim a produção insana da Cidade Carmesim.
A quantidade de bens produzidos pela Cidade Carmesim era absurda, e a cidade provavelmente ganhava uma quantia insana de créditos vendendo para as caravanas.
“Os lucros dessas máquinas na verdade nem são a parte mais importante. O que importa é a alta produção de bens graças à abundância de horas de trabalho investidas.”
“O fato de até mesmo as casas mais pobres terem mais de 2.500 créditos disponíveis todo mês é insano. Em outras cidades, ter 500 créditos já deixa sua vida estável, e com 1.000 você vive com bastante luxo pelos padrões das pessoas normais.”
“No entanto, 2.500 créditos parecem ser o mínimo aqui, e muitos têm mais de 3.500 créditos disponíveis por mês.”
“Uma coisa é certa. A economia está realmente boa na Cidade Carmesim.”
“A Cidade Carmesim está produzindo muito acima de seu porte.”
“E, como sempre, provavelmente é a elite que não quer recuar um passo sequer para permitir que o povo leve uma vida normal.”
“É sempre assim, maldição!”
Nick respirou fundo.
“Infelizmente, não estou aqui para consertar a Cidade Carmesim.”
“Esse já não é mais meu trabalho.”
“A única coisa que posso fazer é relatar isso ao Técnico depois.”
“Quero ajudar, mas preciso manter minha identidade em segredo por enquanto, e não posso me envolver.”
“Eu odeio isso.”